Contra sua vontade, Moira foi guiada até a grande cabine do capitão. Os piratas que a levavam abriram a porta e a empurraram para dentro, fechando o local em seguida. A cabine era pouco iluminada, pois suas janelas eram cobertas por cortinas negras. Apenas um castiçal transmitia luz ao ambiente. Ela pode ver várias mobílias, mapas, quadros e um barril cheio de moedas de prata sobre um canto. Caminhava cautelosamente, semicerrando os olhos para ver a imagem desenhada em um grande quadro, pendurado do lado esquerdo da nau. Era a pintura de um gancho manchado de sangue. Uma imagem um pouco perturbadora para ela. Mas que finalmente a ajudou a por fim ao mistério.

— Então não era um ponto de interrogação — Expôs ainda fitando o quadro.

— Não. Na verdade acho que a marinha tem pouca imaginação — O capitão saiu de um canto escuro e começou a caminhar até sua prisioneira — Há tantas possibilidades neste símbolo, mas o nomearam com algo tão… insignificante. O que não deixa de ser interessante, afinal quem somos nós? O que procuramos? Por quê fazemos isso?

Ao chegar até Moira, foi recebido com um tapa em seu rosto, porém não revidou.

— Em que você se transformou Daniel?! Era para isso que queria se tornar um pirata? Para ser um patife sem coração como Morgan?! — Brodbeck exclamou nervosa.

— Você não me pareceu se preocupar com isso quando parti pela segunda vez — Ele passou a mão onde foi acertado e sorriu, indo para sua mesa.

— Você disse que aceitaria a oferta do imediato de Morgan e se tornaria capitão do Carmen,mas que tudo seria diferente. Tornaria a vida daqueles homens melhor! — Moira dizia nervosa e com os olhos marejados — Mas agora...eu não o reconheço mais...

—Você estava certa Jones, piratas são malditos arruaceiros, impiedosos, traiçoeiros, mentirosos e gananciosos. Nada a mais. Sabemos exatamente como é — Daniel escorou-se na mesa e pegou uma garrafa de rum, a destampando com os dentes e logo saboreando a bebida. Deixando-a escorrer sobre seu pescoço.

— Não sou uma pirata.

— Não é? Tem sangue pirata, estava navegando em um navio pirata, cercada de piratas, vestida como uma pirata, armada como pirata e… matando como uma pirata.

Moira engoliu em seco as palavras do homem. Ele estava certo, tudo que fizera desde que vira Jack em seu quarto em Port Royal, fora pirata. Talvez não pudesse fugir de sua origem, mas as manchas de sangue em suas roupas ainda lhe causavam repulsa.

— Não fique tão pensativa, a realidade é mesmo muito cruel — Daniel sorriu, e novamente bebeu um bom gole de rum.

— Todo esse tempo sem saber notícias suas, esperando o pior ou talvez o seu regresso, e me deparo com alguém completamente vazio de sentimentos...

— Quando eu saí daquele maldito lugar, prometi a mim mesmo que jamais retornaria. Não havia mais nada naquela cidade ao qual valesse a pena lutar — Gancho desviou o olhar, tentando inutilmente não mostrar o incômodo com o assunto.

— Danny, as coisas não são como você pensa, eu… — Moira avançou alguns passos, mas logo cessou. A pessoa a sua frente era imprevisível, teria que se conter. — Todos sentimos a sua falta, Alec ficou uma semana febril após sua partida… Me dê a oportunidade de esclarecer algumas coisas, garanto que vai entender porque entre nós dois...

— Por que estava com Jack? Suponho que Marshall não ficou nada contente com a sua fuga. Você fugiu não é mesmo? — Ele cortou as palavras da outra.

— Atos passados me forçaram a traçar esse curso. Estou a procura de algo, e quando Jack me mostrou o Carmem tive certeza que precisava retornar aos mares.

— Bem lembrado — Gancho seguiu até um baú e pegou a bolsa de Moira que foi apanhada junto com os pertences de Jack e Gibbs — Aqui tem algo que jamais imaginei ver novamente — Ele voltou a frente da mesa com o objeto. — O Carmem de La Rosa, onde tudo começou — retirou a garrafa da bolsa e a ergueu.

— O-o que?! — Os olhos azuis arregalaram-se ao ver o navio do seu antigo inimigo nas mãos do pirata, ao invés do Pérola Negra.

— Este navio me serviu bastante, até aquele demônio nos atacar… Era uma noite nublada, Smee e eu jogávamos cartas no convés enquanto bebíamos um bom vinho do último saque que fizemos. Foi tudo tão de repente, em segundos o Carmem entrou em chamas, lutamos com toda força que tínhamos, mas Barba Negra não era temido atoa. No fim, presenciei meu navio afundar no oceano — Lembrava sério — Dizem que ele morreu, cortesia do seu precioso Sparrow.

