LUNA

Se tudo o que vem acontecendo em minha vida a dois anos, acontecesse a quatro anos atrás, eu diria com toda certeza que não estaria no meio disso. É tanta bizarrice que não sei o que esperar quando acordo pela manhã, não que isso seja importante agora, e que já não fosse bizarro, desde o dia em que fiquei presa em um elevador com Connor. Mas tudo piorou quando encontrei um marciano em minha sala de estar a dois anos atrás.

No início pensei que fosse Connor, ele estava usando a forma física dele, eu perceberia mais cedo, pensando nisso hoje, percebo que só pelo fato dele não ter reclamado que os shorts do meu pijama eram curtos demais para desfilar pela casa, já deveria ter me alertado. Sai do meu quarto, ainda sonolenta, e fui em direção a geladeira pegar um pouco de água, quando vejo “Connor” sentado em frente à televisão desligada, ele não bebe, mas tem certas atitudes de um bêbado as vezes, então não estranhei imediatamente.

–Bom dia. –consigo falar depois de beber meia garrafa de água. “Connor” se vira em minha direção, ele não me secou com os olhos, aquele foi o segundo momento em que deveria ter descoberto. Mas no fundo, tive esperanças dele ter apenas evoluído como pessoa.

–É mesmo um belo dia, Luna. –Sim, ele disse isso. Sem nem um pingo de deboche.

Franzo meu rosto intrigada, e vou em sua direção, me sento a seu lado no sofá, e ele apenas permanece parado feito uma estátua. –Connor, você pegou alguma DST ou engravidou alguém? –pergunto genuinamente preocupada, e ele me olha assustado.

–Claro que não, Luna, eu sou fiel!

–A quem? –okay, foi nesse momento que descobri, mas preferi o torturar mais um pouco, também não me orgulho disso.

–A você? –seguro o riso, ninguém da Liga acredita que Connor e eu somos apenas amigos, por mais que tenhamos passado todo o primeiro ano em que nos mudamos, dizendo exatamente isso a quem perguntasse.

–Claro. –murmuro. –Tudo bem, nosso relacionamento é aberto, e nós sempre nos protegemos, pode me contar. –minto o olhando séria, o constrangimento em seu rosto era visível, como alguém pode ter a habilidade de assumir a forma de outras pessoas e ser um ator tão ruim? –Foi a Miss Marte?

–Connor e a Megan? –ele quase grita, e eu seguro meu abdômen enquanto caio na risada.

–O que está tentando ler em minha mente J’onn? –pergunto quando consigo recuperar meu fôlego. Ele respira fundo, e volta a sua forma humana, a que ele utiliza quando está na terra, um homem alto, com pele morena e traços fortes, usando roupas sociais sob uma capa de chuva, é quase um cosplay do Castiel, se não fosse o cachecol vermelho e o chapéu.

–Queria saber se pode fazer algo, mas é secreto, e ninguém pode suspeitar que está no meio disso, nem mesmo os Queens.

–E eu posso fazer?

–Você é corajosa Luna. –murmuro um obrigada, um pouco constrangida. –Mas não é uma boa mentirosa, criativa, mas não boa.

–Bom, eu posso omitir fatos, muito bem. –olho para o corredor, onde fica o quarto do meu irmão caçula.

Já sabia que era algo sobre o caso de Sara, nós soubemos a algumas semanas que ela estava escalada para uma missão secreta, e que viria na sexta para se despedir de todos, sem nenhum prazo para voltar. Desde então, só pensávamos na visão de Isis, todos os que sabiam estavam ouriçados, já Wally e os Diggle’s, mesmo estando no escuro, parecem ter um pressentimento, desses bem ruins. J’onn tira um pequeno pingente em forma de estrela, em um cordão prateado.

–É um comunicador, Sara vai receber um, só você vai conversar com ela durante esse tempo.

–Tem certeza? Nem somos assim tão próximas. –falo estranhando a situação.

–É uma missão Luna, não precisa ser a melhor amiga dela, e é exatamente por isso que te escolhi, não vai levantar suspeitas. Não sabemos para onde Sara vai, não podemos a seguir, ou ajudar, mas sabemos que se ela precisar de ajuda, poderemos evitar uma catástrofe.

–Tudo bem, eu faço isso. –digo estendendo minha mão para pegar o pingente.

Essa pequena aventura me aproximou de Sara, e por consequência, ainda mais de Wally. Ela me pediu que fizesse o possível para cuidar dele em sua ausência, e foi o que fiz. O problema com aproximações é que elas geram consequências maiores, e o exemplo perfeito de uma, sou eu, aqui em Keystone City, na nova base do Flash, que era uma versão menor da Star Labs de Central City. Em pleno sábado, caindo pela milionésima vez em um tatame, enquanto um homem ruivo estende a mão em minha direção para me ajudar a levantar, com um sorriso de desculpas em seus lábios.

–Quando me pediu ajuda, pensei que você queria uma Hacker, não um saco de pancadas. –murmuro me sentando, massageando meus ombros.

–Você quem desmarcou na quinta. –me lembra.

–Connor e eu fomos a uma reunião na escola dos garotos. –sinto uma fisgada em meu ombro, e passo a massagear o local. –Parece que Isis estava sofrendo bullying de uma menina que gosta do meu irmão.

