Félix estava ansioso com o jantar na casa de Niko. Enquanto dirigia pensava nas palavras de Paloma, que sentiu no ar o flerte entre seu irmão e seu amigo e resolveu alertá-lo.

Paloma chegou à mansão dos Khoury disposta a ter uma conversa séria com Félix. Estava mais do que óbvio o interesse do irmão em Niko, e vice-versa, isso a deixava preocupada, pois ainda não estava convencida de que Félix tinha mudado, mesmo com o esforço dele para demonstrar isso a todo o momento. Paloma precisava ter uma conversa definitiva com o irmão.

Félix se admirava no grande espelho do closet. Queria estar primoroso, perfeito, pois lindo igual a ele com certeza não haveria ninguém, segundo o próprio. Enquanto sorria para si mesmo em frente ao espelho ouviu uma leve batida na porta do quarto.

O sorriso se desfez assim que ele abriu a porta e deu de cara com a irmã, que pediu licença e foi entrando, sem conseguir disfarçar uma olhada na aparência impecável do irmão.

– Você está muito elegante Félix! – Paloma tentava ser simpática enquanto pensava se tinha o direito de se meter assim na vida dele, mas por Niko sentia que precisava.

– Obrigado irmãzinha... – Félix alisava pela milésima vez o paletó e tirava pela centésima vez um fiapo imaginário. – Mas acredito que você não veio até aqui para admirar a minha beleza, veio porque está preocupada com o Niko, não é isso?

– Niko é uma pessoa muito especial! – Paloma falava e encarava o irmão com a expressão muito séria – Ele já se machucou demais e acho que merece alguém que o faça feliz.

– Como assim Paloma? Quem seria capaz de machucar aquele Carneirinho? – Félix não pôde conter a curiosidade diante das palavras da irmã.

– Ele foi traído pelo companheiro, quer dizer, pelo ex-companheiro com quem viveu por muitos anos. Na verdade foi duplamente traído, pelo ex e pela melhor amiga. – Paloma contou toda a história para o irmão em tom de indignação.

– Gente! Tô bege... Que babado! Pobre Niko, como alguém pode fazer isso com ele? – Félix ouvia o relato da irmã estupefato.

– Entende agora, quando digo que ele merece alguém que o faça feliz? Pensa bem Félix, você é essa pessoa? Quero muito acreditar que você mudou, mas estou com medo, pelo Niko.

Félix desviou o olhar do rosto da irmã, baixou a cabeça, deixou os ombros caírem em desânimo e com um suspiro respondeu:

– Talvez eu não seja a pessoa certa, Paloma... Mas sinto alguma coisa inexplicável por aquela criatura cacheada desde que o vi em Milão. Ele ficou no meu pensamento e agora o destino me deu essa chance e o colocou no meu caminho. – Félix voltou a encarar a irmã, e com toda a sinceridade que dispunha dentro dele abriu o coração.

– Vou tentar ser o melhor que posso ser e prometo não machucá-lo como fez aquele ex. – Félix deu um meio sorriso para convencer a irmã e principalmente, a si mesmo do que tinha acabado de dizer.

Enquanto dirigia relembrou toda a conversa com Paloma e não podia deixar de admitir que ela tinha uma certa razão em demonstrar preocupação.

A verdade era que nem ele acreditava em si mesmo. As sombras do passado ainda o acompanhavam, e ele não se sentia merecedor de alguém tão extraordinário quanto Niko, ainda mais agora, depois de saber através de Paloma de tudo que ele sofreu.

Chegando ao seu destino Félix conferiu o endereço e constatou ao olhar a casa, que Niko era um “partidão”. Ajeitou-se e pegou o arranjo de flores que havia comprado. Titubeou ao apertar a campainha. Fechou os olhos se perguntando se estaria fazendo a coisa certa. Na mesma hora visualizou os olhos verdes risonhos daquele Carneirinho e uma força maior o fez seguir em frente.

Dentro da casa outra pessoa estava nervosa com o jantar que ia servir. Niko já tinha revisado os preparativos mil vezes, queria que tudo saísse impecável, seria o primeiro encontro de fato e ele queria muito impressionar. Parecia um adolescente vivendo o primeiro amor, nunca tinha sentido as borboletas no estômago por ninguém, nem pelo “falecido”, como ele chamava o ex, Eron, e agora ele não conseguia tirar Félix do pensamento.

Niko admirava a mesa posta e sorria satisfeito. Estava linda! Tinha caprichado no jantar, levou o dia todo preparando uma lagosta espetacular e para harmonizar com ela, um saboroso gelato de limão siciliano e claro, champanhe. Niko queria impressionar Félix e com a sobremesa relembrar um pouco de Milão no jantar daquela noite.

