Palavras de Heagle

I won't see you tonight


Antes de mais nada, coloquem “I won’t see you tonight” do Avenged para tocar. Na minha opinião, nada fará sentido sem a trilha sonora perfeita...

Sábado havia chego, e eu estava morrendo. Não estou sendo dramática, de fato sentia meu corpo não responder à mais nenhum estímulo. As pernas... puff! Nem adiantava contar com elas. As coitadas já estavam quase sem vida... e se conseguiam realizar algum movimento, era porque simplesmente meus músculos não estavam mortos o suficiente, como todo o resto do meu corpo.

Meus olhos, eu já tinha força de abrir. Mas ousava, vez ou outra, olhar para a janela. Sentia a luz do sol queimar meu rosto. Deveria ficar feliz por isso, seria a última vez que veria um dia novo nascer.

Minhas mãos... bem, elas sangravam, minhas unhas quebraram quando tentei impedir que um dos bandidos voltasse a me agredir. Encravei-as em sua carne... mas em troca, recebi um soco. Lembro-me de ter caído longe, afinal... qualquer força era superior que a minha. Eu já não passava mais de um saco de ossos... de rosto chupado e extremamente pálido. Lamento muito ter exibido tão macabro aspecto. Até meus cabelos que eram tão bonitos... Giulia fez questão de cortar. Não muito, mas o suficiente para deixa-los à altura dos ombros.

Eles queriam realmente que eu morresse feia. Mas tentei alertá-los que isso não era necessário, afinal, sempre estive longe dos parâmetros de beleza. E isso, automaticamente, me fez lembrar do jogo de Verdade ou Desafio que Matthew havia dito que eu era feia. Fiquei tão mal na época... mas ele estava mentindo? Se me visse naquele estado que me encontrava, voltaria a dizer a mesma coisa. Eu sei disso... ingenuidade minha esperar que aquele grande homem fosse gostar de mim. Pensando todo esse tempo, pessoal, cheguei à conclusão que Matthew não foi culpado de nada, e sim eu. Tola de acreditar que eu seria diferente. Forcei uma amizade que não existia. Pressionei ao ponto do pobre rapaz não saber mais o que fazer comigo. Sinto vergonha por isso... por ter acreditado que M. Shadows consideraria uma mera fã caipira e brasileira parte de seu ciclo de amigos. Parte de sua vida.

Mas... as lembranças são difíceis de esquecer, e em menos de 24 horas, elas retornaram, me atormentando. Eu senti meu rosto queimar... e pude concluir que era febre e uma crise de choro que eu já não podia controlar. Meu orgulho era tão forte que não fazia isso na presença dos bandidos. Se fosse morrer, morreria com dignidade.

Lembrei-me de quando eu era apenas uma menina, a filha caçula do Velho Genoom, que corria pelo quintal fingindo que era uma bruxa. E gritava, aos quatro cantos, que derrotaria a rainha malvada que vivia na torre! Já aos 15, essa rainha malvada tornara-se Della, a primeira personagem do meu livro. Sem namorar e muito nerd, meus amigos olhavam para mim como se eu fosse a pessoa mais diferente do mundo. E tudo só estava começando.

Senti o perfume de Hugo na primeira vez que o beijei... e que ele me acompanhou na editora onde assinei o contrato de Os Murphy. Meu pai ficou bravo naquele dia... não queria que eu arriscasse minha carreira de jornalista por algo tão inútil.

Não poderia esquecer de quando meu velho sofreu um ataque, e eu ao menos estive por perto para ajudá-lo. E do quanto gritei e chorei quando soube que ele estava bem. Que ele viveria. Mas, como minha cabeça não podia controlar esse fluxo de lembranças... viajei para o ano que, já grande escritora, eu me mantinha sentada em uma das cadeiras do Aeroporto de Londres, e percebia que uma mão tocava em mim. Era Syn. Era o Avenged. E... do quanto fiquei boba ao ter o primeiro contato com Matthew. Meu Deus, achei que naquele dia eu morreria de felicidade. Meu coração talvez fosse explodir! Senti-me novamente uma adolescente de 17 anos... que ouvia a banda favorita no último volume. E o pôster de Matthew, na parede do meu quarto, acenava para mim que um dia em breve ele seria meu.