–Deveriam ter deixado a peste resolver com a garota. –Wally tinha um sorriso divertido nos lábios, o que me faz o olhar assustada. -Não Phill. Damian. –esclarece, é minha vez de dar risada, coitada da garota se isso acontecesse. –Ainda assim, poderíamos ter treinado a tarde.

Wally me treina três vezes por semana, a mais de um ano, só aceitei de início por que ele parecia meio depressivo sem Sara. Agora, acabou se tornando uma espécie de rotina nossa, por mais que odeie essa rotina, com todas as minhas forças. Ele joga uma toalha em minha direção, que coloco em volta do meu pescoço, em seguida me lança uma garrafa de água.

–Me preocupo com você Lu, só quero que esteja pronta se um dia precisar se defender sozinha. –diz se sentando a meu lado no chão. –Pode perguntar o Dig, ele fez o mesmo por Felicity.

–Conheço a história. –respondo abrindo a garrafa e bebendo um gole generoso. –E eu agradeço Wally, pode apostar que sou muito grata, mas me sinto como um membro do Clube da Luta... Do qual eu não deveria falar. –reclamo o fazendo dar risada.

–Você melhorou, muito. Só precisa ficar mais rápida. –ele toma a garrafa da minha mão, e bebe o restante da água. O observo por alguns segundos, ele estava com o antigo brilho de volta, parecia a ponto de levitar em felicidade.

–E você voltou a ser você. –digo sem parar de o observar. Wally dá de ombros com um sorriso largo, desses que nos faz querer sorrir de volta.

–Sara voltou. –diz como se fosse explicação suficiente.

–Tudo parece tão fácil entre vocês. –penso alto, mas sinto seu olhar sobre minha face. –Como se fosse tão natural quanto respirar.

–É exatamente assim. –brinca empurrando de leve meus ombros. –A família Queen que tem mania de complicar as coisas.

–Não vamos falar sobre isso. –corto, antes mesmo que se inicie. Wally apenas dá de ombros e se deita no tatame, com as mãos sob a cabeça, eu abraço minhas próprias pernas, repousando o queixo sobre o joelho. –Ele foi pego duas vezes nesse mês Wally. –começo a desabafar. –E nas duas vezes injetaram algo nele. –estremeço de leve ao me lembrar. -Custa ser mais cuidadoso?

–Você está parecendo uma doida ultimamente. Me diz, por favor, que já percebeu isso? –fala com naturalidade voltando a se sentar, e eu o olho espantada. –Qual é Luna? Vocês juram não ter nenhum relacionamento além de amizade, mas parecem um casal de velhinhos, até ai eu entendo, ainda acho bonitinho. Vocês cuidam dos irmãos um do outro, pagam contas, e vão a reunião escolares juntos, provavelmente devem dividir o último pedaço de torta enquanto assistem algum filme chato e antigo. –o bizarro, era que ele acertou em cheio. -Mas desde que o Arqueiro Negro o pegou, você meio que surtou.

–Ele quase foi mor-morto! –protesto.

–Dick o resgatou minutos depois, e sabemos que não era ele que o Merlin Jr. queria. –corrige. –Então você passou a ser outra pessoa, a pirar sempre que algo dá errado em uma missão, não consegue mais relaxar quando Connor está em campo. –abro a boca para protestar, mas Wally me silencia com um olhar mortal. -Sara me disse que você quase teve uma sincope quando a Cupido o pegou. A Cupido Luna, o máximo que ela faria era o levar drogado para Las Vegas, e se casar em uma daquelas capelas com um Elvis celebrando! –eu não tinha respostas, então apenas abaixo minha cabeça. –Connor está com a Vicky, então eu me pergunto, por que você se importa que ele se case obrigado com outra?

–Não me importo. –minto, mas como sou uma péssima mentirosa, tudo o que impede Wally de argumentar, é a lealdade dele a nossas amizade.

–Estou com fome. –se levanta super rápido, e estende a mão para me ajudar. Era a forma dele de dizer “respeito o seu tempo”. –Sara e Connor devem ter terminado o almoço, quer apostar corrida? –debocha, e eu reviro os olhos, quando ele pega minha bolsa, e antes que possa protestar, estou em seu colo a caminho de seu apartamento.

WALLY

Preciso parar de bancar o terapeuta, é só no que consigo pensar quando coloco Luna na porta do meu apartamento. Reconheci um carro diferente em nossa terceira vaga da garagem, não era o de Connor, por que claro, ele e Luna vieram pelo teletransporte, mas eu sabia perfeitamente de quem se tratava, e já estava arrependido de ter gasto minha saliva minutos antes. Sinceramente, as vezes acho que Connor pegou todos os genes do Ollie, e os piorou um pouco para formar a própria personalidade.

–Sara, nós chegamos! –falo girando desanimado a chave na fechadura.

Ela aparece com os cabelos cacheados presos em um coque no alto da cabeça, usando uma camiseta branca e shorts jeans, seus olhos encontram os meus, e por um segundo deixa transparecer seu desespero, que é substituído por carinho, assim que olha para Luna. Ela deixa o pano de prato sobre a bancada e corre em nossa direção. Me beija como que por reflexo, depois se esquiva abraçando Luna, que murmura estar suada, mas Sara dá de ombros, mostrando que não se importava.

