"Ninguém tem paciência para pessoas tristes, Afonso. É demasiado cansativo e já estou farto."

Tinha sido com essas palavras que um dia Arthur virara as costas e acabara com uma relação que durava há anos. Assim, tão simplesmente, despedaçou o pequeno português que mantinha naquele loirinho todo o seu coração.

Segundos bastaram para destruir o que demorou anos a construir e toda a confiança que Afonso depositara nele abalou completamente, deixando-o desamparado.

Gostava demasiado daquele inglês resmungão com os olhos mais verdes e bonitos que alguma vez vira para que ultrapassar tudo aquilo de forma tranquila. Era tão apegado a Arthur que mesmo após vários meses não conseguia sair daquela situação letárgica.

Para começar, Afonso tinha pouca confiança em si. Não achava nada nele que o distinguisse das outras pessoas e tinha um emprego vulgar e repetitivo na biblioteca municipal da cidade.

A sua vida caíra numa rotina infinita desde o momento em que teve de tirar as suas coisas da casa de Arthur... Da casa que partilhava com Arthur, para um pequeno apartamento antigo perto do centro.

Acordava às sete da manhã, tomava banho, às vezes tomava o pequeno almoço, ia a pé para a biblioteca, abria o edifício, saía para almoçar, voltava para trabalhar, ia para casa ao final do dia, jantava, lia e ia dormir. Tudo isto de forma quase automática.

As vezes o seu irmão mais novo que vivia noutra cidade vinha visita-lo, outras vezes a sua vizinha belga aparecia com waffles...

Afonso aprendeu a detestar os fins de semana e as férias. Essas alturas antes eram esperadas ansiosamente porque todos os minutos de mimo e brincadeira que conseguisse eram bons momentos mas agora que estava sozinho era mais complicado.

O lusitano tinha consciência que dependia demasiado de Arthur e que isso não era saudável mas infelizmente o coração e o cérebro não pensam igual.

Forçou-se a sair aos sábados à tarde mas a tarefa era mais complicada do que aparentava.

Ele era demasiado tímido para falar com desconhecidos e por esse motivo, mesmo que passeasse pela cidade, andava sozinho. Parecia que sentia toda a gente a julga-lo cada vez que almoçava sozinho nalgum restaurante e a sensação horrível demovia-o de tentar novamente.

Não se sentia desejável o suficiente para ir a bares.

O seu isolacionismo aumentou e a certo ponto era-lhe difícil até aguentar o dia inteiro sem chorar, sem sentir aquele aperto horrível no peito, sem querer desaparecer.

Afonso tentava não chorar quando chegava ao limite do seu esforço durante o trabalho. Não queria prejudicar as pessoas que por ali estavam e tinha de ser prestável e acessível sempre.

Certo dia viu Arthur na outra ponta da rua e o seu coração respondeu com um pulo, uma falsa esperança que logo morreu no desespero de ver o loiro de mãos dadas com outro homem igualmente loiro mas mais alto e de cabelo longo.

Ele parecia tão feliz que Afonso se sentiu mal por ter inveja e ciúmes de uma pessoa que não lhe pertencia.

E nessa tarde, enquanto arrumava os livros antes de fechar a biblioteca já quase vazia, não aguentou em desabar ali mesmo, escondido entre as altas estantes de madeira cheias de livros.

Doía de mais e era uma dor incorrecta. Já tinha passado tanto tempo.... Era normal que Arthur encontrasse outra pessoa que o fizesse feliz. Era lógico que não voltaria para si: Arthur não gostava de pessoas tristes e Afonso era miserável.

Abraçou os livros que carregava e tentou controlar os soluços e estava tão distraído e absorto nas suas próprias ideias que não notou que alguém se aproximava de si.

"D-Desculpe... Você está bem? "

O baixinho assustou-se e pousou os livros na estante, limpando os olhos rapidamente na manga da camisa antes de se virar e deparar com um rapaz mais jovem, claramente universitário, bem moreno e com uma expressão um tanto desconfortável no rosto.

Certo, ninguém gostava de pessoas tristes.

O baixinho assentiu e tentou sorrir, "Ah sim, obrigado. Precisas de ajuda?"

O moreno, nada convencido mas também sem saber o que fazer numa situação daquelas murmurou atrapalhado, "Não eu... Ouvi você chorar e... Bem... Sei lá."

Tirou do bolso um lenço de papel e deu-o ao lusitano, "Não chore, seus olhos são demasiado bonitos para ficarem vermelhos."

Afonso respondeu baixo, negando o elogio e o universitário sorriu levemente, "Quer um chá para acalmar? Ah, vá lá. Não precisa de ter vergonha.", o sorriso dele aumentou ao entender que Afonso parecia ponderar a ideia, sem sequer saber que o rapaz que estudava ali em várias ocasiões já o tinha visto com aquela expressão triste muitas vezes, tantas para o deixar intrigado. Não, não queria saber a vida do bibliotecário. Só queria poder ver mais de perto os sorrisos dele pois já o tinha apanhado a sorrir para alguns livros enquanto que usava sorrisos forçados para as pessoas.

"Meu nome é Luciano da Silva. "

"... Sou o Afonso." , suspirou, limpando as últimas lágrimas que teimavam em sair.

"Muito prazer, Afonso. ", o moreno voltou a sorrir e o lusitano achou que era impossível existir um sorriso mais gentil que aquele.

Aceitou o chá, que mais tarde levou a um café e mais tarde a um jantar e depois a uma saída e a um abraço e a outro mais apertado e a um beijo, e a outro e outro e outro e tantos que perdeu a conta.

Afonso era uma pessoa triste mas a partir daquele momento ganhou Luciano que não suportava ver pessoas tristes e que, por isso, tentava com o possível e o impossível colocar um sorriso no rosto no lusitano. E se não conseguisse? Não havia problema nenhum. Partilhava a tristeza com ele.

Foi isso que ele jurou quando lhe perguntaram, anos mais tarde, se aceitava Afonso na saúde e na doença, na alegria e na tristeza.

Ver o baixinho chorar de alegria só o apressou a dar a promessa.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.