A garota mostrou-se surpresa, pois Jack não havia mencionado nada sobre o outro capitão enquanto contava suas aventuras nos últimos dias. Mas seu pensamento ainda estava conectado ao momento em que descobriu que o navio em sua bolsa não era mais o Pérola. Jack havia o trocado, provavelmente na noite em que dormiu ébria em Tortuga, mas o que não se encaixava era: Se ele já tinha seu navio em mãos, por que aceitou continuar a jornada imposta por ela? Afinal nem se quer tinha certeza se conseguiria ter seu navio em tamanho normal novamente.

Haviam tantas coisas que precisavam ser esclarecidas entre ela e Hook, mas por hora teria que continuar seu objetivo; encontrar Barbossa.

— Talvez eu possa trazê-lo de volta, se nos libertar, posso ajudar — Arriscou. E logo uma grande gargalhada foi ouvida do outro.

— Esse navio velho e engarrafado? Para que iria querê-lo quando tenho o Jolly Rogers e o Úrsula? Aliás, como tomou posse dele? Matou Rackham ou o seduziu?

— Ele me vendeu. Eu não sei se sabe mas a Inglaterra está disposta a exterminar todos os piratas que recusarem o perdão real. Cortesia da tripulação do demônio. O capitão Rackham apenas estava se desfazendo de sua frota — Ela respondeu convicta, e novamente se assustou com mais uma gargalhada.

— Você é tão inteligente Moira, mas ainda assim prefere acreditar na misericórdia humana. Foi isso que aquele covarde te disse? Você não sabe nada sobre o Úrsula não é mesmo? Pois então, vamos reparar esse erro. — O capitão abriu as cortinas, revelando vários desenhos nos vidros das janelas. Desenhos esses que para a jovem lhe pareciam familiares.— Não sei como, mas tenho lembranças dessas imagens, então as desenhei, e quando terminei percebi que elas contam a história do maior e melhor navio do mundo.

A jovem estava impressionada com todas aquelas imagens, bem detalhadas.

Um dos sacerdotes do povo asteca previu uma batalha sangrenta entre o Deus da guerra e a Deusa da tempestade. Precavido o senhor da guerra ordenou a seus súditos que construíssem um navio capaz de suportar toda a ira da Deusa, que de fato iria matar a todos que se opusessem a ela. Quando o dia finalmente chegou, ambos os Deuses foram pegos de surpresa pelo o ataque de um terceiro Deus, o Deus do universo, que pretendia dizimar toda a vida na terra através de gigantescas ondas do mar, entre outras catástrofes. Então para proteger seu povo, os deuses uniram suas forças, usando o navio para refugiar as pessoas, a Deusa da tempestade transformou todos que não conseguiram entrar no navio em homens-peixes para sobreviverem ao indomavel mar. Tudo acabou, os deuses desapareceram, e somente os refugiados e as criaturas sobreviveram. O navio estava intacto, nem uma madeira ou prego fora do lugar. E até hoje esse navio enfeitiçado navega por todos mares, escoltado secretamente pelo que hoje chamamos de sereias.

Deus...

— Uma bela história não é?, Quase como a história bíblica de Noé, só que mais emocionante é claro.

Moira franziu o celho pensativa, até que suas lembranças voltaram aos desenhos externos no templo onde seu colar fora mantido por dezoito anos. Aquelas gravuras agora faziam sentido, as escritas na sala do templo, agora ficavam claras em sua mente pois contavam a mesma história que Gancho lhe dissera.

— A sereia… — Moira comentou boquiaberta. Concluindo que a moça que veio ao convés alertá-la era uma sereia. — C-como pode ter certeza que o Úrsula é esse navio? Você o deixou em ruínas.

— Me acompanhe irmãzinha — James passou pela jovem, abrindo a porta da cabine. Alguns homens miravam o outro navio boquiaberto.

Como um encanto, o Úrsula se reconstruía, cada viga, cada prego, cada dobradiça, tudo voltando a seu lugar maravilhosamente. Os olhos de Moira lacrimejaram de tamanha emoção ao ver algo tão surreal. Um sorriso lindo se formou em seus lábios, deixando o capitão um tanto desconfortável. Ele respirou fundo, espantando qualquer sombra de bondade que viesse em mente.

— Obrigado semideusa, por me trazer do mundo dos mortos. Graças a você e ao o Úrsula, Port Royal não passará de uma lembrança na história— Moira novamente ficou séria, e fitou Daniel.

— O que quer dizer?

— Aquela cidade virá abaixo, mostrarei a maldita marinha o poder dos meus canhões — O sorriso sádico no rosto do homem apenas aterrorizava ainda mais a garota.

