Procuro Um Namorado!

Tentativa 5:Faíscas.


Tempo.

Uma palavra, cinco letras, diversas interpretações. Irremediável. Sempre à frente dos ‘tolos’ humanos, que nada podem fazer além de vê-lo levar consigo tudo o que há de mais precioso em suas vidas.

O tempo passa, e tudo muda. As pessoas, as ruas, a tonalidade do céu azul. É incrível como apenas um segundo pode modificar um mundo inteiro, se lhe for dada essa oportunidade. Mas o pior disso tudo não é o que se torna a ser, mas o que já foi.

Um tempo a que não se pode mais voltar.

– Mira! - Uma jovem, alta e de tirar olhares dos que passavam pelos corredores do pequeno mercado, avistou finalmente a quem estava procurando.

Lucy sorriu - mesmo com as roupas simples, a beldade ainda era reconhecível por onde quer que passasse. No momento, conversava rapidamente com uma mulher mais velha, já beirando os quarenta anos, provavelmente sobre a revista que esta levava nas mãos.

– Realmente, eu... - A modelo parou de falar ao reconhecer a voz, e virou-se. - Ah, Lucy! - Despediu-se da dona de casa com quem falava com um aceno breve, e foi caminhando até a amiga.

– Encontrou outra fã? - A loira brincou, já tendo a alcançado. Mirajane corou com aquilo, dispensando a pergunta com as mãos.

– Não! Ela só tinha me reconhecido da capa, e foi perguntar se era mesmo eu. - Ela respondeu, o sorriso doce nunca saindo de seu rosto. - Mas e então? Achou?

– Sim! - A loira levantou a sacola com um livro recém-comprado dentro, sorridente. - Era o último volume! Levy não vai acreditar quando eu mostrar isso a ela!

– É tão raro assim? - Mira indagou, começando a andar para fora da pequena galeria, sendo seguida pela outra.

– Você não sabe há quanto tempo ando procurando esse aqui. - A escritora respondeu. - Mas enfim! Vamos? Com essa parada, acabei te fazendo esperar mais...

– Sem problemas, Lu, meia hora não é nada! - A beldade riu. - Só espero que meu irmão não tenha chegado antes. Do jeito que ele é, vai acabar acordando a Lisanna de tanto bater na porta.

– Então vamos! - Lucy apressou-se, a sacola com o livro segura em uma das mãos, enquanto a outra levava parte das compras que ambas haviam feito.

Aproveitando do silêncio que se instalara, a loira tornou a observar sua amiga. Realmente, o tempo era um negócio estranho. E pensar que, há alguns anos, Mirajane era o completo oposto do que ela era agora...

As pessoas realmente mudam, não é mesmo...– Refletiu. Observou o céu já pincelado de tons mais escuros, indicando o início do crepúsculo, podendo-se inclusive ver algumas estrelas.

Mudam, e nos deixam para trás.

Uma garotinha, parada em frente à janela, concentrada em descobrir um segredo na imensidão da noite. Sua mãe sempre dizia que ao pedir uma coisa três vezes a uma estrela cadente, seu pedido se realizaria, então...

Ah, ali a estrela! Ela comprimiu seus olhos cor de chocolate e juntou as duas mãozinhas, repetindo na cabeça o desejo que vinha do fundo de seu coração.


Que o papai volte a ser como era antes.

Que o papai volte a ser como era antes.

Que o papai volte a ser como era antes!

Mas, mesmo assim, ele não voltou.

Com o intuito de esquecer a ideia de que acabara de pensar, a mente da moça formulou uma pergunta para recomeçar o assunto.

– A que horas a Lisanna chegou, mesmo? - Mira curvou a cabeça para o lado ao ouvir isso, e pôs o dedo indicador nos lábios, pensativa.

– Hmm... Acho que por volta de meio dia, por aí. - Ela abriu um sorriso. - Tive de empurrá-la para o quarto para fazê-la dormir, aquela garota queria sair por aí vendo o que tinha mudado na cidade assim que chegou!

– Bom, mas ela já está fora há muito tempo! Eu também gostaria de explorar assim que voltasse. - Lucy riu.

– Sim, mas mesmo assim! - Mira protestou, suspirando em seguida. - E também, ela veio aqui para ficar dessa vez. Vai ter tempo o suficiente para matar a saudade...!