Quando o toque da campainha ecoou Niko deu um pulo, o susto o fez sair do estado de graça em que se encontrava ao admirar a mesa lindamente decorada. Sentiu o coração palpitar mais forte, deu meia volta e rapidamente foi atender a porta.

– Félix! – O enorme sorriso tomou o rosto angelical sem se preocupar em esconder a satisfação ao olhar o convidado parado na soleira da porta.

– Tarado do gelato! – disse Félix muito sério, para em seguida explodir em uma gargalhada acompanhada por Niko.

– Para de me chamar assim que eu fico envergonhado. – Niko colocou a mão na boca com as faces ligeiramente ruborizadas, quando pousou os olhos no maravilhoso bouquet de flores que Félix segurava. – Flores? – Os olhos verdes se iluminaram.

– Brincadeira, Carneirinho... E sim, são flores... E trouxe para você. – Félix lhe estendeu o buquê de rosas vermelhas e esboçou um sorriso de lado. – Você merece!

Impossível não sentir a aura de encantamento que envolvia os dois ali, parados na porta e se encarando sorridentes, até que Félix quebrou o encanto.

– Não vai me convidar para entrar, criatura, vou ficar aqui mesmo na porta?

– Ai meu pai amado, me desculpa! Entra por favor, e fica à vontade. – Niko segurava as flores contra o peito enquanto dava lugar para que o moreno entrasse, sem piscar ou tirar os olhos da figura classuda e perfumada que passava por ele ao adentrar a sala.

Félix observava a casa com olhos ágeis. Até que Niko tinha bom gosto para decoração, nem tanto para se vestir, mas whatever, ninguém é perfeito, a não ser ele mesmo. Foi então que sentiu o aroma delicioso vindo da cozinha e não se conteve.

– Que cheiro delicioso é esse? – Com os olhos fechados empinava o nariz pra sentir melhor o aroma que tomava conta do seu olfato.

– Fiz um prato especial... Espero que goste de lagosta. – Niko encarava o moreno com expectativa.

– Lagosta, Niko? Estou até emocionado... Amo lagosta! Nem me lembro da última vez que comi essa delícia. - Félix acompanhava Niko enquanto conversavam e se dirigiam até a mesa.

Félix elogiou a mesa lindamente posta e foi convidado por Niko a se sentar, pois o jantar estava quase pronto. Depois de servir a ambos o chef abriu o champanhe e propôs um brinde.

– Um brinde a esse momento! – Niko olhava com ternura para um Félix meio sem jeito a sua frente.

– Ao momento, a nós! – Félix retribuiu com um meio sorriso e um olhar lânguido.

Durante o jantar falaram de viagens, um pouco da vida de cada um, relembraram as peripécias de Niko em Milão e o show depravado de Félix no Gian. Riram muito, beberam e trocaram olhares.

Niko não era do tipo que se entregava a qualquer um num primeiro encontro, mas algo o fazia sentir que com Félix existia algo mais, como se eles já se conhecessem e apenas se reconheceram naquele dia em Milão.

Já Félix se encantava cada vez mais com a doçura de Niko, e aos poucos um pensamento foi se formando dentro dele: Que direito ele tinha de se envolver com alguém como Niko? E como se envolver sem antes contar tudo sobre o seu passado? Jamais esconderia algo ou mentiria para aquele ser angelical a sua frente, mas o medo de ser desprezado era grande demais. Logo agora que tinha certeza de ter encontrado alguém que realmente faria diferença na sua vida, ele sentia isso só de olhar para o chef de cachos louros.

Antes que as coisas saíssem do controle, Félix tomou uma decisão, iria embora.

– O jantar estava maravilhoso, Carneirinho, e a lagosta um espetáculo... Mas está tarde e preciso ir. – Félix falava ao mesmo tempo em que ia se levantando para sair.

– Espera! Tem a sobremesa ainda... – Niko segurou no braço de Félix deixando claro que não o deixaria ir. – É especial e fiz em sua homenagem. – O loiro piscou o olho e sorriu.

– Criatura, assim vai parecer que engoli um pneu de caminhão, e para de me provocar com esses olhos verdes piscando pra mim assim. – O moreno fingia indignação enquanto imitava as piscadelas sensuais do loiro e sorrindo voltou ao seu lugar na mesa.

Depois de servir a sobremesa, Niko voltou à mesa para se deliciar com o sorvete.

