– Hoje, teremos uma nova colega. Esta é Katherine Winchester. Diga 'oi', Katherine.

A garota vai até a frente da sala. Queria que a professora não a tratasse como uma criança, mas, pela expressão da moça, percebeu que ela só queria ser simpática.

Acostumada, ela recitou, coma prática de mil repetições de situações semelhantes:

– Oi. Sou Katherine, ou Kath. Gosto de ler, escrever e desenhar. Gosto de matemática, artes e educação física. Amo Senhor dos Anéis e idolatro Tolkien. Meu sorvete preferido é flocos, tenho dois irmõs mais velhos e sou heroína nas horas vagas. Mato cerca de dois a cinco monstros por mês, e mês passado cacei meu segundo bando de vampiros.

Ela ouve risinhos divertidos, partindo de diversos focos na sala.

Segundo sua experiência em ser novata, ser divertido sempre era bom para se enturmar, e ser divertido significava contar histórias malucas ou dizer coisas sem sentido - ou, no caso dela, simplesmente ser sincera.

Então, uma voz isolada se eleva a todas as outras.

– Ô, menininha, você não devia estar no sexto ano, não?

Os risos aumentam, mas agora estão debochados e maldosos. O sangue corre para o rosto de Kath.

Talvez por seus olhos brilhantes e escuros, dessa forma refletindo com detalhes o brilho do ambiente como faria a pupila dilatada de um gato, talvez por sua pouca altura - agora tinha 1,45, mas descobrira por um médico que sua altura máxima seria 1,55 -, ela sempre parecera mais nova, infantil ou inocente.

Como se não bastasse ser a única 'a' numa família de caçadores, era a única baixinha da família. Não apenas a única baixinha, como também com dois irmãos incrivelmente altos.

Em seu favor, tinha um corpo forte e saudável, curvilíneo para a idade, mas isso não era o suficiente.

O assunto a ressentia profundamente.

Por que ninguém enxergava como ela era por dentro: forte e destemida?

Furiosa e humilhada, a garota anda até uma carteira no canto da sala, fazendo-se de surda.

Depois de uma hora de aula - a professora neutra e desligada às intermináveis piadinhas sussurradas sobre tamanho - a garota percebe que não conseguiria prestar atenção à aula e se abaixa, pegando um livro na mochila.

Quem dera tudo fosse tão simples como nos livros...

Na história que lia, o vilão era sádico, cruel e com sede de poder. Ele era mau. Simples assim.

Na vida real, as coisas eram um pouco diferentes.

Os fantasmas? Claro, haviam os fantasmas maus - isso era fato - mas eles eram uma minoria quase absoluta.

Pessoas boas, que haviam sofrido, sido assassinadas, maltratadas, acidentadas ou que cometiam suicídio após uma vida de buylling e toda a sorte de provocações... eles, sim, eram a maioria.

Lobisomens? A maioria nem chegava a saber o que era. Vários dos que sabiam pediam para morrer, com medo de ferir alguém.

Wendigos? Pessoas que haviam passado fome por um interminável e congelante inverno.

Demônios? Também haviam os maus - eles nem eram tão minoria assim - mas também havia as boas pessoas, que haviam parado no inferno por causa de Pactos - que, muitas vezes, envolviam salvar alguém - e que simplesmente enlouqueceram.

Por que a vida tinha que ser tão complicada?

A garota se afunda no livro até o ponto em que nada mais a afeta - não enxerga além das páginas à sua frente, não ouve além de sua própria mente -, xingando o vilão, torcendo pelo mocinho e se imaginando em seu lugar.

.

– Gostaria de nos dizer algo sobre você... Samuel Winchester?

A pausa fora o resultado da professora se esticando em direção às anotações em sua mesa, na tentativa de ler o nome do recém-chegado.

Sam se retrai internamente. Nunca gostara de seu nome completo.

– É Sam, na verdade. - ele corrige. - Sam Winchester.

