Proesiando

Diálogo de Bar


Há, em uma mesa de bar, escura e erma, uma discussão acalorada entre duas sombras. Não sei distinguir os participantes, mas o significado de suas falas é límpido. A primeira se pronuncia como um brado rouco:

— O mundo agora tá com essa inversão de valores! É gente saindo com todo mundo, é esse povo que não se dá o respeito!

— Discordo — a segunda começa a falar, baixa e temerosa. Um tom mais agudo que a primeira.

— Como assim?! — rebate, trêmula de raiva.

— O mundo não está com uma inversão de valores... As pessoas é que sofrem de um outro mal, eu chamaria de “imersão de valores”. É essa gente sempre achando que só a sua visão é a correta.

— Mas é! — protesta a voz grave.

— O problema de imergir é que uma hora não se enxerga mais a luz — continua a voz aguda, como se as palavras do outro fossem inexistentes. Toma fôlego, pega forma.

— Lá vem você de novo com isso!

— Vou sim! Vou quantas vezes achar necessário! Você mergulha tão fundo que não vê nada ao seu redor, só essa escuridão.

— Assim não dá pra discutir contigo!

— Concordo.

Despedem-se.

Afastam-se.

A cerveja mofa. Os copos ficam na metade.