Livro Um - Capítulo Um

A Carta

O Arboretum é um lugar lindo. Era aquele lugar especial e único em que você se sente a parte do mundo real e tecnológico, sabem?

Um lugar que você acredita que exista seres fantásticos, locais escondidos, castelos amaldiçoados e, é claro, bruxos.

Não que eu não soubesse que eu seria uma bruxa. Pelo contrário, eu sabia com certeza que seria. Pode parecer esnobice, mas eu juro que não era. Quando você acorda às duas da madrugada levitando a uns cinco metros do chão, isso é uma baita dica do que acontecerá.

Sem falar que a minha família, quase toda, é bruxa. Então, se eu não fosse um aborto, obviamente, eu seria uma bruxa.

Então, não seria novidade se e quando eu recebesse uma carta endereçada da maravilhosa Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Claro que não deveria ser, mas eu estava em êxtase.

Condição daquele que está fora de si ou tomado por sensações diversas, intensas e contundentes como: prazer, alegria, medo...

Era o meu sonho aquela instituição desde que eu tinha os meus três anos e mamãe me explicou sobre como ela aprendeu tudo o que ela sabia (mesmo não tendo sido em Hogwarts). Eu sonhava com o castelo que eu vira em uma imagem que eu recortara de um antigo exemplar dO Profeta Diário. E me imaginava entre aqueles corredores conhecendo outros bruxos e amigos. Fechei o dicionário que estava aberto sobre as minhas pernas pegando, pela milionésima vez a carta endereçada a mim. Na história da minha família, pelo menos a mais recente, não íamos a uma escola de magia. Principalmente essa que era simplesmente vetada.

Como bons bruxos clássicos, estudávamos em casa - no mínimo, era o que minha avó dizia.

Ela era uma típica avó do interior inglês: fazia ótimos biscoitos, tricô e bisbilhotava seus vizinhos, de maioria, trouxas que moravam em cubículos chamados apartamentos. Se não fosse o fato de ela também passar seus dias com uma varinha de condão acenando pelos cantos fazendo suas flores serem as mais belas, seu caldeirão lançando vapores e seus livros de feitiços voarem sem querer pela casa, ela poderia encarnar esse papel - é claro.

Era também excêntrica. Com um sorriso, abri o pequeno grosso livro na página certa.

Que se comporta de modo incomum ou esquisito, que não obedece os padrões normais.

Suas vizinhas, ao mesmo tempo que a adoravam, achavam estranho o vestido e o chapéu de jardinagem que usava a cada instante ou como sempre tinha um graveto em mãos ou ainda a chaminé soltando fumaça 24 horas por dia, estando quente ou frio. Ela era eternamente o assunto das pessoas simplesmente por ser isso e por ser um amor. Que também era.

Apesar de tudo isso, ela era uma bruxa extremamente poderosa. As encomendas das suas poções eram provas suficientes para qualquer um.

E, infelizmente, mesmo a amando profundamente. Se ela visse aquela carta que eu escondia tão furiosamente nos últimos sete dias, ela me deixaria de castigo, rasgaria a carta e ficaria furiosa com todos. Ninguém queria vê-la furiosa.

Era justamente por isso que eu tinha fugido para o Arboretum.

Apesar do nome latino, ele ficava no centro mais antigo de Nottingham e era o parque mais velho da cidade.Centenas de árvores, com memórias e magias típicas delas deixavam o lugar com uma áurea de outro mundo, parecia que estava dentro de um das histórias de Robin Hood.

E, portanto, era o lugar em que a minha avó jamais me procuraria.

Mesmo que o imóvel da nossa família ficasse a apenas uns quatro quarteirões dali, mas, ela não iria ali. Lembrava muito os meus pais.

Falando assim, até parece que estão mortos. Antes que pense isso, não, eles não estão. Eles estão perdidos. O que isso quer dizer? Exatamente isso. Perdidos.

Aquilo foi extraviado, que está desaparecido, dissipado, disperso, inutilizado, esquecido.

