Out On The Town

Capítulo 14 - Klaus


29 de junho de 2022

A princípio, eu não queria acreditar que Caroline realmente não tinha falado comigo nos últimos 17 anos por causa do meu pai. Quer dizer, fazia sentido, mas era muito horrível pensar nisso. O que ele poderia ter dito (ou feito) que a convenceu a não falar comigo por tanto tempo? Se ela tivesse me dito que não queria falar comigo por causa de tudo o que se passou entre nós, eu entenderia e respeitaria a decisão dela, até porque eu acredito que ela precisava e merecia fugir do drama que eu levava para a vida dela, mas quando ela basicamente disse que ele era a razão para tudo isso… eu fiquei curioso. E com raiva dele. Mas principalmente curioso.

Desde aquele dia, eu falava com Caroline praticamente o tempo todo. Certo, tinha toda a questão de diferentes fuso-horários e que nós dois precisávamos trabalhar, mas, sempre que possível, estávamos conversando. E o pior é que eu, que sempre fui tão impaciente, estava percebendo que não me importava em esperar algumas horas pela resposta dela quando mandava mensagem tarde da noite e sabia que ela não responderia porque estava dormindo e não porque estava me ignorando. Ela sempre tinha trazido o melhor de mim à tona.

Vi as últimas mensagens que tínhamos trocado e sorri. Não tinha nada de mais, ela só estava me falando sobre seu trabalho e do quanto ela gostava do que fazia e depois disse que precisava ir jantar.

Por Deus, eu estava parecendo um adolescente.

Isso tinha sido 3 horas atrás e agora eram 5 da tarde, o que queria dizer que estava perto das 10 da noite por lá. Resolvi arriscar e mandar uma mensagem para ela.

"Klaus: Oi."

Menos de 30 segundos depois, a resposta chegou.

"Caroline: Oi.

Caroline: Estava mesmo querendo falar com você.

Klaus: Posso te ligar?

Klaus: Queria te ver.

Caroline: Você sabe que não precisa pedir, né?

Klaus: Você podia estar indo dormir.

Caroline: Bom, eu estou preparada para me deitar e dormir.

Caroline: Mas não vou dormir agora.

Caroline: Por favor, me cure do meu tédio."

Sorri com as mensagens dela e fiz a ligação. Ela atendeu antes mesmo que eu pudesse repensar sobre isso.

— Oi. - eu disse, já vendo o rosto dela. Ela estava sentada na cama e claramente pronta para ir dormir. Por trás, dava para escutar o barulho de uma televisão ligada. - Sabe, se estiver com sono, pode ir dormir. Eu não tenho nada urgente para te dizer.

— Não consigo te ouvir. Só um minuto que eu vou desligar a televisão. - consegui ver e ouvir Caroline bufando, o que me deu uma vontade imensa de rir. Não lembrava até aquele momento o quanto aquela expressão boba ficava bem nela e o quanto eu tinha sentido saudades de vê-la assim, completamente sem filtros. - Por que Richard Marx tinha que decidir se aposentar? - ela disse, claramente resmungando com a televisão que estava desligando.

— A música dos infernos também está te perseguindo? - perguntei, surpreso.

Eu achava impossível que eu tivesse passado 17 anos quase sem escutar Right Here Waiting e, do nada, eu a escutasse todos os dias. Já estava começando a parecer uma brincadeira de mau gosto. Se eu passasse o dia em casa e conseguisse evitar a televisão, eu estaria bem. Porém, se eu fosse para o trabalho e passasse mais de 3 minutos na copa, a propaganda começava. O mesmo valia para supermercados, lojas em geral, as casas dos meus irmãos, recepções e salas de espera de qualquer tipo.

— SIM! - ela disse, rindo e eu não pude deixar de sorrir. - Parece que onde quer que eu vá, a propaganda da turnê está passando.

— E que é a primeira vez nesses lugares?

— Não necessariamente a primeira vez, mas ninguém sabe as datas e as cidades de cor.

— Você acredita que esses dias eu fui num petshop e o dono não sabia que a turnê ia acontecer?

— Como não? - ela parecia indignada.

— Ele não sabia. E o pior, parecia estar realmente interessado em ir.

— Eu não sei qual foi a parte mais assustadora do que você disse. Acho que nós devemos estar assistindo essa propaganda pelo resto da população humana.

— Definitivamente sim. - eu tive que sorrir.

— Agora sim - ela se acomodou melhor. - A que devo o prazer de sua chamada?

— Nada em especial. Eu só queria te ver e ouvir sua voz. - ela sorriu.

— Você queria ouvir minha voz de novo. - ela falava num tom de insinuação.

