Eduardo encontrava-se preocupado. Tinha pesquisado mais afundo sobre Sebastião Ferreira e descobriu que ele era muito mais perigoso do que imaginava. Tem que dar tudo certo hoje! Se ele descobrir o plano... a minha vida e a de todos que estão nesse plano... podem estar em apuros!

Renata entrou desesperadamente na sala. Eduardo suspirou lentamente. Parece que ele chegou... Tá na hora! Renata ficou ao lado de Eduardo e perguntou:

— Acha que pode dar certo?

— Veremos daqui alguns minutos.

Laura estava no colégio tirando dúvidas esporádicas com seus alunos antes da prova. Contudo, sua cabeça estava em outro lugar. É hoje! O Edu e a Renata já devem estar com aquele babaca! Por favor, que dê tudo certo!

— Está tudo bem professora?

— Estou bem sim Carlos. Não se preocupe. Qual é a sua dúvida?

— Queria entender os motivos da concentração fundiária do nosso país. Ultimamente tem tido muitos protestos de indignas e sem terras.

— Isso é mais do estudo da geografia, mas, posso ajudar. O Brasil foi colonizado por portugueses em 1500. Certo?

— Isso eu sei.

— Para poder explorar essa terra, o rei português precisava habita-la. Assim, para atrair gente, prometeu doar terras. Ou seja, desde a colonização, os indígenas já tiverem suas terras repartidas e não tendo acesso a elas depois da chegada dos brancos. Essas terras doadas ficaram conhecidas como sesmarias. Portanto, é aí eu começa a questão de concentração de terras no Brasil.

— Explique mais, por favor.

— Sesmarias eram enormes concentrações de terra destinadas a plantar cana de açúcar. Os indígenas perderam suas melhores terras e ficaram com as menos produtivas, além de serem escravizados. Logo após, vieram os escravos negros que nem direito a própria vida tinham. Imagine se eles teriam dinheiro para comprar terra.

— Já li coisas horríveis sobre a escravidão. É uma mancha horrível na nossa história. E depois?

— As terras pararam de ser doadas para só poderiam ser adquiridas via compra só a partir de 1850. E isso só agravou a questão de concentração. Isso porque só quem tinha muito dinheiro poderia comprar terras. Aí acabou que os imigrantes, indígenas e escravos continuaram a não poder ter acesso à mesma. Coisa que não mudou muito hoje em dia.

— Acha possível que algum dia mude?

— Vai demorar. Existem muitos latifundiários no poder. E o governo precisa de apoio para poder governar. Aí vai acabar defendendo os interesses deles. Mas, mesmo assim, eu ainda acredito. Só que o povo tem que ajudar também. O governo tem medo do povo! Nós temos uma força enorme! Só falta descobrirmos isso.

— Sei que isso não faz parte da prova, mas, obrigado professora.

— Foi um prazer. É bom saber que existem jovens como você preocupado com essa questão. Qualquer dúvida que tiver é só me procurar!

Eduardo pediu para que Renata abrisse a porta. Um homem de aproximadamente sessenta e seis anos entrou apoiando-se em uma bengala de madeira. Ele era um pouco gordo e vestia um terno bem fino e elegante. Não tinha aquele estereótipo de dono de fazenda com seus chapeis e cintos banhados a ouro. Cabelos brancos e pele levemente enrugada. Ele se sentou, encarou Eduardo e disse:

— Admito que fiquei surpreso com o seu convite, senhor Eduardo.

— Mesmo?

— Sim. Nossos ramos são completamente diferentes. Você tem focado na área de construção civil e eu na questão da agropecuária.

— É pelo seu conhecimento na área do agronegócio que eu liguei para você. Gostaria de entrar nesse campo. Acredito que esta empresa precise se renovar e buscar novos ramos de investimento. Além de eu, particularmente, gostar de sair de zona de conforto e arriscar algumas vezes.

— Sábias palavras Eduardo. Um bom empresário deve realmente sempre se reinventar. Agora entendo porque seu pai lhe deixou no comando da empresa. Tão jovem mais com alma de empreendedor.

— Fiquei sabendo que você está tendo alguns problemas para concretizar seus objetivos aqui, não é mesmo?

