— O que está acontecendo aqui? — perguntou Toph, empurrando cada uma das filhas para um lado do quarto, apenas o suficiente para erguer uma parede entre elas — Porque vocês tão brigando?

— A Su fica dizendo que o Tio Sokka e você deveriam casar para ele ser pai dela — respondeu a mais velha, o corpo tenso e as mãos apertadas em punhos.

— Su, o tio Sokka não vai ser o seu pai e passa para o quarto da mãe, você vai dormir lá hoje — era raro que ela fizesse essas concessões. Claro que quando Lin era pequena ela conseguia se espremer entre as duas, mas com o tempo isso foi parando de dar certo e agora só deixava que isso acontecesse quando brigavam de pedras rolarem, o que parecia acontecer toda a semana.

Suyin passou como um vento por suas pernas, mas quando estava longe o suficiente gritou a plenos pulmões, da mesma forma que fizera naquela manhã.

— A Lin tem um namorado!

No mesmo instante a mais velha ergueu as mãos para atacar a menor, mas Toph já tinha enfrentado inimigos piores do que uma adolescente de 12 anos e sabia bem que a melhor forma era evitar a dobra, segurando as mãos dela com dois pilares de pedra.

— Sua irmã é uma criança, Lin! — respondeu antes que jovem pudesse falar qualquer coisa — E nós não usamos dobra contra a família.

— Ela não é minha família — retrucou a menina.

— Eu não quero ouvir você falando isso de novo — disse antes de soltar a menina — Eu vou fazer ela dormir e depois nós duas vamos conversar e sem resmungo mocinha! — ela respondeu ao ouvir o tom contraditório da menina.

Ela caminhou pelo corredor, ignorando as queixas da primogênita e então entrou no próprio quarto, onde Su estava sentada junto aos travesseiros. Se sentou ao lado da pequena e sentiu o colchão balançando conforme ela mexia os pézinhos de forma nervosa.

— A Lin não gosta de mim — ela disse com a voz frágil.

— É claro que a sua irmã gosta de você, Su — disse, envolvendo o corpinho com os braços e a puxando para mais perto — Ela só não gosta quando você implica com ela.

— Eu gosto da Lin — disse, se acomodando no abraço da mãe — Mesmo ela sendo rabugenta e eu gosto de você também, mesmo você sendo rabugenta — completou, brincando com a ponta escura dos cabelos da mãe.

— Bom saber que a minha filha gosta de mim — respondeu, apertando de leve a barriga da pequena com os dedos — Sabe que eu duvidei quando você saiu correndo sem se despedir?

Suyin riu, usando as mãos para se defender do ataque dos dedos de Toph e então se deitou confortavelmente da mesma forma que Lin fazia na mesma idade. Na maioria das vezes, Su se parecia muito mais com o pai, mas naquele momentos podia ver o que a caçula e a irmã haviam puxado dela.

— Você fica linda de cabelo solto, mamãe — ela sussurrou. Toph não havia se dado conta daquilo até o momento. — Você podia usar ele mais assim.

— É… — “igualzinha ao pai” pensou antes de responder, embalando a garota que logo estaria grande demais também — Mas agora você tem que dormir.

Se levantou quando a respiração da caçula já havia acalmado e ela dormia profundamente e então bateu na porta de Lin, mas não havia ninguém no quarto. Foi até a sala, encolhida com os pés sobre o sofá, apenas a respiração ruidosa cortando o silêncio.

— Ta acordada? — perguntou, mas a menina apenas balançou a cabeça — Se você balançar a cabeça eu não vou saber.

— Você sabe que sim — respondeu a mais velha, jogando os pés para fora do estofado.

Toph atravessou o espaço e então se sentou ao lado da filha mais velha, pegando uma das mãos na sua e acariciando o punho.

— Porque você brigou com a sua irmã? — mas Lin permaneceu quieta ao lado da mãe. — Eu já to acostumada a vocês brigando, mas nunca assim.

— Eu só… — ela fez uma pausa pensando em como falar, mas então resolveu mudar o rumo do pensamento — Eu não acho que você precise casar.

— E quem falou em casamento? — perguntou, assustada pelo rumo da conversa. Elas não podiam ter visto o que aconteceu na sala, podiam? — De onde vocês tiram essas ideias?

— Eu só não quero que o tio Sokka faça parte da nossa família — ela respondeu, emburrada — Eu gosto da nossa família do jeito que ela é.

— Primeiro — começou a mãe — família não é só com quem você divide o sangue não mocinha, os seus tios fazem parte dessa família sim. E segundo, você pode ficar tranquilo, porque sua mãe não tem tempo para passar com vocês, quem dirá para namorar.

Ela sabia que Lin estava sorrindo ao seu lado, sem que precisasse vê-la e então a puxou para mais perto

— Você já pode parar, mãe — ela disse, puxando o braço para longe — Não machucou.

— E eu não posso só querer fazer um carinho na minha filha?

