Petrion, o Dovahkin

Capítulo 13 - Primeiro passo em direção ao presente


Quarto dia de viagem. Levantamos acampamento ao amanhecer e retomamos nossa lenta marcha através da Floresta Alva. Cabeça não estava por perto, deduzi que estivesse procurando comida. Nosso amiguinho retornou por volta de meio-dia, parecendo muito agitado. Ele começou a pular e se torcer na minha frente e não parou até eu ver o que ele queria. Percebi que havia algo em seu bico, parecia um escapulário e me era familiar...

–Ei pessoal, já viram isso antes? Não consigo lembrar. – Meus amigos se reuniram a minha volta para observar e de repente Shara engoliu em seco e tirou o objeto de minha mãos.

–É do Kadon! Onde achou isso?!

–Não fui eu, o Beça que me trouxe. – E todas as cabeças se viraram para o monstrinho que nos observava com um “sorriso” orgulhoso. Shara se agachou e perguntou:

–Onde você encontrou isso? Pode nos levar lá? – Como se esperando pela pergunta ele deu um pulo animado e disparou desajeitadamente floresta adentro com Shara seguindo logo atrás. Os Nor’eks estavam andando a frente, mas Ulgrand percebeu a comoção.

–Ei. Ei! Onde ela está indo?!

–Ah, o Torneto pode ter encontrado nossos amigos, vamos atrás dele! – respondi.

–O que? Não! É perigoso demais! Vocês não podem simplesmente correr por aí dentro da Floresta Alva! – Mas Shara já havia se embrenhado entre as árvores. Ela continuou perseguindo Cabeçudo, nós a seguimos e comecei a me sentir estranhamente cansado. Tínhamos acabado de levantar, então por que... As palavras de Thalor ecoaram em minha mente e então eu gritei:

–Parem! Não podemos nos esforçar muito aqui! – mas eles não pararam. Shara sequer escutou, Izzy era arrogante demais para aceitar qualquer coisa que eu dissesse e Pladius apenas seguiu o fluxo. Me forcei a correr e tomar a dianteira, mas eu sou o mais pesado e lento de nós e não conseguir alcançar o ritmo deles. Quando eles pararam eu tomei alguns segundos para saborear grandes goles de ar, me inclinando sobre os joelhos. Levantei o olhar para ver uma Shara desapontada olhando para uma fogueira apagada com dois cadáveres que jaziam à volta.

–Eles deixaram o acampamento... Há pelo menos dois dias. As pegadas são antigas e não há brasas na fogueira.

Então observei os corpos. Eles estavam limpos, sem sinais de ferimentos ou decomposição. O único sinal de que estavam mortos era a palidez excessiva e o fato de estarem frios. “Eles foram atacados? Se foram, pelo que? Os outros haviam sobrevivido?” Essas perguntas dançaram pela minha mente quando o silêncio foi quebrado por Thalor, que apontava sua besta carregada e era seguido pelos outros três, todos prontos para atirar.

–Vocês não podem sair correndo assim. Já dissemos que é perigoso. E parece que não encontraram seus amigos. – E então ele percebeu os mortos. – Estão vendo esses dois? Eles não foram mortos por um inimigo ou uma Sombra, tampouco tiveram uma morte natural. Foram vítimas da Floresta. Aquele ali era velho e a criança devia estar doente, tiveram sua energia drenada até a última gota. Como eu disse antes, a Floresta tira suas forças e se não tiver cuidado, tira sua vida. A Floresta vai continuar sugando o pouco de energia que resta nessas cascas vazias até que elas se desfaçam em sombras e se tornem um com a terra. Eles não se decompõem, não acordam, não fazem nada além de esperar o momento em que deixarão de existir completamente sem deixar rastros. A partir de agora espero que me escutem e comecem a andar com cuidado até deixarmos esse lugar.

Aterrorizados, nós olhamos para os corpos mortificados, em seus últimos resquícios de algo que aqui ouso chamar de vida. Um calafrio percorreu minha espinha, e creio que meus amigos o compartilharam, ao pensar nessa morte lenta e sombria. Shara então disse:

–Você acha que todas aquelas pessoas vão morrer desse jeito? Que eles já estão mortos?

–Deve estar claro para todos, que haviam mais de duas pessoas aqui. Então, como não achamos mais corpos, podemos ter certeza de que alguém saiu daqui vivo. Não posso dizer quantos eram, se estão vivos ou se vão sobreviver, mas pelos rastros, parece que estão seguindo a mesma direção que nós. Por hora é melhor seguirmos nosso caminho normal.

Havia também o fato do grupo deles ser bem maior que o nosso. Confio o suficiente na sagacidade de Kadon para dizer que ele percebeu os riscos dessa floresta e que ele reduziu a velocidade de marcha. Se mantivéssemos nosso passo atual era provável que acabássemos os encontrando. Não eram exatamente notícias animadoras, mas trouxe um esboço de sorriso ao rosto de Shara.

–Êêêê, desgraça, me deixa em paz! – Pladius disse pisando forte no chão.

–Pladius, que porra?

–Essa porra desses insetos ficam juntando em mim! – Ao ouvir isso os olhos de Thalor se arregalaram.

–Insetos?! Temos que ir, agora! Movam-se rápido, mas com calma!

–Por causa de uns insetos? Tá falando sério? – Izzy perguntou com desdém.

–Esses são insetos de Luz! – Ele respondeu olhando nervosamente ao redor – Nascidos das árvores, eles fazem exatamente o mesmo que elas, mas eles são agressivos e drenam muito mais energia.