— Está louco?! Não pode fazer isso! — Moira gritou nervosa — Todas as pessoas que amou estão lá!

— Nem todas… — A resposta de Daniel calou a garota. Que por alguns instantes sentiu um frio em sua barriga — É por isso que ainda está viva senhorita Brodbeck. Sua presença no porto é indispensável — sorriu.

A pequena sensação prazerosa que Moira sentiu, logo deu espaço a uma raiva massante. A crueldade nas palavras do homem a deixava fora de si.

— Senhor Corby, leve a senhorita Brodbeck para os seus aposentos — Hook piscou para ela.

— Não vou permitir que faça isso!

Logo o homem amarrou os pulsos da jovem para trás. Era perturbador imaginar os planos de Daniel se concretizando. Brodbeck não poderia deixar tal ato acontecer. Ela teria que criar um plano para escapar e impedir Daniel de cometer tamanha barbárie. Embora acreditasse que Jack também já deveria está arquitetando algo. Seus pensamentos foram interrompidos no instante em que a figura do capitão surgiu a ponta da escada.

— Jack! — Ela exclamou surpresa.

Os homens que mantinham-se em seus afazeres, notaram o pirata fugitivo e logo o cercaram com suas espadas e pistolas apontadas para ele.

— Acho que essa não é a saída — Sparrow comentou com um sorriso frustrado.

— Inferno Jack! Será que não existe uma prisão capaz de te manter nela?! — Daniel rosnou impaciente.

— Atribua isso a sua hospedagem meu rapaz. Sabe, há momentos em que...na verdade quase sempre, prefiro ver o mundo do fundo de uma garrafa. Rum ou qualquer coisa parecida. Lá embaixo não há Rum, e se não há Rum, as razões para esse momento se tornam inevitáveis — Sorriu ao concluir.

— Então você quer Rum… Ouviram isso homens?! O prisioneiro aqui quer Rum! — Gancho riu e logo o navio era tomado pelas gargalhadas de seus tripulantes. — Acho justo. — continuou — Se eu deixar você beber antes de morrer, talvez essa boa ação me garanta um lugar no que chamam de paraíso.

— Por favor, não vai matar a mim ou a dama ao lado — Jack disse em desdém — Não quer fazer isso, do contrário já teríamos nos tornado comida de peixe.

— Ele pretende nos matar em Port Royal! — Moira interviu. Vendo o pirata fita-la com uma de suas expressões únicas.

— Na verdade Jones, esse privilégio é apenas para você. O Sparrow… Por que o Sparrow tá vivo mesmo? Não importa, mate-o!

— Não espere! — Moira ficou frente a Gancho — Hook o seu problema é comigo, sempre foi. Se quer mesmo uma vingança, poupe o Sparrow e mate-me…

O rapaz ficou surpreso com o pedido, mas podia ver nos olhos da jovem o quão real eram suas palavras.

— Isso, mate-a — Jack disse. Recebendo um olhar incrédulo da garota.

— O-o que?!

— A ideia foi sua amor, não me culpe por aceitá-la — O pirata sorriu.

— O senhor poderia no mínimo ser um cavalheiro e oferecer a sua vida!

Todos viam aquela discussão confusos, excerto James.

— Pirata e cavalheirismo estão definitivamente, inegavelmente, longe de dividir o mesmo espaço querida. Por outro lado, Piratas e desonestidade caminham lado a lado um aguardando o melhor momento para o outro, savvy?

Moira semicerrou os olhos, observando atenciosamente as palavras e movimentos do capitão, que mantinha um sorriso vitorioso em seu rosto.

— Como esse? — Ela deu um mínimo sorriso que poucos poderiam entender.

— É, como esse.

Jack desceu as escadas correndo, e sendo seguidos pelos piratas, enquanto Moira surpreendia Hook. Com as mãos já livres, puxou a espada de Corby da bainha e apontando para ele.

— Uma distração… então vamos ver do que você é capaz! — Daniel empunhou sua espada e Iniciou o confronto contra a jovem.

Smee e outros piratas partiram para conter Moira, mas foram parados com a chegada inusitada de vários outros piratas que estavam presos abaixo do convés, incluindo o subordinado de Jack Rackham. Todos estavam com pistolas e espadas que pegaram dos piratas que perseguiam o capitão.

Quando Graham liberou a todos, eles juraram lealdade a Jack para fugirem do Jolly Rogers. Rapidamente um plano foi montado, então quando ele subiu ao convés, fora apenas para atrair a atenção dos inimigos a uma armadilha. Tudo que Sparrow precisava era ter certeza de que Moira ficaria bem, algo que detectou assim que viu o sorriso da moça.

A luta pela liberdade havia começado, e não importava o que teria que ser feito, Hook e seu bando não teriam o Úrsula sob seu domínio.