Preguiça, Gula e Vaidade

Capítulo 21 - Digerindo


Capítulo 21 – Digerindo

Cherry foi até a cozinha da casa, a agua começara a ferver. Sabia que receberia visita a qualquer momento, e tudo o que poderia oferecer seria chá. Olhou pela janela, o quintal da casa de Muriel parecia o mesmo naqueles dois meses em que a garota se mudara para lá. Luca estava em algum canto adormecido, ainda muito triste com a morte de Muriel.

Alphonse arranjou dois enterros, um para Muriel e outro para Richard. Naquele dia algumas pessoas apareceram para prestigiar sua tia avó, mas apenas Sophie compareceu no de Richard, ela sentiu certa pena.

— Maldita casa! — resmungou ela sem conseguir se lembrar de onde estava a chaleira.

Para Cherry foi uma grande surpresa quando foi avisada que seu nome constava no testamento de Muriel, a casa agora estava em seu nome. Alphonse não gostou nada na ideia da jovem ir morar sozinha com Luca, mas não havia outra escolha já que a criança se recusara deixar o lugar.

Não conseguia acreditar em tudo o que havia acontecido. Seus pais ligaram várias vezes procurando por seu irmão, mas Mike jamais retornaria um contato. Não quando ele já não era mais a mesma pessoa.

— Tire os sapatos — pediu ela sem se virar para Alphonse na porta.

O jovem deu uma boa e demorada olhada na jovem. Estava descalça, e extremamente à vontade assim, usava um vestidinho leve com desenhos de folhas secas. Mas o ponto alto da transformação de Cherry era seu cabelo. Antes castanho e delicado depois negro na sua faze de revolta, mas agora estava completamente loiro.

— Que cena mais afrodisíaca! — falou ele rindo da garota, que se virava como podia na cozinha.

— Cherry! — gritou Jenny ao avistar a amiga.

A jovem parou centímetros de distancia avaliando Cherry de cima em baixo, como se milhões de comentários ocupassem sua mente. Sempre em exagero.

— Você abraçou a vida loira — comentou-a maravilhada.

Cherry passou a mão na cabeça desconcertada, aquele sorriso que escapou de seu rosto impressionou os dois convidados. Era uma nova pessoa. Mais leve, natural.

— Estava crescendo assim então resolvi pintar tudo de vez e aceitar o que viria por ai — falou ela lançando um olhar significativo para Alphonse.

— Não consigo aceitar você aqui sozinha — falou Alphonse, retornando a um velho assunto — Você e Luca deveriam morar no castelo.

— Já conversamos sobre isso — disparou Cherry — Que inferno!

— É uma casa muito bonita — disse Jenny tentando ser educada.

Alphonse saiu da casa meio nervoso, mas Cherry não se importou.

— As coisas andam tão estranhas — comentou Jenny — Eu não consigo acreditar no que aconteceu. Foi tudo tão rápido.

Cherry não disse nada apenas continuou a preparar alguma coisa na cozinha.

— Julius era uma pessoa estranha, mas estávamos acostumados com o seu jeito superior... — Jenny encostou-se à parede — Não esperava que ele fosse fazer isso...Muito menos Stevan.

— Me surpreende que nenhum de vocês tenha se interessado em saber qual era o poder dele, quer dizer... Todo esse tempo — comentou Cherry lavando uma xícara.

— Havia um acordo entre nós... — explicou Jenny — nunca perguntar sobre nossos poderes, ou nosso passado. Já que aceitamos viver todos juntos no castelo, não poderia existir essa informação entre nós, porque a principio a ideia era que fossemos uma família.

— Alphonse sabia — disse Cherry.

— Não caia no jogo de Julius Cherry — falou Jenny — Alphonse disse que não sabia de nada, você precisa acreditar nele.

Cherry deu de ombros. Seus cabelos estavam desgrenhados, mas nem por isso não se tornavam belos aos olhos.

— Você esta igual a sua mãe — comentou Alphonse passando por elas, levando Luca com sigo.

— Ele sempre adormece lá fora — disse Cherry, Jenny sorriu.

Alphonse retornou para cozinha em passos cautelosos, esperando escutar a conversa, mas só conseguiu escutar risadinhas. Observou Cherry rindo descontraída, mesmo depois de tudo o que aconteceu. Seu cabelo amarrado de qualquer jeito caindo em uma ondulação angelical para todos os lados. O sol da tarde batendo em seu pescoço era possível ver os pelos, mas foram os de Alphonse que se arrepiaram.