Não... ele nunca seria meu. Tive a ideia tola de entrar em sua vida, de presenciar a morte de Johnny, de quase matá-lo com uma pizza apimentada. Entendi que a vida de um cantor é tão normal quanto à de outra pessoa. Pelo menos, era isso que ele passava.

Syn e Zacky eram meus maiores amigos. Rio de lembrar o primeiro beijo com meu querido Sinistro... e quando Zacky quase nos envenenou com suas comidas horrorosas!

E Mel... minha irmã. O que aconteceria com minha protetora? Ela era minha, só minha. Mas eu aceitava em deixa-la de herança para Syn. Sabia que o homem de sua vida a trataria, por vezes, até melhor que eu. Quando eu partisse, ela não ficaria sozinha. Poderia ser feliz.

Ah, olá, eu sou Heagle! Essa foi a primeira frase que escrevi. E espero que seja a última. Foi exatamente nisso que resumi toda minha vida: em ser Heagle, a águia que escreve.

Estou... meio confusa.

Matthew invade minha mente sem eu mesmo querer. E são tantas coisas pra lembrar, pra descrever, para sentir. Um beijo, um abraço, uma ofensa, uma briga, um colo, uma agressão, um corpo... uma vida. Não conseguiria descrever nenhum momento com detalhe... afinal, não é o sensato. Talvez eu sentisse medo de ir embora... e queria evitar isso.

- Eu não vou te ver hoje à noite. – murmurei, abrindo os olhos, logo que me puxaram pelo braço. Jogaram água gelada em meu rosto para que eu despertasse. E até que deu resultado.

- Vamos, está na hora. – riu Giulia, levantando-se com violência. – E você vai dirigindo.

- Eu? – questionei, cambaleando. – Por que...?

- Qualquer coisa, abandonamos o carro. – gargalharam, empurrando-me contra a porta. Eis que uma ideia de vingança e justiça surgira em minha mente. E talvez, dependendo do que acontecesse, eu pusesse em prática. Mas era certo de que... se eu morresse... eles morreriam também.

***

(Terceira Pessoa)

Matthew não conseguiu dormir. Não era novidade a ninguém, afinal, mantinha o ritual de sentar na janela e olhar para fora, a noite toda, há algum tempo. Esperava que sua menininha viesse correndo, daquele jeito desengonçado, contando que tudo não passava de uma brincadeira. De fato, ficaria incrivelmente bravo com isso, mas acabaria rindo também, dando-lhe um abraço e um beijo na testa.

- Oh minha ranhetinha... – disse, sorrindo, olhando para o céu. Mantinha-se nublado já há alguns dias.

Mal amanheceu na mansão, e as viaturas de polícia estavam lá. O rapaz não gostou da ideia, achou ousado demais. Era perigoso. Mas, depois de um tempo, passou a ignorá-los. Não disse nada, não sugerira nada. Na verdade, já não sentia nada desde que Marietta fora sequestrada. Como se seu coração estivesse congelado.

- Você sabe o que fazer, não é? – perguntou Karine, percebendo que o grande relógio de Londres já anunciava que eram nove horas. – Estaremos de sentinela, fique...

- Nada pode dar errado. Eu te imploro. – pediu, colocando os óculos de sol. – É hoje que esses filhos da puta terão o que merece. Vou enfiar um bastão no cu de cada um se minha menina aparecer com um arranhão sequer.

- Tenha calma nessa hora, Matthew. – murmurou Melissa, com as mãos juntas. Por mais estranho que fosse... a moça estava rezando. Sim, surpresa para todos nós. – Estaremos lá.

O rapaz assentiu, girando a chave no contato. Seu coração disparou ao ouvir o ronco do carro. Só agora caía em si tudo que estava planejando. Era arriscado... mas a solução. Preferiu não se despedir de ninguém. Acelerou com agressividade e se afastou, cantando pneu. Pronto, iniciara-se o jogo da vida.

O tempo que levou para chegar à rodovia não foi muito, visto que ultrapassara, em determinados momentos, 140 km. Sentia que o pé no acelerador correspondia aos seus batimentos cardíacos, cada vez mais intensos. Como se... toda a adrenalina para salvar Marietta aparecesse de uma vez só, dando forças para acreditar que tudo daria certo. Que tudo ficaria bem.