Coloquei o dicionário ao meu lado, em cima de um banco de pedras que estava embaixo do sol das onze horas. Mamãe era uma nascida trouxa que, por algum motivo desconhecido, aflorara a magia. Lembrei dela: sua pele café, brilhava no sol, na sua estatura diminuta; seus olhos castanhos-mel, refletiam um dourado maravilhoso; seus cabelos encaracolados tinham vários tons coloridos; seu sorriso louco era radiante, principalmente, com o forte sotaque espanhol. Ela é uma entusiasta pela natureza selvagem, correndo atrás de pesquisas que demonstravam como o uso de outros apetrechos mágicos podiam tomar o lugar de muitos bruxos.

Mesmo tendo sido trouxa, vovó e ela se deram bem quase que instantemente quando se conheceram. Minha família puro-sangue não tinha esse preconceito bobo. Para mim, essa palavra parecia que tratávamos de cavalos.

Já papai é o oposto. Enquanto mamãe era o sol, ele era a lua. Enquanto mamãe era energética dançando pela casa, papai ria contido olhando admirado para a esposa. Enquanto... Bem, acho que você pegou a ideia.

Ele, um homem alto e todo músculos, tem um cabelo que, ao sol, tinha uma tonalidade vermelha. Os olhos eram de um verde inconstante: uma hora eram como folhas de cedro, outra como verde-mar. O nariz reto e empinado, fazia com que ele fosse arrogante. Sua pele era tão branca que quase podia ser transparente. O mais engraçado era quando estava nervoso/bravo/rindo que seu rosto ficava todo vermelho. Eu e mamãe costumávamos rir disso. Ele odiava, mas acabava rindo também.

Porém, em um belo dia de abril, há dois anos, eles receberam uma urgentíssima carta, mesmo que quase ninguém mais mandasse isso, para irem para um fim do mundo da Oceania, porque acharam plantas e apetrechos pré-históricos que os interessavam, então, eles precisavam ir. Nunca mais voltaram.

Isso também me aterrorizava. E se eu mostrasse essa carta à vovó e nunca mais voltasse?

Claro que as coisas nunca mais tinham sido tão tensas quanto na era Harry Potter, mas estávamos falando de Hogwarts. Qualquer coisa poderia acontecer! Mesmo o mínimo de aventuras, pode ser demais para o coraçãozinho de vovó.

Suspirei longamente. Eu não poderia ficar ali para sempre, uma hora ou outra, eu teria que voltar para casa e confrontar a verdade. Mesmo que ela fosse incompreensível para mim.

Se mamãe estivesse ali, provavelmente, ela teria batido o pé e me obrigado a ir para a escola. Assim, como ela fez lá na terra dela.

Teria dito que aprender magia não é apenas falar e fazer as coisas acontecerem. Mas ter amigos com quem essas peripécias sejam, possivelmente, mais interessantes.

Claro.

Mas mamãe não estava ali. Então quem decidiria minha educação seria vovó. O que queria dizer uma ida, inexplicavelmente, chata à biblioteca bruxa do condado a cada quinze dias para pegar novos livros sobre o que seria muito mais legal se eu estivesse com outros estudantes ávidos pelo novo conhecimento.

Peguei minhas coisas. Seja o que tiver que ser.

Saí do parque em um passo desanimado. Por causa do meu humor e da magia inconstante, uma parede em construção foi demolida. Ops, foi mal, galera.

Quando cheguei ao nosso pequeno quintal para humanos eu parei e admirei como os esforços da magia poderiam esconder a nossa bagunça de bruxos. Aparentemente, o quadrado verde possuía as mais diferentes variedades de flores. Algumas que não deveriam florir nas condições britânicas, mas eram justificadas pelas constantes viagens de meus pais biólogos que sabiam como tê-las ali. Uma cadeira de balanço estava envolta de pequenos bonecos de animais fantásticos recheados com sementes que eram apenas mitos para os nossos vizinhos. Alguns cata-ventos estavam por todo o jardim, assim como, pequenos arbustos frutíferos. O caminho de pedrinhas brancas era charmoso e sempre fora objeto de admiração pela maneira como nunca sujava. A larga varanda era extremamente aconchegante e sonora com os sinos de ventos e bebedouros para pássaros que moravam no centro da cidade. Isso, porém, era só o que os humanos conseguiam ver, alguns arbustos escondiam a entrada para o nível inferior onde colhíamos algumas ervas que tinham obrigação de ficarem na parte da frente de casa - eu nunca entendi a necessidade mimada delas.

