Leonard não estava preparado quando Jim Kirk - jovem, bonito, gênio, melhor amigo e apenas o cara que Leonard tinha uma queda pior do que a de uma adolescente do colegial - chegou e enrolou seu braço ao redor de seus ombros.

"Magro! Bom te ver por aqui. Quer dançar?" Jim perguntou com um sorriso brilhante no rosto que, na vasta experiência de McCoy, só poderia significar encrenca. Ele ainda não sabe como Jim Kirk aconteceu, mas Leonard devia estar completamente fora de si quando aceitou assumir o cargo de melhor amigo da pessoa que o deixaria careca antes dos cinquenta anos. Ele culpava os turnos absurdos que tinha no hospital, a falta de sono e, é claro, Jocelyn.

Tudo era culpa de Jocelyn.

Inclusive sua falta de amor próprio.

Sem que pudesse responder, Jim continuou "Ah, é muito gentil de sua parte aceitar. Vamos, vamos rápido para a pista de dança!" Agarrando o seu braço, Jim começou a puxá-lo do lugar desconfortável em que sentava no bar.

Leonard, ignorando o jeito com que seu corpo queimava ao toque de Jim e o ar o deixava com a simples ideia de uma dança, preferiu não se mover nem um centímetro e erguer uma sobrancelha em descrença. "Jim, você sabia que eu estava aqui o tempo todo, eu vim para esse maldito clube com você quando ouviu que teria open bar. E que merda toda é essa de dançar?"

"Eu sei que já está velho, Magro, mas eu pensei que até você saberia o que é dançar".

Ergueu mais a sobrancelha de modo que ela quase tocava a raiz do cabelo. Viu Jim piscar em espanto e algo similar a fascínio antes dele falar. "Ok, eu tenho certeza de que sua sobrancelha está viva. Com o que você a alimenta?".

Leonard, obviamente, não respondeu. "Eu quis dizer por que dançar comigo. Eu tenho certeza que tem várias pessoas aqui com a mente pequena o bastante para cair nos seus charmes. Deus, eu vi uma flertando até com o Hendorff. Se alguma palavra resume as mulheres dessa noite é desespero".

"Cupcake é um cara legal" Jim foi recebido com um olhar incrédulo e suspirou. "Está bem, talvez não legal, mas olhe pelo lado positivo, ele sabe fazer tricô".

Com um ronco, Leonard respondeu "É, tenho certeza que a única coisa que aquela loira quer é voltar pra casa com um par de meias tricotadas".

"Eu ouvi dizer que elas são bem macias". Jim sorriu quando Leonard revirou os olhos.

"Sério, Jim, mas por que eu?".

Bufando ofendido, Jim largou o pulso de Leonard e cruzou os braços, o que era um tanto difícil já que as roupas vermelhas de cadete que os dois ainda usavam dificultavam o movimento. "E qual é o problema de eu querer dançar com o meu melhor amigo? As mulheres podem esperar".

Essa era uma frase que Leonard achou que nunca ouviria Jim dizer na sua vida. Jim não fazia as mulheres esperarem, pelo contrário, não as dava nem tempo de respirar antes de pular para cima delas com todo o seu encanto e flertes que Leonard tinha certeza ter lido em uma revista de adolescentes coisa igual. Ele não sabia o que pensar, seja da descoberta que seu melhor amigo lia algo destinado à pessoas com metade da sua idade ou que James Tiberius Kirk proclamara que as mulheres podiam esperar.

Tudo isso só tinha uma explicação.

Leonard cerrou os olhos e encarou seu amigo. "Meu Deus, Jim, você está drogado?" Agarrando brutamente o queixo de Jim com uma mão, Leonard começou a examinar seus olhos. "Suas pupilas não parecem estar dilatadas, mas eu não consigo enxergar quase nada nessa droga de escuridão. Eu te disse pra não tomar nada que um estranho te desse! O que tem na sua cabeça, merda? Isso é-".

"Droga, Magro, eu não tomei nada" Jim o disse enquanto arrancava a mão de Leonard de seu rosto. "Eu só achei que seria legal tirar você desse canto da depressão. Eu vi quando você literalmente espantou a pobre mulher que tentou dar em cima de você com toda uma conversa sobre os intestinos dos romulanos, quem em sã consciência fala sobre isso dentro de um clube? Sem falar que, se eu ver você pedir mais uma dose de uísque, eu vou começar a chorar".

