Os Três Winchester's

Um Estranho Estende a Mão


Durante muito tempo, a chuva não parou, nem diminuiu.

Depois de um bom tempo, porém, Katherine teve um momento de raiva.

Ela lembrou-se do Anjo, que aparecera há uma semana, e que indireta ou diretamente, causara tudo isso.

Ela o chamou. Gritou. Rezou. Pediu. Intimou.

Nada.

Ela estava desesperada. Seu mundo havia desabado. Só o que sempre tivera fora sua família, e agora, nem isso tinha.

Ela continuou pedindo. Em uma explosão momentânea, chutou a árvore com tanta força que ouviu estalar os ossos de seu pé.

Então, depois de um tempo, ela novamente se deixara cair, desistente, e estava novamente achatada contra o tronco quando uma mão tocou-lhe o ombro.

Pega de surpresa, a garota salta para trás.

– Ei, espera - diz o homem.

Não é baixo nem alto. Deve ter em torno de trinta e tantos anos. Seus cabelos são castanhos, um pouco longos, ligeiramente ondulados, e revoltos de um jeito que a lembrava seu irmão. Os olhos são verde-vivos através da lente do óculos simples de armação fina.

Ele veste uma roupa bem casual: um casaco fechado de lã turqueza-acinzentado e uma calça longa de moletom cinza.

Ela o olha com desconfiança e recua um passo, devagar.

– Quem é você? - pergunta, hesitante.

O homem ergue os dois braços à frente do corpo, em um sinal universal de paz.

– Está tudo bem - ele diz, em um tom reconfortante. - Não vou te machucar.

Só pelas palavras, Kath ficaria com vários pés atrás, mas algo em seu tom de voz lhe dava uma sensação de... paz. Comodidade.

– Não respondeu a minha pergunta - a garota retruca, ainda meio hesitante.

– Sou Luke. - ele diz. - Eu moro aqui perto... estava indo para casa, quando vi você aqui. Está perdida?

– Ahn... mais ou menos...

Era bem verdade; era como se estivesse, mas quem pode estar perdida quando nem tem do que se perder?

– Aconteceu alguma coisa? Problemas em casa? - ele indaga, ainda no mesmo tom calmo e receptivo.

A garota solta uma exclamação muda de surpresa.

– Como é que você...?

– Palpite - ele responde. A garota ergue uma sombracelha, ainda desconfiada. - Bom, você não tem cara nem roupas de moradora de rua, e obviamente está fugindo de alguma coisa. E algo me diz que não está na rua por opção; não com esse tempo. Foi o meu primeiro palpite, e, pela sua reação, acho que acertei. Sem falar que já tive experiências com isso. Uma filha adolescente, sabe como é... - ele para e parece cogitar algo. - Você quer falar sobre isso?

Ela pondera a opção.

– Nós podemos ir até uma lanchonete. - ele sugere. - Você fica no seco, e haverá um monte de pessoas em volta, se isso te fizer se sentir mais segura.
– Ahn... eu não tenho nenhum dinheiro...

– Eu pago para você. - Luke afirma. - E então? Pode ser?

A ideia de um ambiente seco já soa atraente aos seus ouvidos.

Ela finalmente se rende.

– Sim, seria bom...

.

Katherine saboreia o pão na chapa com uma sensação de serenidade no peito. Aquilo era quase igual ao que fazia com seus irmãos em um dia normal qualquer.

A única diferença é que seus irmãos não estão lá.

– E então? - Luke apoia na mesa sua caneca de café quente. Ele fala novamente com um tom carinhoso, sem nenhuma pressão ou pressa. - Como é que aconteceu?

Kath fisga algumas migalhas de pão com manteiga do prato e as come. Então, limpa as mãos no guardanapo para gordura da lanchonete.

– Bom, é meio complicado, sabe? - ela diz, hesitante. Como explicaria tudo sem entrar em detalhes que acabassem por tachá-la insana? - Basicamente, há um... um negócio de família. Eu e meus dois irmãos estamos meio que tentando aprender esse... negócio. Um deles é três anos mais velho que eu, e o outro, cinco. Bom, está acontecendo uma espécie de... um problema; é meio difícil de explicar... e nós estamos passando por uma fase complicada. E meus pais... eles viajaram. Então, estamos só nós, mas... o meu irmão mais velho, Dean, ele meio que... pirou, sabe? - ela faz um gesto vago com as mãos. - Ele começou a gritar umas coisas horríveis para mim... e-eu... eu fiquei assustada. Acho que surtei e saí correndo, simplesmente. Nem sei quanto corri, mas, quando me dei conta, estava ali, naquela árvore. Faz umas três ou quatro horas, acho. Não tenho certeza.

Ela olha para Luke, para ver se ele compreendeu, ou pelo menos entendeu o geral da história.

Ele parece pensativo, com o olhar baixo para a caneca.

– Bom... - ele começa. - Do que você me contou, parece que... você não acha que seu irmão não está só um pouco estressado? Quer dizer, essas coisas, problemas nos negócios, fases complicadas... sempre acabam pesando mais em alguém, sabe? Se ele for o mais velho, o que, pelo que você me disse, foi o que deduzi... talvez a falta de pais e tudo o mais estejam deixando-o meio confuso. Talvez se você voltasse...

– Não! - Kath interrompe. - Eu... não quero voltar lá. Pelo menos, não agora... - ela suspira. - Acho que preciso dar um tempo.

– Da sua família?

– É - ela assente, nervosa. - Da minha família, de casa, de tudo.

– Bom... você tem onde ficar?

A garota nega.

– Bom... você poderia ficar comigo... se quiser.

Ela ergue o olhar, surpresa.

O homem era simpático, e parecia honesto.

Mas ela sabia que não podia se arriscar.

– Desculpe, mas... - ela não queria ser grosseira. Como falaria? - É que...

Mas o homem ergue a mão, a interrompendo.

– Tudo bem. Eu entendo. Sou um estranho, né?

Ela concorda nervosamente com a cabeça. Era a explicação mais simples.

– Bom, de qualquer forma, se mudar de ideia... esse aqui é meu telefone.

Ele lhe estende um pequeno papel cartão, como um cartão de visitas.

– Obrigada - Kath agradece.

– Bom, boa sorte com o seu 'tempo' - ele sorri, amigável.

– Valeu - a garota agradece novamente. - Boa sorte para você também... em qualquer coisa que for fazer.

Eles se despediram. O homem saiu do estabelecimento, mas a garota continuou sentada. Ali ainda era mais confortável do que lá fora.