Proud

Capítulo 07


Niko não queria ter a obrigação de encarar o dia a seguir, ficou deitado de bruços na cama, olhando para a parede do quarto, Félix dormia ao seu lado, ele ouvia a respiração dele. Tinha esfriado durante a noite, mas ele estava com preguiça de levantar e se vestir, portanto só ficou ali de cueca, sentindo o frio. Pensava no filho e no que estava passando, e se lembrava de quando os meninos da escola o amarraram na privada do banheiro, porque ele era “diferente”.

Ele não queria que o filho passasse por tudo que ele tinha passado, além do mais, não queria que Jaiminho pagasse por ter dois pais. Ele ouviu o celular de Félix começar a despertar e na mesma hora fechou os olhos, começou a fingir que estava dormindo. A cama se mexeu levemente com Félix reclamando do barulho, então, o som insistente cessou. Como ele ia contar para ele? Então, ele sentiu os dedos dele nas suas costas nuas, trilhando desenhos, e sentiu um arrepio percorrer seu corpo.

_ Carneirinho? – Félix sussurrou no seu ouvido.

Niko não respondeu, gostava da sensação de ser acordado por ele, mesmo que ele não tenha realmente dormido. Ele continuou desenhando em suas costas, até que passou as mãos no seu cabelo.

_ Carneirinho?? – ele cantarolou agora. E Niko não se aguentou e sorriu.

_ Oi? – permaneceu de olhos fechados.

_ Acorda... – ele cantarolou de novo.

_ Não... – ele resmungou. – A gente não pode ficar o resto dos dias aqui?

_ Ai, Niko, para de bobagem.

Niko virou na cama, ficando de frente para Félix e ficou encarando os olhos escuros do amado.

_ Eu só não queria que acabasse...

_ Acabasse o quê, criatura?

_ Esses momentos assim, com você, seu bobo. – ele passou a mão no braço de Félix.

_ Você acordou cheio dos dramas hoje, hein?

_ Fica mais um pouquinho? – ele tentou imitar a voz de Félix, o que fez os dois rirem.

_ Você é péssimo tentando me imitar, mas eu trabalho em casa, então, eu posso ficar mais um pouquinho.

Félix se aproximou de Niko e o beijou com paixão. Parece que toda vez que eles se amavam, o mundo ficava um pouco melhor, sem preocupações, sem problemas. Eles só levantaram da cama quando Niko ouviu a voz de Jaiminho, depois do banho, tomou café com o filho, enquanto Félix estava no banheiro.

_ Filho? – Jaiminho mexia no cereal com a colher, sem comer. – Você tá com saudade de casa, não tá? – o menino só assentiu. Niko pegou na mão dele. – Eu vou lá à escola hoje, e logo você vai voltar para a sua outra escola, tá bom?

_ Tá bom, pai.

_ Come alguma coisa, filho.

_ Eu to sem fome. – ele balançou a cabeça.

_ Adriana? – ele chamou a empregada.

_ Oi, seu Niko. – ela veio com Fabricio no colo.

_ Você pode levar as crianças para a escola hoje? De táxi mesmo? Eu e o Félix temos um compromisso.

_ Tá bom, seu Niko.

Félix estava sentado na frente do computador, falando com o contador no telefone quando Adriana saiu com as crianças, Niko esperou ele desligar a ligação e se aproximou, apertando os ombros de Félix com as mãos.

_ Você não vai mesmo para o restaurante hoje, Carneirinho? – ele segurou em uma das mãos de Niko que apoiavam em seus ombros.

_ Não, eu... Preciso conversar com você.

_ Comigo? – Félix tirou a atenção do computador e se virou pra Niko.

_ A gente pode ir lá para sala?

_ Pode, mas pelas contas do Rosário, o que eu fiz? – Niko saiu em direção à sala, e Félix o seguiu, sentando ao seu lado no sofá.

Félix começou a imaginar que Niko tinha o visto falando com Edith no shopping.

_ Eu sei que eu sempre te dei apoio para seu pai vir fazer esse tratamento aqui, e até ontem eu tava te dizendo que tava tudo bem de ficarmos aqui... Mas...

Félix sentiu a tensão tomar contas dos seus músculos.

_ Mas o quê, Niko?

_ O Jaiminho tá tendo problemas na escola... – ele falou em tom mais baixo.

_ Que tipo de problema? – Félix ficou sério.

_ Bom, ontem ele veio me perguntar por que ele tinha dois pais e nenhuma mãe.

_ Eu devo ter... Esquece. Então, era isso?

_ Os coleguinhas da sala devem estar brincando com ele.

_ A gente precisa ir lá naquela escola agora, Niko!

_ Calma, Félix. – ele pegou na mão dele, tentando acalma-lo. – Sei que você tá preocupado, eu também estou, eu mal dormi essa noite. Mas a gente tem que ir com calma, a culpa não é das crianças...

_ Niko, eu sei disso... A gente que resolver isso logo. Eu não quero que o Jaiminho sofra...

_ Nem eu, nem eu. A gente vai lá hoje, mas por favor, tenta não dar um piti. Aqueles seus pitis...

_ Niko! Você tá dizendo que eu sou uma bicha escandalosa?

_ Não, Félix, mas acho que nessa situação você tem que controlar os seus nervos...