"Primeiro, é o meu maldito dinheiro e eu compro quantas doses eu quiser". Para provar o que disse, Leonard pegou mais um copo e bebeu em um gole só. Quando terminou, jogou uma nota de cinco dólares no balcão e apontou o vidro vazio para o mixólogo, pedindo silenciosamente por mais.

"Na verdade é open bar e-"

"Segundo" Grunhiu irritado. "Você sabe que eu odeio esses clubes que você me arrasta, eu fico sempre no mesmo canto repetindo as mesmas merdas toda vez que venho e isso nunca pareceu te incomodar antes, então pare com esse papo furado e me diga de uma vez o que você quer".

Jim fez uma careta de chocado e colocou a mão sobre o peito numa tentativa de parecer ofendido. Leonard apenas rolou os olhos para o teatrinho. "Eu estou abismado por você pensar tão pouco de mim. Leonard Horatio McCoy, você é um péssimo melhor amigo e deveria se envergonhar".

Leonard riu. "É? Então talvez você devesse procurar alguém digno de ser seu melhor amigo, ou louco o suficiente para te aguentar" Ele cuspiu num tom sarcástico e logo engoliu o uísque que o atendente colocou na sua frente.

"Mas eu posso te perdoar" Jim continuou, como se não tivesse ouvido o que Leonard havia dito. "Se você dançar comigo".

Leonard desviou o olhar do vidro reluzente às luzes multicoloridas dos aparelhos de iluminação e o colocou nas piscinas que eram os olhos de Jim. Aqueles orbes azuis brilhavam na escuridão do clube com a malícia da frase, como se tudo fosse uma brincadeira. Leonard sentiu o seu pulso acelerar e amaldiçoou internamente o dia em que foi burro o suficiente a ponto de se apaixonar pelo seu melhor amigo. Jim pertencia ao mundo, aos clubes noturnos, aos relacionamentos sem compromisso e ao sexo só por diversão, mas não a Leonard, nunca a Leonard. Por um momento achou que Jim tivesse medo de se vincular permanentemente com alguém, por esse e mais motivos escolheu entrar para a Frota Estelar.

Afinal, não era o que a maioria deles estava fazendo? Procurando abrigo no espaço para fugir de todo o resto?

Antes que pudesse responder devidamente, Jim o interrompeu. "Vamos, Magro, não é como se eu fosse te engolir". Falou com uma voz travessa, a mesma que usava para conquistar todas aquelas pessoas que queria em sua cama.

Leonard olhou para seu amigo, o cenho franzindo naquela familiar forma que mostrava irritação, ou no caso de McCoy, seu estado natural. Não era apenas malícia que o olhar de Jim esbanjava, mas também algo como apreensão e... medo? Foi então que Leonard soube que havia algo errado. "Jim, o que você fez?" Quando Jim não respondeu, ele continuou. "Jim, que merda você fez? Me diga agora!".

Jim hesitou antes de responder. "Eu posso ou não ter dado em cima de uma ruiva que já tinha uma namorada". Sacudindo a cabeça e as mãos, ele continuou. "Olha, não importa agora, venha dançar comigo!"

"E por que você fez uma idiotice dessas?" Leonard rosnou.

"Eu pensei que elas eram amigas!"

Revirando os olhos, Leonard continuou. "Nós estamos o século vinte três, Jim. Pelo amor de Deus, os humanos estão namorando até klingons, por que é tão estranho que duas mulheres estejam em um relacionamento?"

"Eu não acho estranho" Jim reclamou "Eu só não pensei que poderia ter algo entre aquelas duas em específico!".

"Isso é o que acontece quando você deixa o seu pênis agir por você. De qualquer forma, não vejo como tudo isso é problema meu".

"Magro!"

"Eu devia deixar ela te dar uma surra, assim você aprende a ter o mínimo de humildade".

Jim grunhiu. "Não agora, Magro. Que tal um acordo? Eu te ajudo a passar em Pilotagem 1 se você fizer isso por mim".

"E por que você acha que eu preciso de nota em Pilotagem 1?" Leonard cuspiu, mas logo arregalou os olhos em realização. "Droga, Jim, você andou lendo os meus e-mails de novo?"