A loira ficou quieta. Sabia que sua amiga esperava por esse dia a muito, quando sua irmãzinha pudesse finalmente voltar para casa. Ela tinha se esforçado tanto... Era incrível o que o amor de irmãos poderia fazer; deixava Lucy um pouco triste por ser filha única.

Ter alguém ao seu lado sempre... Alguém com quem você pode contar, huh...– Ela sorriu de leve. Ela tinha precisado de alguém assim, quando houve aqueles problemas com seu pai no colegial...

E achara, sim. Muitos amigos valiosos, além de um certo morador da casa ao lado a quem ela tinha odiado na primeira semana inteirinha de aula em sua nova escola. E olha só, agora eram melhores amigos! Tempo faz mesmo coisas estranhas com as pessoas.

– Sabe, você me lembra dela, às vezes. - A voz de Mirajane a chamou de volta para a conversa. - Sua alegria, o jeito como você se importa com tudo e todos... - Lucy corou um pouco com isso, o que a fez rir- E, bom... Vocês tem, coincidentemente, o mesmo melhor amigo.

– É verdade, né... - Natsu falava bastante da irmã de Mira, principalmente quando contava as coisas que aprontara no passado. Ele também ficara bem animado quando soubera que ela voltaria... Dava vontade de conhecê-la. Afinal, não é todo mundo que aguenta aquele garoto!

Ainda assim, o pensamento de que existira alguém importante daquele jeito na vida dele antes dela aparecer deixou-a com um gosto amargo na boca. E, não, ela definitivamente não associaria isso com aquela palavra comunmente usada por muitos para definir...

Admita, você está com ciúmes. Uma voz irritante comentou em sua mente.

– Cale a sua boca. - Ela respondeu em voz alta, nem se importando com o olhar estranho que recebeu de sua amiga.

– Você tá bem, Lucy? - Com isso, a escritora percebeu o que fizera e corou.

– Uh... Estou sim, haha... - Será que aquilo tinha convencido Mira? Se a conhecesse bem, a resposta provavelmente seria infinitas vezes não mais um você não me engana. Claro, tudo amaciado por outro sorriso doce. Ela sabia sim como passar uma mensagem só pelo olhar.

A albina a olhou por mais um minuto, antes de rir e revirar os olhos. Depois de um tempo, Lucy recomeçou a conversa.

– Mas, enfim, espero que ela goste das mudanças. Ficar por tanto tempo tão longe de casa... Não sei, meio que faz o tempo parar para você nesse lugar. Voltar e descobrir que você perdeu tanta coisa... - Era assustador. Ela até teria terminado sua frase, porém algo chamara sua atenção.

Algo cinza escuro, fumegante, subindo em direção ao céu não muito longe delas.

– Espera, Mira... - Sua mão moveu-se para apontar para o céu. - Aquilo é... Fumaça? De onde está vindo?

– Quê? - Ela olhou para frente, só para ver... - Não... Não pode ser.

Mas era. Chamas dançando por entre os andares superiores do prédio de sua casa, como se fossem engoli-lo por inteiro a qualquer momento. Ela não teve tempo para pensar; Começou a correr até lá.

– Espera, Mirajane! - A loira foi deixada para trás, muito assustada para se mover. Como não percebera o fogo antes? As pessoas apontando, indo até lá, formando uma aglomeração?

Desgrudando os pés do chão, ela precipitou-se a alcançar sua amiga, esperando que ela não fizesse nenhuma loucura. Esbarrou em quase todos que se espremiam para ver a destruição que mal começara de perto, e chegou até ela.

– Não... - A modelo jazia parada a poucos metros da entrada, os olhos grudados no fogo. Lucy, por sua vez, olhava para os lados esperando ouvir sirenes de bombeiros, ou alguém que pudesse fazer alguma coisa.

Quando não viu, desesperou-se. O que ela, uma simples escritora iniciante, poderia fazer num momento como esse? Em seus devaneios, só conseguiu perceber que alguém a chamava na terceira vez.

– Lucy! - Uma voz. Familiar, que a fez acalmar-se significativamente. Virou-se a tempo de ver um borrão de rosa correndo em sua direção até que braços seguraram-na pelos ombros.

– N-natsu...? - Não demorou muito até o fato de ele achar que ela estar no prédio irrompesse em sua mente, assim como a aparência dele de ter corrido por alguns minutos. A jovem viu-se sorrindo de leve com isso, mesmo o momento sendo extremamente preocupante.

