A escuridão era uma aliada... Uma silenciosa amiga que lhe abrigava. Átem não sabia dizer quem ele era ou quem ele fora... Muito menos sabia seu próprio nome. A única coisa que conseguia entender era que a escuridão lhe era convidativa, que aquietava suas dúvidas e o impedia de alimentar novos pensamentos.

As trevas lhe faziam cego e a quietude lhe fazia ignorante.

Nos milênios de escuridão, o rapaz aguardou, inconscientemente. Ele não fazia ideia do que poderia ser o que tanto desejava em sua alma. Talvez um significado... um propósito... ou isso e muito mais. E durante séculos esperou... e durante décadas se perguntou...

E, em um instante, Átem viu o que era a luz, mais uma vez. Ele não se recordava quando a conheceu, mas, para si, era nostálgico tal brilho. Magnífico. Da luz podia-se ver tudo, desde o contorno dos objetos quanto as cores vibrantes.

Átem encontrou-se maravilhado com o novo mundo. Maravilhado por ter um companheiro e amigo tão querido e leal. Maravilhado por tantas pessoas que cruzaram seu caminho após acordar da profunda escuridão. Aliados, rivais... era grato até mesmo pelos inimigos que surgiam. Eles contribuíam para seu crescimento... para seu carácter.

Mas ele era realmente ele mesmo?

Átem queria negar, apesar de impossível. Sua alma, em pedaços, pedia para ser recomposta. Pedia por uma identidade... Sua verdadeira identidade. Quem ele era? O que ele havia vivido? Por que era ligado com a magia?

O que tanto lhe faltava e nunca era preenchido?

E Átem se encontrava naquela busca eterna... Desde antes mesmo de despertar, quando ainda confinado em trevas. Milhas incontáveis percorridas... Lutando sozinho para se encontrar. Apesar de extremamente grato ao companheiro e seus outros amigos, ele sabia que eles não lhe entregariam a resposta que queria. Ao menos, era o que sentia. Não importava quantas horas, dias ou semanas passassem para Átem, meditando cada memória ausente, turva ou em fragmentos... Ele era incapaz de se entender. Ele estava aos pedaços como um quebra-cabeça, onde ninguém era capaz de montá-las.

Ao menos, fora o que Átem pensou por muito tempo... Até ficar diante de Ísis mais uma vez.

Não fora a beleza da garota ou por seu carisma e gentileza. Por sua inteligência ou habilidade nos afazeres e nos jogos. Fora por seu sorriso... O mais sincero e carinhoso sorriso que Átem já imaginou receber de alguém. E, por algum motivo, lhe era tão familiar e antes que percebesse, até mesmo seu coração parecia mais leve, reconstruindo-se lentamente peça por peça. O brilho daqueles olhos o encantava... Trazia sentimentos e sensações que ele desconhecia.

E quando imaginou que era apenas algo momentâneo, os dias seguintes se provaram o contrário. A cada passo do tempo, mais Átem se sentia preso a imagem delicada da garota. E do desejo, ele viu-se necessitado... E de necessitado, ele viu-se obcecado. Ele não sabia dizer o motivo real de sua fascinação, ou mesmo do porquê dela lhe fazer tão bem. Porém, não lhe importava. Enquanto se sentisse daquela forma, quase completo, já lhe era uma vitória.

E foi o que o rapaz imaginou por um longo tempo... Por muito longo tempo até aquele dia.

Lágrimas já não eram o bastante para acalmar seu coração. Lágrimas tão puras em tristeza e remorso que quem o visse não suportaria tanta dor.

Contudo, Ísis conseguia... Pois ela compreendia perfeitamente seu sofrimento.

Ajoelhado sobre o piso em ruínas, Átem não conseguia retomar o controle de seu corpo. Yugi e os outros apenas assistiam a tudo calados, desorientados e impotentes. Ísis se aproximou, dando os primeiros passos. Ela ajoelhou-se perante seu mestre com o maior sorriso que poderia lhe entregar. E junto da verdadeira expressão de felicidade, as lágrimas que a garota exibia eram genuínas em alegria, livres de milênios de tormento.

— Átem...

Ao ser chamado por seu verdadeiro nome, o rapaz cessou seu estado abalado, conseguindo se reerguer emocionalmente. Olhando a face molhada e feliz daquela jovem, o rapaz finalmente sabia quem ele era.

Ele era Átem, o antigo faraó.

Aos poucos, suas feições se moveram, dando lugar a uma expressão tão conhecida por Ísis. E tocando a face de sua amada, Átem não conseguia crer que há havia esquecido. Ela... A única que seria e fora capaz de fazê-lo inteiro novamente. E diante daquele mar de lágrimas cristalinas, o antigo faraó viu o quanto o amor de sua vida havia sofrido... Esperando por seu retorno após incontáveis milênios. Ísis chorou por seu nome, com sua voz embriagada e falha. Átem abraçou aquele pequeno corpo, sorrindo sinceramente pela primeira vez.

Eles estavam juntos novamente. Eles, finalmente, poderiam permanecer unidos para todo o sempre.

O tempo havia chegado. O tempo de ambos tinha alcançado o seu fim. E mesmo sabendo a dor da partida, que deixariam amigos e companheiros para trás, eles, no fundo, estavam em paz. E nessa paz, ambos agradeceram aos seus amigos, despedindo-se e lhes desejando toda a felicidade do mundo. Os amantes se dirigiram a porta que os levaria de volta no tempo... Que os levaria aos campos tão conhecidos.

Átem poderia ir para casa... Junto da mulher que mais amou. Não haviam mais correntes. Não haviam mais obstáculos para amar e ser correspondido. E ele pretendia ficar ao lado desta por toda a eternidade... E nunca mais ousar em deixá-la novamente.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.