• Rainha Branca

Durante toda a minha vida, sempre tentei ser o mais bondosa possível. Ser boa, honesta e gentil era a minha prioridade, até pouco tempo. A ganância e o egoísmo das pessoas supera a paz e a tranquilidade existente em alguns poucos indivíduos. Dei o meu melhor para ajudar as pessoas, mas elas me retribuiram com o seu ódio e desgosto.
Mas como uma boa Rainha do País das Maravilhas, eu não deixei transparecer os meus verdadeiros sentimentos e nem deixá-los afetar os meus atos. Isso não durou muito tempo, pois logo senti meu coração ficar sombrio, repleto de repulsa.
Em um momento de descontrole alguns dias atrás, no meio da noite, eu saí do Castelo Branco e fui aos estábulos, pegar meu corcel cor de neve. Rapidamente me dirigi ao Castelo de minha irmã, a Rainha Vermelha. Ela era a pessoa que mais me odiava, que gostava de me humilhar por puro prazer. Quando cheguei lá, entrei sorrateiramente no estábulo e fui até o cavalo favorito de minha irmã. Tendo total conciência de que meu ato seguinte iria enfurecer a Rainha Vermelha, peguei uma adaga afiada que eu trouxe comigo e cravei no peito do animal diversas vezes. Seus relinchos de surpresa e dor não significavam nada para mim, pois naquele momento eu estava alheia a tudo.
Quando me dei conta do que fiz, comecei a tremer e deixei a adaga ensanguentada cair de minha mão. O corpo do animal permanecia inerte dentro da repartição do estábulo. Estava morto. Comecei a chorar, quase sem acreditar no que havia feito. Eu nunca faria mal a outro ser vivo, em minha condição normal, eu estava fora de mim. Eu precisava ser contida.
De repente, alguns barulhos no lado de fora daquele lugar me forçaram a despertar do meu estado de torpor. Ser pega e presa (senão morta) pelo meu crime, estava fora de cogitação. Eu ficaria amargurada e remoendo a culpa pelo resto da vida e acabaria por esquecer de viver. Por isso, me virei e montei no meu cavalo rapidamente, e juntos saímos pela porta dos fundos, evitando que os guardas noturnos me vissem.
Apenas alguns minutos depois, eu já estava entrando escondida no meu próprio castelo. Por sorte, ninguém tinha me visto durante o trajeto. Inclusive deixei a adaga comum na cena do crime, porque se eu levasse, ela iria manchar minhas vestes, que possivelmente levantariam suspeitas entre as criadas.
Naquela noite, eu dormi pesadamente em minha cama, depois de uma longa crise de choros silenciosos. No dia seguinte, a notícia do ataque terrorista contra a Rainha Vermelha se espalhou pelo reino, causando-me uma onda de indisposição. Eu estava cheia de arrependimento, mas não podia negar que no fundo, havia uma pontada de satisfação na minha alma. Finalmente consegui me vingar de minha irmã, de forma anônima.
Mas apesar de tudo, eu ainda era boa, e não podia deixar as trevas tomarem conta do meu coração. Aquilo foi um momento de descontrole, e jurei a mim mesma que nunca faria algo assim de novo. Eu nunca mais seria capaz de fazer mal a algum ser vivo.
Só porque as pessoas ao seu redor são malvadas, isso não significa que você deve ser malvada também. Uma Rainha sempre deve manter a compostura e ser educada e prudente, e foi isso que eu fiz. Decidi continuar sendo serena e não pender para as trevas, pois se fosse assim, eu não seria melhor do que nenhuma daquelas criaturas cheias de ódio.