– Hummm... Gostoso... – Niko lambia a colher e gemia ao encarar seu convidado que arregalava os olhos a cada colherada que o Carneirinho colocava lentamente na boca.

– Cristo olhai pra isto! O “tarado do gelato” ataca de novo! – Félix levantava a mãos e revirava os olhos.

– Você quer me envergonhar de novo Félix? – Niko fingia irritação.

– Tudo que eu quero hoje é te envergonhar muito, Carneirinho. - Félix deu uma piscadinha e em seguida encheu a boca com a sobremesa soltando um suspiro de satisfação.

Com a boca cheia e com um gemido orgásmico, Félix atirou a cabeça pra trás, fechou os olhos, bateu os punhos na mesa e engoliu o sorvete se contorcendo na cadeira.

Niko não se conteve e deu uma sonora gargalhada, depois pegou o guardanapo e limpou o doce dos lábios de um Félix surpreso e soltinho.

Sussurros e provocações tomaram conta da hora da sobremesa, o champanhe também contribuiu para o clima de sedução e foi entre sorrisos que Félix se distraiu e deixou escorregar a taça com o sorvete e acabou por sujar a mão.

Sem pensar muito Niko pegou a mão do moreno, que estava suja de sorvete e levou até a boca. Com um olhar safado, chupou cada dedo, um por um, fazendo Félix estremecer de prazer ao sentir a língua molhada e morna do loiro envolver cada dedo.

– Niko! Misericórdia de mim... – Félix gemia em desespero ao sentir o volume aumentando dentro da sua calça de grife.

Quando Niko terminou de lambiscar o último dedo, Félix puxou a própria mão e levantou-se num rompante da mesa de jantar. Sem olhar a cara de espanto de Niko, se virou e foi rapidamente em direção à saída.

– Félix! Espera, aonde você vai? Chateei você? – Niko se desesperou com a ideia de ver Félix sair assim, sem explicar nada. Foi quando o moreno parou na porta, com a mão na maçaneta.

Niko praticamente se encostou nas costas do moreno, já que vinha rápido atrás dele para não deixá-lo ir. Félix respondeu:

– Não, Niko, você não me chateou, nem perto disso, foi tudo perfeito e da forma como imaginei que seria, apenas não posso continuar com isso. – Félix falava sem se virar ou olhar para Niko e mantinha a mão na porta para não esquecer que precisava ir embora.

– Como assim? Não pode por quê? – Os olhos verdes já estavam marejados. O chef queria entender o que estava acontecendo, já que tudo estava indo tão bem entre eles durante o jantar.

– Por que você não sabe nada de mim, das coisas ruins que já fiz, e das quais me arrependo cada segundo da minha vida. Não estou sendo honesto com você Niko, e preciso que saiba quem eu sou. Jamais poderia mentir ou iludir você, Carneirinho. – Dizia essas palavras com alívio, mesmo correndo o risco de perder para sempre o loiro atrás dele.

– Você não acha que quem deve decidir ou julgar alguma coisa aqui sou eu? – Niko estava sério e decidido. – Se você fez algo ruim no passado e se arrependeu, é isso que vale. O que me importa é hoje, é daqui pra frente. É um novo amanhã que espero seguir ao seu lado. Podemos ao menos tentar?

O silêncio não era uma resposta satisfatória para Niko, que quando se decidia a algo, nada o demovia disso. Nem mesmo a imobilidade de Félix que permanecia de cabeça baixa com a mão ainda pousada na maçaneta.

– Félix... Dorme aqui essa noite? – Niko disparou a pergunta em um sussurro rouco, e pôde perceber um leve estremecimento na figura imóvel diante de si.

Depois de ouvir a pergunta, Félix ergueu a cabeça, como se estivesse em dúvida frente à proposta tentadora de Niko. Sem se virar ou fazer qualquer movimento ele respondeu:

– Melhor não... – Tornando a baixar a cabeça, não acreditando que aquelas palavras tinham saído dos seus próprios lábios.

Niko ficou ali parado. Queria que o chão se abrisse aos seus pés. Havia sido rejeitado e não entendia direito por que. Após uma noite tão perfeita como a que partilharam vê-lo simplesmente ir embora ameaçava mais uma vez partir seu coração.

Durante um longo tempo, nada mais falaram, ambos sem coragem de se mexer. Félix sem conseguir soltar a maçaneta, ou tampouco abri-la para ir embora, e Niko com o corpo levemente colado ao dele por trás, também sem ousar se afastar, com se aquele contato pudesse impedi-lo de sair por aquela porta e quem sabe, da sua vida para sempre...

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.