P. Bailey

Três dias


Durante a longa espera pelo médico de Nigel no hospital, Kate conseguiu fazer com que Preston saísse da sala de espera e fosse examinado. Ele voltou meia hora depois, usando duas muletas, com o pé direito enfaixado, e sentou-se ao lado da agente no gigante sofá que se estendia de um canto ao outro da sala. Ele não havia sofrido lesões além de alguns arranhões e um tornozelo inchado.

A caçadora havia desistido de ficar de pé nesse momento e estava sentada logo adiante no mesmo sofá. Kate tentou convencê-la a fazer o mesmo que Preston, mas foi impossível. A teimosa mulher insistiu que não sairia daquela sala sem ter a certeza de que seu amigo estava bem.

Horas se passaram em silêncio naquela sala até alguém da equipe médica surgir pela porta, chamando pelos familiares de Nigel Bailey. Sydney levantou-se e foi a primeira a se aproximar do médico. "Nós conseguimos estabilizá-lo." Disse o doutor. Os três respiraram fundo, aliviados. O médico continuou, em um Inglês fluente. "Embora o socorro ao Sr. Bailey tenha sido imediato, a temperatura de seu corpo atingiu um ponto crítico durante algum tempo e teremos que aguardar que ele acorde para verificar a existência de possíveis sequelas."

Sydney cerrou os punhos. "Podemos vê-lo agora?" E encarou o médico nos olhos. O doutor a analisou um instante, considerando o estado em que a mulher estava. Ela tinha seus cabelos emaranhados e úmidos, suas roupas estavam completamente sujas e seu rosto tinha traços de lágrimas que certamente haviam escorrido, secado e tornado a escorrer sobre suas bochechas. Ele lhe ofereceu um sorriso simpático.

"Em alguns minutos uma das enfermeiras que estão transferindo o Sr. Bailey para o quarto virá buscá-los." Direcionou-se somente para Sydney. "Seria bom se você deixasse um de nossos médicos examiná-la, só por garantia." Ela relaxou um instante e assentiu com a cabeça. O médico se despediu e saiu da sala.

Sydney sentiu-se um pouco mais calma com as informações, mas ainda estava apreensiva. Ficou de pé, aguardando próxima à porta. Como prometido, alguns momentos depois uma das enfermeiras veio informar o quarto onde Nigel fora acomodado.

Os três atravessaram os corredores do hospital e subiram para o terceiro andar, seguindo a enfermeira. Ela os levou até um dos quartos em um corredor azul claro. Eles entraram no aposento e a caçadora viu uma única maca no centro do quarto. Sydney correu para o lado da cama.

Nigel estava deitado, dormindo. Ele estava vestido em um tipo de avental verde claro que deixava seus braços à mostra e permanecia coberto até a cintura por um cobertor azul. Da gola do avental escapavam alguns fios, certamente presos a seu peito, que se ligavam a um aparelho ao lado da cama, monitorando os batimentos cardíacos do inglês. Havia também um pequeno cano preso ao seu nariz, que vinha do tubo de oxigênio próximo à maca.

Sydney suspirou de alívio ao ver que um pouco da cor normal já estava retornando ao rosto do amigo. Na mão esquerda de Nigel, que repousava sobre seu estômago, estava preso um tubo que subia até o recipiente de soro e medicamentos, pendurado perto da cabeceira da maca. A caçadora ignorou a perna esquerda engessada, que estava suspensa em amarras, e segurou a mão direita do inglês.

Ela fechou os olhos e apertou a mão do amigo. Não estava quente, mas ao menos não continuava gelada como há algumas horas. Preston e Kate observaram a mulher em silêncio. A enfermeira saiu do quarto e os dois caminharam até a maca. Eles ficaram de pé no outro lado da cama.

Nigel continuava dormindo. Seus batimentos não se alteraram nenhuma vez. Kate pôs uma mão sobre a cabeça da caçadora e ela abriu os olhos. A agente fez sinal para a porta e só então Sydney concordou com o pedido dela. As duas saíram do quarto e procuraram um dos médicos para Sydney ser examinada.

Era a manhã do terceiro dia desde que Nigel chegara ao hospital quando Sydney recebeu uma ligação de Cláudia. Ela estava no quarto azul claro do assistente. Havia uma cadeira pouco confortável ao lado da maca onde ela passara praticamente os últimos três dias. Sydney soltou a mão de Nigel e pegou sua bolsa. Encontrou o celular e atendeu sem muita disposição. Não precisou dizer 'alô', pois Cláudia foi a primeira a falar.

"Como está meu HoneyBun?"

"Ele está bem, mas ainda não acordou."

"E você? Como tem se saído nesse país esquisito? Tem descansado e se alimentado o suficiente?"

"Sim. As enfermeiras me chateiam com isso o tempo todo. Obrigada por se preocupar, mamãe."

"Amigos são para isso, Syd. Se eu não a chateasse, quem mais o faria agora que nosso TA está de folga?"

"..."

"Syd, está tudo bem?"

A caçadora deu um suspiro pesado. "Quero lhe agradecer pelo que fez, Cláudia. Se não tivesse avisado Kate assim que perdeu contato conosco e informado sobre o envolvimento de Preston ela não teria feito a ligação com o Museu e não nos encontraria a tempo. As coisas poderiam ter acabado muito piores. Obrigada."

"Não precisa me agradecer por isso. Você faria o mesmo por mim!"

"Eu faria qualquer coisa por você ou por Nigel... Mas isso não diminui minha culpa por tudo o que aconteceu nos últimos dias. Eu o forcei a ficar em Londres e ignorei seus avisos. Se eu o tivesse deixado voltar para Boston nada disso teria acontecido."