–Me desculpe, nós tentamos... –começa a dizer baixinho quando se afasta.

–Ah, Wally, oi! –uma voz anasalada chama a nossa atenção, a primeira coisa que vejo é um grande par de seios, o que me apresso em desviar, vendo uma cabeleira loura, presa em um rabo de cavado de lado. –Oi Luna.

–Vicky. –dizemos os dois juntos, igualmente desapontados.

Vicky Print, a ex namorada, ou atual amiga colorida... quer saber, não vou mais perder meu tempo com os rolos do Connor. Se tem uma forma de definir aquela mulher, é gostosa, mas acaba ai. O problema é que ela é muito gostosa, e sabe usar bem isso para compensar os dois neurônios que possui. Ela estava usando um vestido florido, não tão curto, mas não é como se precisasse ser, com aquele decote todo. Luna leva a mão para o abdômen exposto pelo toper de malhação que usava, não que ela precise se envergonhar de nada, é uma das mulheres mais lindas que conheço, mais uma vez, sinto vontade de socar Connor.

–Oi gente. –ele surge com um sorriso amarelo, mas seus olhos secam Luna e é como se ele não encontrasse sua voz por um segundo. –Você está, suada. –diz como se pensasse em voz alta, o que deixa a todos nós desconfortáveis, pois conhecemos a linha pervertida dos pensamentos de Connor.

–Estávamos malhando. –respondo por minha amiga, fechando a cara para ele, que dá de ombros como quem se desculpa. –O que me lembra. –entrego a bolsa dela. –Pode usar o banheiro no meu quarto, vou usar o daqui de baixo. –digo a Luna que sorri agradecida.

Ela sobe as escadas correndo, e Connor acompanha todo o percurso com os olhos, também, não é como se ele pudesse evitar. Olho para Sara, esperando uma explicação, era para ser um almoço para nós quatro tentarmos colocar a conversa em dia, e passar um tempo uns com os outros, antes deles me ajudarem com a cidade a noite, um tempo como pessoas normais. Connor e os dois neurônios de Vicky, parecem perceber nossa necessidade de alguns minutos de privacidade, e voltam para a cozinha.

–O que é isso? –sussurro para Sara.

–Ela nos encontrou no mercado. –sussurra de volta olhando para os lados, antes de me puxar para de baixo da escada, onde precisei me curvar um pouco para caber. –A garota se convidou, o que queria que eu fizesse?

–Não sei! Quem sabe, evitar isso! –respondo revirando os olhos.

–Wallace Rudolph, não pode ficar bravo comigo!

–Combinamos que não iria mais me chamar assim! –reclamo entre dentes e Sara apenas intensifica seu olhar de indignação. –Okay, mas por que Connor não fez nada?

–Ele tentou, sou testemunha, mas essa garota é como um chiclete que gruda no sapato de tal maneira que para nos livrarmos dele, só jogando fora!

–Ótimo. –passo a mão em meus cabelos, puxando alguns fios, enquanto saia de baixo da escada. –Viu como Luna tem andado, a ideia desse almoço era todo para tentar ajudar os dois com isso. –digo, mas sem acusa-la, no fim das contas, Sara tem tentado tanto quanto eu.

–Bom, eu meio que já resolvi essa parte do problema. –posso ver em seu rosto lindo, que não iria gostar nada da forma que ela “resolveu”. –Digamos que Luna tem um encontro...

–Ah Sara! –está pior do que quando voltei no tempo e precisei acertar a vida dos meus padrinhos. –Me fala que não é quem eu estou pensando. –imploro, e no mesmo momento escutamos a campainha tocar, ela me dá um sorriso amarelo antes de atender a porta.

–Oi! –era exatamente quem eu pensei.

–Hunt. –ela cumprimenta recebendo um abraço acolhedor dele.

–E ai cara? –digo apertando sua mão, com um sorriso que me esforcei para parecer real, e ele me entrega uma garrafa de vinho, que eu passo para as mãos de Sara. –Fique à vontade. –indico o sofá para ele. –Linda, eu vou tomar um banho, tenta não deixar nada pior acontecer. –não consigo evitar de provoca-la.

–Não foi minha culpa! –diz entre dentes.

Beijo o alto de sua cabeça, como um sinal de uma bandeira branca, mas bem, esse não é o estilo de Sara, muito menos o meu, provavelmente passaríamos a semana sacaneando um ao outro. Vou tirar minha escova de dentes e shampoo do banheiro, quem sabe comprar um cofre para guarda-los. Da última vez que a irritei, ela colocou tinta preta em meu condicionador, dessas bem vagabundas, precisei raspar a cabeça, e não tem nada pior do que um cabelo ruivo em um corte militar.

Protelo o máximo que posso em meu banho, não queria voltar para sala, mas por fim, não havia mais nada que pudesse fazer no banheiro. Visto uma camisa azul, jeans e vou para o matadouro. Descubro que Luna demorou tanto quanto eu, pois a encontro descendo as escadas com os cabelos cacheados ainda molhados, e usando um vestido branco, com a saia mais curta e rodado, ela tinha facilidade em parecer uma boneca, as vezes me lembra a Fel mais nova, apesar de não serem parecidas fisicamente.

–Bem vindo aos Jogos Vorazes. –ela diz quando nos encontramos no fim da escada.

