Os olhos violetas

Capítulo 44 - Perdendo no Surfe


A praia estava deserta. Não era a mesma que eu tinha surfado com Bernardo, contudo eu não via muita diferença. Aqui perto também tem uma casinha com pranchas. E diferente da outra, essa tinha uma lojinha ao lado onde eu pude comprar um biquíni para usar. Ok, não fui eu quem pagou e sim o cara que vai perder a aposta. Logan não estava brincando quando disse que não pegaria leve. Assim que entrou na água, ele foi incrível. Qualquer onda que passava por Log, conseguia mostrar as manobras incriveis por detrás daquele sorriso irritante.

– Ah! Qual é?! Você não pretende ganhar de mim só sentada na prancha, não é? – Gritou Logan nadando até ficar bem perto. – Patricinha, achei que você soubesse surfar, que pena! Eu devia ter apostado dinheiro!

Para calar a boca do meu amigo, nadei com velocidade e consegui fazer manobras ao nível dele. Não melhor que as de Logan, mas perto. Suspirando cansada depois de algumas ondas, deitei na prancha esperando Logan terminar seu showzinho.

– Molenga. – Ri Log assim que me ver tentando boiar e voltando a me ignorar, prestando atenção só nas ondas.

Ficamos assim a tarde inteira e até pulamos o almoço. Foi a primeira vez em muito tempo em que sai de verdade com um amigo. Tenho tantas coisas anormais para pensar no momento... Como o fato de só uma fruta trancada por magia pode salvar minha mãe. Também tem que um inimigo está dormindo no corredor do meu quarto. No meio disso tudo terei que voltar a escola e começar a trabalhar, sem nem poder usar meu dom para conseguir isso. Você só terá permissão de sair quando ele for embora. Saindo pela porta ou não. Quando me do conta do que Zack disse volto a realidade

Estou deitada na areia esperando meu amigo sair da tão prometida “última onda” que ele pediu. Logan me vê apoiada nos cutuvelos e vem correndo. Seu cabelo molhado fica parecendo mais escuro e um pouco mais longo, porém seus fios lisos não chegam a cobrir a orelha. Rindo de alguma coisa, Logan joga a cabeça para trás e abre um sorriso enorme.

Chegando perto ele estica a mão para mim. – Está linda deitada ai me esperando, gata. Ainda mais com tão pouca roupa, até não pude fazer você esperar mais quando te vi ai.

– Vamos logo. - Levanto rápido, pego minha blusa e short para tampar minha falta de roupa. – Acabei de lembrar que eu não podia sair da casa do Zackary.

– Calma, Hestings. – Meu sobrenome realmente me congelou no lugar. Logan tinha o poder disso. – Eu estou morrendo de fome, vamos comer um hambúrguer com batata fritas que nem na sua primeira noite lá na casa da tia Rosa.

Lembranças daquela noite invadem minha cabeça mas um comentário de Logan fica girando na minha mente.

– Você deve ser meu primo, eu vi seu nome na porta de um dos quartos. – Eu falei alto o bastante para Logan me escutar, mas ainda estava com vergonha do garoto que estava apoiado na porta do quarto.

– Que bom. Isso significa que já sabe onde estarei caso precise de algo – Eu percebi seus olhos eram azuis claros com pintas verdes. Lindo na época, mas agora que conheço seus olhos reais, aqueles antigos são muito sem graça. - E a propósito, não sou seu primo.

Olhei para Logan e notei que ele era, realmente, diferente da tia Rosa. Não se pareciam em nada. E agora sei que não teria motivo para parecer.

– Você é o que meu, então? - perguntei

– Ainda nada - Piscou

– O que você quis dizer quando falou “ainda nada”? – As palavras saem da minha boca antes mesmo de eu concluir o pensamento.

– Juro que não disse isso agora, não. – Riu Log abrindo a porta de passageiro para mim. Após fechar, o dono dos olhos dourados deu a volta pela frente do carro e entrou em sua Picape. – Do que você está falando, Hestings?

Quando escuto meu sobrenome saindo pelos seus lábios eu suspiro lentamente e escuto minha barriga roncando. Merda.

– Relaxa! Já vamos chegar no restaurante. – Escuto o ronco do motor assim que a chave entra na ignição. – Também estou com fome. – Comenta Logan quando percebe que estou vermelha, e não é por causa de ter pego sol.

– Estou falando da minha primeira noite na casa da tia Rosa, quando você invadiu meu quarto e eu te perguntei quem era você... – Murmuro olhando pela janela para as ondas quebrando na areia.

Fico quieta esperando sua resposta mas não chego a recebe-la e fico em dúvida de falei em voz alta ou só em minha mente. Logan estica o braço para o rádio e a música Listen to your heart de Roxette inunda o carro. Por alguns segundos ouvimos a música até o clima ficar desconfortável de novo.

‘Eu não sei para onde você está indo

E não sei por quê,

Mas ouça meu coração antes que você diga-lhe adeus

Às vezes você se pergunta se essa luta vale a pena,

Os momentos preciosos estão todos perdidos na maré, sim

Eles foram arrastados embora e nada é o que parece,

A sensação de que pertencem aos seus sonhos.’