— Não é novidade. A mídia toda está focando nesse assunto. Indígenas e militantes são duas raças que deveriam ser exterminadas. Nessas vezes que eu queria que Hitler estivesse vivo. Com certeza ele daria um fins nesses filhos da puta.

Eduardo sentiu uma raiva surgir dentro dele. Tinha vontade calar a boca daquele velho gordo fascista. Se acalme Eduardo! Se aclame! Não vai estregar o plano todo. Ele respirou profundamente e continuou:

— Esse povo realmente só atrapalham os nossos negócios. Devíamos fazer algo. Aliás, já fiz.

— Como?

— Está do meu lado é Renata Abrel, geógrafa contratada por mim que mapeou as áreas próximas a sua terra e a reserva indígena. Descobrimos algo que pode ajudar o senhor. Contudo, sabemos que tem um plano e precisamos saber qual é.

Sebastião soltou um riso alto. Pegou a bengala e apontou com força para o ombro de Eduardo. Ele se levantou e indagou:

— Acha que sou tão idiota assim?

— Acho que está ocorrendo algum engano aqui, senhor Sebastião. — Afirmou Renata tentando acalma-lo.

— Não tenho nenhum erro aqui senhorita. Duas câmeras na direta e um microfone à esquerda. Se queria tirar alguma informação deveria ser mais esperto. Pesquisei muito sobre você antes de vir aqui. Eduardo Ribeiro dos Santos, ex-namorado de Laura Salgueiro, militante pé no saco que tem me dado dor de cabeça há anos. Além de você ter sido cuidado por aquele tribo que está perto das minhas terras.

— Só saiba que não vamos deixar você tocar um dedo naquelas terras.

— Veremos! Aliás, sugiro que vocês saiam do meu caminho. Ou consequências podem acontecer.

— É uma ameaça?

— Que tipo de empresário acha que sou? Eu não ameaço as pessoas, apenas dou bons conselhos. — Terminou Sebastião saindo do escritório.

Eduardo sentou na cadeira, olhou para Renata e comentou:

— No final das contas não foi tão ruim o nosso plano falhar.

— Não? — Indagou Renata confusa.

— Se tínhamos alguma dúvida de que ele tem algo perverso em mente... Essa ideia foi mais do que confirmada. Já que agora ele sabe a nossa real posição não precisamos nos esconder mais. Além de podermos usar métodos mais práticos como requerimentos judiciais, por exemplo. Vou conversar com os advogados aqui da empresa. Eles vão saber o que fazer.

— Bem pensado.

Eduardo se levantou, pegou nas mãos de Renata e agradeceu:

— Obrigado por ficar comigo todos esses dias. Sua ajuda foi fundamental.

— Fico feliz em ajudar. Principalmente se for você...

Os dois se olharam e sorriram. Renata se afastou um pouco envergonhada e disse:

— Tenho que ir.

— Eu te acompanho. Vou até a casa da Laura para deixa-la informada sobre tudo que aconteceu hoje.

— Faz certo.

Eduardo segurou delicadamente no braço de Renata e advertiu:

— Vá com cuidado! Sebastião é perigoso! Pode tentar algo contra você.

— Obrigada pela preocupação.

Miguel estava no sofá indignado. Seu time de futebol perdia de 3 a zero para o maior rival. Isso só pode ser brincadeira! A companhia tocou e ao atender, fechou a cara. Ele bebeu um gole da cerveja e perguntou:

— O que faz aqui?

— Quero falar com a Laura.

— Ela não chegou do colégio ainda.

— Posso entrar?

— Entra logo Eduardo.

Miguel fechou a porta e voltou a sentar no sofá. Eduardo deu uma olhada na televisão e comentou:

— Uma pena ele estar perdendo. E eu pensando que o time todo reformulado traria mais agilidade.

— Não sabia que torcia para esse time.

— Sou fanático! Na minha casa tem um cômodo só para ele.

— Sério?

— Juro! Sabe aquela faixa de campeão de 1967?

— Lógico que sei!

— Tenho lá em casa. Comprei em um leilão.

Laura chegou em casa exausta. Ao abrir a porta ficou rindo meio confusa. Desde quando Miguel e Eduardo conversão de forma tão amigável desse jeito? A conversa estava tão boa que ela teve que fazer muito barulho para chamar a atenção dos dois.