Ele deveria ter esperado a Festa do Peão em Barretos.

Ele definitivamente deveria ter escolhido Barretos. Era mais barato, ele não ia ter que pagar hotel e ninguém o julgaria se ele quisesse afogar as mágoas com pinga barata ouvindo Simone e Simaria.

Mas ele também não queria ficar de vela com Jean e Isabella, então ele acabou no Lolla. E acabou vendo pessoas. E acabou bebendo e chorando compulsivamente. Agora ele estava bêbado, deprimido e cantando Lana Del Rey como se fosse o fim do mundo.

Patético. Yuuri Katsuki era patético.

Não era para seu final de semana acabar daquele jeito, mas já que seria assim, ele viveria A Fossa. Com muito álcool porque ele tinha direitos. A ressaca iria acompanhá-lo até ele voltar pra Campo Grande, afinal, então não tinha por que pegar leve.

Ele também tinha a opção de ficar com o primeiro rostinho bonito que aparecesse na sua frente e esquecer seus problemas.

Era algo muito tosco e covarde de se fazer, principalmente sabendo que ele estaria em outro estado no dia seguinte. Lollapalooza não era Carnaval, cheio de gente à perigo cuja única razão de viver é a possibilidade de trocar saliva com um estranho, mas ele tinha certeza de que tinha chance com alguma das centenas de meninas com exatamente a mesma roupa - blusa Renner, short jeans e camisa xadrez na cintura - ou meninos de Rayban e camiseta da Supreme. Ele tinha passado máscara. Tinha que valer pra alguma coisa.

Enquanto ele avaliava suas opções ao som de Summertime Sadness, alguma voz chamou por cima da música e da multidão:

— Yuri!

Seu nome não era exatamente comum, então a primeira reação dele foi achar que o estavam chamando. Ele não reconheceu a voz, mas provavelmente era Leo ou Seung-gil querendo saber se ele ainda estava vivo. Povo burro, por que não chama logo no Whats ao invés de gritar igual vendedor de pamonha? É por isso que eles tinham fama de caipira.

Antes que ele pudesse gritar um alto e muito irritado "Eu tô aqui, animal", ele viu quem estava chamando. E Senhor, aquilo era melhor que todas as blusas Renner e Supreme que ele já vira no dia.

1,82 metro de altura. Cabelo loiro platinado (Natural ou pintado? Difícil dizer). Olho azul e uma ondinha no cabelo que convenceria qualquer um a procurar hotel na Internet com ele.

Puta merda. Yuuri pensou tomando fôlego. Abriram o céu da Grécia.

Vai ver ele tinha morrido mesmo e esse era o anjo mandado para buscá-lo. Apesar de Yuuri não ter certeza de que merecia ir pro céu depois dos eventos da Atlética ano passado, ele aceitaria de bom grado acompanhar aquele pedaço de mau caminho.

E porque ele já não tinha mais um único pingo de juízo, ele foi se apresentar.

— Oi.~ - ele disse diminuindo a distância entre os dois com o sorriso mais ridículo em seu catálogo. - Eu sou o Yuuri. Você tava me procurando?

Puta que pariu, Yuuri, você vai levar um soco se esse cara for hétero.

Talvez tenham sido os céus zelando pelo seu bem-estar fazendo com que o estranho seja ou muito educado ou muito sem-noção, mas ele piscou três vezes confuso (Os cílios dele eram prateados, socorro) e depois abriu um sorriso que faria qualquer propaganda da Colgate parecer anúncio de jornal local. Como se Yuuri já não estivesse morto o bastante, o anjo resolveu falar:

— Não, mas que bom que eu achei.

Yuuri teve que engolir em seco naquele momento, porque senão ele acabaria gritando numa frequência não muito digna de homens. Mas ele ainda continuou a conversa de uma forma ainda menos digna para homens, mulheres, quatis e qualquer outra espécie que habitava aquele país chamado Terra.

— Eu morri? - a seriedade com que ele perguntou deve ter tornado a cena ainda mais constrangedora. - Porque só se eu tivesse morrido ia ter um cara bonito chamando o meu nome enquanto a Lana tá cantando no fundo.