— Sim. - confirmei. - Eu estou escutando todos os dias desde segunda passada e ainda assim sinto saudades de escutá-la. - era verdade. Era quinta-feira e, desde segunda feira da semana passada, nos ligávamos todos os dias, seja só por áudio ou com vídeo. Falar com ela desse jeito não era o suficiente para mim. Nunca seria.

— Talvez você fique feliz com minhas notícias, então.

— Se for algo como o que eu estou pensando, eu acho que sim. - eu estava sorrindo e ela também.

— Eu resolvi ir passar umas férias em Mystic Falls. Nos Estados Unidos, na verdade, mas começando em Mystic Falls.

Senti meu sorriso se alargar.

— Quando você chega?

— Depois de amanhã de madrugada. - não consegui esconder minha surpresa. - Eu sei. Como sempre, eu aviso bem em cima da hora.

— Não é uma surpresa ruim. Só imaginei que teria de sofrer por antecipação por um tempo maior.

Ela riu.

— Eu estive longe por tempo o suficiente. Consegui reunir minhas férias dos últimos 2 anos, então vou ter incríveis 8 semanas de férias.

— Uau. - ela devia ser uma funcionária muito boa e, ao mesmo tempo, muito alta na hierarquia. Não era qualquer um que pedia algo desse tipo e era acatado. - E, então? O que planeja fazer quando vier para cá?

— Eu sei que vou passar pelo menos duas semanas aí, e esse é o tempo pelo qual eu já aluguei um quarto. - assenti com a cabeça. Era o mais lógico. Estávamos separados havia muito tempo e seria estranho ela ficar na minha casa. Mesmo que agora eu tivesse um quarto de hóspedes, não queria forçá-la a nada, e imaginava que ela se sentiria mais à vontade no quarto de hotel. - E depois eu ainda vou decidir. - ela deu de ombros. - Talvez vá para passar uns dias na Califórnia ou em Nova York ou só rodando por aí. Não sei ainda.

— Resumindo, você tem um itinerário livre e muito tempo.

— Exatamente. Vou inventando à medida que for andando.

— Bom saber. Uma pena que isso torne mais difícil eu te acompanhar. - disse, em tom de brincadeira.

— Ao mesmo tempo, facilita. Sabe, se eu estiver pensando em ir para algum lugar para onde você queira muito ir também, acho que posso modificar meu cronograma mais facilmente.

— Você planeja me levar mesmo? - eu estava surpreso. Sabia que ela estava voltando e que (provavelmente) queria me ver, mas não imaginava que ela estaria aberta à essa possibilidade logo de cara.

— Se você quiser ir. - ela deu de ombros. - Não me incomodaria com sua companhia. Pelo que eu me lembre, você é um bom companheiro de viagem. Sempre me deixava escolher a música e voltava para a minha estação quando via que eu estava acordando.

— Se você ficasse acordada, eu manteria na sua estação.

— Não estou reclamando, acho certo você mudar. Além disso, faz um bom tempo desde a última vez que eu dirigi do lado direito da via.

— Então você quer viajar comigo pelas minhas habilidades automobilísticas?

— Não só por isso. - ela disse, um tom terno em sua voz. - Também quero ter com quem dividir a gasolina. - revirei os olhos e ela riu. - E porque eu estou com saudade.

— Se te serve de consolo, eu também.

A ideia de nós dois sozinhos numa praia na Califórnia veio à minha mente e eu já comecei a fazer planos. Se eu falasse com Elijah, ele poderia adiantar umas duas semanas das minhas férias daqui a umas duas ou três semanas, certo? Não seria tão difícil. Apesar de ser nosso período mais movimentado por causa da preparação para a volta às aulas, tínhamos aprendido nossa lição com erros passados e quase tudo já estava pronto e, o que não estava, seria produzido de acordo com um cronograma praticamente à prova de falhas. Hayley dizia que esse era o terceiro filho dela e, com todo respeito aos meus sobrinhos, eu também considerava. Ela tinha passado meses avaliando várias variáveis e anos de históricos de vendas para desenvolver um plano de trabalho para cada semana dependendo da situação em que estivéssemos. Tínhamos implementado ele no ano passado e tudo tinha corrido às mil maravilhas pela primeira vez em toda a minha vida. Até meu pai (que tinha sido forçado a se aposentar pelos 6 filhos) admitiu que ela fez um bom trabalho.

De qualquer forma, quando eles dois voltarem das férias deles daqui a uma semana, eu vou pedir as minhas. Acredito que os dois consigam me substituir, já que eu estou fazendo o meu trabalho e os deles enquanto eles se divertem. Sim, Kol também estava ajudando, mas ele não ia sair de férias até o fim de julho, o que deixava 3 pessoas para assumir minhas responsabilidades no curto período de tempo em que eu tentava reconquistar a mulher da minha vida.

Deus do céu, ela nem tinha chegado ainda e eu já estava mudando meus planos para poder ir com ela. Era isso que queria dizer ser emocionado?

