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Capítulo Único


Garotos apenas querem amor se for uma tortura.

- Taylor Swift, Blank Space. Tradução livre.

Cortes de cabelo realmente podem mudar as pessoas.

Ela estava diferente.

A própria Abby sentia isso. Travis também.

Ele olhou um segundo a mais para ela. De costas, sua nuca era de menino. De perfil, havia meiguice demais para um menino. E de frente, bem era Abby, de um jeito tão Abby como nunca antes Travis havia visto. Sem a cortina de fios castanhos que antes emolduravam seu rosto, este agora estava completamente exposto, tendo adquirido (ou apenas acentuado?) seu formato fofo de coração. Há semanas que o rosto de Abby ocupava completamente seus pensamentos. Agora ele seria toda a sua realidade.

Maldição, Abby.

- Não adiantou nada, sabe? – Travis começa, conseguindo o que queria; Abby vira-se inteiramente para ele.

- O que? – ela pergunta, o queixo fininho e as sobrancelhas à mostra erguendo-se, estas em curiosidade e aquele em desafio.

- Sacrificar seu cabelo assim. Mesmo você parecendo um menino, ainda vou querer você aqui na minha casa. Na minha cama.

Ela desvia o olhar, rolando os olhos. Mas a pele do seu pescoço e bochechas começam a ficar rosadas – Travis quase consegue sentir a temperatura dela aumentar. Então ele continua:

- São poucas mulheres, é claro, que podem ter o cabelo assim. Apenas mulheres fortes, muito seguras da sua sexualidade... Não sei bem se você se encaixa nesse perfil, Abby...

Ela revira os olhos outra vez, se levantando. Mas antes que pudesse se afastar muito da sala, ela corajosamente se aproxima do sofá que tanto a enoja (e que, aliás, ela nunca, nunca, nunca sentou e nem sentaria) e abaixa na direção de Travis, sussurrando-lhe na pontinha do ouvido:

- Você não sabe de nada, Travis Maddox.

Travis num bote rápido se vira na direção dela e agarra sua nuca, puxando levemente os poucos fios de cabelo que ali restaram:

- Sei que você tem que ir logo para esse quarto e se arrumar para minha luta.

Ela olha para ele um segundo a mais e depois caminha lentamente até o quarto dele.

Vinte minutos depois ela sai de lá. Travis literalmente pula do sofá.

- Volta. – ele quase grita.

- Para onde?

- Pro quarto. Você não vai vestida assim.

Abby olha para o próprio corpo e a roupa que veste: uma blusa preta de alcinhas finas, uma mini-saia jeans com tachinhas e as sapatilhas douradas mais confortáveis que já comprara na vida.

- Volta você.

- Pra onde?

- Pro mar da onde você veio, oferenda. Não vem querer me dizer o que eu tenho que vestir ou não.

- MALDIÇÃO, ABBY.

- Maldição, Travis.

Ele está quase arrancando seus próprios cabelos.

- Você acha que eu vou conseguir me concentrar na luta com você assim? Você acha que alguém vai prestar atenção na luta com você assim?

Abby apenas dá de ombros.

- Pendura uma melancia no pescoço então, se você quer atenção.

- Você deveria pendurar uma melancia pra cobrir um pouco desses seus peitos ai.

Abby revira os olhos pela terceira vez.

- Você vai ou não? A gente já tá atrasado.

- Eu não vou com você vestida assim.

- Ótimo, eu vou para ver o Max ganhar de W.O. então. Ainda bem que não apostei em você essa semana... – ela então caminha até a porta, pegando a chave do carro de América.

- E você vai dirigindo? Não.

- Não o quê, Travis? Vem logo, cacete.

Travis suspira, derrotado. Parece a ponto de chorar com os olhos saltando dos orbes.

- Abby... Abby, por favor, coloca pelo menos uma jaqueta.

Ela abre a porta, sem nem olhar para trás.

- Abby... Uma meia calça então? Fica sexy do mesmo jeito...

Ela começa a descer as escadas. Travis apenas a segue.

***

Abby nunca vira a arena-porão lotada daquele jeito. Havia gente para todo o lado, comprovando que uma teoria física estava errada: dois corpos podem sim ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo. Ela luta para abrir caminho no meio da multidão e se sente cada vez mais grata e inteligente por escolhido uma sapatilha ao invés de um salto alto. A cacofonia de vozes e cheiros é desconcertante; Abby mal escuta a apresentação que o locutor e promoter das lutas dá. Sem mais nem menos, parecendo que surgiu do além, Travis está no meio da roda da luta.

Abby não se atém muito aos golpes que Travis muito mais dá do que recebe, mas logo se vê gritando com a multidão, entusiasmadíssima. A luta acaba que ela nem percebe. Travis a encontra e ela nem vê ele chegando.

- Por que você parece tão feliz com a luta? Eu ganhei. – ele diz aos berros, enquanto a leva para a saída do porão.

- Nós ganhamos. – ela corrige.

Travis franze o cenho.

- Nós? Mas você disse... Sua mentirosa!

Abby sorri.

- Eu sempre aposto para ganhar, Travis.

- Mesmo assim, seu nariz vai crescer.

Abby gargalha: como um homem que acabara de destruir um outro na luta de repente está fazendo alusões a Pinóquio? O inusitado fã do boneco de madeira aperta o nariz cheio de sardinhas da garota e depois sai correndo pelo gramado. Ainda rindo, Abby apenas o segue.

***

Estão agora no estacionamento do prédio de Travis, jogando pôquer.

- Achei que você apostasse para ganhar, Flor.

- Estou apostando para beber, Travis.