O anjo loiro sorriu ainda mais e, quem sabe, as luzes coloridas do show e a escuridão da noite tenham escondido o quanto ele tinha corado. Devia ser um tom de vermelho muito fofo, principalmente com aquela pele perfeita de catálogo de cosmético.

— Eu tô bem vivo, então acho que você também está, Yuuri. - o jeito com que ele falou seu nome quase fez Yuuri chorar de novo. - Prazer, meu nome é Victor.

— O prazer é todo meu. - Yuuri estava, oficialmente, mais atirado do que o seu eu carnavalesco e isso não era nada bom. - Tá curtindo o festival?

— Eu tô, apesar de ter ficado mais de babá esse tempo todo. - Victor explicou, de repente franzindo as sobrancelhas perfeitamente feitas como se lembrasse de uma coisa. - Eu tô procurando o meu primo. Ele é dessa altura e parece a Billie Eilish.

Ao vê-lo demonstrando a estatura que mal batia no ombro do moreno, Yuuri balançou a cabeça em negação.

— Desculpa, eu ia lembrar se visse a Billie Eilish andando por aí. Ia até pedir autógrafo. - ele se sentiu até meio culpado por não poder ajudar. - É ele que se chama Yuri?

— É sim. Ele ainda tá preso na fase emo dele, então achei que ele ia tá no show da Lana. - Victor suspirou como se estivesse pagando todos os seus pecados com aquela situação. - Meu celular acabou a bateria e ele sumiu de mim. Tô preocupado, vai que ele tá colocando algum piercing por aí?

Quem coloca piercing no Lollapalooza?, Yuuri teve vontade de perguntar, mas não estava disposto a ofender aquela coisa linda ainda.

— Você quer meu celular emprestado? - ele disse trocando a lata de energético de uma mão para a outra e alcançando o aparelho no bolso. - Tem ligação ilimitada pra qualquer operadora e número do Brasil.

POR QUE VOCÊ TÁ FAZENDO MARKETING DA CLARO, YUURI KATSUKI?!

— Ai, meu Deus, sério? Você salva a minha vida assim! - Victor disse parecendo genuinamente agradecido com o gesto. - Mas, tipo, aqui eu não vou conseguir falar no telefone com todo esse barulho. Você se importa se a gente for pra um lugar mais quieto?

Yuuri se controlou muito pra não dizer "Na minha casa ou na sua?", porque sua mente pervertida só conseguia pensar em uma definição de lugar quieto.

— Tudo bem. - ele disse sem desmanchar o sorriso. Se ele tivesse o cabelo mais longo, estaria enrolando uma mecha no dedo como uma piranha. - No caminho você me conta como é o céu da onde você veio.

Victor realmente deveria ser um presente divino cuspido naquele mundo horrível, porque ele apenas riu e teve a audácia de dizer:

— Mas você que é o anjo aqui, Yuuri.

Oh, Deus.

Se Yuuri não estivesse tão afetado pelo mundo como um todo, ele já teria beijado aquele cara.

Ele deve ter demorado muito para demonstrar alguma reação, porque foi Victor que fez a próxima pergunta:

— Você é daqui? - ele disse enquanto eles andavam para longe da multidão. - De São Paulo, eu quero dizer.

— Não, não. - o pingo de sobriedade que ele precisava voltou e ele usou para a próxima resposta. - Eu sou do Mato Grosso do Sul.

Yuuri nunca torceu tanto para que alguém soubesse geografia quanto naquele momento, porque se Victor perguntasse como era morar no Norte, o amor acabaria ali mesmo.

Mas, novamente, Victor era um ser muito bom para aquele universo então é claro que ele daria uma resposta inteligente:

— Oh! Minha mãe estudou em Dourados! - ele disse com aquela animação quase inocente de quem sabia do que estava falando.

Socorro. Yuuri pensou quase sentindo os olhos lacrimejarem. Ele realmente sabe o que é Mato Grosso do Sul, eu tô apaixonado.

— Jura?! - Yuuri exclamou com um décimo de emoção a mais do que o necessário, mas é porque ele ficava feliz com pouca coisa. - Meu Deus, você é a primeira pessoa que eu encontro que não me pergunta se eu já fui na Amazônia. Ninguém sabe a diferença entre sul e norte aqui, eu já tava com crise de identidade.