– Ei, eu estou bem! - Ela o assegurou, colocando uma mão nos ombros dele em resposta. - Eu e a Mira estávamos fora quando começou o incêndio. - Lucy percebeu a falta de algo. - Cadê o Gray? Vocês não viriam juntos para o jantar?

– No trânsito, há alguns metros daqui. - Ele respondeu, virando-se para o prédio. - Ele queria vir também, mas eu fui mais rápido e saí do carro quando tinha a chance. Dava para ver o fogo de lá.

–A-ah... - Mirajane murmurou alguma coisa, observando o prédio. Lucy foi até ela, preocupada. Pelo visto, demoraria até os bombeiros chegarem até o local... Ao menos o fogo não se alastrara pelos andares ainda.

Mas, pelo visto, aquilo não demoraria muito.

– Ei, tem alguém dentro do prédio?! - Natsu gritou para os que observavam a cena apavorados. Alguns pareciam ter saído a pouco, outros só curiosos com o que estava acontecendo.

– N-não, moço... - Uma mulher respondeu. - Batemos na porta de todos os andares quando o fogo começou, não tem ninguém lá dentro.

A loira deixou escapar um suspiro que não sabia que estava segurando. Se todos tinham saído, então...

Foi aí que a beldade que se apoiava nela recuperou a voz.

– L-lisanna... Ela não está aqui. - A modelo murmurou, olhando para os lados. Desprendeu-se da escritora em um segundo, partindo para o tumulto próximo ao prédio. - Lisanna? Alguém viu a minha irmãzinha? Lisanna!– Berrou para todos os lados, mas nem sinal dela.

– E-espera... - Os olhos cor de chocolate voltaram-se novamente para o prédio em chamas. - Se ela não está aqui, então...

Tive de empurrá-la para o quarto para fazê-la dormir, aquela garota queria sair por aí vendo o que tinha mudado na cidade assim que chegou!

Nunca pensou que ouvir a voz de Mirajane repetindo-se em sua mente fosse algo tão assustador.

– Ela está lá dentro?! - Natsu pareceu perceber a mesma coisa que a loira, voltando para frente do lugar. O fogo parecia mais intenso agora, e a brisa da noite que o espalhava para os lados não estava ajudando.

– L-lis... - A beldade parecia desesperada, tombando com os joelhos com um baque surdo no chão. Algumas pessoas tentaram a ajudar chamando o nome da garota, mas sem sucesso. Ela não estava em nenhum lugar.

– Droga, a estação é longe demais para chegarem a tempo... - O rosado encarou o fogo, e engoliu em seco. Notando a expressão familiar no rosto do amigo, Lucy agarrou-o por um dos braços.

Não pense nisso.– Ela implorou.

– Não tem outra escolha.

– M-mas, Natsu-! - Ela se aproximou mais, com os olhos arregalados. - E se o prédio desabar antes? E se você não conseguir sair a tempo... - A jovem hesitou, olhando para o chão. - Não... Não tem mais volta.

– Tem sim, Lucy!- Ele insistiu, - Eu vou ficar bem, prometo. - Seus olhares se cruzaram, e ela encontrou-se acreditando em tudo que ele falava. - Eu tenho que fazer isso. Ainda dá tempo de entrar lá e salvá-la.

– Você ainda é um iniciante. - A escritora murmurou. - Não te deixaram participar de algo tão perigoso ainda. Você não pode ao menos esperar os outros-

– NÃO! - Um grito de Mira fez com que eles olhassem para o prédio. O fogo tinha alcançado o andar acima do dela, e estava se alastrando com rapidez.

O garoto se voltou para ela uma última vez, e lançou-a um dos seus sorrisos mais convincentes. - Vamos, deixa disso. Eu preciso de experiência!

Lucy viu-se num impasse daqueles livros de ação de que tanto adorava ler. Deixá-lo ir, para correr o risco de morrer, ou passar o resto da vida culpando-se por não ter o deixado se arriscar? E uma decisão que parecia tão fácil no mundo da fantasia, agora, no mundo real...

Parecia impossível. Pois eram vidas em jogo, e uma delas era justo uma das pessoas mais importantes da vida dela - o que, naquele momento, ela não podia deixar de discordar. E, ao contrário da ficção onde os protagonistas nunca morrem, eles eram...

Mortais. Simples, ordinários mortais. A vida poderia deixá-los tão facilmente quanto o assoprar de uma vela.

