Pegando emprestado para sempre

Capítulo único - A segunda interpretação


EREN



— Oh, porra. — Claro que eu não poderia ter acordado com um bom dia de meu namorado, muito menos com um beijo. Levi claramente estava irritado, visto o seu tom de voz e, bem, sua expressão. Entretanto, como estava sempre estampado em seu rosto para todo mundo ver a sua antipatia ou irritação com as menores coisas que aconteciam, não sabia nem o porquê de eu ainda achar que um dia acordaria com alguma coisa diferente de mau humor.

— Bom dia para você também, meu amor. — Levi nem se deu ao trabalho de levantar para me ver e, mesmo que eu não estivesse o olhando, tinha certeza absoluta que revirou os seus olhos quando ouviu o meu tom de ironia.

— Eren, onde você colocou a porra da minha capa? Eu estou atrasado. — Pela primeira vez no dia, meu namorado me olhou e, cara, se não estivesse acostumado com aquele olhar de “vou te matar” toda vez que algo desse errado, com toda certeza iria estar tremendo na base. Quer dizer, todos o achavam intimidante por essa razão.

— Estou com ela. — Tentei falar o mais casual possível, enquanto tirava o lençol do meu corpo, dando para ver claramente a capa verde em meu corpo.

— Qual seria o motivo de pegar a minha capa do Esquadrão de Operações Especiais? Você tem uma, porque se não esqueceu, faz parte dele. — Ackerman estava com os seus braços cruzados e uma das sobrancelhas erguida, assim como toda vez em que escutava alguma coisa incrivelmente idiota, mas não poderia falar em voz alta.

— Ela tem o seu cheiro, então quando você não está comigo é como se ela me trouxesse a sensação de seu corpo junto ao meu, nem que seja como uma sensação fantasma. — Dei de ombros e o meu namorado mais uma vez rolou os seus olhos, já que eu tinha falado a coisa mais clichê do mundo. Mesmo que ele iria morrer antes de admitir, um pequeno sorriso tinha estado em sua boca, nem que tenha sido por dois segundos. Pois no fundo, Levi adorava uma declaração romântica, sabia que isso tinha acontecido.

— Ok, vamos fazer uma troca justa. Você fica com a minha capa durante uma semana e, por esse período, vai fazer o meu café todos os dias. — No mesmo instante, um grunhido saiu de minha boca e me taquei de volta para a cama, pegando um travesseiro e dando um gemido alto, do qual não tenho nenhum orgulho.

— Você é um merda, como eu deveria acordar cinco da manhã para fazer a porra do seu café, quando sabe que pego o turno da tarde, porque tenho a tendência de dormir muito? — E não é que meu namorado era um grande filho da puta? Pois quando o olhei, ele estava com aquele sorriso claramente mostrando o quanto estava se divertindo comigo praticamente morrendo, somente para fazer algo que reclamava desde do começo de nosso relacionamento.

— Cada um joga com as cartas que tem, bebê. — Claro que o apelido era cínico, assim como quando ele se inclinou para beijar minha boca e deu uma pequena mordida, logo se afastando com aquele sorriso de merda estampado, mostrando para todos que tinha ganhado aquela guerra.

— Sabe que nunca vou devolver, né? Vai ser um emprestado para sempre. — Gritei no mesmo instante que tinha ouvido a porta se fechar e ser trancada.

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O que eu estava mais acostumado era o fato que ambos nunca sabíamos quando iríamos voltar para casa, às vezes tínhamos que explorar os lugares, às vezes somente fazíamos a parte burocrática das missões, que constituía em preencher formulários e mais formulários, então voltávamos para casa.