"Em minha defesa, você precisa parar de colocar todas as suas senhas como 'Joanna McCoy'. É fofo, mas extremamente ineficaz".

"Eu devia te esganar".

Jim sorriu abertamente para Leonard. "Você me ama demais para isso".

Se apenas você soubesse. Leonard pensou com irritação.

"Mas por que você acha que dançar comigo vai ajudar?" Leonard argumentou com um suspiro. "Se você pensa que eu vou impedir que ela chute a sua bunda, você está muito enganado".

"Por mais que sua preocupação com o meu bem estar me comova" Jim disse sarcasticamente. "Eu tava pensando mais na linha que, dançando com você, ela pode pensar que eu sou apenas gay e que aquele papo todo não passava de um elogio sem segundas intenções".

"... Você é um idiota, Jim".

"Eu sei".

Encarando por mais uns segundos, Leonard suspirou. "Ok, Jim, vamos dançar". Ele ignorou o sorriso amplo de Jim e o jeito com que seu coração parecia palpitar mais forte com a imagem e deixou seu amigo o guiar pelo pulso até a pista de dança, ou, pelos olhos de Leonard, até as portas do inferno. Era como se toda a população da Califórnia estivesse unida em um só lugar. Existia aproximadamente zero centímetro de distância entre as pessoas, seus corpos se esfregando em todos os lugares enquanto elas dançavam no ritmo da música alta. O suor que escorria do templo de um caia na coxa de outro. Tão grande era a transferência de líquidos que Leonard não se surpreenderia se saísse de lá com DST.

O médico dentro de Leonard estava gritando.

Quando satisfeito com o lugar, Jim largou o pulso de Leonard e se aproximou, seus olhos nunca deixando os dele, como se Leonard fosse a sua próxima presa. Leonard não sabia quando, mas todo ar deixara seus pulmões e ele mal conseguia respirar. Talvez esse fosse o grande segredo de Jim: fazer com que qualquer ação, até a menor delas, parecesse o mais íntimo dos gestos. Agora o azul estava sendo invadido por todas as luzes coloridas da pista; o olhar de Jim brilhando mais do que diamante lapidado, uma jóia preciosa por si só.

Nada mais ao redor deles importava.

Ele não sabia quanto tempo ficou no mesmo lugar, preso ao veneno viciante que era o olhar de Jim Kirk. A magia se quebrou quando ouviu uma risada esbaforida direto em sua orelha esquerda. Em algum momento despercebido, Jim havia se aproximado até que suas pernas se tocassem, a respiração fazendo seus tórax colidirem levemente como uma carícia. "Sabe, você tem que mover o corpo se quer dançar". Os lábios rasparam cuidadosamente no seu lóbulo e extraíam de Leonard um suspiro trêmulo.

Sentiu uma pressão fraca nas costelas seguida de uma sensação quente e arrepiante. Tinha quase certeza que eram as mãos de Jim no seu corpo, mas não conseguia abrir os olhos que tinham se fechado. Ele deixou Jim explorar, as mãos escorregando das costelas até a cintura e então finalmente chegando aos quadris, onde estacionaram. Leonard tinha vontade de se contorcer com o pequeno prazer que tudo o proporcionava, não sabendo distinguir se o que queria era sair dali e preservar a amizade que tinha com o loiro ou amolecer e pedir por mais. Jim era como um encanto, uma pequena poção de efeito imediato. Talvez ele devesse ter ficado no bar bebendo a noite inteira.

Com certeza seria bem mais seguro.

As mãos no seu quadril exerceram o mínimo de força para fazê-lo mexer e dançar no ritmo da batida, guiando-o enquanto seu dono recuperava o controle da própria pele. A música eletrônica era ruim aos ouvidos de Leonard, ele odiava esse tipo de música composta apenas por ruídos altos e sons aleatórios, preferindo ouvir algo mais melodioso e poético, muitas vezes optando pelo country que o lembrava da casa de seus pais.

Mas no momento aquele detalhe era o que menos importava. Não conseguia nem distinguir os sons ao redor, preso apenas aos movimentos de Jim e finalmente dançando junto. Mesmo assim, as mãos não saíram do lugar cimentada que repousavam.

