Os filhos do tigre

Novidades - Anik


Todos no escritório estavam muito apreensivos com a saída de Mahish. Robert estava tão nervoso, que eu temi por sua saúde. Ele se desesperou ao se dar conta de que a empresa havia investido muito dinheiro em um negócio que agora estava ameaçado.

— Nós já iniciamos a produção dos Skimers. É um projeto caríssimo e todo o dinheiro investido até agora era da empresa. Sem o dinheiro de Mahish, teremos que colocar mais do nosso próprio capital neste projeto. E o pior é que Mahish é quem iria vender este produto. Nós não temos comprador.

— Não se preocupem com isso. — Disse Sohan com segurança. — Eu tenho compradores para o Skimmer.

Todos os olhares voltaram-se surpresos para Sohan.

— Quando eu tomei a decisão de votar contra a proposta de Mahish, eu já sabia que ele iria tirar o seu dinheiro da empresa. Eu também sabia que o projeto mais caro até agora, e que mais dependia da parceria com Mahish, era o do Skimmer. O senhor Sayam é mesmo um homem misterioso, mas, ainda sim, eu consegui descobrir algumas coisas sobre ele e seus negócios. Eu sabia que a primeira remessa de Skimmers seria enviada para a Noruega, então, descobri um dos parceiros comerciais de Mahish naquele pais e fiz contato com eles. Também fiz contatos com outras empresas náuticas e pelo menos uma, no Japão, já garantiu a compra de alguns exemplares. Não se preocupem, o projeto Skimmer está a salvo.

Kamala abriu um grande sorriso, orgulhosa. Ela não conseguia disfarçar o que estava sentindo naquele momento, pelo menos para mim, que a conhecia muito bem. Robert também pareceu ter percebido. Ele olhou para minha irmã, então para Sohan, que sorria para ela, sem desviar os olhos para qualquer outra direção. Robert parecia abatido e triste.

Depois que os membros da diretoria deixaram a sala, aproximei-me de Robert.

— Não sinta-se mal Robert. Você fez um grande trabalho nesta empresa. O fato de querermos manter as tradições nas Indústrias Rajaram não desmerecem tudo o que você fez aqui.

Eu estiquei o braço para cumprimentá-lo. Robert olhou para a minha mão, então aceitou meu cumprimento.

— Eu sou muito grato à sua família pela oportunidade. Sempre quis fazer parte desta empresa e o tempo em que estive aqui foi de grande aprendizado.

Sohan ouviu e aproximou-se:

— O que você quer dizer com isso Robert? Está pensando em nos deixar?

Robert olhou triste para Kamala, então respondeu de forma direta.

— Eu ainda a amo. Não vou suportar trabalhar com vocês, sabendo que estão juntos.

Sohan e minha irmã se olharam rapidamente. Nenhum dos dois negou o relacionamento. Robert continuou:

— Eu recebi uma proposta de emprego muito boa de uma empresa francesa e resolvi aceitá-la. Eu sempre quis viver na Europa e esta é minha chance. Eu não havia respondido ainda, porque tinha esperanças de que... Enfim. Foi bom trabalhar com vocês. Até breve.

Robert deixou a sala dizendo que entregaria sua carta de demissão ainda naquela tarde. Havia uma certa melancolia quando Sohan, Kamala e eu ficamos sozinhos. Eu perguntei à minha irmã se estava tudo bem.

— Sim, meu irmão. Está tudo bem. Ele merece ser feliz.

— Você também merece ser feliz minha irmã. Vocês dois merecem.

Sohan e Kamala se olharam e sorriram um para o outro. Ele esticou o braço e Kamala segurou sua mão.

— Sabe quem mais merece ser feliz? Eu. Quero voltar para a casa. Estou com saudades da minha esposa. Não vejo a hora de vê-la novamente.

Cheguei em casa no fim daquela tarde. Radha me esperava no jardim. Ela estava mais linda do que nunca. Não sei se era a saudade depois daqueles dias sem vê-la, mas ela estava radiante. Seus olhos brilhavam, assim como sua pele. Seus cabelos longos estavam soltos e balançavam suavemente com o vento. Eu a vi de longe e sorri, maravilhado pela beleza da mulher que era minha. Radha sorriu e caminhou lentamente em minha direção. Eu ainda usava o terno da reunião e corri até ela.

Radha parou quando eu estava bem perto e me olhou de cima a baixo com o rosto impassível. Eu parei assustado, temendo que ela reclamasse das minhas roupas. Radha subiu o olhar para o meu rosto e falou séria.

— Como é possível que meu marido possa parecer mais bonito? Você é como um príncipe, amado marido.