Mas, em algum lugar de si mesma, Lucy sabia que não tinha outra escolha. Pelo bem de Mira e de sua irmã, ela tinha que deixá-lo ir.

–... Tudo bem. - Ela suspirou. - Mas me prometa que vai tomar cuidado.

– Eu não tinha feito isso antes? - O garoto sorriu.

A loira buscou por sua bolsa, a única que mantinha consigo fora os sacos de compras que tinha deixado cair a alguns passos atrás quando viu o prédio pela primeira vez. Tirou dela um lenço, e usou a água que tinha em uma das sacolas para umedecê-lo.

– Aqui. - Estendeu o lenço. - Use isso, não quero que você morra asfixiado lá dentro.

Ele aceitou o objeto com um sorriso, mas ela percebeu que estava nervoso - era normal de Natsu ficasse ajeitando o cachecol quando ficava assim.

Como se tivesse lido sua mente, ele lançou-a outro sorriso e tirou a veste do pescoço, entregando-a. - Pode segurar isso aqui para mim? Não quero que queime.

– ..Ok. - Ela sabia o quanto aquilo significava para ele, então aceitou sem pensar duas vezes.

– N-natsu... - Mirajane se aproximou, lágrimas caindo de seu rosto. - Eu não... Só tome cuidado, certo? E... - Ela fitou o chão. - Se parecer impossível de continuar, volte. Por favor, eu não quero perder ninguém, mas...

– Por que vocês duas são tão pessimistas? Vai dar tudo certo! - Ele assegurou com o sorriso de sempre. Com o lenço nas mãos e um último aceno, começou a dirigir-se para a porta.

– Tome cuidado! - Lucy gritou, vendo-o abrir a porta. Ele curvou a cabeça, levantando uma das mãos em despedida.

– Não se preocupe! - Ele entrou, sua última frase podendo ser ouvida ecoando pela portaria do prédio. - Tudo bem, tô pegando fogo!

– Não fale isso quando está no meio de um incêndio! - Lucy gritou para o outro, mas provavelmente este não podia mais a ouvir. Ela engoliu em seco, não tirando os olhos da porta. - E... volte logo.

Sua resposta não foi nada menos que o barulho de buzinas e uma vista pincelada em chamas.

–-- x ---

Tic, toc.

Cinco minutos desde que Natsu partira. Pelo menos era o que dizia o relógio; pareciam mais horas na perspectiva dela.

O cenário não estava bom, também. Elfman tinha acabado de chegar junto de Cana, e ambos tentavam acalmar uma Mirajane desesperada que não sabia mais o que fazer. Gray também estava lá, e eles tiveram de segurá-lo para que não entrasse correndo no prédio.

Huh, e ainda diz que os dois se odeiam, ela não pôde deixar de comentar em sua mente. Mesmo assim, entendia muito bem o que ele estava sentindo no momento, então decidiu ficar calada.

Alguns repórteres começavam a tumultuar a frente do prédio, respirações ofegantes e mãos trêmulas segurando câmeras - ninguém nunca fica calmo num incêndio. Flashs cintilando como estrelas, e mesmo assim nenhum sinal de rosa ou caninos afiados saindo da porta do prédio.

Os bombeiros ainda não estavam lá. Que diabos estavam fazendo? Aquele trânsito não poderia estar tão caótico assim, se praticamente todos os canais tinham um repórter dando um informativo sobre a situação.

Será que o carro deles quebrou? Ou estavam em outro local antes e demorariam muito para vir...

Pare com isso, Lucy! Vai ficar tudo bem.– Tentou assegurar a si mesma, mas não conseguia parar de tremer. Já tinha anoitecido totalmente há essa hora, e o fogo parecia mais um monstro horripilante prestes a engolir o prédio inteiro.

– Vamos lá, Natsu, saia daí... - A garota praguejou, segurando o cachecol contra si. - Por favor.

Foi aí que ela viu.

Surgindo ao meio de muita fumaça e cinzas que dissipavam no céu, lá estava ele, com uma garota mechas brancas como a neve segura em seus braços. E Lucy teria até soltado um suspiro de alívio por ela estar bem se não estivesse vidrada em alguma coisa completamente avulsa.

Ele estava diferente.

Como uma chama, daquelas que escapam dos seus dedos quando você tenta agarrá-las e que te machucam e te queimam e te conquistam do mesmo jeito.

