Nossa ligação começou no útero. Desde que estávamos na barriga da nossa mãe nós já lutávamos pela nossa existência. E desde aquele momento você já saiu ganhando. Foi o primeiro a sair e o mais forte. A partir daí nossa vida virou uma montanha russa de competição; um querendo mostrar ao outro quem era o melhor. Mais apesar de toda nossa rivalidade ao longo dos anos eu sentia que você era minha alma gêmea. Você me entendia como ninguém seria capaz de fazer. Bastava um olhar, um sorriso que já sabíamos o que outro pensava. Então, como não me apaixonar pelo meu próprio irmão?

Nossa relação começou por iniciativa sua na passagem do ano de 2020. Lembro-me como se fosse ontem. Você me convencendo que o nosso amor incestuoso não era criminoso. Que não estávamos ferindo as leis de Deus e sim a vivenciando. Pois este pregava o amor. Então como seria o nosso amor algo indigno aos olhos dele. Apaixonado por ti, deixei-me levar pela luxuria do momento. Hoje olhando para o nosso passado, percebo como fui tolo. Se este amor era tão certo, porque tínhamos que o escondê-lo? Porque não contamos a ninguém sobre ele? Mesmo tendo quase certeza que nossos amigos sabiam sobre ele.

Existia sempre um motivo para justificar o porque que as pessoas não deveriam saber de nossa relação. Ora um ex-namorado ciumento, ora a inveja de outras pessoas. Todas as explicações terminavam em um denominador comum: algo que fosse nos proteger de um perigo iminente, e nunca muito claro. Quando eu te questionava do motivo que deveríamos esconder nossos sentimentos, você dizia que agir com cautela no começo de um relacionamento é o comportamento usual, e preservar a informação sobre o envolvimento emocional com alguém era razoável. Contudo espera-se que com o tempo, venha à confiança para compartilhar com as pessoas queridas a novidade afetiva. Como fui ingênuo.

Talvez a minha ingenuidade tenha começado desde que nascemos. Pois sempre confiei em você cegamente. Meus amigos tentaram me alertar sobre isso, mas eu não escutei. Afinal, você era minha alma gêmea, minha cara metade. Eu não conseguia enxergar que você me manipulava desde sempre a seu bel prazer. Hoje vendo você abraçado a ele, apresentando aos amigos, mostrando a todos quem é o dono de seu coração. Eu vejo a ilusão em que vivi durante tantos anos. Deveria ser eu e não Radamanthys a estar ao seu lado. Neste momento eu comecei a vivenciar os cinco estágios do luto: Negação, raiva,barganha, depressão e finalmente a aceitação.

Minha primeira reação foi negar o fato que estava bem a minha frente. Não conseguia aceitar que o meu Saga tivesse coragem de fazer uma coisa desta. Onde estava às declarações de amor, o cuidado, o carinho, as promessas feitas em nosso leito de amor? Inicialmente tentei justificar o seu comportamento como: necessidade de algo novo, curiosidade, oportunidade, crise emocional, autoafirmação. Qualquer coisa que pudesse justificar a traição e que me fizesse acreditar que nosso amor não era um devaneio. Contudo, as provas de seu crime estavam sendo desfiladas em meus olhos. E eu tive que aceitar que você esteve mentindo o tempo todo para mim e eu tive que aceitar o fato de que estava vivendo durante anos uma doce ilusão.

O estágio da raiva foi o mais rápido, mas também o mais sofrido, por um segundo eu tiver a impressão que se você aparece na minha frente eu te mataria. Neste momento meus amigos mais próximos vieram em meu socorro; vendo a tristeza me corroendo por sua traição. Afrodite me questionou como eu pude ser tão cego. Como fui capaz de me iludir por tanto tempo. E com isso minha raiva por você só aumentou. Neste momento eu compreendi a frase: o amor é cego. Só esqueceram de acrescentar que ele também era surdo e burro. Pois era assim que eu me via neste momento. Mais um cara nas estatísticas da ilusão amorosa.

O estágio da barganha foi o mais humilhante e o mais rápido. Foi o momento onde mesmo sabendo do mal que ele tinha me causado, eu o queria perto de mim. Fui até o seu apartamento implorar que não me abandonasse. Dizer que não me importava de ser o outro em sua vida, desde que ainda o tivesse em meus braços. E Ele riu de mim. Falou que eu não tinha amor próprio. Que foi muito fácil enganar-me. E mesmo ainda ouvindo aquelas barbaridades eu o queria. Talvez ele nunca tenha me amado, somente me usado. Todavia, eu sim, o amei. Apesar da traição, o meu amor ainda estava dentro do meu peito. Como eu gostaria que este sentimento fosse igual a um interruptor de luz. Liga e desliga em uma fração de segundos.

Após a barganha veio à depressão. Saber que todo aquele amor não significou nada para o ente amado. Que desperdicei anos da minha vida em um relacionamento que não existia. Se meu próprio sangue, minha própria carne foi capaz de tão vil traição, como poderei acreditar novamente no amor? Como resgatar a confiança neste sentimento? Tentei repassar mentalmente cada momento de nossa vida conjugal e não consegui descobrir a resposta para o motivo da traição. Se não sei onde errei, como irei conseguir acerta caso venha a desejar um novo relacionamento? O que leva uma pessoa a deixar de amar a outra? Novamente, meus amigos vieram em meu socorro. Vendo que eu não saia mais, que estava a cada dia me fechando dentro de mim mesmo. Eles vieram em meu resgate. É neste momento de dor que você reconhece quem realmente são seus verdadeiros amigos.

E finalmente veio a aceitação, estágio final do luto. Hoje, vejo que meu único erro foi acreditar demais no sentimento que outra pessoa tinha por mim, na ilusão da alma gêmea. Aprendi que o amor não é um sentimento bom ou ruim. Ele depende de cada um. Eu me deixei ser iludido por um falso sentimento. O que eu sentia pelo meu irmão eram sentimentos que facilmente poderiam ser confundido com amor: Paixão e desejo. A diferença é que a paixão é efêmera e esta diretamente relacionada com o desejo. Bem, diferente do amor.

Levei nove meses para me recuperar da fatídica traição. O mesmo tempo que leva uma criança para nascer. E como uma bebê que nasce para vida, eu renasci para acreditar novamente no amor. Hoje não vejo mais meu relacionamento com Saga como algo ruim, mas sim como uma aprendizagem. Agora sei que o ditado o amor é cego não é verdadeiro. Pois o amor faz os olhos brilharem vinte quatro horas por dia. Mas, a paixão, em um minuto te cega. Não o culpo mais por ter me abandonado. Culpo a minha cegueira emocional. Pois os sinais que este amor era somente uma fantasia da minha mente, sempre estiveram presente. Porém cego pela paixão, não os via. Agora que a venda foi removida, sou capaz de amar e ser amado como deveria.

Agora começa minha nova jornada, um novo começo.

Fim

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.