— Eu tenho que saber. - ele deu de ombros com uma risada. - Eu nasci em Primavera do Leste, é a uns trezentos quilômetros de Cuiabá.

Ele é de Mato Grosso?, o moreno pensou encantado. Desde quando eles exportam modelos? Nenhum dos acadêmicos da Unemat era bonito assim!

Yuuri já se encontrava num estado de espírito que o faria perguntar se havia outra coisa em Victor que era grossa, mas ele resolveu acabar com a sua dignidade de outra forma:

— Você sabe tocar berrante? - ele perguntou com um sorriso de lado que, em outra vida, pareceria sexy.

E Victor riu. Ele riu porque, mais uma vez, Victor era um anjo e anjos não julgam bêbados atrevidos em festivais de música alternativa.

— Eu sei um pouquinho, pra ser sincero. Meu avô criava gado.

Yuuri quase teve um flashback de guerra com aquela frase, porque sendo do Centro-Oeste ele lidava com agro boys todo santo dia e teve uma experiência amorosa não muito boa com eles, a qual arruinou para sempre a visão que ele tinha de bonés da John Deere. Ele só rezava para que Victor não tirasse foto na carroceria da Hilux pagando de elite latifundiária.

— Que legal. - na verdade não era tanto, mas ninguém precisa ser sincero aqui. - Difícil ver fazendeiro que curte música do Lolla.

— Eu não acho que dá pra me considerar fazendeiro. - Victor explicou. - Eu nem tô morando no Brasil.

O sorriso de Yuuri visivelmente diminuiu em chateação. Claro que ele não morava no Brasil, material de qualidade sempre é importado.

— Sério?! - ele nunca se sentiu tão falso quanto naquela hora. - Que chique, deve ver tanta coisa legal lá fora!

— Nem tanto, eu só estudo. - o rapaz disse com um risinho sem graça. - E treino. Treino pra caramba, quem sabe um dia eu consigo algum destaque na categoria.

— Categoria? - Yuuri franziu o cenho. - Você é atleta?

Victor olhou pra ele como se tivesse vindo de outro planeta, apenas para esboçar mais um daqueles sorrisos maravilhosos e declarar com toda a calma do mundo:

— Eu sou patinador artístico, Yuuri. Sou o único representante do Brasil no individual masculino, atualmente.

— Oh. - foi tudo que ele conseguiu dizer para aquilo, apesar de seu cérebro estar conectando as peças na velocidade de um cágado.

Eles finalmente chegaram a um lugar fora do alcance da música depois da caminhada. Victor recebeu o celular e, enquanto tentava ligar para o primo, Yuuri tentava absorver e entender o que estava acontecendo.

Victor era:

1 - patinador artístico;

2 - bonito pra caralho;

3 - morava fora do país;

4 - único representante do Brasil no esporte.

Yuuri sentia que já tinha visto aquela descrição em algum lugar antes, mas não conseguia se lembrar onde. E agora a cara de seu novo crush se tornara mais familiar. Mas de onde se conheciam?

A resposta veio do próprio Victor, que ao não conseguir uma resposta no telefonema, resmungou em voz baixa:

— Piá teimoso do inferno...

Todas as peças se encaixaram com aquela palavra tipicamente sulista e a lembrança do modelo de bombacha que rondou o grupo do Whats dos amigos de Yuuri em fevereiro. Ele tinha vergonha em admitir isso agora, mas se pesquisasse nas conversas antigas, com certeza encontraria uma mensagem de si mesmo comentando a foto:

"ah mas com um boy desse qualquer porto fica alegre ( ͡° ͜ʖ ͡°)~~~"

Yuuri queria abraçar a Morte agora.

— Ai, minha nossa senhora. - a vergonha torna as pessoas católicas aparentemente, mas Yuuri não pôde se controlar. - Você é o cara que foi pras Olimpíadas!! Victor... Hã...

Qual era o sobrenome mesmo?! Era algo tão gringo e tão difícil de dizer, talvez fosse russo? Se Yuuri sabia escrever "Tchaikovsky" e "Rachmanioff", ele tinha que lembrar desse! Nazarov, Niliforv, Nissan-Ford...