●●●

1º de julho de 2022

Eu estava ali, no portão de desembarque, esperando para ver Caroline pela primeira vez em 17 anos. Dezessete anos. Era irônico como, literalmente no mesmo dia que ela saiu da minha vida, ela agora voltava. Quando ela me falou sobre vir, eu não me ofereci para vir buscá-la no aeroporto, mas foi a primeira providência que eu tomei no dia seguinte. O aeroporto ficava a uns 40 minutos de Mystic Falls, então ela precisaria de um táxi ou algo do tipo, mas ela chegaria de madrugada e seria perigoso deixá-la nas mãos de qualquer um. Resumindo, eu vim buscá-la.

Então eu olhei para a frente e tive a sensação de estar tendo um flashback: ali estava ela, a cerca de 5 metros, como no dia em que eu a conheci. Exceto que não era ela. Os olhos eram de uma cor diferente e seu cabelo talvez fosse levemente mais escuro, além do sorriso, que era completamente diferente.

Parecia que ela estava procurando alguém, até que olhou na minha direção e piscou algumas vezes. Ela tentou disfarçar depois, mas era muito óbvio que estava olhando na minha direção. Talvez estivesse pedindo ajuda. Andei na direção dela.

— Oi, está tudo bem?

Ela pareceu se assustar um pouco.

— Sim, só estou esperando minha mãe voltar com as bagagens. - ela disse e logo concluí que estava vindo visitar e não voltando de viagem, uma vez que seu sotaque era britânico. Depois continuou, num volume mais baixo. - Eu tenho um pouco de pânico de multidões quando eu estou sozinha.

— Ah. Isso explica muita coisa.

— Explica? - ela parecia surpresa. - 90% das pessoas acham que é frescura.

— Bom, eu tenho sofrido com isso por mais de 20 anos, então eu entendo.

— Não parece que você quer sair correndo.

— Eu faço acompanhamento psicológico. Ainda tenho vontade de sair correndo, mas já consigo fingir que não.

— Eu já comecei a fazer, mas parei por um tempo. Gostaria de chegar onde você está em algum momento.

— Você vai conseguir. - sorri para a menina. - Você aceita companhia até a sua mãe chegar?

— Sim, obrigada. - passamos alguns momentos em silêncio. - Então, quem é importante a ponto de te tirar de casa no meio da madrugada de uma sexta-feira?

Ela parecia genuinamente curiosa sobre a resposta para a sua pergunta.

— Minha ex-namorada. Não nos vemos há 17 anos.

— Nossa. Ela deve ser realmente especial.

— Ela é. - sorri. - E você? O que te traz para esse lado do Atlântico?

— Minha mãe nasceu num interiorzinho por aqui. Eu nunca tinha vindo aqui, mas meu avô morreu recentemente e ela decidiu que era hora de eu conhecer meu pai.

— Você não conhece seu pai?

— Bom, minha mãe contou para ele que tinha perdido o bebê, mas era só para ela ter uma desculpa plausível para ir embora. A razão real é bem pior. - ela começou a falar mais baixo, de um jeito que só eu podia ouvir. - Meu avô ameaçou ela e meu pai de morte e estava disposto a cumprir se ela não fosse embora.

Enquanto ela falava, eu achava a história familiar. Talvez familiar até demais. Como se fosse o outro lado da minha própria história.

Fiquei de frente para ela de novo. Ela realmente parecia muito com Caroline: o formato do rosto, dos olhos, o nariz, os cabelos... mas outros aspectos nem tanto. A cor do cabelo dela era um pouco mais escura do que a de Caroline, sendo mais próxima da minha do que da dela. Os olhos dela eram verdes, assim como os meus.

— Qual o seu nome? - perguntei.

— Hope Elizabeth Forbes.

Ela não tinha nem terminado de dizer Forbes, mas não consegui me conter. Tive que abraçar minha filha. Haviam lágrimas rolando pelo meu rosto e eu não tentaria pará-las. Eu conseguia sentir um pequeno ponto molhado na minha camisa, mas eu não ligava.

— Klaus? - Caroline, que estava a 3 metros de nós, chamou, o que me distraiu e levou Hope a me soltar, só me dizendo para ir, um sorriso estampado no seu rosto.

Nos aproximamos um do outro e nos abraçamos mais forte do que jamais tínhamos nos abraçado. Haviam lágrimas correndo pelo meu rosto e outras molhando minha camisa.

— Care. - falei, quase fazendo uma oração de seu nome.

— Desculpa. - ela disse, olhando em meus olhos. - Eu devia ter te contado tudo no segundo em que eu cheguei em casa.

— Eu tenho que te pedir desculpa. Eu tinha que ter ido atrás de você. Tinha alguma coisa muito estranha naquilo tudo.

— Então, paz? - seus olhos brilhavam.