O caminho, na verdade, não levava apenas à porta de entrada, mas a uma escada caracol que se estendia por toda a casa de três andares e chegava a um solário em que mais plantas exóticas estavam plantadas ao redor de um monstruoso telescópio e uma estátua de Trivia - a deusa romana das

... encruzilhadas assombradas, cemitérios e deusa da feitiçaria e bruxaria.

Dicionário de mitos e verdade, Magali Campbell.

Que lugar mais positivo, não? Sem falar, é claro, do nosso fiel e assombroso fantasma. O lorde Clarke. Ele, um dia, fora um fiel matador de bruxas, tudo por causa de um fora que ele levara, e, por isso, foi condenado a servir por uns dois mil anos a família de uma outra velha bruxa. HÁ HÁ HÁ - o destino riu na cara dele. Mas, depois de quinhentos anos, ele já não xingava tanto e, até, gostava de algumas personalidades, tipo minha mãe e eu.

Decidindo se eu ficava por ali, ou subia as escadas, ou, ainda, encarava de frente vovó, percebi que não estávamos sozinhas pelas vozes que saíam extravasadas da sala de entrada.

Eu subi as escadas atrás de um outro jeito para entrar em casa e ver o que acontecia. De vez em quando, um cliente insatisfeito com alguma poção que não tinha o efeito que ele queria invadia a nossa casa atrás de reembolso.

Ação de pagar o valor ao cliente após não contentamento com o produto.

Uma palavra que não existia na residência dos Aglo. Jamais fale sobre isso com nenhum de nós - principalmente se você tem amor as suas orelhas que ficariam extremamente surdas após uma gritaria em espanhol.

Subi as escadas com uma energia renovada. Eu sou um bicho curioso, tá?

Mas, a verdade era que vovó já não era mais uma senhora em seus sessenta anos, mas uma quase noventária e alguns bruxos acreditavam que isso era sinônimo de fraqueza. Caso esteja se perguntando não é. Valorizem seus avós.

Então, eu tinha a missão de correr atrás do meu tio que morava não muito longe caso alguém tentasse fazer algo com ela.

Mesmo que ela já tivesse dito mil vezes que não precisava da ajuda. Mas alguém tinha que esconder o corpo, né? Brincadeira!

Quando cheguei no solário, o céu do meio dia já mostrava sinais de que uma chuva não tardaria a chegar, mas aquele fantasma não estava em lugar algum! Com um pé atrás olhei ao redor, ele só saía em missões extremamente oficiais ou para cumprir algo que queríamos dentro da casa.

Próximo ao telescópio, um alçapão abria caminho para o restante da mansão. Caso não soubesse o segredo para abrir, uma pessoa poderia passar o resto da sua vida, que não seria muito longa, tentando, mas, de modo ágil, e com um puxão não-sonoro, abri e entrei.

Esse cômodo, caso não fosse um familiar, seria extremamente mortal para qualquer pessoa que, por um acaso, conseguisse entrar ali. Automaticamente, quando você pisava, não estava na ponta de uma escada, mas preso em um buraco em que teria que fazer força para puxar seu corpo para cima e sair, com uma força levando ao lado contrário, para fora. Caso conseguisse passar, quando olhasse à frente, você se veria caindo sobre o teto e teria que abraçar algum móvel para evitar morrer ou ganhar uma viagem só de ida para o Peru.

Eu realmente gostava desse negócio de mágica.

Mais ainda quando o cômodo girava como um pião! Era hilário. Não para quem estivesse dentro.

Para mim, era só dar um pulo para cima que estava para fora daquele mundo de confusão e no corredor dos nossos quartos.