Quando chegou ao lugar do ponto, encontrou um carro semelhante ao de Giulia no acostamento. Aproximara-se com cuidado, caso estivesse errado, mas uma cabeleira cacheada e negra fez com que entendesse que estava no lugar certo, na hora certa. Era Marietta.

- MARIE! – berrou, estacionando atrás do carro. Giulia tirou a cabeça para fora do carro e acenou, sorrindo.

- Trouxe?

- Sim. – respondeu, tentando segurar o impulso de descer do carro, ir até aquela vadia e socar até seus úteros. Mas, pelo visto, o Ogro Engibizado havia aprendido a ser paciente.

- Siga-nos. – ordenou a ruiva, fazendo um gesto para a refém.

Marie, automaticamente, olhou pelo retrovisor. Como se não tivesse mais controle algum, sentiu novamente o rosto ruborizar, e os olhos encherem de lágrima. Não queria que Matthew presenciasse o que poderia acontecer. As mortes de Jimmy e Johnny já eram suficientes para abalar seu psicológico.

Mas... por um tempo, mesmo com uma arma apontada em sua cabeça, continuou imóvel, fitando-o. Era incrível o quanto gostava daqueles óculos de sol estilo aviador que o ídolo sempre usava nos shows. E quando os tirava, deixava à mostra aquele par de olhos verdes que qualquer homem ou mulher invejava.

Sentira-se, pela décima vez, uma tola. Como pôde ser tola? TOLA, TOLA, TOLA! Que imbecilidade a sua... de estar ali, diante de um reflexo, a beira de uma crise de choro.

“Não... não vou chorar”, pensou consigo mesma, dando partida no carro. E com dificuldade de movimentar o pé, pisou no acelerador e começou a seguir a rodovia.

- Será que ele trouxe? – questionou um dos bandidos à Giulia, que segurava a arma encostada na cabeça da refém.

- Lógico. O cara tem grana... e não vai arriscar tanto assim. A morte dessa pirralha mancharia sua carreira.

No outro carro, Matthew mantinha-se inquieto, batendo os dedos no volante. Pela falta de visibilidade no vidro traseiro, não percebera que Marietta estava com uma arma apontada para sua cabeça. Se tivesse, talvez, teria impedido que a polícia, tempos depois, ligasse a sirene das viaturas e começasse uma perseguição.

- POORRA! – gritou Giulia, levantando-se do banco. – CARALHO, TODA A POLÍCIA DE LONDRES ESTÁ ATRÁS DE NÓS!

- FILHO DA PUTA! – gritaram em coro, olhando para fora do carro. Deram de cara com o carro de Matthew ao lado e as viaturas de polícia logo atrás. Por um momento, sentiram medo de ser pegos, por mais que estivessem armados.

- QUE A GENTE FAZ, VÃO FAZER PICADINHOS DA GENTE!

- PARA ESSE CARRO, VAMOS FUGIR.

- NÃO PODEMOS FAZER ISSO, E O DINHEIRO?

- FODA-SE, VAMOS APODRECER NA CADEIA!

- Vou acabar com a raça desse playboyzinho que acha que pode brincar com a gente. – riu um deles, já fora de controle, apontando uma arma para a cabeça de Matthew. Marietta olhou para o lado e viu o rapaz, que nesse momento, olhara também. E tudo voltara à tona...

~

“– AH VAI SE FUDER, EU NÃO POSSO NEM GRITAR EM PAZ? FAÇA-ME O... – gritei (no caso, berrei para todo hotel ouvir), olhando para a pessoa parada lá na porta. Um cara alto, tatuado, musculoso, sem camisa e uma bermuda de pano fino. Estava descalço, descabelado e sem óculos escuros. Devia estar dormindo... e foi acordado pela minha crise de TPM sem PM.

Pedi para morrer naquele instante. Não, não... DEUS, QUANDO PEDI UMA SOLUÇÃO PARA MEU PROBLEMA, EU NÃO ESTAVA ME REFERINDO AO FATO DO M. SHADOWS PARAR NA MINHA PORTA!

