O ônibus amarelo havia acabado de parar no sinal vermelho.

Jimmy Fields, sentado no último banco do lado esquerdo estava inteiramente estressado. Seus pés batiam em um ritmo rápido sobre o chão e de meio em meio minuto o jovem erguia o braço para se informar das horas.

— Oito e trinta. —sussurrou para si mesmo, embolando seus fones de ouvido e colocando- os no bolso.

Oito e quarenta e cinco era em que Jimmy tanto ansiava. Se atrasasse sequer um milésimo, perderia uma importante prova do colégio e reprovaria pela terceira vez.

Jimmy tirou um papel em péssima caligrafia do bolso e fixou seus olhos nele, memorizando cada letra, cada palavra e cada sílaba em sua cabeça.

Impossível.

A garotinha ruiva que estava ao seu lado chorava sem parar, desconcentrando-o .As freadas que o ônibus dava de segundos em segundos, deixava-o tonto, fazendo sua cabeça ficar tonta, a ponto de deixá-lo sem paciência.

— Droga! — resmungou.

No exato momento em que o ônibus havia dado mais uma de suas freadas, um homem de estatura baixa e encapuzado entrou no ônibus carregando uma maleta e percorreu o corredor de cabeça baixa. Seus olhos estavam completamente avermelhados e cheios de olheiras — o que dava a impressão de que ele não dormia há dias.

Jimmy percebeu o que aquele cara tinha. Não era doença e não tinha sido espancado. Estava drogado, completamente fora de si.

— Horas! Quantas horas? — Perguntou o homenzinho para Jimmy. Sua voz era rouca e muito fanhosa.

— Oito e trinta e oito.

O homenzinho fechou sua mão em um punhal e bateu contra o ferro do encosto da cadeira da frente. Conduziu-se então até o motorista, ficando bem ao seu lado, observando atentamente como um falcão os passageiros distraídos.

O motorista olhou de soslaio para o homenzinho e deu um longo suspiro.

— Meu jovem, precisa se sentar — pediu educadamente, enquanto abria a porta para duas freiras entrarem.

— Cale a boca — sua voz fanhosa estava controlada.

O ônibus parou de se movimentar ao meio de uma grande rodovia movimentada, lotada de carros, caminhões e motoqueiros.
Um dos velhinhos que fez o sinal da cruz se levantou, e se conduziu até eles.

— Deixe-me ir com ela. —pediu.

O homenzinho disse algumas palavras de baixo calão e foi até o motorista, apontando a arma em sua cabeça outra vez.

— Abra a droga da porta.

A porta se abriu, e ao meio da rodovia, a grávida e o velho saíram descoordenados, sem saber para onde seguir.

No momento em que o velho e a grávida saíram da vista do homenzinho, que estava distraído, o motorista tentou arrancar a arma de suas mãos bruscamente, tentando de algum modo salvar todos daquele ônibus.

Porém, o segundo disparo da arma já havia acontecido.

O motorista estava estirado no chão, morto.

O drogado abaixou-se e analisou o corpo do motorista, concentrado, com se procurasse algo ali como dinheiro.

Jimmy aproveitou a distração do homenzinho drogado e puxou os pés da jovem loira, ajudando ela a se sentar no banco.

— A janela estás aberta. O ônibus está parado. O cara drogado está distraído. Posso lhe ajudar — sussurrou ele, olhando para a garotinha ruiva encolhida debaixo do banco.

Ela suspirou e tentou sorrir.

— Claro. Eu preciso de sua ajuda.

A jovem loira se encaminhou a janela vagarosamente, tentando não ser vista pelo assaltante drogado, que estava abaixado sobre o corpo do motorista. Ela passou com um pouco de dificuldade sobre o pequeno buraco e se libertou daquele ônibus.

— Obrigada — agradeceu ela, com os braços erguidos para pegar a jovem Ana.

Jimmy pegou Ana e passou-a pela janela sem dificuldade devido ao tamanho dela. Ela aparentava ter uns dois anos de idade, ou três. Ao entregá-la aos braços da jovem loira, Jimmy foi surpreendido com um tiro na perna direita.

— Mal garoto! — Grunhiu ele, aproximando-se de Jimmy.

Jimmy manteve-se calado, tentando suportar a queimação na perna.

— Não sou cego e nem nada! Está querendo bancar o super-homem? — gritou.

— Evitei que duas pessoas não morressem aqui. — Sussurrou, com dificuldade.

— Cale a boca! — Gritou — Minha paciência tem limite, e já estou cansado. Eu queria me libertar disso tudo! Mas eu preciso de dinheiro! De muito dinheiro.

Jimmy manteve-se calado.

—E já que você as libertou, você ficará aqui.

Jimmy não entendeu o sentido da palavra “você ficará aqui". Apenas reconheceu a coincidência de que esse “você ficará aqui” ele sempre ouvia de sua professora do jardim de infância quando fazia alguma arte ou batia em algum colega.

Algumas horas haviam se passado. Talvez uma ou duas.

O ônibus estava parado ali no meio de uma rodovia perto do centro de Nova York, rodeado de carros de polícia, barulhos de sirenes e pessoas gritando. Jimmy não fazia ideia de que horas era. Seu ferimento na perna se tornara algo difícil de aguentar, assim como os gritos do homenzinho drogado, que estava completamente descontrolado a procura de dinheiro.

Era o pôr-do-sol quando ele deu um grito no ônibus e se aproximou de Jimmy.

— Acho que já está na hora de acabar com isso. Você já ficou tempo demais aqui e precisa partir — ele se virou para frente, olhando para todos os passageiros — todos devem partir.

Houve uma comemoração ali. Sorrisinhos, pessoas ofegantes e abraços.
Mas elas não iam embora, para a casa delas.

De sua maleta, o homenzinho retirou uma lata de álcool e jogou por todos os bancos de couro negro do ônibus, com um sorriso imenso estampado no rosto.

— Iremos embora, todos juntos.

Uma pequena chama de fogo se acendeu no isqueiro.

Antes que pudesse dar uma de suas gargalhadas ou um de seus berros, o homenzinho apontou a arma na direção de sua própria cabeça, e sorrindo, encostou o isqueiro com uma pequena chama em uma poltrona encharcada de álcool, incendiando todo aquele ônibus amarelo.

Não suportando mais a dor de sua perna, Jimmy Fields viu entre as chamar o homenzinho sorrir e logo depois ouviu um disparo. Ele havia se matado, e estava ao meio de chamar, virando somente pó.

Esse é o fim de Jimmy Fields e de todas as pobres pessoas que estavam naquele ônibus no qual morreram tragicamente.

O resultado de tudo isso?

Não sobrara nada de ninguém. Nem um pequenino grão das cinzas.