Eram oito e meia da noite e eu ainda estava na Livraria , revendo preços , colocando livros no lugar e todas essas coisas que se fazem em livrarias , ué.


Ah, eu não esqueci de me apresentar , meu nome é Acqua , eu sei é um nome estranho , mas fazer o que? O pior – apesar de me orgulhar de minha família – Completo é Acqua Jéssica O’hannoly Eleanor Wain Dawson. Ei! Você ainda ta acordado? Voltando as apresentações , eu tenho 18 anos , moro em Nova York. Minha família é um caso complicado,uma mistura danada de raças, meu avô por parte de mãe é Inglês – nascido e criado em Boston , onde reside até hoje- e minha avó Francesa , por parte de pai , meu avô é brasileiro e minha avó tem puro sangue latino. Misturando tudo isso , BUUM, resultado : eu, morena,dos cabelos ondulados e pretos,olhos castanhos,alta -isso com certeza eu tirei dos ingleses,aos treze já tinha 1,85 e permaneço assim até hoje- e com um amor eterno por Nova York. Minha mãe e meu pai são separados , mas mantém uma relação tranqüila , desde que cada um fique no seu canto : mamãe em Boston , juntamente com meu irmão mais novo Daniel ,e minha irmã ainda bebe Claire Woods – fruto do seu relacionamento com meu padrasto Marshall Ellines. Marshall é um cara legal , podemos dizer , minha relação com ele é ótima . Minha mãe Catherine Cerys , é uma das donas da marca Accessorize e graças a isso recebo boa parte das coleções todo ano -apesar de não usar nem metade.

Eu não sei muita coisa sobre meu pai , mas sempre que dou uma alfinetada na minha mãe pelo telefone ela muda de assunto, mas tudo bem. Eu vivo da livraria e das minhas fotos. Aos 14 anos eu ganhara uma câmera , e fotografava tudo o que podia e que não podia , sempre pedindo câmeras novas nos aniversários . Aos 16 eu montei um site de fotografias , daquelas que você acha no WeHeart it., fotos fake, e esses tipo de coisa , no inicio eu não levei muito a sério , mas quando eu completei 8 mil visitas por semana , ai a coisa ficou séria. Algumas empresas me contataram pra colocar seus anúncios me pagando pra isso. Mas o ápice foi quando a Coca-cola me contratou pra fazer umas fotos com as latinhas e garrafas de vidro, fotos minhas mesmo.

E aí estou eu , de pé até hoje.


O barulho da sinetinha ecoou pelo local , me deixando incomodada ,afinal a biblioteca não era uma lojinha de conveniência de estrada. Uns 5 garotos usando calças skinny , suéteres e terninhos , entraram conversando alegremente.

Suspirei e peguei uns cinco livros devolvidos que estavam em cima da bancada e fui coloca-los em seus devidos lugares.

O primeiro era Os três mosqueteiros , um clássico, estava fazendo sucesso agora que o filme fora lançando e as meninas – sempre querendo saber um pouco mais,para caso encontrassem o seu ídolo por aí –estavam sempre pegando emprestado.


Os outros quatro eram livros infantis , que eu particulamente , não vou coma cara , porque sempre ficam lááá em cima das estantes .

Usei uma escadinha para colocá-los nos espaços correspondentes , e desci devagar. Eu tenho um certo tipo de pânico por altura , então a cada degrau eu tremia mais que Lola , minha Yorkshire , no inverno.


Olhei para o fim do corredor e vi um garoto me encarando, sua aparência era familiar. Ele com certeza era britânico , tinha que ser. Tinha olhos azuis que mesmo de longe dava pra reparar.


–Posso ajudar? – perguntei me aproximando.

–Claro.


Fiquei calada esperando ele falar o tipo de livro que procurava ou algum cd, mas ele ficou lá. Sorrindo com sua fala flutuando no ar. Ficamos assim por uns dois minutos , e nesse tempo eu pude reparar um pouco mais nas suas feições. Ele tiha o cabelo repicado e bagunçado , jogado –propositalmente eu espero- para o lado , a pele tão branca feito leite e um jeito inglês que me lembrava um pouco meu irmãozinho Daniel.


– Entãão, - quebrei o silencio –se precisar de ajuda , é so chamar lá no balcão.- fiz sinal com a mão como se pedisse carona com o dedo polegar e me virei em direção ao final do corredor.


–Ei! Espera, eu preciso , da sua ajuda. Eu quero.... ééér – olhou pra cima provavelmente buscando uma desculpa , arqueei a sombrnacelha – As aventuras de Camarada – o ursinho carinhoso. Eu adoro ele , ele é tãão.... tão...


Arqueei a sombrancelha mais uma vez .


–Camarada. – ele falou por fim , com voz de derrotado.


Nesse momento , eu não pude deixar de rir.