"Onde está Sydney Fox?" A caçadora ficou confusa com a pergunta da loira. "Sydney Fox não fica se remoendo pelo que poderia ter acontecido. A culpa não é sua por um maníaco ter surgido de repente, sequestrado você e seus amigos e os levado para um lugar que eu nem consigo pronunciar o nome. Você cuidou de todos da melhor forma possível e Nigel vai ficar bem. Pare agora de se culpar ou ele vai puxar a sua orelha quando acordar!"

Sydney deu uma risada cansada e secou os olhos. "Você tem razão quanto ao maníaco."

"É claro que eu tenho razão. Agora pare já de chorar e conserte a maquiagem! Amanhã ligarei novamente para saber das novidades. Preciso ir dormir."

"Tudo bem, Cláudia. Até amanhã."

"Bye-bye!"

Sydney desligou o celular e o guardou na bolsa. Sentiu-se um pouco mais animada depois da conversa com Cláudia. A garota estava certa, ficar se culpando não resolveria nada. Ela esticou o braço e segurou novamente a mão do homem deitado na maca a sua frente.

O inglês dormia tranquilamente. Ele não havia acordado nenhuma vez desde o incidente na cachoeira. De acordo com os médicos, ele despertaria quando seu corpo tivesse se recuperado do trauma. Ele teve febre nos primeiros dois dias e Sydney não saiu do hospital sequer para dormir ou se alimentar. Mas a febre começou a baixar e Sydney se viu obrigada no último dia a passar pelo hotel, onde Kate alugou quartos para os três, para tomar um banho decente e descansar um pouco.

Ela havia aproveitado aquele momento para ter uma conversa com Preston a respeito das cartas. Sydney se pegou sorrindo ao lembrar da careta abusada que Nigel havia feito em Londres para seu irmão enquanto Preston choramingava por causa do nariz. O assistente ficaria no mínimo satisfeito se visse a cara de Preston quando Sydney contou que havia descoberto quem realmente escrevera as cartas.

O irmão mais velho, que supostamente deveria proteger e zelar pela felicidade do irmão caçula, teve a capacidade de 'encontrar' as cartas quando os três se cruzaram em Londres e Nigel deixou sua mochila próxima de Preston. Sydney conseguiu espremer do inglês, ainda, que ele as enviou com o intuito de que ela reconhecesse que fora Nigel quem as escreveu.

Esplêndida desculpa. Até teria funcionado se Preston não tivesse recitado trechos das cartas para Sydney na estadia que tiveram no hotel de Londres, alegando serem de sua autoria. Ele devia estar com o olho roxo até agora.

Sydney pensou no maço de envelopes que estavam em sua bolsa. Ela olhou para o rosto do amigo deitado na cama. Este era o homem que escrevera aquelas palavras. As declarações perfeitas que a fizeram acreditar que sua busca pelo homem de sua vida havia acabado. Sydney ainda estava se acostumando à idéia de Nigel estar interessado nela de uma maneira romântica.

Pensando logicamente, ele seria o parceiro perfeito para uma aventureira como ela. Nigel era a pessoa que melhor a entendia e que a aceitava sem tentar mudá-la. Ele era seu melhor amigo e não havia alguém mais dedicado e fiel, disso Sydney não tinha qualquer dúvida.

Mas outros homens antes de Nigel também chegaram perto de conhecê-la e aceitá-la tão bem quanto ele.

Isso até ela resolver aceitar a mudança no relacionamento e estragar tudo. No final, a amizade acabava sempre destruída e não havia mais chances de continuarem qualquer envolvimento, pois eles haviam se tornado possessivos, sensíveis demais e incomodados com características na personalidade da caçadora pelas quais se diziam interessados antes.

Talvez por isso ela tenha ignorado anteriormente as intenções do amigo. De todas as pessoas que conheceu, Nigel era o mais próximo. Se os dois iniciassem um relacionamento, passaria ele a ser como os outros homens que a abandonaram por ela ser quem é?

Sydney não suportaria perder o vínculo maravilhoso com o inglês. Ela não encontraria outra pessoa para preencher o espaço que Nigel ocupava em sua vida se os dois se separassem por ela ter feito a escolha errada de aprofundar o envolvimento com o charmoso assistente. O que fazer em uma situação assim?

Kate apareceu na porta do quarto, interrompendo seus pensamentos. A agente estava com um buquê de flores nos braços. "Olá. Vim me despedir. Voltarei para a central hoje à noite."

Sydney sorriu para Kate e levantou-se da cadeira. "Obrigada por ter ficado até agora." A outra mulher percebeu os olhos inchados da historiadora. Aquela não era a primeira vez que vinha para o hospital e se deparava com Sydney nesse estado. Era como se ela só tivesse chorado nos últimos três dias. Detestava ver sua amiga desse jeito.

Kate pôs as flores sobre a pequena mesa encostada na parede ao lado da maca. "Na verdade, gostaria que me acompanhasse em um café. Poderemos conversar em um ambiente mais animado. Você está precisando!"

Sydney fez cara de quem não estava com vontade nenhuma de sair, mas Kate não lhe deu oportunidade para contestar. Aproximou-se e deu um beijo no rosto de Nigel. "Acorde logo." Ele não se moveu. Kate fez a volta na cama, pegou a bolsa da caçadora e puxou Sydney pela mão para fora do quarto.

O pequeno café que ficava na esquina próxima ao hospital era minúsculo. As duas mulheres encontraram uma mesa no canto mais reservado e sentaram-se perto da janela. Kate fez o pedido e observou Sydney por algum tempo. "Sobre o que gostaria de conversar?" perguntou a caçadora sem tirar os olhos da janela.

"Sobre Nigel."