Seus passos fizeram batidas surdas contra o asfalto frio enquanto ela se aproximava lentamente, os olhos nunca deixando-o: A figura misteriosa e envolvente que tinha tomado o lugar de seu melhor amigo.

O que estava acontecendo? Sua respiração vinha agora em um ritmo acelerado, como se o ar que ela puxava para os pulmões fosse levar em troca o sentimento novo que estava ali em seu peito.

Não, aquele não era o Natsu.

Tump.

Não podia ser - O olhar dele, sua silhueta contra a luz cintilante do fogo posto ao céu - aquele não se assemelhava em nada, absolutamente nada-

T-tump.

Ao seu melhor amigo; e sim a Natsu Dragneel, aprendiz de bombeiro que acabara de resgatar sua primeira vítima de um incêndio.

E ao mesmo tempo, continuavam a mesma pessoa.

Como podia? Controvérsias assim existem mesmo na vida real? Lucy estava confusa. Confusa, cansada, e em dúvidas de sua sanidade. Afinal, não é todo dia que você passa a cogitar a ideia de existir um clone do seu melhor amigo.

– Lucy? - Seus passos chegaram a um fim, e ela se viu ao meio de diversas pessoas que tentavam ver de perto a figura da garota que fora salva. A loira encontrou o olhar de Gray, que parara ao lado deles enquanto Mirajane soluçava ao lado da irmã, que era examinada por um médico que estava de passagem pelo local.

– Tá tudo bem? - Quis saber o moreno. Ela assentiu, ainda um pouco tonta, percebendo que pressionava o cachecol de Natsu um pouco forte demais. Curvou os olhos para Lisanna, sentindo uma revirada dolorosa no estômago ao avistar uma queimadura feia por entre o tecido queimado de seu ombro esquerdo.

Ela sabia, porém, que poderia ter sido bem pior.

– E-ela vai ficar bem? - Indagou, tropeçando nas palavras. Natsu, que se afastara para dar espaço a Elfman e Mira enquanto ambos se recuperavam do susto de quase perder a irmã - de novo - , respondeu por eles.

– Ela sofreu uma queimadura feia no ombro e algumas outras nas pernas, mas nada de grave. - Ele a informou, um pouco preocupado. - Mesmo assim, é melhor que ela fique no hospital por um tempo.

– Ah. - Lucy tomou tempo para olhá-lo de perto dessa vez, e deu um passo involuntário em sua direção quando viu um borrão de pele queimada em uma parte do pescoço do garoto. - Natsu! Seu pescoço, ele está-

– Isso? - Ele tocou de leve o ferimento, trincando os dentes com a dor. - Me assustei quando vi que o fogo tinha alcançado o andar e acabei batendo num armário e me queimei.

Como ele conseguiu um ferimento no pescoço batendo num armário? Foi o que provavelmente passou pela cabeça da loira com a cara que ela fez.

– Natsu... - Ambos voltaram-se para a beldade Strauss, que olhava receosa para cima. - C-como está tudo lá em cima?

O rosto dele tornou-se receoso. - Me desculpa, Mira... Eu tava tão preocupado em salvar a Lisanna que não consegui achar muita coisa. - Ele tirou uma carteira um pouco queimada do bolso. - Isso é tudo o que eu consegui pegar.

– N-não tem problema, eu... - Ela pegou o documento, suspirando pesadamente ao ver que os documentos importantes tinham sido preservados. - Obrigada... E imaginar que isso poderia ter acabado bem pior do que já está...

Lucy engoliu em seco ao pensar que, sim, poderia ter sido pior. Mas esses pensamentos saíram da cabeça de todos ao ouvirem o barulho familiar de sirenes soando pela rua. Suspiros de alívio puderam ser ouvidos, e Elfman levantou sua irmã desmaiada com cuidado.

– Vamos, temos que tratar logo desses ferimentos. - O homem que tratara da albina antes orientou, levando-os para junto da ambulância que terminava de estacionar junto com os bombeiros.

– O que você ainda está fazendo aqui? - A loira virou-se para seu melhor amigo, bufando. - Vamos! Você tem essa queimadura horrível no pescoço e vai ficar aí parado?

– Ah. - Ele piscou, direcionando sua atenção do carro vermelho de onde saíam homens para apagar o fogo para Lucy. - Tá, já tô indo. - Ele percebeu o tecido familiar seguro nas mãos dela, e sorriu. - Obrigado por segurar o cachecol para mim.

