O santuário dos cavaleiros templários

A reunião com os amigos se deu no centro de Fortaleza. Eric estava aguardando junto com Nathlália e Isabel quando Oliver chegou. O grupo já sabia que Oliver tinha se metido em confusão, mas ao contrario do que Oliver pensou, não passaram qualquer tipo de sermão.

– Irmão, você me deixou preocupado. Quer dizer que seu pai é o boss level o tempo todo? – Eric perguntou incrédulo enquanto que Isabel mantinha uma pose mais contida alguns passos atrás. Marmarino havia assumido a aparência de uma moto estradeira cor branca com detalhes marmorizados. – Logo Lucas e Jade vão chegar. Cara, temos notícias excelentes.

– Temos a chave. Parece que a menina Isabel é a tal chave. O meu pai falou que existe um guardião. Levamos Isabel até perto da 10ª região militar naquele mesmo momento ela entrou em transe e apontou para uma localização no mapa, não muito longe daqui. É um shopping, chamado Del Passeo. – Nathália acariciava de leve a sua pulseira de bronze enquanto falava. Era o primeiro presente que recebera diretamente do pai desde sempre e estava preocupada com o que poderia ser. Normalmente Ares dá presentes menos sutis como espadas e lanças. Um bracelete liso, feito de puro bronze celestial parecia algo que não se encaixava na descrição.

– Ao que parece existe um templo dos cavaleiros templários no shopping. Uma igreja no seu subterrâneo. Ela abre muito raramente, mas é o lugar exato que Isabel apontou. – Eric falava num misto de excitação e preocupação – com certeza ali vamos achar o guardião e a pista para o enigma.

Não demorou muito e Jade e Lucas chegaram. Jade estava bronzeadíssima como se tivesse passado ao dia tomando sol. E um detalhe que atiçou a curiosidade e a imaginação de Eric: sem marcas de biquíni. Lucas vinha ao seu lado sofrendo horrivelmente com o calor que fazia naquele momento. Ele parecia que tinha sido molhado por um balde de suor. Com todos juntos pegaram um ônibus para o tal shopping. Andar de carro na cidade poderia ser bem complicado.

O Del Passeo é um shopping bem bonito, com ares de modernidade, todos os andares servidos por escadas rolantes e ar condicionado bombando. Lojas, aliás era o que não faltava em seus pavimentos. Mesmo num dia de meio de semana, na parte da tarde o shopping estava lotado.

A entrada do templo ficava no subsolo, perto da entrada do banheiro masculinho. Era uma fachada imponente, mas de pequena estatura, toda decorada com imagens do que pareciam ser sábios entalhados em bronze, cercados por outros desenhos e letras em vários idiomas.

– Peixes – comentou Isabel enquanto olhava a porta com deslumbre – os peixes foram um dos primeiros símbolos da cristandade. Os cristãos vivam se escondendo das perseguições religiosas e pra saber se uma pessoa era ou não cristão eles desenhavam meio peixe no chão se a pessoa fosse cristã completava o desenho.

– Como um aperto de mão secreto? – perguntou Lucas, enquanto devorava seu terceiro sorvete de casquinha desde que chegara ao shopping.

– Mais ou menos isso. – disse Isabel segurando nas maçanetas de bronze celestial e tentando abrir – Hmm... está fechada. Eric?

Eric deu um passo a frente esfregando as mãos. Nenhuma porta e fechadura tinha sido páreo para o seu aspecto de Hermes. Até agora. Ele segurou as maçanetas com vontade, puxou e empurrou, fazendo um movimento de vai e vem até finalmente largou as duas. A porta estava ainda fechada.

– Não entendo... – disse ele – eu senti várias vezes como se elas fossem abrir, mas algo as fechava em seguida.

– É um enigma. – disse Oliver – deve ter alguma coisa a ver com as pistas que temos até agora. Viemos para Fortaleza, e de lá fomos até a Fortaleza de Nossa Senhora e agora estamos aqui. O que estas coisas têm em comum? E quem é aquele barbudo no alto da porta? Ele se parece com Hefesto, mas eu duvido que os cavaleiros templários colocassem um deus da mitologia grega entre seus símbolos.

– Tudo o que visitamos até agora tem a ver com pedras. – Eric divagou – Pedras fazem Fortalezas, criptas e prisões... prisões que podem deter até mesmo um deus. Mas o que pedras têm a ver com cavaleiros templários e a religião cristã?

O silêncio desconfortável tomou conta do grupo. Uma pergunta daquelas deixava espaço até para que o barulho do shopping ficasse distante. Oliver sacou seu tablet e começou a buscar alguma coisa. Eric tentou mais duas vezes a porta e o resultado foi sempre o mesmo fracasso.

– Teria alguma coisa a ver com o nome? Quem sabe alguma palavra-chave ou secreta. Como se fosse algo como um abre-te sésamo. – Jade falou olhando a porta bem de perto – Vi uma vez num filme que os entalhes da porta eram na verdade botões.

– Pedro significa “rochedo”, rocha. Vem do aramaico, a língua que se falava nos tempos de Cristo. Simão era discípulo de Cristo, mas quando este ascendeu aos céus disse a Simão “sobre esta pedra erguerás a minha igreja” daí Simão adotou o nome de Pedro. – as palavras de Isabel soavam distantes e mecânicas como se ela estivesse recitando algo que passou horas decorando – mas não existem letras em aramaico nesta porta. Mas estas letras aqui são estão em grego.

Escondidas entre os afrescos de peixes e os rostos dos querubins dava para ver com algum cuidado as letras do alfabeto grego. As letras começavam no lado direito e avançavam por toda extremidade esquerda da porta.