–Que a sorte esteja sempre a seu favor! –completo a fazendo rir. –Por falar nisso, você tem um encontro. –acrescento, acabando com seu sorriso. –Culpa da Sara!

–Como meu treinador, posso te fazer uma pergunta? –ela pede, olhando em direção aos quatro que já estavam arrumando a mesa.

–Vá em frente.

–Qual as minhas cha-chances de vencer sua noi-noiva em um combate, assim, se eu trapacear um pouco? –seguro o riso.

–Não muitas, quase nenhuma. –admito. –Mas podemos trabalhar juntos, eu pego o Connor. –ofereço meu punho fechado para ela, que bate a mão nele, em um cumprimento, selando o acordo.

Luna e eu vamos para a cozinha ajudando os outros a levar a comida para a mesa. Trabalhamos em um silencio constrangedor, onde Vicky e Hunt pareciam alheios ao clima pesado, e brincavam entre si. Restava apenas a travessa com a salada sobre a bancada, Luna e Vicky estendem a mão ao mesmo tempo para pegá-la. Todos parecem prender o ar na sala, observando a cena, como Vicky era a única que não sabia dos meus poderes, e estava muito ocupada encarando Luna, sorrindo uma para outra com falsa simpatia, eu dou um jeito de aparecer no meio delas.

–Eu me ofereço! –digo de forma teatral. –Eu me ofereço como tributo! –pego a travessa, e saio, deixando as duas constrangidas, e os outros tentando disfarçar o riso.

CONNOR

‘Eu não vou inventar um chamado para te tirar daí Con!’ Isis diz do outro lado da linha.

–Eu te dei espaço Isis, não fico te cercando há tempos, e quando preciso de você pela primeira vez...

‘A uma semana, tirei sua bunda branca das mãos da Cupido. Literalmente.’ Chego a ficar enjoado só de me lembrar. ‘Sou uma excelente irmã.’

–Nem tenta! –exclamo cortando o drama. -Você estava usando a situação para descontar suas frustrações. –reviro meus olhos. –Qual é Isis? –suplico me escorando na porta do quarto do Wally, onde estava me escondendo a cinco minutos.

‘Mesmo se eu quisesse te ajudar, o que não quero. Connor, você precisa parar de correr, ou tentar ficar colocando garotas peitudas aleatórias entre você e Luna.’

–Falou como a nossa mãe agora.

‘Ela costuma estar certa.’ Escuto seu riso musical. ‘Olha, não é tão difícil depois que você diz as primeiras palavras, as outras saem naturalmente.’

–Então é isso? O máximo que vou conseguir da minha irmã caçula é um conselho sentimental?

‘Preciso ir agora Connor, estamos seguindo os rastros de Tommy, acho que papai encontrou algo relevante. Mantenho vocês informados.’

–Tudo bem, se cuida. –suspiro me dando por vencido. –Mas se acontecer alguma coisa comigo, a culpa é sua!

‘Eu te amo.’ Fala antes que a linha fique muda, e eu possa responder que também a amo.

–Connor? – a voz anasalada de Vicky quase faz com que eu de um pulo de susto. Não sei como eu consegui não perceber o barulho do salto agulha batendo no assoalho. – Estamos todos te esperando. –sorri com carinho, e por mais que eu não queira vê-la como uma Janice na minha vida, tenho que admitir, que além de mais bonita, não era culpa dela a situação que estávamos vivendo aqui.

Descemos as escadas, e a primeira coisa que vejo é Hunt, sentado ao lado de Luna no sofá, ela tentava se esquivar o mais distante que podia. Não que não estivesse gostando da conversa, o problema era que Hunt estava próximo demais de sua zona pessoal, e ela não o conhecia o suficiente para estar à vontade com a proximidade. Wally com certeza quer me socar, posso ver nos olhos dele, quando me sento a seu lado, e Vicky passa por nós e se senta, para o desespero de Sara, ao lado dela, a vejo tentando puxar papo algumas vezes, e Sara tenta interagir, mas são mundos completamente diferentes, sem falar em prioridades.

–Seu cabelo é lindo. –ouço Vicky tentado, mas a última coisa que importa para Sara era o cabelo, limitando sua resposta a um simples ‘obrigado’.

–É minha culpa. –digo para Wally, alto o suficiente para que apenas ele me escute, não tinha mais o que dizer.

–Concordamos em alguma coisa. –responde olhando intrigado para Luna tagarelando com Hunt sobre Jurassic Word, Chris Pratt e a mulher que corre de salto alto. –Sua rota de fuga, não deu certo?

–Me conhece melhor do que deveria, West.

–É o que se espera do melhor amigo, e sem contar que viajei no tempo, e conheci uma versão sua. -ele faz careta ao se levantar em direção a cozinha, e o sigo em silencio. –Com um gênio pior, um humor esquisito, mas ainda assim. –dá de ombros tirando duas latas de soda da geladeira e me entregando uma delas. –Posso reconhecer o Ollie em cada uma das suas burradas.

–Aut! Isso vai deixar marcas. – reclamo fazendo uma cara de dor fingida. –Hey! Esse não é aquele cara que contabilizou o tempo que você ficou sem ver Sara na faculdade? –pergunto em um sussurro.