Eu sorri aliviado e a puxei para os meus braços. Radha estava cheirosa e eu inspirei profundamente, para que o cheiro dela tomasse conta de mim. Levei minha mulher para a nossa casa e a deitei sobre as almofadas no chão. Então eu a beijei com toda a minha paixão.

— Estava com saudades de você meu marido.— Radha disse, enquanto deslizava o blazer por meus braços.

— Eu também estava com saudades de você, minha esposa cheirosa. — Falei com meus lábios contra o seu pescoço. — Você não sabe o quanto!

Nós nos beijamos e nos deleitamos um do outro, até matarmos completamente nossa saudade. Então, dormimos ali mesmo, no tapete da sala, sobre as almofadas.

Na manhã seguinte, despertei com Radha em meus braços. Ela já havia acordado e me olhava com carinho, acariciando meu peito. Eu abri os olhos e sorri feliz, ao encontrar o olhar de Radha. Eu a abracei com força e suspirei profundamente.

— Bom dia minha vida! Dormiu bem?

— Muito bem meu amado. É bom dormir com você. Estávamos com saudade.

Sem entender, eu dei uma risadinha.

— É mesmo? sentiram saudades do trabalhador dedicado que eu sou? — Perguntei, achando que ela se referia às pessoas da comunidade.

— Não meu amado. Sentimos falta do amor de nossas vidas.

Radha sentou-se nua ao meu lado, pegou minha mão e depositou um longo beijo afetuoso em minha palma, então colocou-a sobre o seu ventre.

— Nós sentimos sua falta. Eu e o nosso bebê.

Eu fiquei em choque. Por alguns segundos, eu fiquei paralisado, assustado. Vários pensamentos surgiram em minha cabeça ao mesmo tempo, preocupações, afinal, eu teria um filho.

Olhei nos olhos tranquilos de Radha e me acalmei. Ela era a mulher da minha vida e teria meu filho. Fui tomado de felicidade. Era tanta felicidade que não cabia em mim. Eu chorei de emoção nos braços de minha mulher. Então eu a beijei e nós nos amamos novamente.

Ainda naquela manhã, recebi o telefonema de Sohan. Ele também estava completamente feliz.

— Bom dia irmão! Chegou bem em casa?

— Bom dia Sohan. Cheguei bem sim. Você e minha irmã conversaram?

— Conversamos. Vai ficar tudo bem na empresa. O problema dos Skimmers já foi solucionado e não teremos prejuízos. Concordamos que, com a saída de Robert, eu assumirei a presidência e...

— Não se faça de bobo Sohan. Não é das empresas que estou falando.

Sohan riu.

— Anik, ela me ama. Finalmente Kamala é minha!

Meu irmão estava tão feliz, que eu não compartilhei com ele a minha própria felicidade. Deixei que ele e minha irmã aproveitassem aquele momento, depois de tantos anos de espera. Eu imaginava o quanto eles deviam estar felizes.

Sohan e Kamala, por mais de 10 anos foram apaixonados um pelo outro, sem saber que eram correspondidos. Ambos tentaram esconder seus sentimentos, enterrá-los ou esquecê-los em vão.

Eu amei minha mulher no primeiro momento em que a vi, e nunca tentei esconder o que eu sentia. Eu tive que esperar poucos meses antes de poder viver este amor e foi tão angustiante este pequeno tempo de espera, mas tão recompensador quando Radha finalmente aceitou ser minha. Eu imaginava a plenitude de felicidade que Kamala e Sohan estavam experimentando naquele momento.

Alguns dias depois, nossa família reuniu-se em minha casa. Estávamos todos felizes e tínhamos novidades à compartilhar. Era um belíssimo fim de tarde e todos nos sentamos juntos em um círculo, tomando chá e sorrindo. Tio Sunil começou:

— Nilima e eu tomamos uma decisão. Vamos deixar a casa do senhor Kadam e nos mudaremos para os Estados Unidos.

— Por que pai? O que houve?

— Não houve nada meu filho. — Tia Nilima respondeu— É que nós já cumprimos o ciclo naquela casa. Não nos sentimos mais em casa ali. Nós resolvemos morar aqui na comunidade!

— Sério Nilima? — Perguntou mamãe animada. — Que bom, vamos fica mais perto uma da outra!

— Sim, vai ser ótimo!

Kamala comentou:

— Logo agora que eu resolvi me mudar para a Índia!

Os mais velhos olharam surpresos para Kamala.

— Nunca achei que você quisesse morar na Índia filha.

— Nem eu pai. Mas eu tenho alguns projetos. Para começar, Sohan e eu concordamos em aumentar a participação da sede indiana nos negócios. Ao invés de contratar empregados mais qualificados e dispensar os outros, vamos oferecer treinamento e cursos aos que já trabalham para nós. Vamos aumentar a produção nas fábricas da Índia para gerar mais empregos.