_ Eu devo ter feito babyliss nos cabelos de Dalila, Niko! – ele exclamou, mas diminuiu o tom com o olhar de Niko. - Mas, eu vou... tentar. – ele apertou a mão de Niko.

_ Eu só vou me trocar e nós vamos logo.

_ Tá bom.

Quando Niko se levantou, Félix pegou o celular e ligou para o doutor Lutero.

_ Olá, velho. Calma, você não precisa me xingar. – ele riu. – Eu quero saber de papi soberano... Hm? Mais alguns dias? Lutero, eu não posso ficar muito tempo aqui em São Paulo, minha vida é em Angra agora. E ficar aqui já está me causando muitos problemas. Tá certo, então. Te ligo amanhã. Obrigado, Lutero, e mande um beijo para a vovó. Até. – ele desligou.

Depois de alguns minutos, eles seguiam para a escola de Jaiminho, Félix estacionou o carro na quadra da escola e Niko pediu para conversar com a diretora.

Ao entrarem na sala da diretora viram uma bela mulher na casa dos 30 anos, com cabelos pretos longos e levíssima maquiagem.

_ Que pele... – Félix comentou baixo com Niko, que concordou.

_ Eu sou o Nicolas. – Niko sorriu para a mulher que o cumprimentou. – E esse é o Félix. – ela o cumprimentou também.

_ Muito prazer, eu sou Miriam, a diretora da escola. Você é pai de quem?

Niko e Félix se sentaram de frente pra ela, ela ocupou sua cadeira, e olhava para Niko.

_ Nós somos pais do Jaime, do 4º ano.

_ Ah, sim. – ela sorriu meio sem graça. – O que trazem vocês aqui? Algum problema com o ensino?

_ Não, o ensino está ótimo. O Jaiminho tem ficado estranho ultimamente, e sem vontade de vir a escola, né, Félix. – Félix concordou. – Eu conversei com ele sobre isso, e acredito que esteja acontecendo alguma coisa...

_ Que tipo de coisa?

_ Acredito que ele está sofrendo algum tipo de bullying por conta dos amiguinhos da sala, porque bom... Porque ele é criado por nós dois, entende?

_ Ah... – a mulher parou para pensar alguns segundos. – Veja bem, senhores... Atualmente é difícil termos nas escolas crianças adotadas por casais gays, infelizmente. Mas, este número vem crescendo, mas ainda assim é uma coisa que é tratada como “diferente” pelos outros pais. Jaiminho deve ter comentado com os amigos que tem dois pais, e pela própria criação errônea que as outras crianças têm, eles acabam achando isso estranho, e por isso, o bullying com ele. Na escola, a gente tenta fazer com isso não aconteça, mas não podemos prever o que vai acontecer.

_ Resumindo esse bla, bla, bla... – Félix interrompeu a mulher. – Você não vai poder fazer nada, é isso?

_ Félix!

_ É isso que ela tá querendo dizer, Niko.

_ Eu não posso controlar o que as crianças dizem, tudo isso vem da criação dos pais, do que eles aprendem em casa. Tem criança que acha isso normal, mas são poucas, enquanto outras não.

_ Mas na outra escola, nós nunca tivemos problema com isso. Ele nunca se sentiu excluído, ou descriminado.... – Niko disse.

_ Deve ser porque vocês não estão preparados para lidar com uma situação com essa, não é? – Félix disse em tom de sarcasmo.

_ Olha, senhor... Não é bem isso, nós vamos tentar controlar, vamos conversar com a professora...

_ Claro, até por que, nós pagamos essa escola e muito caro por sinal, e quero que o meu filho seja tratado com respeito.

Depois de alguns minutos de conversa, Félix deixou o prédio da escola com o nervosismo à flor da pele.

_ Eu devo ter furado a arca de Noé para ter que aguentar isso!

_ Félix...

_ Eu fui o mais educado que eu pude, Niko, pelas contas do Rosário! Não briga comigo. O Jaiminho não merece sofrer por causa dessa escola incompetente, dessas crianças maldosas.

_ Eu sei, eu sei, meu amor. – Niko colocou as mãos no rosto dele. – Fica calmo, daqui a pouco a gente volta pra Angra...

_ Não vejo a hora.

Niko olhou as horas no celular.

_ Você pode me deixar no restaurante? Eu sei que falei que não ia lá, mas esqueci de resolver umas coisas...

_ Ok, vamos. – eles entraram no carro, e de tão nervoso que estava, Félix não percebeu que tinha um papel preso ao parabrisa.

_ O que é isso? – Niko perguntou, Félix saiu do carro e pegou o papel.

Félix pegou o papel que trazia marcas de cola, e letras de jornais grudadas um ao lado da outra. Formando a frase: “Você não vai se esconder de mim, Felix”. Félix sentiu o coração disparar por um motivo que ele não sabia qual era, amassou o papel e enfiou no bolso.

_ O que era? – Niko questionou quando voltou Félix voltou para o carro.

_ Nada. Propaganda.

Félix partiu com o carro e se lembrou de Edith e do que ela tinha te dito, agora precisaria descobrir quem estava por de trás daquela mensagem, e o que a pessoa queria com ele. Félix podia ter mudado, mas seus inimigos que não eram poucos, não tinham. Ele tinha que tomar cuidado não só por ele, mas por sua família.