–Hunt melhorou muito desde então, ele nem é mais assim tão paranoico. –defende como um bom amigo, mas então seu rosto se torna pensativo.

–Qual o problema agora, Wally?

–Estou pensando em como seria o casamento deles. Imagine as manias de Luna, somadas as de Hunt, reunidas em uma criança. –a pior parte, é que para Wally, aquele era um assunto sério, ele não estava tirando onda com a minha cara.

–Lu não vai ficar com ele, ela só está sendo simpática. –falo rápido demais, o fazendo erguer uma sobrancelha, me olhando com descrédito.

–Serio, não entendo vocês. –Wally olha diretamente para as Luna que está de costas, mas se meche inquieta parecendo notar que está sendo observada.

–Não é para entender. –dou de ombros enquanto bebo um gole do meu refrigerante.

–Sei. -resmunga. –Seja útil, e me ajude a com esse assado. –ele olha para o forno onde um pedaço de carne estava parecendo muito apetitoso. -Mais um pouco, vamos comer carvão. –não conheço ninguém nessa vida mais exagerado que Wally West.

Sara percebe a deixa, e se levanta feliz por enfim ter algo para fazer. Logo estávamos todos sentado à mesa, Hunt e Vicky conversavam facilmente, ela parecia feliz em poder interagir com alguém, acho que eles falavam de alguma coisa sobre moda, ou poderia ser uma nova máquina de ressonância inventada na Coreia, quem sabe, o final do Super Bowl, juro, não conseguia acompanhar a linha de raciocínios deles.

–Connor gosta de cinema, me fez ver todos os filmes de o poderoso chefão. –Vicky dava risada como se fosse algo absurdo.

–Eu gosto desses. –Hunt diz na falsa defensiva.

–Os filmes são ótimos. –ela dá sinal de quem se rendia, e pela primeira vez Luna parece se interessar pela conversa. – Mas tive pesadelos com aquela cabeça de cavalo por um mês. –Vicky leva o guardanapo ao rosto para esconder a vergonha. – Mas também ele me pagou. Fiz ele assistir toda a Saga Crepúsculo.

–Por isso nós terminamos. –minha voz sai mais mal humorada do que pretendia.

–Coitadinho, em uma maratona? –Luna acaricia meu ombro, como se quisesse me confortar. Balanço a cabeça confirmando e vejo piedade em sua face.

–Pegou pesado. –Hunt estava quase engasgando com o vinho, Wally estava no meio de uma sincope, e Sara não parecia em estado melhor.

–Mas até hoje não sei qual é o filme favorito dele. –Vicky me olha especulativa.

–Clube da Luta? – Hunt aponta para mim. –O que foi? Você tem cara de que gosta de filme de ação. -se defende. –De qualquer forma, é o meu, filme favorito. –dá de ombros levando um pedaço do assado a boca.

–Matrix? –Wally tenta, mas nego com a cabeça. –Então, azar o seu. –parece ofendido, e Sara acaricia seu rosto.

–Duro de matar? – era a vez de Sara, e abisma a todos. – Qual é? É o melhor filme de natal já feito!

–As patricinhas de Beverly Hills? –Vicky fazendo com que olhássemos espantados para ela, até que não conseguíamos mais segurar o riso. -O que foi? Nem tudo pode ser sério o tempo todo. –brinca.

–Acho que eu nunca parei para pensar sobre o meu filme favorito. –respondo.

–Onze homens e uma sentença. – Luna fala baixo, me pegando de surpresa. –Você acha a maneira que o diretor prende a atenção utilizando apenas diálogos bem construídos fascinante. –dá de ombros, como se fosse algo que ela sempre soube e pensado agora, tinha razão, esse era o meu filme favorito.

–E o seu Luna? – Vicky pergunta, mas sua expressão era indistinta.

–2001. –comento, e ela apenas concorda com a cabeça como se não tivesse espaço para contestação.

–Nerds. –Sara joga o seu guardanapo em meu rosto, eu o pego por puro reflexo no momento que minha atenção é desviada para Vicky que tinha um sorriso triste nos lábios.

–Ainda prefiro o Clube da Luta. –Hunt comenta, tirando minha atenção da expressão da minha amiga.

–Ok, já entendemos isso. -Wally pega um pedaço de pão que estava no meio na mesa e joga na cara de Hunt.

–Espero que saiba, que é você quem vai limpar isso. –Sara bebe um pouco de vinho enquanto implica com o noivo.

–Como se pudesse ser diferente. –ele entrelaça os dedos com os de Sara de uma maneira tão natural, que acho quem nem eles têm consciência do que estão fazendo.

No início da tarde estava tudo tranquilo, e para a surpresa de quatro entre seis pessoas presentes naquela mesa, foi um almoço agradável e normal, não houve silencio constrangedor ou lacunas. E não tive nenhuma parte do meu corpo arrancada, ou amizade desfeita. Estávamos terminando a sobremesa quando Hunt pede licença para atender o telefone.

–Eu vou ter que ir, surgiu uma emergência. –Sara, Wally e eu nos levantamos de sobre aviso. –Mas está tudo sobre controle. – Hunt sorri passando a jaqueta por um braço. –Foi um prazer te conhecer. –ele para em frente a Luna, mas desvio meus olhos, para não ver seja o que for que acontecesse.