–Que pena – falei quando consegui parar de rir e olhei pro visor do meu relógio de pulso – o meu horário acabou .


Corri até o balcão e joguei meu avental na poltroninha , peguei minha bolsa e sai pra fora da biblioteca.


Já estava de noite, mas meu loft era tão perto que decidi não optar por um táxi. Nova York não é tão perigosa assim...

Cheguei a uma avenida iluminada – corrigindo, mais iluminada que outra , porque , hellou, nós estamos falando de Nova York – e apertei o botão para a passagem dos pedestres.


Eu não sei porque , mas eu ainda não me acostumei com o encanto de Nova York ,sabe? As luzes , parecem que a cada dia mudam de lugar , aparência , formato , cor , personalidade , é tudo tão , tão aconchegante. Eu sei , as vezes eu me sinto anormal por achar que um lugar – que para os outros é – barulhento,agitado e enorme , é aconchegante , ao invés de uma cidade pequena , ou um lugar tranqüilo onde você possa trabalhar na lojinha da esquina , se sentar com seu namorado na balança do jardim e cantar canções na areia da praia em volta de uma fogueira. Mas isso definitivamente está riscado da minha lista , eu só vou nesses lugares pra tirar fotos ou visitar algum parente. Acho que tenho até um certo de pânico , de algum dia não poder voltar pra Nova York , isso sim é amor.


O farol abriu instantes depois , e eu virei a esquina entrando numa rua não muito vazia , mas também não era tão agitada pra ser considerada uma avenida.

Olhei para trás como de costume , e vi uma Range Rover atrás de mim.Gelei na hora , nada contra mas em NovaYork não é de costume ver esse tipo e carro , grandão e preto.

As pessoas geralmente optam por carros pequenos , como mini-coopers , ou preferem usar o taxi mesmo.

Apertei o passo e pelo jeito o carro também acelerou um pouquinho.


“Não demonstre medo , não demonstre medo” pensei comigo mesma.


Me virei pra trás e coloquei as mãos na cintura numa pose “eu-to-cagando-de-medo-mas-to-pagando-de-corajosa-então-é-melhor-correr-antes-que-eu-mande-minha-Yorkshire-atrás-de-vocês-amanhã” e o carro parou na hora .


Fiquei nessa posição por um minuto , e o carro continuou lá;pensei em ficar daquele jeito até os supostos seqüestradores irem embora e eu finalmente pudesse fugir . Mas ouvi umas risadinhas vindo de dentro do carro e o vidro da janela foi vagarosamente descendo.


–Hey – uma voz saiu lá de dentro , e logo uma cabeça apareceu na janela , era o carinha do ursinho carinhoso – como você se chama.


Acho que eu fiz uma cara de brava , feia , mas tão feia , que ele entrou de volta e fechou a janela. O carro parou na minha frente e ele abriu a porta. Lá dentro estavam ele e os outros que entraram na biblioteca.


–Vem , eu te levo pra casa. – fez sinal com a mão.


Bufei e segui meu caminho até o local do loft , e o carro continuava me seguindo. Ele chamava e chamava , o sotaque que me cativou no começo estava começando a me irritar.


Mourrisse, o porteiro já devia ter me reconhecido , pois eu ouvi o barulhinho do portão se destancar. Eu sei que os lofts geralmente não tem porteiro , por serem simples e tal. Mas minha mãe não queria que eu ficasse em um qualquer, mas como eu insistia em morar num lugar pequeno e aconchegante feito um loft , ela deixou que eu ficasse nesse.


A uns 7 passos do portão , senti um movimento atrás de mim e de repente o carinha estava a minha frente .


–Oi.


–Oi – falei seca.


–Como se chama?


–Se fosse da sua conta você saberia.


Outch – ouvi os 4 falando do carro .


Pronta para entrar avancei , mas seu braço me barrou.


–Você não vai me falar seu nome mesmo ,né?


–Se eu falar , você me deixa em paz?


–Aham .


–Acqua.


–Hmmm.. Quer tomar um café?


–Não. –tirei seu braço do caminho e entrei , batendo o portão de ferro na sua cara. – Até.


Virei as costas e entrei


–Espera. – parei e fechei os olhos impaciente – Quando a gente se vê de novo?


Me virei


–Você tem alguma bola de cristal? – perguntei


–Não – respondeu com estranheza .


–Que coincidência , eu também não!


Outch – ouvi os 4 repetirem de novo e também ouvi um “Shut up” vindo do carinha.


–Que fora , hein George.


Hmmm, George era o nome dele.


Subi até meu loft , e adentrei jogando minha bolsa no sofá. Por instinto – e não porque esperava algo – olhei pela janela e lá embaixo vi o cara , olhando pra cima . Ele sorriu pra mim quando me encontrou , e eu fechei a cortina na sua cara.


Tomei um banho e fui dormir , o dia seguinte seria cheio.