— Então você vai para a Índia e Sohan ficará nos Estados Unidos?

Kamala e Sohan se olharam e sorriram. Ele respondeu:

— Sim, por enquanto.

— Com o tempo, Sohan voltará para a Índia, comigo.

— Sim. Eu não conseguiria ficar longe de Kamala por muito tempo.

Todos olharam para os dois, surpresos e felizes.

— Filha, não me diga que você finalmente percebeu que vocês foram feitos um para o outro? — Perguntou mamãe.

Kamala sorriu.

— Sim mãe. Eu finalmente percebi.

Papai riu:

— Até que enfim você disse a ela! Achei que você ia deixá-la ir...

— Filho, que bom que você finalmente criou coragem. Estou tão feliz por vocês!

— Espera um minuto! Quer dizer que todos vocês sabiam sobre os sentimentos de Sohan?

— E sobre os seus também né minha irmã! Estava na cara, todos esses anos. Você era a única que não via.

— Não tem problema. — Sohan falou sorrindo— As coisas acontecem no momento em que elas tem que acontecer. Mas agora que você sabe que eu te amo, espero que você nunca mais me deixe sozinho.

— Eu nunca vou te deixar.

Os dois sorriram e nossos pais suspiraram satisfeitos. Kamala sugeriu:

— Conte a eles o que você descobriu sobre Mahish, Sohan!

— Ah sim. Eu sempre achei que havia algo estranho em relação àquele homem. Quando comecei a procurar informações sobre ele, não havia muita coisa. Eu descobri que o pai de Mahish vinha de uma família de comerciantes indianos. O avô de Mahish enriqueceu trabalhando no ramo de joalherias. O pai de Mahish, era o filho mais velho de outros dois, portanto, o responsável por tomar conta dos negócios da família. Mahish também era o irmão mais velho de outro cinco. Ele veio aos Estados Unidos para estudar, e nunca mais voltou para a Índia. A família não sabia nada dele. Então eu descobri que ele trabalhava em uma empresa, quase tão grande quanto as Indústrias Rajaram. O senhor Sayam tinha um cargo importante naquela empresa, mas não era o dono.

— Que empresa era esta?— perguntou Nilima.

— Era um conglomerado industrial com sede na Índia. O dono era um homem misterioso. Há poucas informações sobre ele. O que se sabe é que ele desapareceu há alguns anos e o pai de Mahish ficou com a empresa. Quando os pais morreram, Mahish dissolveu as empresas e passou a usar o dinheiro investindo em empresas e em campanhas de políticos. Descobri que ele doa dinheiro para políticos e partidos políticos em vários países, principalmente aqueles mais pobres.

— Mas qual é a vantagem disto? — Perguntou Radha.

— A vantagem — respondeu Sohan— é que Mahish tem essas pessoas em suas mãos. E estes políticos, de certa forma, governam segundo os interesses daqueles que os financiam.

— E por que este homem estava interessado na nossa empresa?

— Tia, eu não sei ao certo, mas acho que talvez tio Ren consiga pensar em uma razão. Eu descobri que existe uma ligação entre os Rajaram e o homem que fundou a empresa que Mahish herdou. Até onde eu cheguei com minha pesquisa, parece que aquele homem tentou de várias formas atingir as Indústrias Rajaram. Vocês se lembram de Lokesh?

Mamãe agarrou o braço de meu pai nervosa. Os olhos de papai brilharam com raiva à simples menção daquele nome.

— Sim. Lokesh era um demônio. Ele tentou nos fazer mal de muitas formas.

— Mas nós o destruímos, há muitos anos atrás. — Disse minha mãe, ressentida.

— Mamãe, vocês tem alguma coisa a ver com o desaparecimento misterioso deste homem? — Kamala perguntou amendrotada.

Mamãe olhou para a minha irmã, com firmeza e convicção.

— Um dia minha filha, nós vamos te contar tudo o que nós vivemos no passado. Nós quatro — ela apontou para Sunil e Nilima, o senhor Kadam, seu tio Kishan e Anamika, a irmã de Sunil.

Todos ficamos em silêncio por alguns instantes, então Radha quebrou a tensão.

— Anik e eu também temos uma novidade para contar.

Mamãe colocou a mão sobre a boca e seus olhos se encheram de lágrimas.

— Não me diga que eu serei avó?

— Mãe, a senhora estraga a surpresa!

— Então é verdade?

— Sim!

Mamãe levantou-se rapidamente e correu até Radha, abraçou e beijou minha esposa e depois a mim. Meu pai repetiu o gesto e chorou ao me abraçar.

— Meu filho, que alegria!

Naquele dia, nós fechamos mais um ciclo em nossas vidas.