Princesa industrial

Acho melhor olhar o contrato.


Eram quase três da manhã quando Felipe estacionou na porta da minha casa. Saí do carro e entrei em casa na ponta dos pés. Assim que fechei a porta atrás de mim ouvi risadas. Entrei na sala onde estavam meus pais, meus futuros sogros e meu futuro marido:

–Meu amor, ainda bem que você chegou. Estávamos começando a nos preocupar. - Miguel disse se levantando e me dando um selinho.

–Onde você estava com a cabeça, Milena? Chegar tarde deste jeito e ainda deixar seu noivo esperando.- Disse meu pai fingindo ser razoavelmente amigável.

–Eu saí com alguns amigos, já que daqui aproximadamente um ano eu estarei casada. E por este mesmo motivo eu presumi que não teria problema chegar um pouco mais tarde em casa. Também não achei tão absurdo deixar meu noivo esperando já que eu encontrei com ele algumas horas atrás no lugar em que eu estava. - Sorri sarcástica. - Agora se me dão licença, eu vou dormir. Por ser a única menor de idade no recinto eu tenho aula amanhã. Boa noite a todos.

–Nem tão rápido, mocinha. - Disse meu pai já irritado. - Você acha que esta é a vestimenta adequada para alguém comprometido? O que seus sogros vão pensar de você? Da próxima vez que sair com seu noivo pense bem no que irá vestir.

– Eu acho que esta é a vestimenta adequada para uma adolescente, que é o que eu sou. Meus sogros vão pensar exatamente o que pensam neste momento, que eu sou a filha de alguém importante e que vou trazer muito dinheiro. E de acordo com todos os presentes nesta sala, tendo como base o dia em que conheci meu noivo, eu deveria usar apenas uma lingerie quando encontrar com ele. - Sorri rapidamente e virei de costas.

–Milena, eu não vou tolerar este tipo de comportamento. Você está de castigo. - Meu pai estava vermelho de raiva e minha mãe morrendo de vergonha.

–E qual será? Vai me mandar casar a força com alguém que eu acabei de conhecer? Espere, isso você já fez. - E saí da sala calmamente.

Subi as escadas e senti alguém atrás de mim. Olhei e vi Miguel. Fechei a porta:

–Pode falar, vou me trocar.- Disse olhando para ele. Virei de costas. - Abre pra mim? - Ele desceu o zíper do top que eu estava usando e beijou meu pescoço. Diferente da noite anterior o beijo não me causou nenhuma reação. Seus lábios estavam gelados e só de pensar que a boca dele havia percorrido todo o corpo de uma desconhecida horas antes meu estômago embrulhou. O empurrei e tirei a saia:

–O que foi, Milena? Não gostou da noite passada? Podemos tentar novamente. - Ele disse se aproximando. Ele colocou as mãos na minha cintura. - Fui eu que te apertei assim? Desculpe, não queria te machucar. - Ri, ele nunca teria a força de fazer aquilo e nem o jeito de fazer sem me fazer sentir dor. O empurrei novamente.

–Não é que eu não tenha gostado, eu só não quero repetir. - Disse baixo enquanto colocava o sutiã.

–Por que você está assim? - Como ele conseguia ser tão sínico? - Não precisa ficar com vergonha, você foi incrível.

–Eu sei, das duas coisas. Você simplesmente sumiu hoje cedo e depois eu te encontrei numa boate agarrando uma menina e saindo com ela tempo depois.

–Sem crise de ciúmes agora, Milena. Você não entende como funciona um homem. Eu realmente quero acertar as coisas com você. Eu te amo. - Ele realmente me acha ingênua a esse ponto? Apenas olhei para ele e abri a porta. - Milena, você está presa a mim querendo ou não. Você sabia como seria este noivado. Pare de sonhar.

–Eu estou presa a você, mas agora eu não tenho mais nem uma gota de vontade. Viva a sua vida, eu vivo a minha e cumprimos agendas sociais. É assim que vai ser a partir de agora. Nada de contato físico até o casamento.

–Isso é o que veremos, noivinha. Para sua informação, o contrato é bem especifico. Eu não sei se você leu, mas acho bom tirar um dia desta semana para isso. Te vejo na sexta-feira, princesa. - Bati a porta. Este contrato me deixa cada vez mais nervosa.

***

No dia seguinte saí da aula, passei em casa para pegar uma xerox do contrato e fui para o apartamento de Felipe. A porta estava destrancada. Abri e me deparei com ele apenas de calça jeans, sentado no sofá com um livro e um óculos que o deixava com um ar intelectual. Ele olhou pra mim e abriu um sorriso ficando de pé. Eu fechei a porta, joguei o envelope em algum canto da sala e corri até ele pulando em seu colo. Ele me beijou:

–O que você faz aqui? Que surpresa boa. - Ele disse assim que separou nossos lábios.