– Ahn, certo. - Apesar de Sam ter mantido um tom neutro (não estava animado com a situação, mas tampouco estava bravo), ela parecia tensa.

Mas, pelo que Sam pudera deduzir, isso parecia ser próprio da sua nova professora.

O garoto caminha até uma carteira mais ou menos no meio da sala, com a mochila pendurada sobre um ombro - bem leve, com apenas dois cadernos universitários, um estojo e algo para comer.

A aula passara normalmente, quase totalmente em silêncio.

Até que, cerca de dez minutos depois, ele ouve algo.

Seu olhar se ergue da tarefa à sua frente.

Ele olha em volta rapidamente - se fosse uma raposa, suas orelhas estariam girando, atentas - mas não consegue descobrir de onde veio o som.

Quando vai tornar a escrever, porém, ele ouve algo mais perceptível.

– Psiu!

Ele se vira para a esquerda - de onde viera o som - e vê um garoto.

O estranho é alto, de ombros largos, pele bronzeada, cabelos negros e olhos azuis vibrantes.

– Oi. Eu sou Daniel. Daniel Whycase.

Sem saber como reagir, ele sussurra de volta, hesitante:

– Sou Sam - ele diz. Só então percebe que o estranho já sabe.

–Eu só queria te cumprimentar - ele diz. - Tem poucos novatos esse ano. E eu lembro como é chato ser calouro.

– Ahn... obrigado - ele diz, em dúvida.

– Saiba que, qualquer coisa, pode me pedir. Tenho meus... 'contatos' aqui na escola... pode-se dizer que eu 'posso tudo'. - ele termina, com um sorriso suavemente egocêntrico.

Sam reconheceu imediatamente o tipo. Metido. Não era gente com quem gostaria de se enturmar.

– Claro. Pode tudo, e, mesmo assim, está sussurrando agora.

Daniel sorri.

– Não quero atrapalhar quem quer prestar atenção à aula - ele explica, plausivelmente.

Ponto para ele.

– E ei, Sam - ele chama. - Hoje à noite vai ter uma festa lá em casa. Só para os colegiais. Quer vir?

Sam cogita a possibilidade. Ele não gostara muito de Dan, a princípio, mas não tinha nada para fazer à tarde, e eram raras as ocasiões em que podia ter um tempo só para ele - sem monstros para matar, ou irmãos para observar.

As ocasiões em que podia se afastar da família. Da responsabilidade.

Além disso, era uma chance de ter uma noite normal, como qualquer garoto adolescente.

– Tá - ele diz, finalmente. - Já está marcado.


.

Dean sempre gostava de ser o centro das atenções.

Mas 'sempre' não se estendia a 'à frente de três dúzias de alunos de direito como um calouro que começou uma semana atrasado pronto para atravessar o inferno da Escola por um período indefinido enquanto o pai que caça monstros procura pela mãe ausente desaparecida e diz para cuidar dos dois irmãos mais novos quando praticamente todos os demônios do mundo têm um interesse considerável em servir suas cabeças em bandejas de prata simplesmente pelo fato de eles serem Winchester's'. E, de preferência, fatiá-los no processo.

Pelo menos boa parte da turma era formada por garotas.

– Hey - ele se apresenta. - Sou Dean Winchester. Adoro várias séries de TV e, a quem interessar possa, tenho dois caçulas.

Simples e direto.

Ele se senta na segunda fileira, pouco à frente da professora. Garotas sempre gostavam de rapazes com irmãozinhos.

Ele sente olhares fixos em sua nuca. Depois de um tempo ele se vira, discretamente, e vê algumas garotas o olhando.

Ele escolhe uma garota ariana, pálida, loira e de olhos azuis brilhantes, que está mordendo a ponta de um lápis, sorrindo com seus dentes brancos.

Ele pisca, galanteador, e a garota cora, ao mesmo tempo tímida e radiante.

Se teria que passar tanto tempo naquela prisão, pensa Dean, por que não se divertir um pouco?