Os olhos violetas

Capítulo 15 - Duas vidas


Então tia Rosa estava de volta finalmente, porém por consequência da volta, Logan se foi para junto de alguns de seu clã. Pelo menos lá ele estará cheio dos amigos videntes, ou quase. Passei pelo quarto com a placa Logan. A porta de madeira era tão diferente da minha. Todas as portas eram diferentes afinal, aquela casa era estranha. Mas a ida de Logan mesmo sendo a três dias atrás eu ainda sentia falta da sua ignorância e idiotice. Ele era um pouco cabeça dura. Mas sei lá, sentia falta da sua “proteção”. Era como meu irmão mais velho que eu nunca tive, pensei.

Nestes três dias fiquei em casa ouvindo das histórias da Sra. Rosa. Estudei um pouco meu dom e cada vez mais me sentia mal. Meio tonta. Me senti realmente estranha, até vomitando as vezes. Entro no meu quarto depois da janta. Eu dividia meus pensamentos entre Logan e Bernardo, entre Bernardo e Logan. O Be até fazia “sentido” mas o Logan não. Os dois diziam a mesma coisa, mas é claro, com afeto diferente, que eu escrevia bem, boas histórias, e o jeito que as escrevia. As palavras ficavam vivas.

Talvez, eles estejam certos. Talvez, haja algum problema comigo. Eu só não consigo ver como um mundo, que faz coisas maravilhosas, possa ser mau. Olhe isso, pensei olhando para meu quarto no fundo do oceano. Isso não é arrumado? Qualquer um não pensaria que minha coleção está completa? Qualquer um não pensaria que eu sou a garota que tem tudo?

Olhe esse tesouro, olhei para meu quarto e minha vista, tesouros incalculáveis, pensei. Quantas maravilhas uma caverna pode conter? Olhando aqui ao redor dá para pensar “Claro, ela tem tudo”.

O que eu daria, Se pudesse viver fora dessas águas? O que eu pagaria para passar um dia quente na areia? Aposto que na terra eles entendem, aposto que eles não repreendem suas filhas,

Jovens mulheres brilhantes, cansadas de nadar. Prontas para ficar em pé. Porque não? Seria tão ruim ir andar na areia?

Completamente sozinha, aqui estou eu, não sei o que eu estou procurando. Agora que você é apenas um amigo. Eu não posso te chamar e te perguntar, e a partir da primeira vez que eu vi seu rosto. Eu sabia que estava satisfeita. Você estava falando tão doce, eu tinha que provar. Eu desejo que eu nunca ter tentado.

Eu estava escrevendo sobre a pequena sereia. A história da vida dela é claro. Eu estava fazendo o novo trabalho de português. “Reescrever um conto”. Eu tinha que escolher entre vinte contos um, para eu reescrever e foi esse. De todos os textos o professor irá escolher três para virarem peça. Sorri ao pensar em como fariam se fosse o fundo do mar, ainda mais do jeito que minha turma é “organizada”.

Parei de olhar para a tela do meu computador e olhei agora para o MEU quarto. Ele não tinha nada demais, um simples quarto. OK, era bem grande, porém não deixava de ser simples. A única coisa que me diferenciava das garotas da escola, Grace, Camilla, Isa, era que elas não tem esse dom para atormenta-las, pensei.

Quando acordei já estava quase na hora da escola e a tia Rosa falou para não faltarmos mais. Pelo menos não seguidas vezes. Acordei Rob e Sofi, passei pelo o quarto de Logan e faltava segundos para não ir acorda-lo também.

– Ele não está ai, Susanna – Sofia me falou de olhos entre abertos. – Esqueceu? Agora é você quem dirige o carro dele.

Tinha me esquecido do ocorrido. Quis me esquecer. Com tanta coisa na cabeça. O destino podia escolher apenas uma das minhas duas vidas como real, ou a escolar ou a sobrenatural. Não é possível ser as duas em uma só, reclamei para mim mesma.

Era o dia da apresentação do texto, pensei ao passar pela porta do meu colégio e lembrando qual seria a primeira aula. Português. Me sentei sozinha, por algum motivo o Bernardo faltou, ou pelo menos não estava ali. Acho que ele notou que eu ando o ignorando um pouco, pensei.

– Senhor Cand – Disse o professor Terry Fired – O senhor é o primeiro, está pronto? – Olhei para o desajeitado e preguiçoso garoto. Ele estava no fundo da classe quase dormindo. Devia desejar que o Sr. Fired fosse para longe, pensei.