Eles estavam próximos, muito próximos. Leonard, ainda com os olhos fechados, sentia a respiração pesada de Jim colidir com a sua boca. Como se engolisse pedra, abriu devagar as pálpebras e sua visão foi completamente preenchida com a figura de seu melhor amigo, olhos azuis completamente abertos e vidrados no seu rosto.

"Magro" Jim sussurrou com uma voz que Leonard podia jurar que carregava a rouquidão do desejo. Ele lambeu os lábios completamente secos e notou Jim seguindo o movimento de sua língua com os olhos. Ele se viu inclinando em direção à seu amigo, a visão presa à imagem daquela boca vermelha e quente. Leonard já conseguia sentir o gosto do beijo quando-.

"Ouch!"

"Droga!"

Leonard sentiu a ardência da dor e se afastou rápido, a nuvem de prazer rapidamente se dissipando ao redor deles. Ele levou a mão até a boca, segurando-a enquanto se certificava que tudo ainda estava no lugar. Finalmente levantou o olhar para ver o que acontecera.

Jim esfregava uma mão no queixo, como se o movimento fosse o poupar do desconforto. Atrás dele, as pessoas continuavam a dançar sem se importar com nada em volta. Um deles jogou pelo ombro um ligeiro 'desculpa pela batida, cara' e prosseguiu com a dança - se pular pudesse ser considerado uma dança.

Aparentemente um indivíduo um tanto empolgado conseguiu empurrar Jim forte o suficiente para que este esmagasse seus crânios juntos de maneira nada agradável. Leonard não sabia se a batida foi intencional ou não, a única coisa que ele sabia é que Deus provavelmente o odiava. Talvez Jocelyn estivesse rezando pelo mal dele... de novo.

Leonard se voltou para Jim. Mesmo com a cara contorcida, Jim o fitava com os olhos esbugalhados em realização. Um sorriso verdadeiro surgia naquela boca agora sangrando, iluminando seu rosto por inteiro.

Entrando em modo médico, Leonard pegou de maneira suave o queixo de Jim, ignorando o jeito desconfortável que se sentia sob o olhar de Jim, e o examinou. "Você está bem?"

Quando Jim permaneceu o encarando, ele insistiu. "Jim?"

Piscando, ele finalmente respondeu. "O quê?"

"Você está bem?"

"Estou" Jim balbuciou levemente, sua atenção parecia estar em outro lugar. Leonard foi abrir a boca para questioná-lo quando sentiu o toque repentino das pontas dos dedos de Jim sobre seu lábio. "Você está sangrando" Ele sussurrou.

Tentando evitar que a vermelhidão se espalhasse pelo seu rosto, Leonard pigarreou. "B-Bem, você tem sorte que a sua cabeça é mais dura que a de um cavalo ou então ela iria quebrar".

"Wow, obrigado, Magro" Jim tentou dizer com sarcasmo, mas não conseguia segurar o sorriso. Ele continuou encarando Leonard com um olhar incrédulo e feliz, mas Leonard não conseguiu encontrar voz para perguntá-lo sobre o que se passava na sua cabeça. Ele não pode deixar de notar que os olhos de Jim pareciam mais azuis do que sempre foram.

Percebendo o silêncio, Leonard desviou o olhar para o lado, como se procurasse algo. "Jim, onde está a mulher que queria te matar? Eu não vejo ninguém".

"Quem?"

"Aquela de quem você deu em cima da namorada".

"Ah" Respondeu em um tom despreocupado. "Talvez ela já tenha ido embora"

Leonard o olhou com descrença. "Sério?"

"Sério" Agora Jim o fitava com o sorriso mais traquino que já vira, como o de um menino já contando vitória. "E sabe o que mais? Eu tenho uma garrafa fechada de uísque do meu dormitório. Nós poderíamos ir lá beber e você pode dar uma olhada melhor no meu corpo, verificar se nenhuma outra parte está comprometida".

"E com isso você quer dizer que o seu colega de quarto tem uma garrafa fechada de uísque". Leonard ergueu a sobrancelha, preferindo não notar a cantada horrível do seu amigo, mesmo que o seu coração traidor palpitasse mais forte com a situação.

A expressão de Jim logo mudou para algo mais impaciente. "Você prefere pagar por uma?"

"Deus, não. Lidere o caminho".

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.