– Tente Pedro – sugeriu Nathália tomada por um súbito interesse – quem sabe?

Isabel passou os dedos pelas letras e percebeu que elas se moviam ao seu toque, como se fossem botões. O mesmo não aconteceu quando Jade fez o mesmo. Estava mais que claro agora que Isabel era mesmo a chave. Ela digitou “Pedro” em grego. Nada. Depois tentou “pedra”. Também sem resultado. Depois tentou rochedo. Logo depois ouviram o som de uma tranca se abrindo. A porta estava destrancada. Eric empurrou as portas e elas deram acesso a um longo corredor iluminado por tochas.

– Então a dica era esse barbudo, certo? – Eric deu uma cotoveladinha em Jade, que quase esquivou do amigo.

Por dentro o corredor não se parecia com uma igreja templária. Eles avançaram juntos pelo túnel. A medida que iam avançando o ar ia ficando mais denso e pesado. Lucas olhou para trás e viu que as tochas se apagavam a medida que iam avançando. Não conseguia ver a porta de entrada e os sons do shopping haviam ficado mudos. A sensação de que estava cada vez mais longe de qualquer lugar conhecido tomou sua mente.

Não souberam por quanto tempo caminharam. Nathália julgou alguns minutos, mas Oliver pensou que tinham andado por horas. Jade manteve-se calada o tempo todo. Ela tinha visto algo na porta que havia calado a sua boca. Algo que secara sua garganta. Ela já tinha visto a imagem do homem barbudo antes. Era um dos disfarces de Apolo. Mas um disfarce que ele não usava fazia muito tempo.

Por fim o corredor morreu numa ampla sala arredondada. As paredes eram de rocha polida como se alguém tivesse cavado todo o cômodo na rocha nua e depois tivesse dado um acabamento personalizado. Existiam afrescos na rocha por todos os lados. Muitos mostravam imagens de antigos feitos mitológicos como algumas cenas dos doze trabalhos de Hércules, a história de Prometeu e a lenda de Eco. Nos cantos mais tochas ardiam e no centro do aposento, virado de costas para os jovens semi-deuses estava uma figura de armadura. Parecia uma armadura templária recém saída do jogo assassins creed, dessas que se usava na terceira cruzada. Ela era prateada e coberta de marcas de batalha.

A figura se ergueu de súbito e virou para os meninos. Estava sem o elmo revelando um rosto negro, com a cabeça forrada de espesso cabelo crespo, tão prateado quanto a armadura que usava. Ele trazia na cintura uma espada longa. A sua capa, logo percebeu Isabel, tinha o mesmo brasão de armas de sua família.

– Bem vindos semideuses e semideusas. – disse ele em tom amigável, porém firme. – Bem vindos ao templo dos cavaleiros templários, capítulo XXXIV. Eu sou Gaufred de Saint-Omer, guardião deste templo. - ele tocou o cabo da espada e encarou Nathália por um segundo - si vis pacem para bellum, irmã.

Todos olharam estranho para Nathália, mas contendo o desconforto que as palavras lhe causaram ela deu um passo a frente e tocou no cabo da espada romana que carregava e respondeu a saudação em bom português: se queres a paz prepara-te para a guerra.

– Eu sou o primeiro grão mestre da ordem dos templários e fui recrutado por Ares em pessoa para ser o guardião desse primeiro enigma. Vocês são os primeiros visitantes deste templo desde tempos imemoriais – ele olhou com certo desprezo para uma pilha de armaduras e ossos que jazia empoeirada num canto. Ao que parece Isabel e seus amigos eram os primeiros visitantes em muito tempo, mas invasores eram razoavelmente freqüentes. – se vocês estão aqui é porque buscam o pergaminho áureo.

– É isso mesmo, nobre guardião. Eu sou a chave. Agora se puder nos dar a pista que queremos podemos ir embora o quanto antes. – disse Isabel num tom de súplica.

– Percebo a verdade em suas palavras filha de Hécate, mas não é assim tão fácil. Você e seus guardiões devem vencer três provas. Se ao final das três forem bem-sucedidos eu entregarei o que sei da localização do pergaminho.

– E se falharmos? – Eric arrependeu-se da pergunta quase imediatamente depois de proferi-la. O guardião se limitou a apontar com os olhos para a mesma pilha de ossos e armaduras no canto.

– Ok, e quais são essas provas? – quis saber Oliver, dando um passo a frente.

– São três: a prova de combate, a prova da esperteza e a prova da coragem. A primeira delas é a prova do combate. Um de vocês deve se oferecer para combater com um desafio terrível. Uma luta de vida ou morte e sem nenhum limite de técnica ou poder. A segunda prova colocará vocês contra um desafio de lógica, digna do mais intelectual dos filhos de Atena. A terceira prova é a da coragem: é nela que veremos de verdade do que cada um de vocês é feito.

Antes que alguém pudesse dizer alguma coisa Nath já tinha dado um passo na direção cavaleiro, espada em guarda. Ela andava de forma decidida e até certo ponto ameaçadora. Foi até o centro do salão, bem perto do cavaleiro. Um pouco mais perto e poderiam sentir o cheiro um do outro.

– Eu aceito o seu desafio de combate – disse ela em tom firme – me dê o seu melhor.

O cavaleiro sorriu satisfeito e as paredes do templo forma se desmanchando, tijolo por tijolo, dando origem a uma arena no estilo dos gladiadores romanos. Por trás de Gaufred três vultos enrolados em mantos tão escuros quanto a noite aparecerem. O primeiro deles portava uma longa espada, o segundo um tridente e uma rede e o terceiro um enorme machado de duas mãos.

– Que se inicie a batalha!