– Claro, Fired – O garoto foi até a frente da sala e se sentou na mesa do professou. – Como todos sabem sou fã do Nickelback. – Ele fez um som como se estivesse respirando menos. - Oh, parece um outro dia de Bob Marley – Ele fez uma voz de fumante - O bater do sino como um apito de um trem. E agora nós estamos juntos esta tarde. Nós apanhamos ervas no quintal, a quatro pés de altura. Cheech e Chong provavelmente iriam fumar todas. Então, estou no sofá essa tarde. Então, eu estou no sofá esta tarde. Garrafas de cerveja derrubadas no chão da cozinha. Se nós as recolhermos, nós podemos comprar mais. Então não acredito que nós vamos sair esta tarde...

– Senhor Cand – O professor interferiu na história. – Não pedi para que me trouxesse uma musica do seu cantor favorito.

– Não pedi para sua aula ser um saco – O garoto respondeu.

– Não aturo que fale comigo dessa forma, vá para a direção – Ele apontou para a porta, para aonde o garoto foi com elegância. – Han... A próxima da lista é a Srta. Hestings. Por favor, que seja uma história e não uma musica já inventada.

Li a minha história, cortando os pedaços que eram da musica da Carly Rae e continuei a lê-la. Descrevi mais do que estava escrito. Em alguns momentos fechei os olhos para imaginar a cena. Quando os abri todos a minha volta estavam de olhos fechados, inclusive o professor. Contei a história inteira, eram apenas cinco páginas. Demorei uns dez minutos para completa-la.

– Não somos só amantes, porém não somos apenas mais que amigos. Coloque nossa chama em cada palavra que você já disse. Case-se comigo, dizia o príncipe. Os lindos cachos vermelhos de Ariel voavam. Não, ela respondeu – Eu sorri e fechei o caderno.

Em minutos, ou segundos, meus colegas foram abrindo os olhos. E aparentemente todos estavam impressionados com a história, mas também irritados.

– Você não pode acabar com a história assim – Gritou uma garota de voz fina no fundo da sala e meu sorriso sumiu.

– A princesa fica com o príncipe, é a regra – Disse outra na terceira cadeira.

Olhei para o professor e ele estava me encarando com uma perna apoiada na cadeira e com o rosto nas mãos.

– Então, professor...

– Sente-se Hestings, mas antes coloque o seu trabalho na minha mesa. – Seu olhar era curioso e ao mesmo tempo sem nenhuma audácia.

O professor pediu aos outros professores hoje ser o dia apenas da matéria dele, para todos apresentarmos o trabalho. A cada dois minutos que falavam eu olhava para o Sr. Fired. Seu olhar estava me dando medo.

– Alo? – Atendi o telefone na hora do almoço assim que sai da aula.

– Alo... – Disse uma voz triste, e reconhecida – finalmente me atendeu – MERDA, EU DEVIA TER LIDO DE QUEM ERA!

– Oi, Bernardo. – Eu falei olhando em volta.

– Precisamos conversar...

– Um minuto – Olhei para o meu relógio. – Fala

– Por aqui não – Sua voz era fraca.

– O que quer então?

– Podemos nos encontrar na praia? – Eu senti a ardência do laço. – Agora?

– Sim – Tremi ao dizer e desliguei o telefone.

Fui a pé até a praia logo após dar a chave do carro para Isa e pedir para ela levar tanto Rob tanto Sofia para casa. A cada passo que dei me senti mais próxima dele. A cada passo entendia o motivo de estar tão mal esses dias que se passaram.

Olhei para o mar não o vi. Olhei para a areia, depois de volta pro mar, depois de volta para areia. Em certo momento o avistei. Ele estava com uma cara de acabado, como se estivesse sem comer a dias

– Olá, sei que já faz um tempo – Ele falou se aproximando.

– Faz apenas três dias – Digo

– Eu me pergunto onde você está e se você pensa em mim.

– Você parece mal... – Olhei para suas olheiras. – Anda comendo?

– Às vezes, porque você está sempre na minha mente... Você sabe que eu tinha uma vida difícil...Tentando esquecer você agora piora, mas quanto mais eu olho em volta. – Ele apontou para o mar. - Mais eu percebo – Ele colocou a mão no meu rosto e nós dois sentimos a ardência. - Você é tudo que eu estou procurando.

– Eu já te expliquei o motivo disso tudo... – Eu disse tentando sair de perto, contudo, parecia que eu não dei nem sequer um passo.

– Não fale que não vamos nos ver – Be falou rígido – Eu não sei porque você é assim. O motivo do laço, porém se não fosse para acontecer não aconteceria, certo?