Por quê? Poooor quê?”

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“Foi naquela ocasião que encarei a outra face de Matt, e fiquei muito feliz, muito mesmo, quando ele sorriu, dando-me um abraço não muito forte (porque se ele depositasse um pouquinho de força... com certeza, eu nem estaria aqui viva).

– Prometo, cara. E valeu por tudo, Marietta.

E ficamos lá, por um bom tempo, abraçados, no meio da sala. Teve horas que cheguei a perguntar, pra mim mesma, se eu queria que aquele momento tivesse um fim. Até hoje não sei a resposta”.

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“– Cai na escada. – resmunguei, afundando no travesseiro. – Fui buscar meus documentos para fazer sua ficha. E... estava correndo e... cai.

– Por que você fez isso? Você disse que me odiava, me deixasse morrer.

Olhei-o ofendida, por cogitar tal hipótese. Não era para levar a sério meus xingamentos. Na hora do nervoso, falo muita merda... mas não a ponto de odiar ou matar alguém. Nunca faria isso. Passei as mãos pelos cabelos, e ainda fitando-o, sorri:

– Eu morreria por você”.

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“Outro mico que passamos (ou melhor, EU PASSEI! Porque Mel e Matt não possuem vergonha na cara), foi quando nos aproximamos dos seguranças. Entreguei minha credencial, e Mel a dela. Já Matt, não tinha como pegar, já que nós não íamos colaborar.

– Sabe que é, senhor segurança? – comecei, toda meiga. Estava pondo em prática minha quinta vingança: a da prisão. – Esse nosso amigo é fugitivo do estado de Rio de Janeiro, no Brasil. Ele era traficante... e fugiu há poucos meses. Há algum tempo, decidiu virar cantor de metal... até que o encontramos. Minha amiga, Mel, foi seduzida e espera um filho... então, pra ele não escapar impune... tivemos que algemá-lo.

– QUE? – gritou, arregalando os olhos. Dei-lhe um tapa e fingi estar brava e ofendida.

– Você disse que ia fugir pra não dar pensão!

– MEU BEBÊ... TÁ CHUTANDO... – gritou Mel, pondo a mão na barriga”.

~

“Matthew procurava pelo lado direito, Mel olhava para outro, enquanto Syn e Zacky davam voltas. Por fim, quase uns dez minutos depois, o olhar de Matt encontrou o meu. Deus, me explica, como um cara daqueles consegue ser tão lindo, mas tão idiota?

– MARIETTA! – berrou ele, correndo em minha direção.

Juro gente, o abraço que ele me deu foi tão forte, mas tão forte, que fiquei um tempinho básico sem poder respirar. Sério! Ele trombou em um monte de gente no saguão, deixou Mel e os outros pra trás... pra me abraçar. Que coisa sinistra ein?”

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“Deitou-a com cuidado, beijou-lhe o cenho e murmurou:

– Boa noite, linda. Bons sonhos.

Marietta sorriu, roubando-lhe um selinho:

– Você é um máximo. Admiro seu respeito por mim. Eu não me arrependeria de trair Hugo. Você é um cara que vale a pena.

Matt sorriu, esperando que ela pegasse no sono. Sentiu-se aliviado, mesmo que tivesse perdido uma transa que poderia ter sido incrível. Mas nada valia a amizade de Marietta. Nem mesmo uma noite com ela”.

~

“– Ér... – comecei, pegando uma pulseirinha escrita (em inglês): Sou amigo de um filho da puta.

– Eu e Jimmy usávamos essas pulseiras. Daí ele falou assim: “Olha Matthew Pau no Cu, se um dia eu morrer, você tem a obrigação de se livrar dessa pulseira feia pra porra... e dar pra alguma pessoa que mereça pagar essa penitência como eu pago desde os 16”. Daí... quando ele morreu... a pulseira estava guardadinha na caixinha. E eu parei de usar, depois disso. Mas... achei um bom presente. Você gostava muito dele, não?

– Eu adorava Jimmy mas... você não quer guardar contigo? Afinal, ele era seu melhor amigo.

