Pelo escuro

Noite especial


Desci as escadas lentamente. Não porque tenho medo de descê-las e acabar caindo. Mas sim porque quero dar um ar charmoso a decida. Que graça teria se eu simplesmente pulasse os degraus? Qual versão Ethan preferiria? Rapidamente afasto esse pensamento da minha cabeça. Porque quero tanto agradar Ethan? Dane-se o modo como ele gosta! Afinal, somos só amigos.

Quando cheguei ao último degrau, Ethan segurou minha mão de forma delicada. Seu toque suave provocou batidas rápidas e ternas em meu coração e eu deixei escapar um sorriso. Meu vestido era especial, pois eu nunca o havia usado. Ele alcançava meu joelho e suas tiras para amarrar se encontrava em meu pescoço, deixando meus ombros a mostra. Na altura do busto suas cores se misturavam entre vermelho, laranja e rosa e ao longo do vestido elas se separavam deixando o branco entre elas. Por fim, na altura da barra tinha flores decorando-o. O tecido era suave assim como eu ficava suave ao lado de Ethan, por isso o achei especial.

Não exagerei na maquiagem, fazendo algo leve e meus cabelos ficaram soltos; e como sandália, escolhi uma sapatilha aberta preta, pois preto combina com tudo. Ethan estava com uma camisa social branca com listras azuis, as mangas na altura do cotovelo. A calça era preta, jeans óbvia e um tênis para finalizar. Seus óculos finalizavam seu look com muito estilo.

—E aí, como estou? — pergunto. Com a mão que está segurando ele me gira, analisando bem. Então falou em meio a um sorriso torto.

—Linda. — sorri e logo imitei o seu gesto, virando-o. — Você também está lindo. E eu nem me lembro de termos comprado essa blusa!

—Bem, porque não compramos. Eu a escolhi há duas semanas. Orgulhosa?

—Muito. E então, vamos ou não?

—Claro. — Ethan ofereceu seu braço e eu o entrelacei no meu. Saímos sem falar nada, até chegar ao carro. — E para onde vamos?

—Pensei em um pub aonde os meus amigos da faculdade vão. Eles servem pizza e tem karaokê.

—Pizza e karaokê? Aí eu dou valor. — falei sorrindo. Continuamos o resto do caminho calados, em um silêncio aconchegante.

Quando chegamos o lugar estava cheio de universitários da nossa idade. O som de alguém desafinado cantando propagava-se pelo lado de fora, fazendo as pessoas que passassem retorcer seus rostos em caretas. Ri da cena e entrei com Ethan. O lugar era normal, cheio de mesas, uma recepção e no fundo um palco com uma tela e a letra da música passando.

Devido à quantidade de gente, Ethan pegou minha mão e saiu conduzindo-me pelo espaço. Até que chegamos a um grupo de meninos todos com bebidas nas mãos e óculos a frente dos olhos. Eles sorriram para Ethan que cumprimentou a todos com brincadeiras.

—Que milagre poeira de biblioteca, você aqui. — disse um deles antes de se abraçarem.

—Poeira de biblioteca? — perguntei a Ethan. Ele sorriu para mim enquanto dizia o significado do apelido.

—É que eu sempre estou na biblioteca, como poeira. Perdoe a criatividade de Roger, Deus não foi generoso nesse ponto.

—Está certo. — falei sorrindo.

—Não vai nos apresentar sua nova namorada, Ethan? — perguntou um deles sorrindo.

—Idiotas essa é a Evangeline. Evangeline esses são Peter, Luke, Christopher, Jack e Arthur. E ela não é minha namorada. — apertei a mão de cada um deles. Nenhum deles era bonito, mas eu simplesmente sorri ganhando o sorriso deles de volta.

—Então, solteira, comprometida...? — perguntou Peter.

—Livre, leve e solta. — respondi. Ethan fez uma careta.

—Interessante. — Peter passou a mão nos lábios. Ethan revirou os olhos.

—Deixa a Eva em paz, Peter. — Ethan sorriu sem humor. Seu sorriso estava mais macabro que feliz de verdade. Peter levantou as sobrancelhas. Christopher vendo o clima tenso da situação puxou outro assunto e esse leve desentendimento foi logo esquecido.

Ethan brincou um pouco mais com eles, enquanto eu só assistia. Uma mecha rebelde de seu cabelo escapava do penteado quando ele ria. Quando era algo muito engraçado ele batia palmas enquanto ria, como uma foca. E quando não tinha graça, ele ria mesmo assim, apenas por rir, como se não fosse difícil fazer isso. Como não estava fazendo nada e me sentia morta de sede então toquei o ombro de Ethan.

—Vou buscar uma bebida. Quer uma?