Foi o que precisava para fazê-lo sorrir também. Não sabia que sensação estranha era aquele, algo exclusivo daquela casa que diferenciava do castelo. Naquele lugar ele sentia-se muito mais próximo. Tocou a parede de papel antigo, tão caloroso e convidativo. Sentia que poderia morar ali...

— Ele dormiu mesmo? — perguntou Cherry. Alphonse tomou um susto já que estava em outro cômodo.

— Sim — respondeu chegando á cozinha — Mas ele pediu para dormir no quarto de Mike...

— Por que tanto chá? — perguntou Jenny, tentando rapidamente fugir do assunto “Mike”.

— Outras visitas — explicou Cherry, mas Jenny não entendeu.

— Já estão aqui — disse Alphonse observando a janela.

Cherry finalmente terminou de arranjar a bandeja de prata e indicou para que Alphonse e Jenny a acompanhassem. Do lado de fora da casa um pequeno grupo de jovens aguardavam no gramado.

— Desculpe a invasão — falou Gasper.

— Só tenho chá, espero que gostem de frutas vermelhas — Sebastian fez uma careta de onde estava.

O jovem perdera um de seus braços, exibia um amontoado de faixas para tampar o que faltava. Edgar exibia machas de seu ferimento lutando com Richard e Félix também aparentava estar meio abatido. Só havia esses quatro.

— Ficaremos felizes em aceitar — disse Félix meio desconcertado.

Alphonse tinha um olhar atento nos quatro. Jenny ajudou arrumar a mesinha que ficava na varanda da casa.

— Então.. — comentou Alphonse de braços cruzados observando Sebastian e Edgar garantindo seus lugares — No final todos nós temos o mesmo objetivo.

— Uma aliança é a melhor escolha — falou Gasper, parecia ter tomado á frente do grupo já que Sebastian permanecia calado o tempo inteiro.

— Se Julius conseguir o que quer as pessoas vão estar em sério perigo — explicou Félix — A presença da ira original já é motivo para nos preocuparmos...

Cherry parou por um momento de servir, mas continuou.

— É muito difícil de acreditar no que houve — falou Edgar triste — Primeiro Lena, depois Mike. Tínhamos tudo sob controle, o plano parecia perfeito.

— O problema é que todos nós fomos usados! — disse Gasper — O vaidade esperava que acontecesse daquela maneira.

— Difícil de acreditar que são virtudes — zombou Alphonse — Principalmente aquele ali.

Sebastian retribuiu o comentário com um olhar furioso.

— E o que pretendem fazer? — perguntou Jenny.

— Por enquanto não podemos fazer nada sem a permissão de nosso líder... — falou Edgar.

— Líder? — perguntou Cherry curiosa.

— Depois do incidente o concelho de virtudes definiu que qualquer ação nossa teria que ser supervisionada pelo nosso líder. O “castidade” — explicou Gasper — Antes tínhamos permissão para agir por conta própria, pois nosso líder estava em uma missão especial. Mas agora tudo mudou.

— Ao menos existe uma vantagem do nosso lado — falou Alphonse, as virtudes o observaram sem entender — Os diários de Muriel e Anna Belle.

Sebastian soltou uma risadinha pela primeira vez.

— Essa vantagem não existe mais — disse.

Cherry e Alphonse entreolharam-se sem entender.

— Caleb nos traiu — falou Sebastian — Em uma noite ele simplesmente apanhou os dois diários e desapareceu.

— Ainda não temos certeza se foi assim! — retrucou Félix.

— Vocês ainda não aceitaram que foi assim — rebateu Sebastian.

Alphonse notou a expressão pensativa de Cherry. Ele colocou sua mão no ombro da jovem.

— O que houve?

Ela suspirou.

— Muriel — disse — Morreu sem descobrir que sua irmã estava sendo controlada por todo esse tempo...

Houve um silencio entre todos que estavam ali, mas Cherry continuou. Sua postura era tranquila como jamais esteve.

— Julius separou essas duas irmãs para conseguir o que queria — falou firme — E fez isso de novo.

Ela pensou nas palavras do jovem quando ele se referiu ao romance dela com Alphonse.