— Sim. - sorri. - Paz.

Peguei o carrinho com as malas e começamos a ir na direção do estacionamento.

— Fizeram uma boa viagem?

— Sim. - Hope respondeu. Tentei não encarar para não envergonhá-la, mas era difícil. Eu queria conhecê-la e, no momento, ouvi-la falar e estudar seu rosto era o jeito de fazer isso. - Foi bem maior do que qualquer outra viagem de avião que eu tenha feito, mas foi bem tranquila.

— É. Bem melhor do que quando fui para lá, disso pode ter certeza. Acho que nunca tinha pego tanta turbulência em um vôo. - Caroline disse.

— Bom, as viagens cruzando o Atlântico geralmente são mais turbulentas do que as outras. Acho que vocês tiveram sorte dessa vez.

Ambas sorriram para mim e fomos conversando sobre a viagem delas até chegar no carro. Coloquei as malas no carro e voltamos para Mystic Falls conversando sobre nada em particular na maior parte do tempo. Hope acabou adormecendo em algum ponto do caminho e eu e Caroline continuamos conversando baixinho. Notei ela ficar tensa enquanto passávamos pela ponte e sabia que isso era algo que nunca iria mudar. Só quando terminamos de passar foi que ela soltou a respiração.

Assim que chegamos na frente do hotel e eu parei o carro. Hope continuava dormindo no banco de trás e eu estava com pena de acordá-la, então desliguei o carro. Se dependesse de mim, elas ficariam na minha casa, mas havia muito para discutirmos antes de qualquer aproximação desse tipo, afinal já faziam 17 anos.

— Precisamos conversar antes de qualquer coisa. - Caroline falou, num tom de voz baixo.

— Tenho que concordar. O que você acha de tomarmos café de manhã antes de eu ir trabalhar? - sugeri, já sabendo que ela iria aceitar. Precisávamos mesmo conversar.

— Ok.

— Posso passar aqui para te buscar às 8? - eu chegaria mais tarde no trabalho, mas não queria que ela tivesse que acordar tão cedo por minha causa.

— Sim. Acho que Hope ainda não vai ter acordado a essa altura.

— Ok.

Ela chamou Hope e saímos do carro para tirar as malas. Depois que elas tinham feito o check-in e que estavam com tudo em ordem, eu sabia que era minha hora de ir.

— Acho que devia ir.

— Obrigada por ter nos buscado no aeroporto. - Caroline falou, já me abraçando.

— Sim, obrigada… - Hope começou, mas parecia incerta de como continuar.

— Klaus. - eu disse, mesmo que isso estivesse partindo meu coração. Ela precisa do tempo e do espaço para decidir quando e se vai me chamar de pai, mas no momento somos dois estranhos. - Klaus está bom - por enquanto.

— Ok. - ela sorriu. - Então, obrigada, Klaus. - ela me abraçou.

— Tchau. - Caroline disse.

— Boa noite. - respondi e saí do hotel.

Fui para casa e, assim que cheguei, fui recebido por Lupi. Ela já estaria dormindo a essa hora, mas devia estar me esperando chegar em casa. Me agachei e fiz carinho na cabeça dela.

— Você tem uma irmã mais velha. - eu disse a ela, depois engoli em seco. - Eu tenho uma filha de 16 anos. O nome dela é Hope e eu não sabia que ela existia até uma hora atrás.

Dizer isso em voz alta era estranho.

Subi para o quarto, tomei banho e deitei na cama, mas não consegui dormir. Minha cabeça corria de um lado para o outro.

Eu tinha vontade de ter filhos, mas isso era algo que eu tinha me conformado que não teria. Descobrir que o tempo inteiro eu tinha uma filha do outro lado do oceano era um choque, para dizer o mínimo.

Não sabia como reagir.

Sempre tinha dito que, quando fosse a minha vez, seria melhor que meus pais. Eu estaria lá. Eu levaria meus filhos para a escola todos os dias. Faria o jantar ou pediria pizza quando os amigos deles fossem dormir em casa. Acalmaria eles quando tivessem pesadelos. Ajudaria com a lição de casa, por mais que estivesse procurando no google como fazer aquilo porque já fazia muito tempo que eu tinha visto e eu não lembrava. Eu estaria lá para ver eles crescerem e ajudar a se tornar os adultos que eles estavam destinados a ser.

E agora eu tinha feito pior que meus pais. Apesar de ausentes, eles ao menos sabiam que eu existia.

Por que Caroline não tinha me contado? Eu queria entender. Ela tinha mencionado sobre meu pai ser uma das razões para ela não ter falado comigo em quase 20 anos, mas eu não imaginava que ela faria o mesmo se não tivesse perdido o bebê. No fim, não importavam as razões. Seria querer colocar a culpa do meu erro em outras pessoas.

Eu devia ter ido atrás dela.