– Contigo ele está bem guardado. – sorriu, puxando meu pulso. – Acho que três voltas são o suficiente. Vem cá, me ajuda, coloca no meu pulso também”.

~

“Aquilo era um sonho, só podia. Seus sentimentos, tão confusos naquele momento, não faziam sentido. Marietta, já um pouco sonolenta (devido ao “efeito” do álcool e aquela “agitação” entre os dois...), fechou os olhos, sussurrando:

– Se for um sonho... espero nunca acordar.

‘Lamento que sejamos tão diferentes...’, pensou o rapaz, pegando-a no colo. Teve o cuidado de vesti-la com um sobretudo, para que não passasse mais frio. Pousou-a no banco de trás do carro, para que descansasse.

Colocou as roupas, mesmo que estivessem sujas e molhadas... para que pudesse levá-la ao hotel.

– Feuer und Wasser... kommt nich zusammen. – cantarolou, colocando os óculos novamente.

Fogo e água, realmente, não se juntam. Não podem ser atados, não são relacionados”.

~

“É, o beijei. O beijei como se o chão fosse abrir debaixo de nossos corpos e... tudo acabasse. Se fosse o fim do mundo, o fim da vida... eu morreria feliz, porque estava beijando Matthew!

E não era aquele beijo da noite do Natal. Nem um beijo teatral, para enganar ex namoradas. Nem sonho, nem pesadelo. Era o beijo que gritava dentro de mim, querendo acontecer, querendo existir. Era o beijo que eu precisava para... ficar livre, e ter certeza do que era pra ter certeza.

Por que as pessoas são tão tolas? Por que eu sou tão tola como as pessoas?

Aquele era o beijo da minha vida, e nada, absolutamente nada, iria apagar aquela lembrança. A lembrança de quando beijei MEU Matthew Sanders. Meu M. Shadows. Meu Jonathan Harrington.

O Ogro Engibizado que era o amor da minha vida”.

~

“– O problema, Syn, é que... eu fiz a pior burrice da minha vida. – suspirou, disposto a falar, pelo uma única vez, sem ressentimentos ou brincadeiras. Precisava falar o que sentia... porque, no caso, acabaria explodindo.

– E qual foi essa “pior burrice”?

– Eu me apaixonei. Pela Marietta. – confessou, abaixando a cabeça”.

~

“O rosto de Marietta estava sangrando. Sua coluna, torta com a queda, parecia ter dado um “nó”, se assim podemos dizer. As pernas pareciam mole, ainda apoiadas no último degrau.

– NÃO, VOCÊ NÃO ESTÁ MORTA. – gritou, sentando-se do outro lado, enquanto um misto de desespero e irritação o dominara. As risadas, cada vez mais altas, demonstravam sua confusão. Já não era mais dono da sua razão.

– Não, não, não... não! NÃO, não... – repetia, balançando-se, enquanto as lágrimas caíam.

Rezava, mesmo sem saber, para que alguém chegasse logo. Precisava de ajuda. Não podia carregar a culpa de ter machucado sua pequena Marietta, a escritora que tanto amava.

Não podia carregar a culpa de... trazer a sua vida mais uma tragédia.

– Não... posso... perdê-la.

E lá fora, a chuva caía. E a escuridão tomava conta”.

~

“– Não. Não precisa. Só quero que... se caso consigam me encontrar morta... que você cante minha música, a Warmness On The Soul. Lamento nunca ter ouvido de sua própria boca, ao vivo, essa canção. Nada faz sentido agora, nem mesmo o que eu digo. Acredito que nunca tenha sido nada para você. Hum... sabe Matthew, passamos por bons e maus momentos, mas mesmo assim, eu quero permanecer com o único laço que nos une: a pulseira do Jimmy. Hum... Eles estão arrombando a porta. Acho que chegou a hora do...

PÁ! Um barulho de tiro, alto e bem nítido, pode ser ouvido até mesmo por Mel e Zacky, não tão próximos ao celular. Era oco, como se estivesse bem próximo do alvo. Ainda se esse alvo fosse...

– Adeus. – completou Marietta num sussurro. A ligação caiu”.

~

- NINGUÉM MACHUCA O MATTHEW! – berrou Marietta, virando o volante com força. O carro fez um zig-zag na pista, e o tiro errara o alvo.