Quando dois dias se passaram, não fiquei preocupado, nossas missões demoravam em média uma semana no máximo. Sempre que sentia o apartamento muito silencioso ou no meio da madrugada levantava para ir ao banheiro e voltava para cama, ficava alguns preciosos minutos olhando para aquele lado direito, antes tinha a certeza de que Levi iria sempre estar lá, com aquele barulho infernal que fazia quando roncava, mesmo que jurava que não fizesse. Antes odiava aquilo, mas naquele momento? Somente queria ter aquela pequena irritação de volta, se significasse que seu corpo estaria ao lado do meu, não uma parte sem vida e escura igual ao meu coração.

O pior não era aquela sensação de que algo não estava certo, passando por todo o meu corpo com uma intensidade tão anormal e, toda vez que respirava, era como se o coração não batesse, porque estava doendo muito e nada que as outras pessoas me falassem iria diminuir. Não quando ouvi que o esquadrão estava fazendo de tudo para achar meu namorado, não quando Mikasa ficava em nossa casa me fazendo companhia. E muito menos toda vez que meu coração só batia normalmente quando a sua capa preciosa estava em meu corpo.

Semanas e mais semanas de angústia significaram semanas e mais semanas sem tirar a capa de Levi. Chegava ao ponto que minha alma somente estava em paz e não ficava chapado de dor se sentisse aquele conforto, como se Levi estivesse ao meu lado.

Até que recebi a porra da carta. Ele estava morto. Levi estava morto.

Não tive muita certeza quando Mikasa tinha chegado em nosso apartamento, mas, quando soltei aquele papel, minhas lágrimas caíram desimpedidas, meu corpo caiu no chão e ficou. Quando meus pulsos foram em contato com o chão e bateram, era a frustração e a injustiça que passavam por todos os meus pensamentos.

Ele era o cara mais badass que já tinha conhecido em toda minha vida, não era justo que pudesse morrer, era impossível. Deuses eram imortais, eles não sangravam, eles somente sentiam dor e conseguiam passar por isso, então porque Levi era conhecido como Deus se ele não era infalível?

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— Eren, você realmente está certo disso? — Não era a primeira vez que Mikasa me perguntava a mesma coisa, vendo a última caixa de papelão que estava no chão do apartamento.

— Nunca estive tão certo em um milhão de anos. — Girei a chave, apoiando a caixa em minha perna para conseguir ter uma mão disponível e trancar a porta.

Um ano tinha se passado desde que tinha recebido a notícia, depois de passar por todas as cinco fases do luto, a última era a melhor e que parecia mais certa: aceitação. Já era hora de conseguir deixar o passado para trás e conseguir ver a felicidade. Tenho certeza que meu namorado, em algum lugar do céu, está orgulhoso de mim por eu me desfazer e ter conseguido crescer emocionalmente.

— Eu só preciso fazer algo antes de começar esse novo ciclo. — Mais uma vez, apoiei a caixa no chão e peguei o lixo mais próximo, colocando-o em minha frente. Como se fosse mágica, nem tive que pensar muito para saber onde estava aquela capa verde de Levi que eu tanto amava.

Coloquei-a no lixo, peguei um fósforo e comecei a ver as chamas de fogo aumentando cada vez mais. Mikasa arregalou os olhos, colocando as mãos em seu rosto, senti que algumas lágrimas caíam, pois sabia mais do que ninguém o quanto aquela peça de roupa era importante para mim.

E era exatamente por isso que queria quebrar aquele vínculo. Durante muito tempo, era como um apego emocional, quando sentia que nada poderia dar certo ou o quão confuso estava, aquela capa era como uma segunda pele, como se tocasse o meu coração e tudo que uma vez era complicado ficasse fácil.

Entretanto se quisesse realmente seguir em frente, deveria aprender a dizer adeus, se toda vez que colocasse os olhos e lembrasse de uma coisa que no começo tinha sido emprestada, mas no fim virou para sempre, não iria conseguir.

As chamas dançavam a minha frente, quando não sobrou nada, somente póm eu tive certeza absoluta que o próximo capítulo de minha vida tinha começado e sinceramente? Não poderia estar mais empolgado.



Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.