Os anjos Amam...

E sono un imbranato!


Clara...

Viro na cama sem conseguir adormecer com as últimas revelações. Seria bom não ter racionalidade neste momento. Assim, não me sentiria culpada por querer ouvir apenas meu coração. Mas todo o ser humano precisa encontrar o seu próprio equilíbrio para poder decidir com lógica e sentimento. Não há como dissociar o sentimento da razão. Minha atração por ela é tão insólito que me impede de discernir.

Chegamos a um ponto em que será preciso tomar uma decisão. E a decisão está em minhas mãos. Ou nos contentamos com esta situação, de nos encontrar por 1 hora e 32 minutos sem uma troca de carinho sequer, ou, com os sonhos, que nem sempre acontecem no momento ou do modo que queremos.

O sono não vem, mas os minutos se atropelam no contador das horas.

***

O meu encontro com George foi o que esperava tão previsível que me faz pensar que estou voltando no tempo. Diferente de Marina ela aparecesse sem ser convidada, sem espera. Ela fala com o coração, mas suas palavras são tão inocentes e intensas, que fico pensando que talvez ela esteja me vigiando. Me perco nos olhos dela, na sua boca...estou a desejando lascivamente.

O relógio antigo da sala soa nove vezes e a campainha anuncia a chegada de George, pontualmente. Convido-o a entrar sem olhar em seus olhos. Reparei primeiro em sua roupa e espero que ele não tenha notado minha expressão embaraçosa. Só faltaram os óculos para completar o visual Clark Kent: cabelo meio batido de lado, calça social e camisa de manga comprida, em plena noite de 28ºC. Maria nunca perdeu uma chance de observar o comportamento da juventude. George é um prato cheio para suas análises esta noite. Respiro aliviada ao me certificar de que ele não trouxe flores. É um sinal dos tempos modernos, em que os rapazes já não cortejam as garotas com flores, mas com falsos pretextos de assistir ao DVD preferido dela. Parece que estou com a mesma mania de Maria. Tenho que parar de analisá-lo e convidá-lo logo para sentar.

― Fique à vontade. Eu vou pedir a Maria para preparar suco e pipocas. Pode ser? ― pergunto para quebrar a tensão e sinto uma leve coçeira no nariz, provavelmente causada pelo excesso de perfume que invadiu a casa toda. ― Claro. O DVD está aqui ― diz ele mostrando o objeto. ― E você estava certa: não é que eu quase ia me esquecendo dele em cima do sofá? Foi o Marcus que me lembrou! ― É para isso que servem os irmãos! ― penso comigo: e os amigos! E eu que pensava que a vaga de cupido já tinha sido preenchida pela Ju...

Adentro a sala equilibrando na bandeja, os sucos e o balde de pipoca. Não sei de onde George tirou os óculos que acaba de colocar. Agora não falta mais nada para me sentir a própria Lois Lane. Talvez se eu escorregasse e derrubasse a bandeja em seu colo. Mas é melhor não dar ideias a mim mesma. Ao sentar-me ao lado dele, dou pelo menos quatro espirros, um após o outro. Ele não parece se importar; não se move nem um milímetro para o lado e, ao contrário, aproxima-se mais, até praticamente grudar-se em mim. ― Desculpa, Clara, talvez eu tenha exagerado no perfume ― talvez? Enquanto tira umas pipocas do balde, liga o vídeo.

― Pode ligar o vídeo! ― pressiono, para ver se ele esquece de me encarar fixamente. Estamos ainda na primeira música quando sinto o braço de George esticar-se e acomodar-se por trás de mim, sobre os meus ombros. Afasto-me um pouco e ele se retrai. ― Linda essa música! ― empolga-se, desta vez acomodando o braço sobre a minha coxa. ― Não acha? ― Acho... ― e acho também que você está tomando liberdades demais!

Ensaio cruzar as pernas, mas o braço de George afunda entre os meus joelhos. Suas mãos não têm nada de bobas neste momento e pelo leve movimento dos seus dedos percebo que ele prepara o bote. E eu abraço com firmeza o balde de pipocas que pretendo derramar inteiro em sua cabeça. Quando a segunda música Amazing já está no fim, meu celular vibra sobre a mesa. Inclino-me para pegar o aparelho e George finalmente se afasta. É uma SMS enviada através do Twitter. A única pessoa que tem o hábito de mandar tweets pelo celular é a Ju, que a esta hora ainda está na academia, na aula de Ioga. Isso me fez lembrar da última vez, nesta mesma hora, em que ela retweetou que seu professor sexy tomou Ricky Martin por inspiração e assumiu a homossexualidade. Na ocasião não fez nenhuma diferença na minha vida (nem o tweet, nem o Ricky Martin ou seu professor sexy de Ioga), mas agora, qualquer pretexto para me livrar dos tentáculos de George vem a calhar. Vale tudo.