Giulia olhou desesperada para os lados, talvez não esperasse que as coisas tomassem rumos tão drásticos. Sinal disso foi que sua mão tremia, segurando o gatilho.

- Para esse carro, acabou.

A refém, iluminada pela esperança de todo aquele inferno ter tido um fim, tentou mover o pé. Ele não respondeu. Tentou inúmeras vezes, e desesperada, pôs-se a gaguejar, irritada.

- Não sinto minhas pernas!

- Hã?

- NÃO SINTO MINHAS PERNAS.

- GAROTA, PARA ESSE CARRO AGORA!

- Já cansei disso. – resmungou o bandido, que mais uma vez, esticou a arma para fora do carro. – Vou estourar seus miolos, filho de uma quenga.

- EU JÁ DISSE, SEU DESGRAÇADO, NINGUÉM MACHUCA O MEU MATTHEW – berrou Marie, jogando o carro mais uma vez para o lado. Mas, diferente da vez anterior... não houve como voltar.

Giulia emitiu um berro ao perceber que seu dedo, na movimentação brusca, havia puxado o gatilho, e que um fio de sangue, ralo e contínuo, corria pelos cabelos emaranhados de sua refém. Matthew, do outro lado, gritou de uma forma que jamais fizera antes. Pressentiu que o pior havia acontecido logo que viu um breve aceno surgir pela janela.

- Adeus, Ogro Engibizado. – murmurou Marietta, tombando a cabeça no banco. E o carro, antes mesmo que algum dos bandidos reatasse seu controle, chocou-se em um dos pilares lateral e capotou.

- MARIETTA, MAAARIETTA! – berrou Matthew, estacionando o carro em qualquer lugar (que até hoje, ele não sabe identificar). Correu em direção ao acidente, mas o cheiro de gasolina quase o impedira de continuar. O carro estava destruído, e tudo isso em questão de segundos.

Há uns metros de distância, toda contorcida no chão, tremia uma magra e pequena figura feminina. O coração do rapaz voltou a disparar, e sem pensar na hipótese de que pudesse ser atropelado caso continuasse a andar no meio de uma rodovia, correu de encontro ao vulto.

A primeira reação que teve, talvez a mais digna possível, foi tocar no corpo da jovem caída ao chão. Tentava encontrar qualquer vestígio de vida. Precisava, era necessário.

- Por favor, minha querida, não me diga que... meu Deus, não Marie... não faz isso comigo, eu te imploro. – gaguejava, chacoalhando-a.

Ouviu o barulho das sirenes se aproximar, e o pavor tomava conta de quase todas as suas ações. Por instinto, mesmo sabendo que não deveria, puxou o corpo de Marietta em direção ao seu, e afastou os cabelos de seu rosto.

Sem poder resistir, ou manter uma força falsa diante da triste realidade, abraçou com força aquele corpo ferido, e talvez, morto.

- Não Marie, não me deixa. Não se vingue de mim. Eu te amo, minha menina. Não me deixa, eu te imploro, não me deixe.

E sentindo que sua vida, a partir daquele momento, sequer possuía motivos de existir... começou a cantarolar, enquanto suas lágrimas corriam pelo rosto... e os curiosos começavam a se aproximar.

Matthew Sanders morria naquele exato momento.

“No more breath inside, essence left my heart tonight” (Sem mais fôlego por dentro, a essência deixou meu coração essa noite).

***

“Acho que morri... de certo morri. Lamento tanto deixar para trás tudo que eu mais amo. Lamento não ter a chance de ouvir um ‘Te odeio sua puta!’ de Melissa novamente, e de provar a comida horrível de Zacky, xingar o galinha do Syn e subir nas costas de Matthew gritar o quanto ele era um Ogro Engibizado.

Talvez amanhã de manhã eu acorde e perceba que tudo não passou de um pesadelo. E que eles estarão me esperando, comemorando meu aniversário, com um bolo enorme de brigadeiro! E que eu possa xingar a todos, e dizer o quanto os odeio...

Ou simplesmente... devemos aceitar que as luzes se apagaram, e o meu espetáculo das Palavras de Heagle... acabou”.