— Quem é você e o que fez com a minha mãe? — perguntou Lin, cutucando as pernas de Toph com os pés descalços.

— Vem aqui agora, sua perdedora — respondeu, puxando o pé com delicadeza antes de abraça-la e aninhar a cabeça da adolescente em seu colo.

— Devolve minha mãe, sua impostora — respondeu a garota, o corpo tremendo com as risadas.

— Psiu!! Você não quer acordar a sua irmã — fez a mãe, a encarando como se pudesse ver seus olhos no escuro — Agora me conta que história é essa de namorado.

— Não!

— Você já tá resmungando de novo? — perguntou segurando as mãos pequenas — Anda logo, me conta.

— Não! — disse de forma mais incisiva, tentando se desfazer das mãos da mãe — É humilhante que você estava inventando uma dobra e salvando o mundo na minha idade.

— É verdade, mas eu pensava em meninos também, isso faz parte da idade — ela respondeu acariciando os fios finos da filha — E você devia agradecer que não precisa fazer nada dessas coisas.

Houve um silêncio quase contemplativo. Era difícil que tivessem algum tempo sozinhas para conversar sobre as necessidades da mais velha e só agora ela percebia o quanto a filha havia crescido de fato. Lin estava deixando de ser uma meninha e logo mais Su faria o mesmo caminho.

Não tinha certeza se estava pronta para isso ainda.

— Você pode pensar em meninas também, como sua prima Kya — ela disse de repente — Só para você saber que eu não me importo.

— MÃE é um menino! — respondeu quase saltando do sofá — Mas eu não vou falar sobre isso igual.

— Então sobre o que você quer falar?

As duas acabaram conversando sobre as histórias do passado a noite inteira. Um daqueles momentos mãe e filha que tendem a sumir da mente dos filhos quando eles crescem, mas nunca das mães. Lin dormiu no sofá naquela noite, porque Toph já não tinha mais força para carrega-la para o quarto, mesmo assim a cobriu e colocou um travesseiro sob a cabeça, antes de ir para a própria cama, onde a caçula se aninhou nos braços dela.

— Você não ouse crescer, Suyin — ela sussurrou, mas a menina apenas bocejou e mudou de posição.

Haviam combinado de se reunirem naquele fim de semana, algo realmente raro por esses dias em que todos pareciam ocupados demais com suas próprias vidas. Mas era um dia especial, afinal a primeira das crianças da equipe avatar estava voltando para casa depois de anos servindo na marinha.

Era bom ter Bumi de volta depois de tanto tempo e também reunir o velho grupo e ter uma boa conversa entre adultos sobre os velhos tempos, enquanto as crianças se sumiam pela casa.

Mas o tempo passava rápido também e logo Toph tinha que ir para casa. Com algum truque mágico, Lin havia conseguido convencer Katara a deixa-la passar a noite e ela até agradecia, já que carregar Su até em casa não seria fácil.

— Eu ajudo com ela — disse Sokka, pegando a pequena nos braços.

— Não precisa — ela tentou protestar, mas a criança já estava acomodada com a cabeça no peito do homem.

— Deixa de bobeira, Toph — ele respondeu, acomodando a criança no banco de trás do carro — Você ia carregar ela no colo até em casa a pé?

Era um bom ponto, melhor aceitar uma carona mesmo que não fosse tão longe assim do que destruir as costas carregando a menina e precisava conversar com o homem de qualquer forma.

A viagem fora curta e silenciosa e ao chegar, foi ele quem subiu com a menina e a colocou na cama.

Toph sentiu o corpo tremer quando as mãos grandes tocaram sua cintura e o homem beijo-lhe o pescoço, ela sabia que isso estava vindo, mesmo assim não quis evitar, mas logo se virou de frente para ele.

— Isso tem que acabar — ela disse, impedindo que ele se aproximasse ainda mais.

— Toph… — ele começou a ensaiar um protesto, mas ela não o deixou.

— Eu já mal tenho tempo para as meninas, eu não posso começar um relacionamento agora.

Ela sentiu enquanto ele assentia, segurando as duas mãos dela juntas, esperando que ela continuasse antes de falar.

— Eu vou viajar a trabalho — isso não não estava decidido até aquele momento na verdade. Sim, tinha trabalho para fazer longe de Cidade República, mas não precisava ser especificamente ele — Isso pode levar alguns meses… ou anos. — Sokka ergueu o rosto dela com as mãos para olhar os olhos opacos.

— Então… Você veio se despedir — era claro que ela sabia que era uma mentira, mas era uma mentira que beneficiava os dois, então porque revelar.

— É…

No mesmo instante os braços dela envolveram o pescoço do homem, selando a distancia entre eles. Se iam se despedir por meses ou anos então talvez fosse melhor fazer isso da forma mais memorável possível e sabia que ele tinha a mesma ideia quando ele passou as mãos por sob os joelhos da mulher e a segurou em seus braços.