– Você é quem me prende a este mundo – Pensei alto.

– Exatamente – Ele sorriu e segurou minha mão sentindo comigo a dor do laço – Você é quem me prende aqui

– Não me entendeu – Soltei minha mão. Que merda, porque Deus tinha que me responder que p` ertenço aos dois mundos me ligando a um humano normal. Coitado dele. – Você realmente me prende aqui...

– Su, eu te am...

– Não fala isso – Senti um choque sem ao menos toca-lo. Mas ele se calou – Temos que parar com isso. É você que me prende no mundo normal. Sem você sentindo o que sente por mim eu não estaria aqui.

– Eu também não estaria – Ele sorriu fraco

– Não está me entendendo – Quase surtei – Bosta, não sei o que fazer...

– O que te faz tão bonita é que você não sabe como você é linda para mim. – Be sorriu me puxando para a areia, sentando comigo - Você não está tentando ser perfeita. Ninguém é perfeito mas você é para mim. Você tenta tirar o meu fôlego, sem o menor esforço. Sente as palavras que eu não digo, não sente? – Eu senti minha pele queimar

– Para, Be... Isso é sádico – Informei-o

– Eu queria de alguma forma poder dizê-las agora... Eu poderia dizê-las agora. – Ele falou a segunda frase com mais vontade

– Certo, Bernardo, CHEGA – Falei no meu tom “especial” – VOCÊ VAI ENTENDER O QUANTO É PERIGOSO VIVER LAÇADO COMIGO. VOCÊ VAI CONSEGUIR VER COMO EU, COMO SE FOSSE DE UM CLÃ, MESMO CONTINUANDO SENDO QUEM É. – Meu deus, ele me deixa louca.

– Calma – Ele disse – Não grita comigo assim - Ele pediu – Eu entenderei se me explicar o motivo de ser perigoso.

– Olhe para o mar, você está vendo igual a antes – Assim que eu disse, olhei também, tantas cores, mais do que eu via antes de saber sobre os dons, apesar de sempre ver mais que os normais.

– Estão tão mais... Perfeitas – Ele disse baixo – Me explica essa merda – Ele falou

Depois de alguns minutos explicado tudo, exatamente tudo para ele. Bernardo entendeu o perigo que está em torno de mim. E de meus amigos. E que era melhor para a vida dele de ele se afastasse. E para completar eu contei para ele sobre o meu clã ser basicamente só eu.

– Então só existe você do clã Ornatos Violetas? – Me perguntou e eu fiz que sim com a cabeça.

– ME CONTE TUDO DE VOCÊ QUE EU NÃO SAIBA – Pedi com meu dom.

– Tudo? – Ele me perguntou com medo e eu afirmei.

Depois de ouvir seus micos durante as aulas, suas apostas idiotas com os amigos, suas festas bobas, as garotas que beijou ele finalmente falou algo que eu não esperava.

– Ah, e também sou clã dos olhos de fogo, eles cuidaram de mim a vida inteira, recentemente eu fiz Harry ser um dos nossos. Meus amigos do clã me disseram que só os que tem os dons como o meu, conseguem. – Ele falou com tanta naturalidade que não parecia que éramos inimigos.- O que eu estou fazendo aqui acorrentado a você, linda Susanna?

“É que eu me envolvi demais no meu trabalho. – Ele coçou a cabeça. – Eu tinha que convencer-te a vir comigo para meu clã. Mas acabou que eu não sabia exatamente quem era você. Estudei o Logan por um tempo, então já sabia sobre ele. – Ele deitou na areia – Eu não tinha que faze-lo vir comigo, eu tinha que aprender com ele o dom da terra, mas o “menininho” não sabia nem que tinha o dom.”

“Você foi a continuidade do trabalho, mas ai para te tirar de perto do mundano Kevin acabei me empolgando e te beijando. Sabe... esse é o jeito mais simples de convencer a uma garota sobre quase tudo. Mas acabou que bem, realmente você é especial e eu não estou entendendo porque estou contando essas coisas a você – Ele me olhou.”

– Só que agora só penso em como podemos fazer sentido, quando estamos sozinhos. É como se você fosse a outra metade de mim, eu me sinto incompleto, eu deveria saber... Nada no mundo se compara aos sentimentos que nós compartilhamos... É tão injusto – Ele disse e se calou. sentou-se novamente me encarando. – Que porra foi essa que fez comigo?

– Qual o seu dom? – Perguntei e por causa de ter usado o meu dom anteriormente eu nem precisei repetir.

