Katherine já sabia que eles não chegariam a tempo.

Eram dois irmãos contra quatro demônios, e nenhum deles sabia como se matava um demônio. Não havia a menor chance.

E Castiel apenas observava.

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A garota já estava bem fraca, a ponto de sua cabeça começar a pender.

Mas ele não podia interferir. Fora alertado.

Mesmo assim, era triste olhar. Olhar a vida de uma garotinha se esvaindo de seu corpo, com a solução ao alcance de um toque, mas sem poder fazer nada.

A verdade é que ele já tinha se afeiçoado à ela. Já se afeiçoara a toda a família de caçadores.

Fora mandado para observá-los. Para ver se seriam dignos da missão que os aguardava, e para guiá-los em seu caminho árduo, sombrio e marcado de sangue.
Um caminho sem Katherine.

De repente, a garota emite um som vago com a garganta.

Depois, repete, mais claramente.

– Anjo...? É você?

Sua voz não passa de um sussurro fraco, mas Castiel se surpreende. Ela não devia poder vê-lo.

Talvez fosse porque ela já estava com um pé na cova.

– Sim - disse, por fim. - Sou eu.

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A luta estava intensa como nenhuma outra da qual Dean já participara.

Eles não morriam. Não recuavam.

Do contrário, agora haviam tornado a avançar, com mais um inimigo.

Num golpe certeiro, Dean mirou o pescoço de Celeste. Se a decapitasse, talvez, conseguisse alguns segundos de vantagens.

Mas a mão da garota foi ainda mais rápido que a mente, bloqueando o movimento numa velocidade que ele nem pôde processar.

Então, ela piscou, e seus olhos se tornaram totalmente negros.

Demônios!

– Mas... o que... - ele murmurou, incrédulo. - Mas nós fizemos o teste em vocês!

– Ah, 'Christo'? - desdenhou ela. - Vamos dizer que... não nos sentimos assim, demônios, há muito tempo. - sorriu, e atacou.

A distração de Dean foi crucial.

Num único chute, a garota derrubou a faca de sua mão. Aproveitando a deixa, seu companheiro arrancou-lhe a arma, e Celeste derrubou-o no chão, prendendo-o com o braço no pescoço.

– Suas últimas palavras, Caçador?

Deans e debateu.

– Vai se ferrar, maldita!

Celeste fez uma falsa expressão magoada.

– Ah, isso foi rude.

E se preparou para quebrar-lhe o pescoço...

... Quando um tiro soou e ela caiu de lado, com um ferimento ensanguentado bem entre os olhos.

Dean olhou na direção da porta.

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– Você não pode me ajudar, pode? - murmurou ela, fracamente.

Castiel hesitou, mas negou com a cabeça.

– Sinto muito.

– Tudo bem - a garota parecia resignada. - Eu já... imaginava. Se pudesse, já teria me ajudado. Você não... não parece o tipo de pessoa que deixa os outros para morrer. - ela tentou sorrir, mas já não conseguia mais.

Castiel sentiu uma sensação no fundo do estômago. Vergonha?

– Anjo... você poderia... - ela tossiu. - Poderia fazê-los se esquecer? Poderia me apagar da memória de minha família?

Castiel surpreendeu-se.

– ... esquecer? - repetiu, cuidadosamente, mascarando o tom de voz.

– Quando meu pai chegar... ele... ele irá culpar meus irmãos. - ela disse. - Eu estragarei qualquer... qualquer chance de uma família feliz. Ele nunca os deixará esquecer do que fizeram... eu não quero isso, Anjo. Quero que eles vivam felizes, no tanto de vida que lhes resta.

Muitas imagens passaram na cabeça de Castiel.

Ele a acompanhara, tanto quanto os outros dois. Lembrou-se de um texto, que parecia ter sido escrito a apenas alguns segundos, marcado como estava na cabeça do Anjo.

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Ela cresceria. Viveria. Faria amigos. Então, morreria. Sua filha choraria por ela. Sua neta se lembraria de sua avó.

Sua bisneta conheceria seu nome, mas a filha de sua bisneta nunca saberia que ela existira. Ela acabaria com sua lembrança, e sua lembrança acabaria com o tempo.

O que era morrer? Se o destino de todos era o esquecimento, morrer não era apenas o nascer do fim? De repente, não tinha mais medo da morte, mas do esquecimento.

Então, aquilo era morrer?

De repente, morrer não parecia tão ruim.

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Anjos, se não mortos em batalha, existiam para sempre. Viviam para sempre.

Quando um Anjo morria, era uma ocasião não só triste, mas melancólica. Lamentável. Catastrófica.

Para um Anjo - para Castiel - nada era pior do que a morte.

Mas os Anjos nunca seriam esquecidos. Se um Anjo não dura para sempre, pelo menos um de seus amigos durará. Sua lembrança permanecerá na existência para toda a eternidade.

Mas se alguma coisa assustava os humanos ainda mais que a morte... era algo que Castiel não conseguia compreender.

E lá estava a garota. Deixava bem claro que o esquecimento a assustava mais do que morrer. Mais do que deixar de existir nessa dimensão como um ser vivo e único em sua existência como um todo.

E lá estava ela, pedindo para ser esquecida, pelo bem de sua família.

– Pode fazê-los esquecer? - pediu Katherine, novamente.

Castiel novamente hesitou antes de responder.

– Vai fazê-los esquecer? - ela insistiu.

– ... Não.

A garota não se surpreendeu, mas pela sua expressão, Castiel sabia que não era o que ela queria ouvir. Uma lágrima escorreu por sua face, e mais uma, discretas como a própria Katherine.

Então, seus olhos se fecharam, devagar.

Castiel se aproximou.

– Eu vou te curar.

E tocou a testa da garota com a ponta dos dedos.

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Dean arregalou os olhos.

Parado, na entrada da porta, estava um homem, de cabelos grisalhos, boné azul-cinzento e uma arma grosseira em mãos.

– Seus idiotas - disse Bobby. - Achavam mesmo que iam matar um bando de mortos-vivos sem a minha ajuda?

Dean apressou-se, aproveitando a distração dos demônios, e recuperou a arma e a faca, decapitando Luke num só golpe.

– Como nos achou, Bobby? - Sam perguntou.

– Ash me disse onde estavam.

– Depois, me lembra de pagar uma cerveja para o carinha - Dean disse, golpeando novamente Celeste, que se recuperava.

Agora, eram três contra quatro.

Não. Eram três Caçadores contra quatro.

Ainda havia uma chance.