Capítulo 16 — Ressaca

POV’s Lucy

“LUCY! O QUE ACONTECEU?”. Essa voz conhecida surgiu do nada em minha mente. Era tudo que podia distinguir naquele momento e isso de certa forma me confortava pelo simples fato de não estar só, mas a solidão que a escuridão me proporcionava voltou a me assombrar quando nada mais pôde ser ouvido segundos depois. O que estava acontecendo? Onde estava? Por que não estava na festa?

“Lucy... Eu...”. Mais uma vez aquela mesma voz falou comigo e eu pude sentir meu corpo se arrepiar até os ossos em antecipação por algo que não tinha pista do que poderia ser. Meu corpo respondeu por mim sem ao menos pedir por autorização. “Shh. Apenas pegue as chaves, certo? Se não este jogo não vai funcionar”. As palavras que proferia não faziam o menor sentido para mim, porém aparentemente faziam para aquela pessoa na minha frente, pois sua resposta foi um simples “Certo”. E tudo ficou escuro novamente.

Enquanto flashs passavam pelos meus olhos, eu sentia minha pele macia sendo tocada ora violenta e selvagemente afim de deixar marcas que demorassem para sair, ora suave e cuidadosamente com o propósito de me levar a loucura. Eu sentia alguém em cima de mim me dominando por inteira e esta era uma sensação além de incrivelmente boa, definitivamente viciante. “Está aqui como desejado, princesa”. Aquela pessoa com certeza deve me conhecer bem, visto que sabe que odeio ser chamada de “princesa”, então deu ênfase quando me chamou desse jeito. Essa criatura provavelmente era amiga de Levy... eu teria uma conversa bem séria com a baixinha na próxima vez que a visse.

“Diga meu nome, Luce”, Natsu disse olhando no fundo de meus olhos.

E então eu acordei.

A luz que entrava pelas pequenas fendas que eram meus olhos naquele momento eram o suficiente para me fazer puxar os cobertores acima de minha cabeça que parecia prestes a explodir. Eu sentia todo o meu corpo dolorido, principalmente meus membros inferiores, e isso me intrigava. Eu me sentia tão fadigada que eu acho que estaria melhor se tivesse corrido a maratona de São Silvestre inteira. Acho que ter bebido tanto na noite de ontem não foi nada brilhante. Eu poderia passar o dia inteiro na cama se eu não estivesse suando tanto a ponto de minhas roupas.... espere. Onde estão as minhas roupas? Que estranho, eu não me lembro de ter ido dormir nua. Na verdade não me lembro de muito da noite passada, mas isso não era de se impressionar, visto a quantidade de bebida que ingeri. Notei em cima do meu criado mudo um bilhete em papel rosa escrito com uma péssima caligrafia que foi terrível de decifrar por conta do raciocínio lento que vinha de brinde com a ressaca, mas no fim consegui decodificar a mensagem. Dizia:

“Muito obrigado pela noite passada (você não tem noção do tempo que eu fiquei imaginando aquilo), o jogo foi muito divertido, mas o que realmente me surpreendeu foi aquela sua encenação. Você é muito boa nisso, sabia?

Do sempre seu, Salamander

P.s.: Depois eu volto pra devolver Loke e Taurus, tive de sair para resolver uns assuntos.”

Primeiro, o que eu fiz na noite passada para ter alguém me agradecendo? Segundo, que jogo era esse tão divertido? Terceiro, até onde eu sei, eu sou péssima atuando, tanto que até mesmo minha ex-professora de teatro já tinha me dito isso. Quinto, o que diabos é “Loke e Taurus”? Sexto e último, QUEM É ESSE TAL DE “SALAMANDER”? Eu devo ter bebido muito mesmo, porque a última coisa da qual me lembrava era de engolir aquele restinho de bebida em meu copo descartável. Eu nunca tinha realmente ficado bêbada, e agora, depois dessa experiência, não me deixarei mais me levar desse jeito... eu subestimei a ressaca.