— Nikiforov. - Victor disse parecendo achar graça da afobação dele. - Pensei que não ia me reconhecer. Ninguém reconhece, pra ser sincero.

— Me desculpe! - Yuuri praticamente gritou sentindo suas bochechas corarem. Seria ele o mesmo cara que estava pagando de piranha há menos de cinco minutos? - Nossa, eu sou muito idiota, eu devia ter te reconhecido! Você é tipo um herói nacional!

— Eu? Nem de longe, acho que eu teria que jogar futebol pra conseguir algo assim. - Victor deu de ombros mais uma vez, muito relaxado com o tópico. - Mas obrigado pelo apoio. Eu faço o que eu posso.

— Eu não consegui assistir as Olimpíadas na TV, mas eu ouvi muito sobre você na época. - ele admitiu, acalmando-se pouco a pouco, mas não ficando menos constrangido. Isso nunca. - Sobre como você batalhou pra conseguir a classificação, o orgulho que era pra CBDG de ter você lá representando o Brasil... É muito legal o que você faz. Eu não acompanho patinação, mas sei que não é nada fácil chegar onde você chegou. É bom saber que tem alguém lá fora competindo pela gente.

Victor parecia ficar mais encantado com ele a cada palavra. Como ele pôde encontrar uma pessoa tão incrível (e bêbada) numa festa daquelas?

— Ninguém nunca me elogiou tanto. - ele confessou com um sorriso sem-graça. - Você é cheio de surpresas, Yuuri.

— Eu tô é cheio de vergonha. - Yuuri disse arriscando um riso surpreendentemente sóbrio. - Desculpa, de novo. Meu dia foi muito louco e eu ainda perdi meus óculos, então eu tô ó... - ele fez um sinal com a mão que talvez pudesse ser traduzido como "arregaçado" em libras. - Se fosse num dia qualquer, eu teria te cumprimentado da forma correta. Você merece.

Victor sentia algo crescer dentro de si a cada palavra de carinho que aquele (lindo, adorável e, com sorte, solteiro) estranho dizia. Não ajudava que Victor se apaixonava por pouca coisa, mas Yuuri era tão fofo falando daquele jeito. Ele tinha vontade de colocá-lo num potinho e levá-lo com ele para os Estados Unidos. Mas isso seria estranho, macabro e provavelmente ilegal.

Victor provavelmente ficou tempo demais divagando sobre a possibilidade de convidar Yuuri pra comer crepe, porque quase não percebeu o mesmo perguntando:

— Não conseguiu falar com o seu primo? - Yuuri soava genuinamente preocupado e aquilo só o tornava mais adorável a cada segundo.

O loiro piscou algumas vezes antes de balançar a cabeça e devolver o celular.

— Não. - ele franziu as sobrancelhas. - Acho que ele tá ignorando a ligação porque não reconheceu o número. Eu não sei como vou achá-lo desse jeito.

— Seu celular só precisa de bateria, né? - Yuuri perguntou e ele assentiu. - Meus amigos trouxeram carregador portátil, você pode carregar um pouco e tentar ligar de novo. Isso ou procurar nas barracas de pronto socorro.

Victor internamente passou mal com a possibilidade. Se alguma coisa tivesse acontecido com Yuri enquanto ele estivesse sob seus cuidados, tanto seus pais quanto seus tios o matariam. Não ia ser uma cena bonita.

Ele não conseguia pensar em algo melhor, até porque muito lhe atraía a ideia de passar mais tempo com Yuuri, então concordou.

— Eu não queria te incomodar mais, mas me ajudaria muito. - Victor estava se esforçando para soar constrangido, porque ele não se importava nem um pouco em ser irritante desde que pudesse ficar mais próximo daquele embaixador do paraíso.

— Não é incômodo, é bom ajudar as pessoas de vez em quando. - Yuuri sorriu enquanto digitava algo no celular. - Ainda mais um orgulho da nação.

Ele havia mandado uma mensagem para Leo perguntando onde eles estavam, pois ele precisava ajudar um amigo com celular sem bateria. Não demorou para ele responder:

> tamo naquela área das redes

> tbm temos gente pra ajudar aqui

> seung adotou um calouro da unicamp com o seu nome

Yuuri quase fez um som alto de desgosto para a palavra "Unicamp", mas aquela história parecia muito familiar pra ele voltar ao seu estado deprimido. Foi a vez dele perguntar:

>> o calouro parece a billie eillish??