E como ela bebe, Travis não pode deixar de se surpreender. No chão, próximo aos pés descalços dela, amontoam-se sete copinhos de tequila e ela nem está falando enrolado ainda. Abby vira a ultima dose de perdedora olhando bem nos olhos dele. As consequências disso resultariam com toda certeza em um violento atentado público ao pudor.

Travis então se levanta.

- Okay, já chega.

- Tchaa-au, Travis.

- Tchau nada, Abby. Nós vamos embora.

- Ah não vamos não.

- Já estamos indo. – ele então a pega no colo, jogando-a nos ombros.

Abby esperneia e grita, mas no fundo se diverte.

- UH, mas é vermelhinha. – grita alguém. Travis para de andar na hora. Coloca Abby no chão, empurrando-a para trás de si.

Encontra o interlocutor: Teddie, um nerd careca magricelo que está caindo de bebâdo. Travis não diz nada, apenas cerra os punhos e caminha em direção ao otário falador. Abby imediatamente percebe o perigo.

- Não. Não. TRAVIS. – ela corre até se colocar na frente dele – Não. Nós estamos indo embora.

- Só um minuto, Flor.

- Nem um segundo. TRAVIS! – ele finalmente olha pra ela. Seus olhos estão injetados de fúria.

- ELE VIU A SUA CALCINHA.

- PORQUE VOCÊ ESTAVA MOSTRANDO PRA TODO MUNDO.

- O que? Quem que estava usando a calcinha?

- Quem que estava levantando a minha bunda no ombro?

Abby suspira e meio que cospe um pouco. Travis solta um rosnado meio grito e está arrancando os próprios cabelos.

- Abby!

- Travis!

- Você vai me deixar louco. Completamente louco...

Abby revira os olhos. Travis está dando cambalhotas de fúria.

- Você já é louco. Vamos embora.

E ela sai andando. Travis demora um segundo a mais para segui-la. Quando finalmente a alcança, agarra seu braço, trazendo-a para si.

- Aquele cara viu a sua calcinha.

Abby não responde. Agora é ela quem está furiosa.

- O que? O que você tá fazendo? ABBY! PARACOMISSO.

Mas ela não para. Logo, sua calcinha de renda vermelha está em suas mãos com unhas pintadas na mesma cor.

- Agora todo mundo vai ver a minha calcinha. – ela joga o pequeno tecido tão polêmico por sobre o ombro. As pessoas ali remanescentes começam a gritar enlouquecidas.

Abby sai andando desfilando. Travis apenas a segue, embasbacado.

***

Abby bate a porta do quarto de Travis com delicadeza atrás de si. Talvez ele já estivesse dormindo; ela demorara mais do que planejara no banho. Mas Travis não está dormindo.

Travis Maddox está bem acordado e nu em sua cama.

Abby não consegue nem gritar de espanto. Ela apenas encara Travis, os olhos esbugalhados saltando dos orbes e sentindo a sua pele ficar tão vermelha quanto a calcinha que abandonara.

- O que.. Tr.. Ham...

- O que? – Travis sorri perversamente – Fiquei sabendo que a nova moda é não usar roupa debaixo. – ele cruza os braços atrás da cabeça, esticando-se bem na cama para se expor um pouco mais.

O primeiro impulso de Abby é gritar com Travis até que ele fique surdo e atirar todo o guarda-roupa deles nele. Mas dois podem jogar esse jogo.

Ela sorri perversamente.

- Travis Maddox, seguindo tendências de moda, quem diria...

Então Abby começa a tirar a roupa. Travis não diz nada, está sem fala e nada para cobrir a ereção que começa a crescer. Abby finge não ver aquilo e se deita na cama, deixando vinte e dois centímetros de distancia entre os dois.

Travis está olhando para cada centímetro do corpo dela. Abby de repente avança sobre ele e agarra seu rosto com uma das mãos, fazendo questão de fincar as unhas na pele bronzeada e macia dele.

- Se você encostar um dedo em mim, ou qualquer outro pedacinho desse seu corpo, eu arranco esse seu pinto fora. – ela diz baixa e ameaçadoramente. Depois se vira de costas para ele e apaga a luz. – Boa noite, Travis.

Ele não responde. Somente longos minutos mais tarde ele diz:

- Isso é tortura, Abby. E tortura é crime inafiançável segundo pelo menos três tratados internacionais.

- Provocar lesões corporais também é crime, Travis. – ela responde, rindo muito internamente – E com sorte um dia, machismo também será e então você vai ficar tempo demais na cadeia.

- Machismo?

- Sim, machismo. Você é machista, Travis.

- Eu?

- Você, Travis Maddox. Você trata as mulheres como objeto, como coisas que usa só pra jogar fora. E eu não vou me submeter ao seu machismo.

Nada daquela conversa faz sentido para nenhum dos dois na verdade. Mas mesmo assim, Abby está se levantando da cama e levando um dos edredons consigo. Ao ouvir isso, Travis acende um dos abajures.

- O que você tá fazendo?

- Vou dormir na sala.

- O que? Não. Fica...

Ela sorri perversamente outra vez.

- Você não me possui, Travis.

E ele nem dorme naquela noite.

Quando levanta na manhã seguinte, Travis encontra Abby dormindo enrolada na coberta no meio do chão da sala. Ela veste um camisetão que pegara emprestado do namorado de América, sem ele saber é claro. Travis não a acorda. Fica parado por um tempo infinito observando-a dormir.

Ele sorri.

Você está enganada, Flor. Seu nome está tatuado no meu coração. Eu te tenho, te tenho na minha alma.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.