De repente eu ouvi um zumbido. Ficou cada vez mais alto, até que o chão começou a tremer antes de se abrir bem no meio do grupo, para libertar um enxame de Insetos de Luz, brilhantes como as árvores que nos rodeavam. Corremos em direções separadas, Shara e Pladius para um lado, os Nor’eks para outro e eu e Izidor em uma terceira direção. Corri com as poucas forças que tinha, vendo Izidor a minha frente e sentindo meu corpo pesar cada vez mais. Quando achei que fosse despencar de cansaço, Izidor parou e eu trombei com ela, levando nós dois ao chão.

Quando levantei o olhar percebi que havia uma parede a nossa frente. Um desnível gigantesco, que provavelmente se originou de um terremoto violento, se erguia imponente e intransponível. Não havia falhas suficientes na rocha para que fosse escalada, a pedra era dura demais para ser quebrada com instrumentos comuns como picaretas e creio que mesmo que tivéssemos tais ferramentas, não teríamos energia para transpor este obstáculo. Olhando para traz vi que os insetos estavam parados, fechando um cerco à nossa volta. De costas um para o outro, sacamos nossas armas e esperamos. Os insetos começaram a avançar e então eu agarrei Izidor pelo pescoço e gritei:

–FUS RO DAAAAAAAAAAH! – Enviando uma onda sonora poderosa, eu mantive a última palavra ressoando enquanto os insetos eram arremessados para longo e outros se prendiam teimosamente ao chão. Se eu não tivesse segurado Izidor, ela teria sido arremessada longe também. Mantive meu Thu’um até meus pulmões se esvaziarem, meu corpo não aguentar mais e eu cair de joelhos.

–Agh... Agh... Fus Ro... Fus Ro... Agh… - Ofegante e sem forças eu não conseguia sequer terminar a frase. Izzy se pôs de pé, meio cambaleante e se preparou para lutar, pois mais insetos haviam chegado e os que eu afastei haviam voltado.

–Merda... Merda, merda, merda! – Ouvi-a dizer. Ela começou a brandir suas espadas, como que para afastar os insetos, que recuavam um passo e avançavam dois, se aproximando cada vez mais. De repente, eis que vejo alguém se mover por entre as árvores e parar para olhar. Quando minha visão se ajustou, vi que era Kadon! Ele começou a correr em nossa direção com energia fluindo por suas mãos enquanto palavras indistintas saíam de sua boca. “Não há tempo... Usar um Thu’um não vai adiantar, mesmo que eu conseguisse usar um...”. Então reuni minhas forças, prendi meu escudo nas costas e quando novamente os insetos avançaram, me joguei sobre Izidor, tentando cobri-la o máximo possível. A princípio só senti as pancadas em meu escudo, mas ele não cobria muito mais que minhas costas e logo senti minhas pernas sendo drenadas de sua pouca força restante.

Tudo ficou frio. Mais frio. Eu quase conseguia sentir gelo em minhas pernas. Mas tudo estava quieto. Abri os olhos e tudo que vi eram massas de gelo onde antes estavam os insetos de luz. Ao olhar por cima do ombro vi a mesma coisa, além de minhas pernas também presas no gelo. E ao olhar para baixo, aninhada entre meus braços, vi uma versão rubra de Izidor que nervosamente desviava o olhar em todas as direções. Eu ri e ela não pode evitar um sorriso.

–Estou... Interrompendo alguma coisa? Não? – Disse Kadon com uma risada zombeteira. O cenho de Izidor se franziu na mesma hora e ela começou a me empurrar.

–Muito engraçado, realmente... Dá pra sair de cima?

–Eu gostaria, mas estou literalmente grudado no chão.

–Talvez eu devesse deixar os dois a sós. HAHAHAHA!

–Talvez eu devesse te dar seus olhos para comer! – Ela disse enfurecida. – Tira a gente daqui agora ou eu juro que arranco suas tripas pra fazer um colar quando eu sair!

–Calma, calma, não precisa ficar com vergonha. – Kadon com certeza estava se divertindo mais do que ela. Ela estava vermelha de novo, mas agora, de raiva. Acredite em mim, é notável a diferença.

O mago calmamente derreteu o gelo acumulado em volta das minhas pernas, tomando cuidado para não soltar os insetos que estavam incrustrados nele. Quando me soltei, não me levantei, apenas rolei para o lado para que Izidor se levantasse e ali fiquei deitado. A Assassina Nascida da Fúria, como veio a ser conhecida, correu para cima de Kadon, o segurou pela gola, segurou um soco no ar... e o soltou. Deu uma risada fraca e disse:

–Você está vivo. Petrion estava certo. Finalmente te encontramos.

Com um suspiro me levantei e disse:

–É bom vê-lo de novo são e salvo. – e então pensei – Espera, onde estão os outros?! Você estava com Roben, Mandis e as pessoas da cidade, não é?! – Com um olhar curioso ele respondeu:

–Estão bem, estamos acampando aqui perto. Bom... bem, BEM eles não estão, temos alguns doentes, alguns morreram, mas estamos fazendo o possível.

–Então temos que encontrar os outros, cada um correu pra um lado quando os insetos apareceram. Mas como você sabia que gelo ia funcionar? Eles resistiram até a Voz!

–Depois que tivemos nossos primeiros mortos aqui, um deles sendo um garoto que estava bem saudável até então, comecei a entender esse lugar. Essas coisas absorvem energia, calor, logo, meu palpite era que se eu as congelasse, absorvendo a energia delas com o frio, eu poderia detê-las. Versão curta, vocês serviram de cobaias. – Nossas risadas atravessaram a floresta, mas Izidor ainda estava muito irritada pra rir de qualquer coisa. – Agora me diga uma coisa: como você sabia que estávamos vivos e viajando com as pessoas da cidade?

–Longa história. Explico no caminho. Vamos achar os outros, Shara vai ficar feliz em te ver.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.