> eita

> como vc sabe??

Antes que Yuuri pudesse responder, Leo mandou uma foto. A princípio ele pensou que era de Seung-gil e uma gótica loira fazendo sinal de facção criminosa com a mão, mas analisando melhor, a tal gótica não era tão feminina assim. Não mudava o fato de que o garoto parecia uma vandalização punk de Masha e o Urso.

— É o seu primo? - Yuuri perguntou mostrando o celular para Victor.

— É ele. - Victor assentiu sem hesitar, quase não acreditando na coincidência. - Onde que ele tá?

— Com os meus amigos. - Yuuri explicou, talvez não sóbrio o suficiente para achar aquilo bizarro. - O mundo é pequeno e o Lolla é menor ainda, eu acho.

— E eu não falo que você é um anjo salvador de vidas, Yuuri? - Victor riu, mas no fundo já se perguntava qual promessa de Santo Antônio ele teria que cumprir pra agradecer aquele dia. - Você é um presentinho dos céus mandado só pra me ajudar. Eu tô até meio emocionado aqui.

— Assim você me deixa sem graça. - ele disse com um sorriso desconcertado, digitando mais alguma coisa no celular. - Os meninos vão segurar o Yuri até a gente chegar lá. Problema resolvido, me sinto a Dora, a aventureira.

Seu estoque de micos não acaba, Yuuri Katsuki?

— Ah, eu assistia isso! - Victor às vezes parecia um filhote contente por saber alguma coisa. - Sabia que na versão americana ela fala espanhol ao invés de inglês?

E esse é o resultado dos dois últimos neurônios de Victor Nikiforov tentando manter uma conversa casual com um menino bonito que ele acabou de conhecer.

— Eu ouvi dizer. - o moreno admitiu, achando graça do rumo que a conversa tinha tomado. - Você cresceu fora do país?

— Mais ou menos. - Victor deu de ombros, tentando não soar tão esnobe por dizer que morou no exterior. - Se estiver disposto a ouvir a história da minha vida, acho que dá tempo de contar.

— Adoraria. - não havia nenhuma segunda intenção no sorriso que Yuuri deu. Victor era o tipo de pessoa boa demais para ser gasta com alguns beijos roubados.

O moleque usava coturno. Num calor de 31°C.

Essa foi a primeira coisa que Yuuri notou no primo de Victor e a que mais lhe partiu o coração. Talvez por vergonha alheia ao lembrar de sua própria experiência usando munhequeira com rebite e beanie no verão. Era muito difícil ser emo às portas do Pantanal.

De qualquer forma, ele não teve oportunidade nem vontade pra comentar aquela agressão visual, pois logo que se aproximaram do grupo composto por Leo, Seung-gil e Yuri; Victor chamou para todo mundo ouvir:

— Yuri! - ele disse apertando o loiro contra si como num reencontro meloso de novela. - Você sumiu de mim, pensei que tinham te roubado!

Yuri empurrou Victor, provavelmente não compartilhando nem um décimo do carinho que o primo estava sentindo no momento, porque ele parecia muito bravo enquanto reclamava:

— Eu te falei mil vezes que eu ia ficar no lounge, mas você me ouviu? Não! 90% do que tu ouve vira pó nessa sua cabeça de gringo esnobe e sem-noção!

— Ah, você é um amor, Yuri. - Victor nem tentou esconder o sarcasmo, mas a próxima parte soou mais sincera. - E fez amigos! Tô tão orgulhoso!

Leo puxou Yuuri para um canto e falou em voz baixa:

— Eles ficaram discutindo o sucateamento da UNESP por uma hora. - pelo tom cansado, a conversa havia sido desgastante e com alto teor anarquista. - Nunca mais me deixe sozinho com o Seung-gil.

— Desculpe. - Yuuri disse sincero. Ele sabia o quanto os discursos ideológicos de Seung-gil podiam ser estressantes.

As devidas apresentações mal tinham sido feitas quando Yuri falou:

— Victor, chama o Uber, eu quero ir embora.