Então ouvi uma batida na porta quarto e mesmo quase derretendo, me escondi debaixo das cobertas antes de pedir para quem quer que fosse entrar. O barulho que minha voz fez foi o suficiente para fazer minha cabeça doer ainda mais por causa da sensibilidade momentânea. Virgo-chan adentrou o cômodo e parou na metade do seu trajeto até mim e me olhou com um olhar de descrença.

— Eu acho a ressaca ótima, sabe. Serve de punição para aqueles jovens abusados que não põe limites em si mesmos, afim que eles um dia aprendam a se controlar um pouco – a Virgo-chan, apesar de não ter filhos, age como uma mãe para mim e ela realmente têm aquele senso materno de saber as coisas só de olhar pra criança. Ou era isso ou eu estava horrivelmente acabada

— Por favor não me julgue agora, Virgo-chan, eu estou sofrendo – fiz minha melhor carinha de cachorro que caiu da mudança mesmo sabendo que não funcionaria contra aquela Mão-de-Ferro.

— Eu não estou julgando ninguém... só vim avisar que tem um rapaz de cabelos estranhamente rosa lá embaixo querendo falar com você. Ele disse que avisou que vinha – após isso, a empregada se retirou do recinto sem nenhuma palavra mais.

A única pessoa que eu conheço que possui cabelos “estranhamente rosa”, como diz a governanta, é Natsu Dragneel, o qual eu tenho certeza de não ter me avisado que passaria aqui em casa pra me dar um “oi” bem animado e me contar de como a sua noite com Juvia fora inesquecível. Idiota. E ele nem teve a mínima decência de me chamar para apenas uma longa e muito esperada dança, com nossos corpos colados enquanto movemos nossos corpos lentamente segundo a melodia da música que tocava no fundo para acompanhar o momento. Idiota.

Coloquei a primeira roupa que vi em meu closet e um óculos escuro que mantinha guardado em uma de minhas gavetas para além de esconder as imensas marcas abaixo de meus olhos, protege-los da luz nem que fosse só um pouco. Desci escadarias o mais rápido que pude, porém ainda fora deveras demorado... meu corpo estava totalmente dolorido, como se eu tivesse feito um exaustivo exercício físico na noite anterior. Estranho.

Assim que pude avistar o rosado, pude perceber o seu estado de alegria e animação. Parecia estar tendo um ótimo dia. Claro, não era ele quem estava tendo uma ressaca de matar. Ao me ver, seu sorriso aumentou ainda mais, e se ele fosse uma garota eu diria que ele finalmente tinha se encontrado com a sua BFF pra contar do novo babado, fortíssimo e inédito, sobre o gato da escola que ela queria pegar. Mas como ele não é uma garota, eu não sei o porquê de toda essa felicidade.

Logo, Natsu começou a andar em minha direção como se estivesse impaciente e quando me alcançou fui inesperadamente puxada para um beijo apaixonante. Não é que eu não tivesse gostado, mas eu fui pega de surpresa, sabe. Eu desesperadamente queria um beijo vindo daqueles lábios, mas eu não achei que seria assim que eu conseguiria meu desejo.

— Bom dia, amor da minha vida – o rosado me cumprimentou de forma certamente inusitada para mim e eu me afastei dele para que ele visse que meus cabelos eram loiros e não azuis. Vai que ele pirou, né.

— Ahn... Natsu? O que acabou de acontecer aqui? Acho que os efeitos do álcool ainda estão agindo muito forte em mim. O que você acabou de fazer? E de falar? – provavelmente eu fiz perguntas demais em uma só sentença, mas isso não me importa no momento

— Eu te chamei do que você é. Amor da minha vida. E eu acabei de te beijar, não é obvio? Eu posso te mostrar de novo, se quiser – respondeu com um sorriso maroto nos lábios – mas acho que isso seria pouco perto do pequeno “joguinho” da noite passada.

— Mas que diabos de jogo é esse? Eu não me lembro de ter feito nada ontem - repliquei simplesmente e pude ver a confusão se espalhando nos olhos de Natsu

— Você não... se lembra de nada? Não se lembra da cena que fez para me fazer entrar em seu quarto? Não se lembra de me fazer “resgatar” Loke e Taurus? Não se lembra da “punição”? Você não se lembra de nada? – as palavras pareciam sair de sua boca como uma clamor, buscando por uma resposta positiva que trouxesse alívio, contudo eu não as possuía.