— Eu vou pegar de volta tudo o que ele me tirou — falou Cherry, todos observaram a expressão decidida da jovem — Desculpe se ele foi seu amigo, mas eu não descansar até conseguir isso.

Alphonse sorriu.

— Acho que Julius já viveu por tempo demais — comentou ele abraçando a garota.

— Você pode contar comigo também! — disse Jenny.

Sebastian soltou uma risadinha seca.

— Com todo o respeito, o que você poderia fazer sem a ajuda de seu príncipe encantado? — comentou.

Cherry observou o jovem sentado, o olhar lascivo e decidido. O sorriso de Sebastian se desfazia aos poucos.

— Por todo esse tempo Julius brincou com a vida das pessoas — falou Cherry — Não me importa o quão poderoso ele é. Nada do que ele fizer agora será o bastante, porque vai sentir o gostinho da minha ira.

Sebastian revirou os olhos.

— E trate de tomar essa porcaria de chá antes que eu mesma empurre pela sua garganta! — falou nervosa, mas se retirando em seguida. Dentro da casa era possível ouvir o barulho de algum quadro cair no chão.

Alphonse encarou as virtudes sentadas. Ele usava um casaco preto bastante leve e justo, aberto perigosamente, como de costume, mostrando que ele não usava nada por de baixo. Estava com o cabelo solto deixando reluzir em diamante negro no sol da tarde. A leve cor bronzeada que ele possuía já não estava amis ali, mas Cherry não parecia ter notado, pois de certo teria comentado alguma coisa já que sempre afirmara que o jovem usava de recursos para adquirir aquela cor.

— Sem você creio que Julius terá que procurar outra luxúria original, isso pode nos proporcionar um pouco de tempo — falou Gasper.

— Ele já conseguiu alguém — falou Alphonse, para surpresa dos demais.

Ele não deu mais detalhe algum sobre o assunto, mas sabia que a pessoa era Albert, seu grande amigo. Depois do incidente na estrada ele viajou para os Estados Unidos e descobriu pelo próprio. O que havia acontecido era que Julius estava com Zahara, o grande amor de Albert, e de alguma forma estava o chantageado.

Observou Jenny, a última remanescente junto á ele dos “sete”. Não queria perder a garota também, considerava-a como sua irmã. Mas durante esses dois meses ele foi tomado pelas palavras de Julius. Alphonse saberia de tudo aquilo? Ele teria concordado com o plano apenas para reaver a lembrança de sua mãe?

Era verdade. Alphonse já não conseguia mais se lembrar da mulher que reina por tantas fotos no castelo. Ele observava sua imagem, mas sua mente não lhe diz absolutamente nada.

Retirou-se para procurar por Cherry. Encontrou a garota na parte de trás da casa, sentada em uma cadeira de madeira, uma perna apoiada em um dos braços da cadeira e segurando o violão que Alex lhe dera.

“Remorsos se acumulam como velhos amigos

Aqui para reviver seus momentos mais sombrios

Não vejo uma saída, não vejo uma saída

E todos os monstros saem para brincar

E cada demônio quer seu pedaço de carne

Mas eu gosto de guardar algumas coisas pra mim

Gosto de deixar minhas questões definidas

É sempre mais escuro antes do amanhecer

E eu fui tola e cega

Nunca consigo deixar o passado pra trás

Não vejo uma saída, não vejo uma saída

Estou sempre carregando esse peso nas costas

E todas as suas questões, tal ruído de sofrimento

Esta noite eu enterrarei esse peso na terra

Pois gosto de deixar minhas questões definidas

É sempre mais escuro antes do amanhecer

Liberte-se, liberte-se

Liberte-se, liberte-se, oh whoa

Liberte-se, liberte-se

Liberte-se, liberte-se, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas

Então, sacuda-o, oh whoa”

Cherry foi diminuído o ritmo devagar, Alphonse se aproximou dela.

— Gostei da sua versão! — falou — “Florence” e alguma coisa?

“Florence and The Machine” — corrigiu ela com a voz tediosa — Aquela banda que você tem os dois CD’s escondidos debaixo do acento do seu carro.

Alphonse ficou desconcertado. Apanhou outra cadeira e sentou ao lado da garota. Encostou a cabeça nos ombros de Cherry, tentando focalizar o mesmo lugar que ela fitava. Permaneceram naquela posição por algum tempo, enquanto as virtudes e Jenny discutiam do outro lado da casa.