― Aconteceu alguma coisa? Ele pergunta ― Não! Tudo tranquilo. Mal termino de completar a frase, a campainha grita, sonora e malcriada: “Clara está f%r&a#a!”. Preciso correr para atender a porta antes que Maria chegue na frente e provoque um encontro entre rivais: Geroge e Jonas não podem se cruzar. Nem talheres. Não podem? Mas deveriam... Uma ideia pipocou entre meus neurônios elétricos: até que não seria ruim eles se encontrarem. Talvez seja a salvação para me livrar dos dois! Antes de dar o impulso para me erguer do sofá, já estou me recostando novamente, dissimuladamente, confortavelmente. Permaneço assim, ignorando a campainha. Maria aparece na sala e anuncia: ― Clara, desculpa interromper, mas o Jonas está aí a sua espera. Até os perversos sentem frio na barriga. Foi o que acabei de descobrir. Mesmo sabendo que não é a opção mais hippie, prossigo com meu plano de afastar os dois rapazes da minha casa. Afinal, como não tenho os poderes sobrenaturais de Marina para fazê-los desaparecer, preciso dispensá-los com truques humanos mesmo.

***

Mas uma vez chego na Faculdade atrasada, isso ta virando costume. Bom essa semana foi bem corrido contando com a quantidade de rapazes que vão a minha casa com segunda e vigésima intenções. Enquanto a garota dos meus sonhos continua sendo um mistério pra mim, eu continua sendo dura com ela. Quando digo dura, quero dizer fugindo. Sento na cadeira da frente quando ouço.

Aline_ Clara Fernandes está muito mal acostumada. Forma dupla com a Meirelles que também está atrasada. Não vou perdoar na Próxima vez, entendido?!

Eu respondo_ Sim.

Procuro Marina entre os estudantes e vejo ela no cantinho, ela realmente curte um escuro. Bom o trabalho da Professora Aline e sobre o cérebro. Ficamos eu e Marina para fazermos o trabalho pra próxima semana. Não reclamo ultimamente o azar está preso em mim. Mas pode ser uma boa. Vou descobrir um pouco dela.

Marina...

A Sr. Aline me colocou no trabalho junto com a Clara. Só tenho tempo na semana no fim de semana consegui um trabalho numa lanchonete perto da casa da Clara. Preciso trabalhar e é divertido. Minha cabeça anda muito cheia ultimamente. E preciso de dinheiro aqui na terra nada se sustenta sem dinheiro.

Esses dias que passei longe de Clara, descobri que os humanos vivem de uma imensidão sentimental. Que nada se concretiza sem vontades. E a minha é Clara. Então preciso ir devagar. Não posso atropelar as coisas como fiz nas ultimas vezes que nos encontramos. E não posso deixar esse ciúme me dominar. Ela é livre e eu vou ser sempre um serviçal. Então se quero ser algo mais importante para ela, preciso agir devagar.

***

Intervalo

Clara...

Estava procurando um livro na biblioteca quando...

Marina_ Clara?

Clara_ Oi!

Marina_ Na minha casa o trabalho?

Clara_ Na minha.

Não vou pra aquela casa escura de novo, e la me trazem lembranças nada agradável. Ela silencia novamente. Seus olhos enublecem. Não posso deixar de perguntar. _ Por onde você estava?

Marina_ Ocupada.

Mas ainda espero a resposta. E ela não vem. Então, insisto:_ Você tem o Dom de esconder as coisas. Odeio isso! Odeio você e sua prepotência toda. Odeio você! Exaspero com ela.

Marina_Clara?

Clara_ Não Marina! Eu não vou mais ouvir suas desculpas! Você acha que pode ir e vir quando quiser, você acha que pode aparecer como se nada tivesse acontecido?! Sua mudança de humor repentina me enlouquece!

Marina...

Diante da raiva e descontrole dela, me descontrolo. E arrasto ela pra uma sala pequena que mal cabe nos duas. A encosto na parede com uma força nada delicada. Odeio ser esse monstro as vezes, mas preciso para-la. Espero que um dia me perdoe por isso.

Clara...

Mas o que ela esta fazendo, ela agarrou meus braços com uma certa força e me consta na parede dentro da sala da arrumadeira da Universidade.

Clara_ Você é louca? Me solta Marina.

Marina_ Depois que você me ouvir!

Clara_ Me solta. Está me machucando.

Marina...