–Vou com você. –Vicky se levanta, vem até mim e me dá um leve abraço.

–Não quer que eu te leve? –pergunto quando nos afastamos.

–Não precisa, meu carro está lá em baixo. –sorri fraco, já se afastando. -Nos falamos depois. –havia alguma coisa no tom de sua voz, mas não soube dizer o que. – Obrigado pelo almoço, estava tudo delicioso. –sorri para os demais e sai atrás de Hunt.

–Se for alguma coisa importante, vamos saber. –Luna diz como se pedisse para todos nós nos acalmarmos.

Passamos mais algum tempo, lembrando de momentos embaraçosos, até que Sara começa a tirar os pratos da mesa. Todos nós passamos a ajudar, limpávamos a cozinha, aquando Wally esgota o pouco de paciência que possui e limpa tudo antes que possamos piscar.

‘Vocês já almoçaram certo?’ nossos pensamentos são desviados quando Cisco nos chama através dos comunicadores.

–O que aconteceu? –Wally pergunta.

‘Eu tenho algo para mostrar.’ percebemos que não poderia ser nada sério, pois sua voz estava repleta de orgulho, e nenhuma modéstia. ‘Vou teleportar vocês agora.’ E assim estávamos no meio do convex, na nova base do Wally.

–Eu ainda odeio ser teleportada. –Luna se apoia em meu braço, toda a cor de seu rosto havia desaparecido.

–Você não tem mais salvação. –me curvo para dizer baixinho a ela, que balança a cabeça concordando ainda de olhos fechados, mas podia ver a linha fina de um sorriso em seus lábios.

–Eu trabalhei nisso durante quatro anos, esse projeto me tomou muito tempo, imaginação e pesquisa. –Cisco estava realmente orgulhoso de si mesmo, atrás dele havia um quadro coberto por um pano branco, e para confirmar minha teoria ele tinha um canetão em mãos.

–Cisco? –Sara sua atenção.

–Qual é? Foi muito tempo de trabalho, um projeto desses não me toma tanto tempo desde a Poderosa. -Só então começamos a entender do que se tratava. Luna ao meu lado parecia ansiosa como não ficava desde o dia em que conseguimos a guarda e Phill. –Isis me tirou a oportunidade de lhe dar um codinome apropriado, apesar que o nome dela é bem legal. –ele para e ponderar por um momento. –E com os spoilers que você soltou no passado. –aponta para o Wally, que sorri sem jeito. -Felicity nem me deixou dar nome a ela, e Oliver já tinha o de Sara e usou um antigo apelido de família para a Thea, o que é muito sem graça ao meu ver.

–Cisco! -Sara, Wally e eu damos um berro em uníssono, o tirando do devaneio.

–Ok, ok. E sem mais delongas. –puxa o pano revelando a lousa branca.

–Gláuks? -Wally olha novamente inclinado a cabeça na tentativa que as letras se ordenassem em alguma coisa que fizesse sentido.

–É. Gláuks. –Cisco tinha os braços cruzados sobre o peito, e o rosto fechado. – Não está em discussão.

–Nem faz sentido. –me junto a indignação de Wally.

–Falou os dois seres que por falta de imaginação, faltou colocar um Jr. no codinome dos pais. – e o velho ficou bravo!

–Já vi te chamarem de Arqueiro Verde Jr. –Sara sussurra para mim, que lanço um olhar irritado para ela, que ergue as mãos. –Só estava comentando.

–Eu adorei! –Luna nos surpreende. –O sentido é muito maior, que o nome. –parecia emocionada. –Nem sei o que dizer.

–Você merece. –Cisco sorri com orgulho.

–Qual é o significado? – Sara pergunta para impedir que o namorado tenha uma crise.

–Significa, coruja. –Luna sorri com os olhos brilhando, presos a lousa.

–E você fica feliz? Isso é quase um xingamento. –Wally está à beira de um ataque, eu não sei se achava engraçado, ou me juntava a sua revolta.

–É grego antigo. E segundo a lenda, a coruja é o símbolo da sabedoria, tanto que é o anima de estimação da deusa Atena. Pode acreditar, eu fui perguntar para Donna Troy, e ela me confirmou tudo. –Cisco bota um ponto final na discussão.

–Significa, vigilância constante. –Luna diz com a voz fraquinha.

–Gláuks? –eu testo em voz alta, Luna é muito melhor, mas posso me acostumar.

–Depois não vai reclamar por te zoarem, deixa só o Dick saber desse nome. – Wally implica, mas ele já sabe que perdeu.

–Qualquer um que foi chamado de Menino Prodígio, não tem muita moral para falar do codinome dos outros. – eu pondero. –Gosto de Gláuks.

–Pronto. –Cisco pega a mão de Luna e a puxa para o centro da sala. –Vamos todos ser sinceros, a única opinião que ela levaria em consideração era a dele. –aponta para mim, que não escondo meu sorriso prepotente.

–Hey! Nós somos amigos dela! –Wally protesta, mas Cisco apenas revira os olhos, como quem diz “e daí?”.

–Tem mais uma coisa. –ele abre o holograma com uma foto da Luna, sua ficha de membro da Liga da Justiça, já atualizada. –Felicity me fez prometer que te mostraria assim que contasse o nome.