E lá foi ele outra vez, com aquele sorriso grande e sincero que a deixava fora de base. O pior de tudo era que, mesmo que Natsu tivesse “voltado ao normal”, ela sentiu-se fraca nos joelhos e acabou por olhar diretamente nos olhos dele...

Ah, não.

Quase que instintivamente, a garota empurrou o tal tecido para as mãos do garoto e começou a se apressar pela rua ainda lotada de pessoas, o mesmo pensamento repetindo-se em um loop pela sua cabeça.

Não pode ser - Isso não pode estar acontecendo, não, não mesmo!

Em seu conflito interno,ela nem percebeu uma garota apressada que corria em sua direção.

– Lucy! - A jovem olhou para cima, reconhecendo uma Levy ofegante chegando até ela. - Você... Onde você está indo? Tá tudo bem lá?

–... Levy? - Ela piscou, ainda confusa com tudo o que ocorrera e extremamente cansada. Assim que sua mente cogitou a possibilidade dela ter visto algo no noticiário, continuou. - Não, tudo está bem, conseguiram tirar a Lisanna de lá.

Tiraram? Ela estava dentro do prédio? - Lucy assentiu com a cabeça, ainda em silêncio. - Quem tirou ela de lá? Os bombeiros não estavam quando eu vi o noticiário, e...

– Foi o Natsu.

– Eh? - A pequena bibliotecária interrompeu sua seção de perguntas, tombando a cabeça para o lado. Depois, sua curiosidade voltou com força total. - E você não está lá dando uma bronca nele por entrar num prédio em chamas? Lucy, o que houve?

– Eu estou cansada, só isso. - Ela desviou o olhar, sua mente viajando de volta à alguns minutos atrás. - É melhor eu ir, avisa para todo mundo que não tem porque se preocupar, tudo bem?

– Ei! Espera...

– Até mais, Levy!

– Mas-! Lu! - A azulada tentou chamá-la, mas já era tarde - podia ver a silhueta da melhor amiga desaparecendo entre as ruas escuras da cidade. Ela bufou, vendo em seguida outra pessoa familiar se aproximando.

– Levy! - Era Natsu, que carregava uma sacola nas mãos. - Você viu a-

– Lucy? Acabou de passar por aqui, disse que estava cansada. - Ela interrompeu-o. Ele fez uma cara de dar dó, levantando o que levava.

– Ela esqueceu isso...

– Hm... - A bibliotecária pegou os sacos, examinando o conteúdo do saco. - Sonho de uma noite de verão...? Mas ela estava atrás disso há tempos! Por que largar do nada por aí?

A McGarden virou-se para a direção em que sua melhor amiga tinha ido, confusa. Para sair daquele jeito, numa situação como aquela... O que tinha realmente acontecido?

Seja o que fosse, ela descobriria.

–-x--

Lucy praticamente se jogou na cama, tendo ignorado as boas vindas de Virgo do andar de baixo e fechado a porta com um estrondo. Não por querer, é claro - ela nem prestara atenção em nada com todo aquele turbilhão na sua cabeça.

O que de errado tá acontecendo comigo? Ela virou-se de costas para baixo, observando o céu azul pela janela do quarto.

A imagem do que era para ser o seu melhor amigo contrastando com o prédio em chamas voltou para sua cabeça, e a garota enterrou a cabeça no travesseiro.

– Ugh! - Sua voz saiu como um grunhido,abafada. - Lucy, você tá maluca? Para pensar uma coisa dessas - E num incêndio, para piorar!

Ela estava se envolvendo no seu próprio conto demais, tanto ao ponto de ficar doida! Afinal, não tinha como... Ela sempre era provocada pelas amigas por aquilo, mas nunca fora realmente verdade, e...

O que foi aquilo, hein? Ela suspirou. Quando tinha olhado para os olhos dele naquela hora, ela...

– Não pode ser. - Ela discordou do que seu coração queria tanto afirmar.

Porque, naquele momento, quando seus olhares se encontraram e o tempo pareceu parar, Lucy sentiu.

Algo que lembrava criancinhas de mãos dadas, sentimentos ingênuos, beijos tímidos e de seu primeiro amor - mas, ao mesmo tempo, era diferente. Era algo mais forte, um indício, uma coisa que poderia tornar-se uma chama que a consumiria por inteira-...

Faíscas.