–Eu vim aqui para duas coisas na verdade. Pra te ver e pra te pedir um favor. - Disse um pouco envergonhada.

–Qualquer coisa pra minha princesa preferida. - Sorri.

–Você faz direito não faz? - Ele sorriu maliciosamente.

–Vamos pro meu quarto que eu te mostro. - Eu ri.

–Besta - Bati em seu ombro. - Eu estou falando da faculdade. - Ele assentiu. - Eu preciso que me ajude a analisar um contrato. Eu preciso saber exatamente o que eu sou obrigada a fazer e como eu me livro dessas coisas. - Desci de seu colo e peguei o envelope do chão.

Ele estava sentado no sofá. Entreguei o envelope para ele. Ele pegou minha mão e me fez sentar em seu colo. Ficamos boa parte da tarde lendo o contrato. Depois de três horas lendo eu fui fazer café para tomarmos. O celular dele estava sobre o balcão. Enquanto a água fervia o celular tocou e o nome Sophia apareceu no visor. Ele levantou do sofá e atendeu. Por algum motivo eu fiquei com uma pontinha de ciúmes. Eu não podia sentir ciúmes dele, eu não podia sentir nada por ele. Será que eu estava confundindo meus sentimentos com os que eu sentia por Miguel? Eu não podia sentir nada por Felipe, eu estava noiva. Dei um tapa no meu próprio rosto para expulsar este pensamento. Terminei de fazer o café e logo ele apareceu na sala novamente. Voltamos para o sofá e desta vez sentei ao seu lado:

–Bom. Esse contrato é o mais absurdo que eu já vi. Se você deixar eu posso mudar os nomes e pedir para o meu professor nos ajudar. - Assenti. - Mas do que eu entendi você praticamente foi dada para o seu noivo como um objeto. Você sabe que eu adoro seus pais, mas eles foram totalmente sem escrúpulos nisso.

–E o que diz que eu tenho que fazer? - Perguntei esperando que ele me dissesse uma saída.

–Ele poderá te tocar livremente e você terá que ceder as vontades dele até o momento que disser “Eu aceito”. A partir desse momento você poderá viver sua vida, mas sob o mesmo teto que ele por pelo menos dois anos. Depois disso, cada um fica com metade de ambas as companhias. Sinto lhe informar que ele pode te trair quantas vezes ele quiser até você subir no altar, depois disso qualquer forma de traição fará você receber uma quantia de aproximadamente um milhão de dólares o que não é muito levando em consideração os danos morais que este contrato já está te causando. Eu não sei como te tirar disso sem envolver ambas as famílias ou uma crise dentro da sua. Eu vou procurar alguma coisa pra te tirar disso, mas não prometo nada. Vou olhar melhor isso. Me dê alguns dias.

Assenti. Então o Miguel poderia encostar em mim quando bem entendesse. Eu não acho isso certo de forma alguma. Como meus pais puderam fazer isso comigo? Eu estava me corroendo de saber que ficaria sozinha com Miguel por três dias no final de semana. Eu só queria fugir, sumir do universo até tudo isso se resolver. Eu sei que depois do discurso de Felipe minha cabeça estava girando. Diversos pensamentos passavam pela minha mente, mas eu só consegui verbalizar um deles:

–Felipe, quem é Sophia? - Ele riu. Eu precisava tirar minha mente daquele contrato por pelo menos um segundo.

–Eu não sei se fico feliz ou preocupado com esse ciúme repentino. Você é comprometida e eu sou só um babaca que desde ontem só pensa em você. Sophia é uma colega da faculdade, nós iríamos fazer um trabalho em dupla hoje a noite e ela perguntou se podemos remarcar para amanha o que eu achei até melhor já que você está aqui.

–Quer dizer que você não está com ninguém no momento? - Ele assentiu. - E que você anda pensando em mim. - Ele assentiu. - Isso é bom, porque eu também estou pensando em você. - Pensei por um segundo que ele faria como Miguel e sumiria assim que ganhasse o que queria, mas logo descartei essa possibilidade.

Se fosse pra ele fazer o mesmo que Miguel, ele teria feito na noite anterior. Me aproximei e ele também. Ele me beijou.Ele me carregou até o quarto dele e me colocou na cama. Ficamos apenas deitados, nos beijando por algumas horas. Voltei para casa quase oito da noite. Combinamos de nos encontrar dois dias depois, na quarta-feira, para não levantar tantas suspeitas de meus pais. Fiz a lição e fui para cama.