Era extremamente divertido.

Enfim, com um pé ante pé desci as escadas o mais silenciosamente que eu pude em direção à sala. Guardando a porta de maneira despreocupada, finalmente, encontrei o fantasma que deveria estar de guarda lá em cima, nesse momento, estranhei ainda mais a visita.

— O que está acontecendo? - Perguntei só articulando com os lábios. Eu treinava com ele leitura labial desde que eu vira em um programa infantil na TV humana. Você não sabe quantas coisas podemos aprender com fantasmas.

Em resposta, ele deu de ombros, apontou para a sala, fez um chapéu com as mãos, o sinal universal de um vestido, um chocalhar com o punho fechado e um enfático "NÃO". Ou seja, os sinais da Língua Mágica de Sinais para

— Eu não sei, mas lá está uma bruxa poderosa. Não vá.

Eita. Ignorando-o e tentando me aproximar mais da porta, ouvi minha vó em um tom exasperado.

Que foi alvo de exasperação, que está muito irritado, exaltado ou enfurecido.

Recitei em uma nota mental.

— Entenda, Minerva. Kate não poderá ir e, essa, é a minha resposta final. Principalmente, depois do jovem Riddle. - Parei, ela estava falando de mim?

— Emilie... - Uma voz desconhecida disse. - Eu sei, mas se ela não for, eu temo o que poderá acontecer com a escola. - Uma longa pausa. - Você conhece a velha pro..

— Kate chegou! - Gritou Lorde Clarke ao meu lado. Olhei extremamente ofendida para ele. Nunca, em todos os meus onze anos, ele tinha me entregado, pelo contrário, sempre trocávamos fofocas. Mas seus olhos imploravam meu perdão. Isso só poderia significar que vovó o fizera prometer que diria assim que eu chegasse. Não me senti menos traída depois dessa constatação.

— Mary-Anne Katherine Herrán-Aglo, entre. - A voz de vovó era como um dos seus feitiços, mandona, o que impedia de eu sair correndo e me esconder embaixo da cama. Sem falar que ela usou meu nome completo, nunca era um bom sinal.

— Sim, vovó? - Perguntei baixo, tentando não causar sua revolta.

— Essa nossa convidada é a professora Minerva McGonagall, diretora da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. - Uma pausa afiada. - Mas acho que você já conhece isso... - Um tom acusatório dizia que ela sabia sobre a carta.

Em uma vã tentativa, escondi o dicionário em minhas costas. - Todos conhecem, vovó. - Dei um aceno para a mulher que estava a minha frente. - É um prazer conhecê-la, diretora.

Apesar da idade, acredito que ela teria a idade de vovó, seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque apertado sem um único fio fora do lugar. Suas vestes bruxas eram pretas com delicados botões de prata. Seus olhos verdes me olhavam perspicazes sob as rugas da idade.

Clarke tinha razão: era uma mulher poderosa.

Accio - vovó disse azeda apontando a minha mão com o dicionário.

Droga.

— O que é isso, Katherine?

— Eu... Eu... Eu... - Eu vi meu sonho de sair daquela casa para Hogwarts ruir. - É uma carta, senhora... - Disse baixo com os olhos colados no chão.

— Humpf. - Disse, simplesmente. Eita, vovó quando ficava monossilábica não era um bom sinal.

— Senhora? Isso não é nada. - Eu disse com a voz presa e tentando colocar algum humor. - Sei que devo estudar em casa. Só achei divertido.

Ela olhou ácida à diretora.

— Como eu disse... A garota sabe seu lugar, Minerva.

— Tanto eu quanto você, sabemos que ela não quiz dizer isso, Emilie. - Ela parou. - A menina sente a necessidade de ir em defesa de Hogwarts. - Ela virou-se para mim e disse com olhos muito astutos. - Não é mesmo, querida?

Eu queria gritar para que nunca desse as costas à vovó, mas eu só vi um brilho vermelho em minha direção e, tão graciosamente quanto isso pode ser, eu apaguei.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.