Victor suspirou, buscando seus últimos farelos de paciência para não mandar a criança pastar.

— Tudo bem, Yuri, eu também cansei de andar atrás de você. Só espera um pouco. - ele virou-se para Yuuri, mais um de seus sorrisos brilhantes à mostra. - Muito obrigado por me ajudar, Yuuri. Você salvou a minha noite.

Yuuri sorriu sem graça, muito mais sóbrio e menos constrangedor do que há meia hora.

— Não foi nada. Fico feliz que tenha achado o seu primo.

— Você tem insta? Twitter? - Victor não demorou para perguntar, soando até um pouco desesperado no processo. - Até tumblr eu aceito. Eu meio que não vou me conformar se perder o seu contato.

Yuuri só conseguiu rir com aquilo, mentalmente dizendo uma alto e sonoro "NOPE" para a ideia de Victor vendo suas postagens no tumblr.

— Acredite, você não quer ver o meu tumblr. - ele disse pegando o seu celular - Eu não posto muita foto no Instagram, mas é bem fácil de me achar online.

Considerando que o celular de Victor estava sem bateria, coube a Yuuri mandar as solicitações de amizade nos respectivos sites. Ver tantas fotos de Victor com qualidade quase profissional fez sua respiração falhar um pouquinho, mas com sorte ele se recompôs.

— Prontinho. - ele disse com um sorriso.

— Victor! - Yuri estava com menos paciência a cada segundo.

— Eu já vou, Yuri. - Victor também já não era mais o poço de compostura de minutos atrás, mas ele tentava. - A praga tá me apressando, eu sinto muito.

— Tudo bem, criança tem que dormir cedo mesmo.

O loiro virou a cabeça tão rápido com aquela frase que algum osso provavelmente deslocou.

— Ah, vá tomar no...!

— Até mais, Yuuri e amigos do Yuuri! - Victor interrompeu o xingamento enquanto empurrava Yuri para longe, mas nunca deixando de olhar completamente para Yuuri. - Obrigado pela ajuda!

— Até mais, Victor. - Yuuri disse acenando e rindo. Ele até que sentia muita falta da própria rebeldia emo para se ofender.

— Te vejo no Lolla 2019? - Victor perguntou com expectativa.

— Sei lá. - o moreno disse dando de ombros, sorrindo ainda mais - Mas vou sentir saudade.

Se o olhar de Victor podia brilhar ainda mais, ele conseguiu.

— Eu também!!

— Victor, para de passar vergonha, por favor. — Yuri resmungou enquanto arrastava o primo para longe. Toda vez era aquele mico, Victor tinha a idade mental de um bebê de dez meses.



Quando os dois quase estranhos já estavam fora de vista, foi a vez de Leo perguntar:

— Foi por causa dele que você sumiu? - ele sorriu malicioso. - Que feio, Yuuri, trocando amigo por macho.

— Foi uma boa troca, o cara parece um manequim da Zara. - Seung-gil comentou em desinteresse. Não fazia o tipo dele. - Ele é um pouco familiar, pra ser sincero.

— É uma longa história. - Yuuri disse esfregando os olhos. Ele estava cansado daquele dia. - Gente, eu perdi os meus óculos. Alguém pode me guiar até o hotel onde eu vou terminar de chorar?

— Ah, ótimo, sabia que o olho vermelho não era de você estar chapado. - Seung-gil reclamou, já tendo percebido mais cedo que Yuuri tivera alguma crise. - Pra quem eu ligo: Phichit ou Isabella?

— Pra ninguém, eu não tô morrendo. - ele revirou os olhos, mas sentindo os mesmo umedecerem levemente ao recaptular os eventos daquela tarde. - Só queria um Big Mac. E uma cama.

— A gente vai conseguir um Big Mac assim que chegar no hotel. - Leo assegurou. - Até lá, você pode ir falando sobre como conseguiu amizade com o manequim da Zara.

O sorriso bobo voltou ao rosto de Yuuri ao lembrar de como seu dia fôra salvo por um anjo loiro matogrossense. Aquele definitivamente foi o ponto alto de sua viagem.

Ele não via a hora de Victor Nikiforov mandar uma mensagem.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.