–Eu adorei Cisco, é perfeito. –agradece encantada. Me pego pensando em como é fácil fazer Luna feliz. Um nome, um bilhete pela manhã, um agradecimento pelo qual ela não espera, nunca foi tão fácil conviver com ninguém antes, em toda a minha vida. –passamos algum tempo conversando, até que Cisco volta a trabalhar, e nos damos conta que estávamos desocupados.

–Luna, o que acha de mostrar a Sara os novos golpes que aprendeu? –Wally pergunta agitado, incapaz de não fazer nada, por um segundo que seja.

–Nunca mais, a Sara me treina. –responde baixinho a ele, e se escora a meu lado, como se quisesse que eu a protegesse deles. –Essa garota parece um trator! –reclama nos fazendo dar risada.

–Wally pega muito leve com você Lu. –Sara diz a fazendo se encolher ainda mais. –Se o Ollie estivesse te treinando, você saberia o que é ter um trator passando por cima do seu corpo, muitas e muitas vezes. –concordo com um aceno.

–Não quero pegar uma aljava e sair por ai acertando flecha em pessoas.

–Pessoas más. –acrescento.

–Isso. –ela concorda.

–Kid, tem um momento? Fiz algumas melhoras em sua esteira, preciso que teste. –Cisco aparece no convex animado.

–Vocês vem? –pergunta já seguindo Cisco, de mãos dadas com Sara.

–Ele com certeza vai cair. –Sara acrescenta, com mais esperanças do que deveria em sua voz, e apenas negamos sorrindo. Olhamos os três se afastarem, Sara e Wally estavam mais felizes do que nunca, principalmente ele.

–Vicky é uma garota legal. –Luna começa a dizer quando eles saem do nosso campo de visão. –Se conseguisse entender o que ela diz, a esse ponto eu já gostaria dela. –sorrio. –É aquela voz Connor, todas as vezes que ela se aproxima sinto vontade de dizer: AI. MEU. DEUS!

–Janice! –dizemos ao mesmo tempo e gargalharmos. –Não é nada sério, Vicky é uma amiga. –digo quando paro de dar risada, a olhando nos olhos. –E o Hunt, parece ser um cara legal. Ele curte O Club da Luta! –debocho, Luna morde os lábios para prender o riso.

–Nunca vai acontecer. –diz simplesmente, mas por alguma razão solto o ar, aliviado. –Não nego que ele é legal, até bonito, se eu ignorar o fato de viver cercada por caras como você ou o Grayson, mas não colocaria alguém como ele no meio de tudo isso. –ela me olha de lado. –Nós somos uma bagunça Hawke. –sussurra para mim, em tom de segredo.

–É, nós somos. –concordo.

SARA

Cisco e eu observávamos Wally correr da sub sala, desde que eles descobriram a variante da Speed Force que Wally utiliza para impulsionar sua velocidade, perceberam que a esteira do Barry não era mais suficiente. E agora todos dizem que um dia, meu noivo vai ser o homem mais rápido do mundo, superando o próprio pai. É divertido vê-lo correr, apesar que depois disso, atletismo nunca mais foi divertido como era antes.

–Já marcaram a data? –Cisco pergunta, enquanto atualizava alguns dados do Wally no computador.

–Nós fomos ontem olhar a igreja que Barry e Iris se casaram em Central. –falo. –Mas não sabemos como vai ser com a Liga, e nossos... –sou interrompida quando luzes alucinantes começam a piscar dentro da base.

–O que é isso? –Wally já estava a nossa frente. Corremos todos de volta para o convex, onde vemos Luna em frente aos computadores, digitando freneticamente.

–É um alerta da Iron Heights. –diz abrindo as imagens em hologramas para que pudéssemos acompanhar. –Parece uma transferência de prisioneiros que deu errado, é algo secreto, isso aqui está cheio de protocolos criptografados. –ela volta a digitar em silencio por alguns segundos. –Solicitaram a força tarefa ante meta-humanos para ajudar.

Vemos as imagens normais da prisão, não parecia ter uma emergência acontecendo, mas conforme Luna digitava, as imagens mudavam. De repente a calmaria se transforma em caos. –Eu conheço aquele cara. –Connor comenta dando um passo em nossa direção, e Wally já saia em disparada com seu traje de Flash.

–Nós damos reforço, ou chamamos o Barry? –questiono olhando para o Cisco que estava congelado. Vendo Grodd com o corpo inconsciente de Hunt nas mãos, Zoom parecia uma boneca de pano, entre os dedos do monstro.

–Barry. –ele já tocava o comunicador. –Wally precisa de você.

Não demora e Wally aparece em frente aos dois, ele parecia conversar com o gorila que lança Hunt em direção a parede, após algum tempo, mas o Flash o pega antes que possa bater. Um segundo Flash surge, e eles passam a correr em volta de Grodd que começa a perder o ar, Barry usa o raio para o levar a nocaute. Foi tudo rápido demais, e quando vemos, o restante da força tarefa já estava levando Grodd para a jaula.

‘Hunt está muito ferido.’ Escutamos a voz de Wally que estava agachado em frente ao nosso amigo.

–O hospital mais próximo fica na 52 com a Chambers, já estou avisando que tem um trauma chegando, e nós encontramos você lá. –Luna diz rapidamente. –Vamos. Sara é melhor passar as chaves do seu carro para o Connor, ele dirige feito um louco. –nem discuto, apenas o entrego a chave e saímos apressados.