– Eu tenho alguns dons que não sei como nomeá-los. Um deles é fazer alguém sentir, sentimento mesmo, o que não sentia. Outro é minha habilidade de convencer alguém.

– Já usou ou tentou comigo antes? – Perguntei e ele foi obrigado a responder.

– Já – Olhei-o – Já tentei fazer no primeiro dia de aula, mas naquele momento notei o quanto a sua mente é trancada. Desfaz isso que fez em mim, por favor.

– Não – Eu disse me levantando – O que pretende fazer agora?

– Meu coração martela... Meus pensamentos voam de te carregar até meu superior ou ficar aqui na praia te beijando e esquecer do resto.

– E o que vai fazer? – Ele se levantou com a minha pergunta.

– Quero que faça eu parar de te amar – Quando ele tocou no assunto amor ele gritou de dor. - Não é você, A culpa é toda minha. Eu estava correndo de mim mesmo, estava atormentado faz anos com essa vida no clã. Porque eu não poderia dizer Quão profundo que nós seríamos? Eu estava com medo que fosse o destino... Mas dói pra caramba – Ele colocou a mão no ombro. - Espero que não seja tarde demais, só uma virada do destino.

– Tem um jeito de acabar com você – Eu falei

– Então acaba – Ele gritou – Não, não acabe... Sim acabe.

– Já sei, você está em duvida, certo? – O perguntei – O jeito é acabar com você. Achei que bastava você beijar outra garota, mas você é de um clã, caralho! – Exclamei – Devia ter me contado!

– Você disse que há um jeito – Ele voltou no assunto

– E há. Tenho que rasgar o meu símbolo de você – Olhei para o ombro dele. – Mas isso tiraria tudo sobre os clãs de você. Você não se lembraria de nada. Há quanto tempo você é um “Olho de fogo”?

– Desde os três anos mais ou menos.

– Mas os seus olhos, são tão normais...

– É apenas mais um dos meus dons.

– Agora você sabe tudo de mim e eu de você... – Olhei-o, parecia a única coisa que eu sabia fazer – O que vai fazer?

Ele me encarava.

– O que tiver que ser feito – Seus olhos brilharam fogo depois voltou para o normal – Sairei do clã dos olhos de fogo. E irei te proteger, deles, com a minha vida.

– Resumindo, FUDEU! – Olhei para cara dele.

– Exato – Bernardo estava tão lindo com o entardecer. Estávamos a caminho do seu carro.

– Como você parará de ser um deles? – Perguntei sem otimismo.

Ele levantou a blusa e a tirou virando-se de costas para mim. Suas costas eram impecáveis. Mas em poucos segundos um símbolo estranho, apareceu nelas. Toquei-o de reflexo.

– Tenho que remover essa tatuagem – Ele disse com dor.

– E como fazemos isso?

– É preciso congela-la. E queima-la ao mesmo tempo... Foi o que me disseram... Poucos foram aqueles que sobreviveram a isso. Não tenho certeza se algum sobreviveu realmente.

– Eu sei como fazer isso. – Pensei alto

– Mas sabe que se eu acabar morrendo você sentirá as mesmas dores que eu, certo? – Ele me olhou.

– Oie? – Falei achando graça.

– Olhe – Ele pegou uma das pedras do chão e passou forte em seu braço, em poucos segundos o meu estava rasgado e ardendo.

– Seu doente! Era só dizer, eu acreditaria - Eu disse tentando estancar o sangue. – Como você descobriu sobre isso?

– Você pisou em uma concha agora a pouco não foi? Foi esse o motivo de se desequilibrar, certo? – Be tinha um enorme ego, percebi, e era incrivelmente bonito também. Me perguntava o que agora me prendia ao mundo mundano.

– Foi – Respondi pacientemente. Eu conseguia sentir a respiração dele perto de mim.

– É eu sei, eu senti. – Ele abriu a porta do carro para mim. O resto da luz reluzia no carro. Eu me peguei encarando o homem que estava comigo.

– O que fará agora? – Perguntei

– Tem alguém que sabe de tudo com vocês, certo? – Ele deu a volta no carro e se sentou ao meu lado – Quem era mesmo?

– Minha tia... Ela deve querer te matar se você for lá. – Eu ri. E esperei ele dar a partida no carro. Eu não conhecia bem a tia Rosa... Não tinha lá muita certeza do que aconteceria. Tia Rosa as vezes me assustava. Mas ela falava muito estranho sobre os olhos de fogo, como se houvesse algo por trás de tudo, e que nem mesmo ela sabia.

– Espero que esteja errada – Ele disse sério – Você é muito nova para morrer.