Quando escuto a ultima frase de sua boca que está a milímetros da minha, me assusto. O que estou fazendo?

Marina_ Desculpa! Eu...Eu...

Baixo a cabeça encostando em seu ombro lentamente.

Clara...

A atitude até o momento que era autoritária dela se desarma e ela se transforma em um ser covarde novamente. Me assusto com a mudança repentina de posição seu corpo está colado sobre o meu e sua boca está roçando lentamente sobre meu pescoço. Meu corpo todo se arrepia com o hálito quente que recebe. Passo minhas mão lentamente sobre a barra de sua camisa que está desabotoada e trilho caminhos até seu pescoço fino e esbelto. Seguro seu rosto de frente para o meu com minhas duas mãos e a olhos nos olhos, da mesma forma que ela faz comigo e me tira de cena. Dessa vez sou eu no comando sem nenhuma vontade de parar. A boca dela está entre a aberta e vermelha a milímetros da minha.

È iniziato tutto per un tuo capriccio
Io non mi fidavo, era solo sesso
Ma il sesso è un'attitudine
Come il'arte in genere
E forse l'ho capito e sono qui

Scusa sai se provo a insistere
Divento insopportabile, io sono
Ma ti amo, ti amo, ti amo
Ci risiamo, va bene, è antico, ma ti amo

Marina...

Estou me sentindo uma marionete em suas mãos e estou ardendo em desejo. Elevamos as mãos e unimos as palmas na altura de nossos rostos, entrelaçando nossos dedos. Em sintonia, os meus passam por entre os dela e os dela por entre os meus e embora o tempo não esteja presente, temos o contato. E por enquanto, isso me basta.

Chego a desejar que o tempo pare. Aprendi a desejar isso quando estou com Clara e agora seria mais do que perfeito se isso pudesse acontecer: que este momento ficasse congelado no tempo.

Clara...

Estou a um passo de fazer a melhor loucura da minha vida, beija-la não só por ser mulher será a loucura e sim, por ser a única pessoa que invade meus sonhos toda a noite e me tira o sono. Marina se tornou o meu maior pecado e com certeza o melhor. Pois tudo que está em volta dela me atrai, tudo.

Ela fecha os olhos e adoro saber o poder que tenho sobre ela, e presenciar isso assim de perto, em todas a dimensões possíveis me fez aperfeiçoar o que está preste a acontecer.

Minha boca lentamente se choca com a dela e o beijo vem calmo e intenso, com minhas mãos voluntariamente invadindo seu espaço, seu corpo. Enfio minhas mãos dentro da gola de sua camisa e arranho lentamente sua nuca e sua coluna espinhal forçando a se fundir comigo. Enquanto minha outra mão ataca sua camisa a puxando de forma perversa pra cima de mim. O beijo dela é quente e vicioso, estou delirando em sensações. As mãos delas estão agarradas em minha nuca entre meus cabelos. É nessa hora que o cheiro dela me invade e perco os sentidos e minha cabeça gira e me recordo da noite do acidente.

Foi ela que me tirou do carro!

Marina...

Acabei de quebrar todas as regras celestiais do meu reino. Ela me beijou e eu retribui com a mesma intensidade ou maior, minha sede de Clara é de uma fonte infinita. E dessa vez não há volta, meu corpo todo só obedece a ela e minha boca conhece e prova a melhor coisa que existe. Beija-la me libertou sentimentos impuros que quero descobrir só com ela. Ela me arranha, me rasga e nada é melhor do que ser machucada por ela. Pelas suas mãos. Mas ai ela me joga, me afasta.

Clara...

_ Você, foi você...

Marina_ Quê? Responde quase em um fôlego.

Clara_ Você, seus machucados. Eu sabia que alguém me tirou. Eu sabia. Foi você Marina.

Marina...

Nesse momento eu entendi o que Clara estava querendo dizer, que foi eu que a salvei.

"

Scusa se ti amo e se ci conosciamo
Da due mesi o poco più
Scusa se non parlo piano
Ma se non urlo muoio
Non so se sai che ti amo
Scusami se rido, dall'imbarazzo cedo
Ti guardo fisso e tremo
All'idea di averti accanto
E sentirmi tuo soltanto
E sono qui che parlo emozionato
E sono un imbranato!

Ciao, come stai? Domanda inutile!
Ma a me l'amore mi rende prevedibile
Parlo poco, lo so, è strano, guido piano
Sarà il vento, sarà il tempo, sarà fuoco"

Marina_ Calma!

Clara_ Como Calma? Que tipo de loucura você fez. Como me tirou dali eu sai ilesa?