— Fiquei intrigado com uma coisa... — começou a dizer, Cherry inclinou levemente seu rosto na direção de Alphonse — Por que não abriu a porta?

Ela refletiu.

— Eu sei que naquele momento você sentiu necessidade de encontrar Mike, mas nada te impediu nesses dois meses de voltar lá e abrir aquele porta — Alphonse escorregou sua cabeça até o colo de Cherry, encarando a garota.

A jovem deu de ombros e olhou o quintal floresta.

— Não quero saber — disse ela — Já não importa mais.

— Mesmo depois de tudo o que passou?

— No final não valeria a pena — confessou Cherry — O que está atrás daquela porta não chegou lá atoa. Em algum momento eu senti a necessidade de trancar aquele segredo, vou respeitar essa minha vontade.

Alphonse observou a expressão reflexiva de Cherry, como se ela mesmo não tivesse certeza do que dissera.

— Quando eu vasculhei a sua mente eu vi que você era especial — contou — Só não sabia explicar o porquê. Esperava que tivesse essa resposta, mas concordo plenamente com você Cherry querida. Não importa qual é o seu segredo!

Ela o encarou, ainda pensativa.

— E o que será que importa, afinal?

— Nós — respondeu ele imediatamente.

Cherry respirou fundo e sorriu. Passou a mão delicadamente nos cabelos de Alphonse.

— Pode sentir essa sensação? — perguntou ela.

— Posso — disse ele abrindo um sorriso safado, ela o beliscou.

— Estou falando de uma sensação de fim — explicou — Como se nossa estória, o nosso impasse, se aproximasse de sua conclusão.

Alphonse moveu o rosto de lado e olhou para Cherry meio confuso.

— Pense bem — pediu ela — Com todos os segredos revelados, bem quase todos, o que falta aqui é uma conclusão de toda essa história.

— Você fala de um final feliz? — perguntou.

— Não — disse ela séria — Apenas uma conclusão. É como Julius disse, nunca se tratou de um conto de fadas. Então chega de castelos e príncipes encantados... e chega de esperar por um milagre.

Os dois trocaram olhares cheios de significados, finalmente conseguindo entender um ao outro.

— Vamos descobrir como tudo isso termina — falou Cherry com certeza na voz — A única certeza que temos é que o nosso momento vai acontecer. Não vou mais mentir, quero que aconteça. Quero que se dane o destino e o seu esquecimento. Eu quero você Alphonse, quero muito te beijar...

Cherry começou a ficar extremamente vermelha e Alphonse arregalava os olhos, mas como um felino que acabara de ver o pequeno ratinha sair de sua toca e notara que ele estava se entregando de bandeja.

— Eu quero todas essas coisas com você Alphonse e eu cheguei ao meu limite! — disse ela.

Alphonse voltou a sentar ao seu lado e apanhou a mão dela.

— Mas ao mesmo tempo eu não quero perder você — ela o olhou triste — Então, a conclusão virá. Mas o que vaia acontecer?

Ele massageou os dedos da jovem.

— Vamos descobrir juntos — ele sorriu.

— Desculpe interromper! — falou a voz de Félix — Mas como eu havia explicado antes, só tomaríamos alguma ação depois que nossa líder, o castidade estivesse aqui.

Cherry e Alphonse não largaram as mãos. Félix não estava sozinho, alguém estava lá, se aproximou da varanda, a velha madeira rangia com os seus passos.

— Bem, não posso mentir — disse Cherry — Para mim não é surpresa.

— O momento de se surpreender já passou — falou David diante dos dois, os cabelos castanhos desgrenhados de sempre e o sorriso entreaberto — Quem aqui está pronto para dar o troco?

Foi um enoooooorme prazer escrever para vocês durante tanto tempo. Gostaria de agradecer o carinho e as mensagens motivacionais. Eu até hoje não consigo acreditar que essa série esta se transformando em livro aos poucos (Luxúria já esta a venda quem diria!!!).

Agora a história continua nos livros e espero contar com a ajuda de vocês. Com um bom resultado de Luxúria vamos conseguir seguir em frente com a série! Comentem com os amigos se puderem e ajudem curtindo a página da história também https://www.facebook.com/Luxuria7

Não será possível continuar a história por aqui, mas eu quero agradecer novamente a todos. A ultima história dos irmão se chama “Ira” e espero conseguir chegar até ela.

Um grande abraço!

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.