ZOLOMON

Minha cabeça girava, e não conseguia me lembrar de onde estava. Quando abro meus olhos eles estavam cheios de pontos de luz coloridos, embaçando minha visão. A primeira coisa consigo distinguir com clareza, são aparelhos hospitalares ao meu redor, depois uma cabeleira ruiva, que com esforço consigo fixar meus olhos e ver Wally West, sentado ao lado do que parecia ser, meu leito. Ele abre um sorriso de alivio quando percebe que estava olhando para ele, e vejo seus olhos tão vermelhos quanto o cabelo, parecia exausto. Não o via dessa forma mais, desde que Sara voltou.

–Oi cara. –diz feliz, se levantando para pegar minha mão. –Assustou muito a todos nós.

–O que aconteceu comigo? –minha voz soa estranha, como se algo tivesse se partido em minha garganta. Nada parecia se fixar em minha mente, apenas alguns flashes de memória.

–Grodd. –é como se sentisse dor ao responder a pergunta, e não consigo entender todo o sofrimento em seu rosto. Decido uma abordagem mais simples.

–A quanto tempo estou apagado?

–Cinco dias. Sara e eu revezamos para estar o tempo todo com você. –ele tenta sorrir, mas não era genuíno. –Luna e Connor também ficaram nos primeiros dias, mas precisaram voltar por causa do Phill, mesmo assim ligam a cada hora. –ele falava com pesar em cada sílaba, não era o estilo do Wally. –Preciso chamar um médico. –uma lágrima escorre em seu rosto, enquanto ele caminha curvado em direção a porta, nada fazia sentido em minha mente. Tento me levantar, mas acho que devem ter me sedado, ou algo do tipo. –Por favor, não se mecha. –ele segura meu ombro, me empurrando de forma delicada.

Um homem negro, com óculos redondos e usando um jaleco, que tinha um botão faltando, entra no quarto, com cara de enterro, e quando ele começa a falar, não era como se estivesse descrevendo meu caso. Me senti como outra pessoas vendo algo de fora, não conseguia sentir medo, ou pavor, nem mesmo quando ele disse que a lesão em minha coluna era irreversível e que eu nunca mais andaria. Wally sofria muito mais do que eu, mais uma vez não entendo todo o pânico em sua face. O médico diz que mandaria um psicólogo para me acompanhar na próxima semana, na qual ficaria internado, apenas balanço a cabeça, aquilo não seria necessário.

–Eu sinto muito. –Wally diz quando estamos sozinhos mais uma vez.

–Por que? –questiono confuso, e ele fica sem expressão por um momento.

–Hunt, eu sei que está em choque, e talvez ainda não tenha processado o que aconteceu, mas você não pode mais andar. –ele diz cada palavra como se explicasse a uma criança.

–Cara, você é o Flash. –falo o obvio. –Já me contou que voltou no tempo antes, para salvar sua tia. –o rosto dele estava branco, e o vejo engolir em seco. –É só voltar no tempo, e mudar o que aconteceu. –me parecia muito simples.

–Hunt. –chama com a voz calculada. –No dia seguinte à minha volta, fomos atacados pelo exército do Darkside, era uma consequência que não conhecia. O destino sempre substitui a tragédia que impedimos por outra ainda pior. –ele olha para os lados antes de voltar a falar. –Muitas pessoas morreram em meio àquela guerra, jurei para mim mesmo que nunca mais faria de novo.

–O que isso quer dizer? –olho confuso em seus olhos.

–Que eu realmente, sinto muito. –murmura como resposta.

–O que faria se fosse a Sara, ou Connor? –pergunto chocado e ele apenas balança a cabeça de forma negativa, com lágrimas nos olhos. –Permitiria que eles ficassem presos em uma cadeira de rodas, para sempre? –minha voz sai tão alta quanto meu desespero.

–Não posso mais voltar no tempo Hunt. –sua voz era baixa, mas firme, ele não voltaria. É quando sinto um abismo enorme se formando em meu peito.

–Me deixa sozinho. –digo seco, olhando para a parede branca, do lado oposto ao que ele estava.

–Zoom...

–SAI! –grito irado, e começo a sentir o desespero aumentar mais a cada segundo. Wally passa pela porta com sua super velocidade. –O que eu vou fazer? –murmuro passando a mão em meu rosto, sinto uma lufada de ar no quarto, e estava pronto para gritar com Wally mais uma vez, mas o que vejo tira a minha capacidade de falar.

–Primeiro, vai parar de choramingar. Depois, vou te contar como fazer do Flash um herói melhor.

O homem parado em frente à minha cama, vestia um uniforme semelhante ao do Wally, porém as cores eram inversas, ele era amarelo, e o raio era vermelho. Parecia vibrar constantemente, e podia ver a luz vermelha em seus olhos. Me encolheria se pudesse mexer minhas malditas pernas.

–Quem é você? –sussurro, e posso ver os aparelhos cardíacos indicarem o quanto meu coração estava acelerado.

–Uma versão melhorada, sua. –responde, parando de vibrar, e retirando a máscara, reconheço meus olhos, nos dele. –Agora, vamos aos negócios.