Iniciava a tarde ajudando meus pais na lanchonete, o movimento foi escasso, uma vez que os encontros do Lonely Hearts Club pareciam ter acabado. Estava certa que deveria ter seguido os conselhos da Catherine, deveria pensar melhor antes de impor uma resposta para o clube. Meus pensamentos pareciam está me confundindo cada vez mais, o que eu havia feito? Deixar de lado minhas amigas, deixar de lado meu clube por causa de um garoto?

— Mãe! Eu sou bipolar? — perguntei dando um grito do balcão para a cozinha.

Logo em seguida minha mãe lançou-me um olhar duvidoso. E após disso gargalhou.

— Ótimo! — disse passando minha mão em meu rosto, fazendo sinal de reprovação. Obrigada mãe, pensei.

Pulei do banquinho alto do balcão e caminhei para a Jukebox e coloquei alguma música aleatória. Nada de Beatles, aliás. Não estava com essa cabeça para repensar no LHC. Também nada de dançar por aí como uma idiota, falando sobre isso acabo me recordando de meu reencontro com Jeremy naquele mesmo lugar. Quem diria, hein? Passou de um só canalha para meu suposto namorado. Todavia estranhava a sonoridade daquela palavra em meus ouvidos.

— Na-mo-ra-do. Namorado. — fiz algumas tentativas frustradas para me familiarizar com a determinada palavra. — Esquece. — disse espantando a palavra do ambiente.

— You make my dream, you, you, you, you! — cantarolei mexendo o corpo de acordo com música que tocava. E voltei a meus afazeres na lanchonete. O pequeno sininho denunciando a presença de clientes adentrando no estabelecimento tocou de leve e olhei.

— Boa tarde, Will! — saudei normalmente evitando recordar de nossos desentendimentos de outrora. — O que deseja? — perguntei.

—Você. — ele disse dando uma piscadela para mim.

Eu ri e abaixei minha cabeça um pouco corada. — Sério, o que deseja? — indaguei.

— Eu quero um muffin de pêssego, só isso. — respondeu-me simplesmente e se aproximou do balcão, questão de um pequeno intervalo e já estava lhe entregando um pratinho com um muffin. Ele apenas mexeu a cabeça e foi sentar-se em uma mesa distante.

Há muito tempo tinha problemas em ser sutil e estava eu lá com o braço sobre o balcão e a mão apoiando meu queixo admirando fixamente Will. Ele percebeu, eu sabia disso. Ri de leve e o vi fazendo um sinal com a mão para aproximar-me. De inicio eu não iria, porém já era tarde demais, eu hesitei e continuei traçando meu caminho até chegar em sua mesa.

— Gostaria de algo mais? — perguntei puxando um bloquinho de notas de meu bolso traseiro. Ele sorriu e negou com a cabeça, fiz uma careta de desentendida.

— Senta aqui, Marni. — ele pediu e eu sentei-me em uma cadeira ao seu lado. — Eu queria conversar... — ele falou um pouco nervoso, mas ele não terminou sua frase, pois logo o interrompi.

— Conversar sobre nossa situação? — perguntei.

— Sim. — ele disse. — Naquela noite não pude me explicar e te ver hoje com Jeremy me faz pensar como fui um idiota. — ele findou.

— Que bom que você tem essa ciência, não foi nada legal deixar-me esperando para o baile, enquanto você estava com outra. — falei adquirindo outra postura que estranhava em mim, uma que não estava nem batendo ou xingando Will mentalmente.

— Certo, você tem todo esse direito. Eu só quero me explicar, antes de você vir com quatro pedras na mão.

— Vai em frente, garotão, então. — eu disse.

— Para inicio de conversa, saiba que meus sentimentos por ti continuam intactos. — ele articulou e senti um golpe em meu estômago. — Eu queria ir muito ao baile com você, só que me vi obrigado a ir com a Danny já que sou pai de seu filho. — outro golpe, sendo esse em meu coração miserável. — Ela já está com quatro meses e mesmo não apareça, o vestido não coube de inicio e ela disse que não iria ao baile, só que ela comprou outro e fui obrigado a ir com ela... — porém eu o interrompi.

— Você nunca pensou em me avisar? — disse baixando a cabeça.

— Pensei sim. Só não queria que você me odiasse. — ele continuou.

— E o que te faz pensar que eu não te odeio? — disse alterando um pouco a voz. Will nada disse, ele apenas engoliu em seco e olhou em meus olhos.

— Existe algo que diz que algum dia você irá me corresponder dessa mesma forma. — ele disse e minha visão ficou meio turva.

— Sabe, existiu uma época que meus sentimentos iam além disso por você, existiu uma época que queria ser além de sua amiga. Existiu uma época que meus sentimentos eram tão visíveis que todos caçoavam de mim. Foi em uma noite de novembro que escrevi aquela carta de doze páginas para você! — eu proferi sentindo um gosto salgado em meus lábios. Lágrimas estúpidas!