Tento toca-la acalma-la mas perdi esse direito logo após o beijo. Então ela se afasta de mim indo em direção a porta.

Marina_ Clara! As coisas não são assim.

Clara_ Vai fugir da pergunta, como faz sempre? Tão covarde.

Marina_ Como eu queria te livrar de tanta dúvida. Mas não posso.

Clara_ Claro! Por que prefere correr. Fugi Marina, é só isso que sabe fazer, até depois disso, da gent...da gente ter se beijado.

Marina_ Clara...

Clara_ O que? Fala Marina, desembucha.

Marina_ E....Eu...Eu não sou huma...

Ju_ Clara todo mundo esta te procurando.

Julianna entrou sem bater, me impedindo de terminar a frase. Clara me olhou e viu que a Julianna não ia sair então se virou e olhou pra mim.

Ju_ O que vocês estão fazendo aqui? Seu batom Marina.

Ela apontou pra minha boca. Entendi que ela sabe o que aconteceu aqui. Observei Clara não falar nada. Resolvi agir.

Marina_ Depois agente conversa. Falei seria olhando nos olhos dela. Ela tinha que me da uma chance de explicar tudo.

Clara_ Ok.

Ju_ Xau Gata. Piscou pra mim.

Saíram me deixando sozinha naquele lugar.

Clara...

Falei pra Ju que conversaríamos depois. Não estou pronta pra falar sobre o corrido muito menos sobre Marina. Ela insistiu mas depois com meu excesso de problemas atualmente acumulados ela deu uma trégua.

***

Enfim em casa estou tonta e exausta, tenho o corpo todo dolorido e não encontro posição na cama para o braço que ainda lateja. Sinto como se tivesse sido atropelada por um trem descarrilhado. Ou melhor, por duas composições inteiras totalmente desgovernadas. Saio de casa num rompante e corro descalça olhando para o céu. Gostaria de sonhar esta noite, mas tenho medo de Marina não aparecer. Os pingos de chuva lavam o meu rosto. Sinto a terra molhada na planta dos pés enquanto os cabelos começam a pesar e grudar no pescoço. Estou confusa. Queria que essa chuva levasse os meus receios, as minhas dúvidas e o meu sentimento por Marina. Por que tenho tanta saudade? Por que não consigo imaginar a minha vida sem ela? Por que ela me dá esperança e se sacrificaria por mim?

Onde estará Marina agora? Será que ele sabe o que isso me assusta? Será que desistiu de mim? Acho melhor voltar e tentar dormir também. Talvez esqueça um pouco esta insegurança e as dúvidas que me atormentam. Meus espirros me convencem a voltar. Retorno a passos largos, escolhendo o caminho dos jasmineiros. O incômodo do frio e do cansaço não têm qualquer importância agora que me sentei embaixo de um deles, pois este aroma alimenta o meu espírito. É como se Marina estivesse à minha frente tocando meu rosto e o enxugando da chuva. Penso em tudo que se transformou na minha vida e, resignada, espero o dia amanhecer. Os primeiros raios de sol incomodam e me levanto assustada. Estranho estar confortável em meu pijama seco. É como se tivesse dormido a noite toda agasalhada sob as cobertas da minha cama.

Ainda é muito cedo quando me aproximo do jardim. Entro em casa a passos leves, subindo para o meu quarto. A cama está desfeita como se eu tivesse dormido nela e sobre o meu travesseiro, repousa um singelo buquê de jasmins. Meu rosto se ilumina ao perceber que Marina voltou e que não me abandonou. Talvez tenha me trazido para casa e até velado o meu sono, ou será um sonho?

***

Na faculdade, encontro Ju descendo do carro de Gustavo. Não consigo ver o chamego dos dois e não pensar em quão mais fácil seria se eu tivesse me apaixonado por um pessoa normal. Mas a verdade é que se não existisse Marina, eu talvez nunca me apaixonasse.

E lá está ela talvez eu nuca vá me acostumar com a imagem dela olhando pra mim. Talvez eu nunca me canse de ser admirada por ela.

"

Ciao, come stai? Domanda inutile!
Ma a me l'amore mi rende prevedibile
Parlo poco, lo so, è strano, guido piano
Sarà il vento, sarà il tempo, sarà fuoco

Scusa se ti amo e se ci conosciamo
Da due mesi o poco più
Scusa se non parlo piano
Ma se non urlo muoio
Non so se sai che ti amo
Scusami se rido, dall'imbarazzo cedo
Ti guardo fisso e tremo
All'idea di averti accanto
E sentirmi tuo soltanto
E sono qui che parlo emozionato
E sono un imbranato!
E sono un imbranato!
Io, si
Ah, ma ti amo"