— Me desculpe... nada disso é familiar para mim. Será que você poderia me explicar o que são? Tem um tal de Salamander que me deixou um bilhete e... espera aí. Foi você quem me deixou um recado em cima do criado mudo? – agora isso fazia um pouco mais de sentido. Pouco.

— S-sim... sim, fui eu – me respondeu o garoto – eu não acredito que isso está acontecendo. Como foi que eu pude... se duvidar ela nem mesmo se lembra do baile... droga, eu não sei o que fazer – ele murmurava para si mesmo e me deixava ainda mais intrigada

— Olha, eu odeio ser grossa e interromper o seu momento de frustração, mas eu estou morrendo de dor de cabeça, de dor corporal e qualquer barulho parece estar vinte vezes mais alto, então será que você poderia me explicar logo o que é que a gente fez noite passada pra você ficar assim? – eu já estava beirando a impaciência. Recebi um olhar de culpa do rapaz.

— Me desculpe, Luce – ele me chamou da mesma forma que o Natsu versão Salamander havia, e isso me fez todos os pelos da minha nuca se arrepiarem – Eu realmente achei que você estava ciente do que estava acontecendo e que você tinha se lembrado de tudo e todos na Fairy Tail... você parecia a antiga Lucy e eu achei que.... me desculpe – ele falou tudo, menos o que eu queria saber. Além de que eu achava estranho ele estar se desculpando daquela forma.

Natsu pareceu meio perdido, olhando para os lados como se procurasse por algo e então enfiou as mãos nos bolsos e de um deles tirou duas chaves douradas, chaves que eu conhecia muito bem, as minhas chaves da porta de casa e da porta do meu quarto. O que ele fazia com elas era um mistério. Ele pegou uma de minhas mãos e colocou ambas as chaves ali, fechando minha mão logo em seguida. Depois disso, o confuso rosado se virou e hesitou por um momento antes de se retirar de minha casa.

Olhei para as chaves que tinha agora comigo. Em uma havia o desenho de um leão e na outra o de um touro, e me lembro do dia em que as recebi. Meu pai dissera que os desenhos eram para que eu não confundisse as chaves então decidi dar nome a elas. O leão seria Loke e o touro seria Taurus, mas também tinha Aquarius, que era a chave do quarto de banho, Crux, a chave da biblioteca, entre outros tantos que faziam parte de um conjunto enorme.

Subi para o meu quarto e peguei meu celular no intuito de ligar para Levy, mas quando vi tinha duas mensagens não lidas. A primeira era da pequena azulada e dizia algo como “COMO ASSIM VC PASSOU A NOITE COM O NATSU??? EU QUERO DE-TA-LHES” e resolvi responder essa mais tarde na esperança de que algo retornasse às minhas memórias. A segunda era de quem? Do Natsu, é claro, e tinha acabado de chegar. “Me desculpe de novo, Lucy. Tanto pelo que eu fiz, nós fizemos, quanto por fugir da sua casa correndo daquele jeito. É que eu não sabia o que te falar”. As palavras que ele me dizia não faziam sentido algum e ele parecia cada vez mais estranho na medida que ele tentava se explicar. Fui pensando em uma resposta apropriada para mandar enquanto ia em direção da minha cama para passar o resto do dia ali. Afastei as cobertas e sentei. Quando finalmente algo tinha aparecido em minha mente eu olhei para o lado e pude ver uma mancha vermelha em meu lençol branco. Parecia sangue. Arregalei meus olhos. Será que.......? Céus, agora tudo fazia sentido. Parei para olhar o ambiente ao meu redor e vi meu vestido de ontem e minhas roupas íntimas sensuais que eu guardava para uma ocasião especial jogadas em locais diferentes do quarto e o sutiã estava claramente rasgado. Juntando tudo isso ao fato de eu ter acordado nua, só pude concluir uma coisa e isso me assustava. Talvez até mesmo mais do que dragões.