O que não esperava era que aquilo iria ter um grande efeito sob Will. Ele olhou-me no fundo dos olhos, desvendando todos os pequenos mistérios de minha alma. Tocando meu rosto delicadamente ele enxugou minhas lágrimas.

— Decisões ruins fazem boas histórias. Quando eu te vi, eu me apaixonei e você sorriu porque você sabia. — ele disse permanecendo olhando-me.

— Eu adoro quando seus olhos encontram os meus. — eu sorri entre lágrimas.

Will puxou minha mão e beijou as costas dela e colocou algo nela. Isso logo chamou minha atenção e eu vi ali. Aquele colarzinho escrito LHC.

— Nunca desista de ser quem você por um garoto. Nenhum. — ele falou simplesmente e empertigou-se, saindo do estabelecimento.

{...}

A noite nunca foi mais torturante. Embaixo de meus olhos duas bolsas se formavam. Nunca chorei tanto por um garoto. Não sabia exatamente se era por felicidade ou tristeza; Will Bloom. Ele era além de uma pessoa, era também um sentimento. Ainda deitada em minha cama toquei meu pescoço, ali pendurado estava meu colar. Eu funguei de leve sentindo meu coração desmanchar. Havia tentado de todas as maneiras para dormir, infelizmente o sono nunca chegou. O relógio apontava que eram quatro horas da manhã, eu levantei e coloquei meu casaco ainda me pijama, calcei sapatilha e saí de casa, caminhando em direção ao parque. Era sempre uma boa ideia caminhar para esfriar a cabeça, isso era meu maior passatempo depois dos LHC.

Dez ou quinze minutos até chegar lá a pé. O parque estava silencioso, nada além de minhas pisadas faziam barulho. Eu sorri de leve admirando aquela paisagem solitária.

{...}

Ser obrigada a passar dezenas camadas de maquiagem para disfarçar os resquícios de lágrimas e da tristeza-feliz não fazia meu tipo, só que não desejava que Jeremy me perguntasse algo, além do mais, não queria falar com Jeremy naquela manhã. Deveria ser meu ego ainda ferido e frágil, eu não estava mais me entendendo. Eu poderia gostar de duas pessoas ao mesmo tempo? Ou o que apenas sentia por Jeremy era atração? Não pude conter um soluço quando lembrei-me da foto da sua Polaroid que guardava em minha agenda. Ou o que sentia por Will era só atração? Uma vez que não iria tirar mais nunca aquele colar de meu pescoço.

Praticamente bruxuleava nos corredores amontoados de adolescentes. Minhas amigas, continuava sem falar com elas, não havia nem dado o trabalho de responder as tantas mensagens, naquele estado não tinha capacidade de pensar. Encontrei meu armário lá longe, um pequeno borrão amarelo, havia esquecido meus óculos, ou minha visão não estava tão boa naquela manhã.

Eu abri o armário com facilidade e me surpreendi com uma pequena carta em uma das prateleiras. Não era familiar para mim, não sabia o que era. Puxei-a para fora do armário e tratei de abri-la.

— Eu tenho inveja do sol da manhã, cujo sempre é o primeiro a te ver. Ou inveja do seu copo de café, que beija seus lábios sonolentos quando está acordada. — li sussurrando e um sorriso adornou minha face. Meu coração deu salto e eu vi um W no final da folha. — Will... — rematei sozinha.

Com impulso bati a porta de meu armário, dei-me conta que estava correndo à sua procura. Se a vida nos dá uma segunda chance, essa é chamada de amanhã ou hoje. Corria desviando de todos ao meu redor, de vez em quando eu bati em alguém ou alguém reclamava da minha pressa e indelicadeza por correr daquela forma.

Você estava lá sentado em um banco com uma garota no parque, agora eu sabia que não deveria ter seguido minhas emoções, era sempre assim. Tinha que acabar machucada ou pior, mais machucada. Eu tinha inveja da forma que você beijava-a, porém eu havia escolhido aquilo. Não iria ser a hipócrita naquela história. Se você era ou não o cara perfeito não sabia. Se Jeremy era ou não o cara perfeito para mim, também não sabia. Entretanto eu sabia que não era masoquista para suportar aquela espécie de jogo com meus sentimentos, eu assim dei meia volta e fui atrás da biblioteca.

{...}

“Para você,

Aqui estão as coisas que eu quero para você:

Eu quero que você seja feliz. Eu quero alguém para conhecer o calor do seu sorriso, para sentir a maneira como eu me sentia quando eu estava na sua presença.

Eu quero que você saiba o quão feliz você me fez uma vez e se você realmente me machucou, no final, era para ser assim. Eu não sei se o que tínhamos era o amor, mas se não foi, espero nunca mais me apaixonar. Por causa de você, eu sei que sou frágil demais para suportar.

Eu quero que você se lembre dos meus lábios sobre os seus e como você me disse coisas que nunca disse a outra alma. Eu quero que você saiba que eu tenho guardado tudo o que você tinha confiado em mim, e eu sempre amarei você.

“Finalmente, eu quero que você saiba o quanto estou triste por ter te afastado, quando eu só queria trazê-lo mais perto.”

Marni.