—Eu vou com você. — dei de ombros. Nós saímos rapidamente, espremendo-se pela multidão e chegamos ao balcão. O rapaz ao lado olhou para mim, piscando. Antes que eu pudesse sequer analisar sua beleza, Ethan puxou-me para o outro lado e manteve uma mão na minha cintura, como se eu fosse sua namorada. Apenas ri.

—O que foi isso?

—Isso o que? — Ethan perguntou encarando as bebidas.

—Você. Primeiro com Peter, agora o cara da bebida... — expliquei. Ele olhou para mim, e apesar de seus olhos estarem brilhando não parecia ser de felicidade.

—Você vai ser só minha hoje. — ele sorriu, beijando a minha bochecha.

—Que ousado. E o que te faz pensar que eu vou aceitar isso?

—Seus olhos. Você nem sequer deseja estar com outra pessoa. — ele falou. Revirei os olhos depois um sorriso tímido escapou sem permissão.

—Está certo Senhor Possessivo. Sou só sua hoje! — abracei Ethan, que passava a mão em meus cabelos, enquanto esperávamos nossa vez para fazer o pedido. As bebidas chegaram junto das pizzas, que havíamos pedido. Pegamos tudo e achamos uma mesa no canto para sentar. Ethan queria que ficássemos a sós, por isso não sentamos com seus amigos.

—Então, desde quando os conhece?

—Aqueles moleques? — perguntou ele, alegre. — desde quando entrei na faculdade. Eu fui a cola que os juntou.

—Interessante.

—Muito. — silêncio. Encaramos os olhos um do outro. Os seus tão inocentes, uma vida cheia de sonhos e lutas cravada na cor castanha. Os meus tão maliciosos, que já tinham visto tudo, mas ainda assim acreditava que a humanidade tinha concerto. E por isso sorria. Os dele, tão científicos, sorriam para mim com mensagens que não consegui decifrar. Desviamos os olhares ao mesmo tempo, bebericando um pouco.

—Já cantou no karaokê?

—Uma vez. Eu estava bêbado. — ele se defendeu.

—Deve ter sido lindo.

—Ganhei trinta pontos. — rimos. — E você? Já cantou?

—Sim. Milhares de vezes, mas quando era adolescente. Agora acho que não vejo graça mais.

—Você devia cantar.

—Não, não mesmo. — neguei.

—Por quê?

—Hum, espere um minuto. Estou procurando uma desculpa boa. — ele olhou no relógio e quando deu um minuto olhou pra mim. — não estou bêbada o suficiente.

—Certo.

A conversa continuou a noite toda. Ethan era muito divertido e se ele agia assim em seus encontros, puxa vida, não sei como uma garota consegue ficar somente no celular. Fiquei pensando na diferença de Ethan com Patrick. Patrick era sexy, incrivelmente sexy. Ethan também era sexy, mas ele tinha algo mais, um complemento. Patrick só era bom de cama. Ele não me trazia mais do que egoísmo e egocentrismo. Pensando bem, todos os rapazes com quem saí eram assim. Eles sempre mandavam beijos para si mesmo ao olhar para a colher; sempre diziam o quanto eram bons em algo e ressaltavam vinte vezes a minha sorte de estar ali ao seu lado. Ethan era completamente diferente. E eu estava amando essa diferença.

***

A noite passou rápido. Enquanto estávamos na pizzaria/bar/karaokê apostamos que quem tirasse a menor pontuação no karaokê iria nadar de roupas íntimas no lago da praça que ficava ali perto. E lá estávamos nós, com Ethan tirando a roupa.

—Evangeline, vire para lá.

—Meu nome é Eva. E não, quero ver você tirar a roupa. — observei enquanto ele descia as calças. — nada mal branquelo. — Ethan tinha os músculos da barriga formando, levemente, um tanquinho. Não havia muitas espinhas em suas costas e suas pernas não eram muito cabeludas. Seu rosto estava muito vermelho e eu apenas gargalhei sentada onde estava. Primeiramente ele pisou na água tremendo todo. Depois se afastou e contou alto até três. Então correu em direção ao lago e pulou molhando-se todo.

Ele emergiu com um grito. Gargalhei, levantando-me. Ele bagunçou o cabelo e mexeu-se na água para ficar quente.

—Vem, antes que você fique gripado. — eu disse. Aproximei-me dele estendendo a mão. E o traíra, ao me alcançar, puxou-me para dentro da água, de roupa e tudo.

Emergi surpresa. Começamos uma guerra, jogando água um no outro. Então, tudo mudou. Não sei se foi a bebida, ou aquela voz na minha cabeça; se agi por impulso ou por vontade própria, mas a guerra acabou. No lugar dela, veio o beijo na boca que Ethan me deu.