Quando terminou o refrão e continuou a letra Logan bateu em algumas teclas do rádio para mudar de estação. Indeciso, ele mudou três vezes até finalmente parar e abaixar a mão para sua própria coxa.

Estava terminando uma melodia forte com misturas de bateria, guitarra e consegui até ouvir violino. Ninguém mais ouve violino hoje em dia nesses tipos de música. Depois de algumas palavras outra música começou. Era A thousand years de Christiana Perri

O coração acelerado

Cores e promessas

Como ser corajoso

Como posso amar quando tenho medo de me apaixonar’

Instintivamente olho para Logan que está olhando para frente, contudo seus músculos estão começando a ficar tensos. Eu definitivamente amo essa música, mas escutá-la agora não está sendo uma boa idéia. Estico a mão para trocar de estação rádio ao mesmo tempo que Log e quando nos tocamos minha mão congela no ar, já a dele volta para cima da perna como se tivesse levado um choque. E logo depois seu braço inteiro virasse pedra.

Sem nos mexer continuamos escutando a música até o carro parar e finalmente sairmos do carro. Eu já estava ficando claustrofóbica até Log abrir a porta do carrona para irmos ao restaurante. Não nos falamos desde meu murmuro e só voltamos a nos olhar quando sentamos frente a frente. O garçom Gary, ou Grey, não consegui escutar direito pois ele falava muito rápido, perguntou o que queriamos e Logan pediu por nós dois.

Chegou depois de quinze minutos o pedido e era o mesmo hambúrguer da primeira noite. Era quase completamente simples, além do pão, só tinha três hambúrgues bem suculentos e queijo prato. Apesar de comum e provavelmente teria em qualquer fast food, estava delicioso. E foi o que comentei.

– Eu sei! – Logan volta com seu humor sorrindo. – É o melhor hambúrguer da área!

– X-burguer para ser mais exata. – Comento com metade dele na boca o que faz Log rir mais ainda. – Como o garçom sabia seu nome?

– Venho muito aqui.

– Trás todos seus encontros aqui? Nossa! Pensei que você tivesse alguma classe. – Rio e depois toco minha testa dramaticamente. – Quase me esqueci que você é um lutador e um surfistinha!

Log vira o rosto com um sorriso de canto de boca, se apoia em uma das suas mãos e continua a me encarar. Logan de vez enquando se ajeita na cadeira e morde um pedaço da sua refeição. Seus olhar me paraliza em alguns momentos em que percebo que ele não para de me olhar.

– O que foi? – Pergunto depois de passar a mão no cabelo ainda molhado. – Vai ficar olhando o tempo inteiro? Acho que temos que fazer um contrato para você começar a agir certo, né?

– E o que estaria escrito? – Ri Log fazendo com que eu perceba o que antes não havia visto, uma covinha no canto esquerdo. – Preciso saber antes de assinar. – Dá de ombros.

– Não precisa, basta assinar, depois você descobre o que está lá. – Sorrio um pouco pensando no assunto.

O garoto joga as mãos para cima em desespero. Consegue atrair minha atenção e acabo prendendo meus olhos nos seus. – Não! Imagina se você me fizer ter que te trazer para mais encontros?

Merda. Eu realmente tinha dito encontro? Olho para baixo bem sem graça. Dou uma olhada em volta e percebo que só há alguns garçons e garçonetes conversando perto da cozinha. E cá estamos nós, sozinhos em silêncio. O que tenho que falar para minha vergonha passar?

– Onde você morava antes disso? – Faço um movimento entre nós dois e percebo seus olhos fechando um pouco como se fizesse esforço para entender. – Antes de ir para a casa de Rosários?

Logan se cala de novo, pela décima vez hoje. Respira fundo e demora a se decidir se irá falar algo ou não. – Uma das poucas regras era não dizer de onde viemos, lembra? – Sei que sua pergunta é retórica mas concordo com a cabeça. – Não venha sentir pena de mim ou algo assim. – Avisou-me. – Apesar de saber que é exatamente isso que vai fazer. – Susurrou e me lembrei.

Logan havia me dito, a muito tempo, que além do poder da terra ele também ver coisas. Não é vidente como a avó da tia rosa, mas ver coisas.

– O que você vê? Quando surgiram seus poderes? As pessoas tinham medo de você por causa de seus olhos? E seus pais? Onde estão? - Por que você mora com a tia rosa? De onde você veio? Quais são seus planos para quando as coisas se tranquilizarem?– Você queria ter nascido normal? Sempre soube que era diferente? Quantos outros Olhos você conheceu antes de conhecer a mim? O que você faz quando...

– Cala a boa Suzanna! – Logan me interrompe bem sério, coçando a cabeça. – Você fala muito. E pensa muito. Está me dando dor de cabeça. – Respirando fundo ele se encosta na cadeira. – Vou tentar te responder, ok? - Concordo com a cabeça – Mas fica quieta.