— A vossa pequena excursão terminou, amigos!

A voz era áspera, escarninha, impositiva. Viera de detrás deles e Han achou por bem voltar-se devagar, mãos à vista para evitar um tiro à falsa fé que o debilitaria com um ferimento. Lando tinha os ombros descaídos e sacudia a cabeça, desapontado. Threepio calara-se, Chewbacca rosnou uma única vez. Os três mantiveram-se nas suas posições a olhar a liberdade que ficava a apenas um salto, um curto salto até ao solo escuro. Depois era só correr, alcançar a nave, pairar no espaço com o dispositivo de camuflagem ligado e preparar outra incursão, desta feita à segunda lua…

À frente de um bando armado estava um homem oculto pelas sombras. Era uma silhueta larga e ameaçadora, maciça, envolvido em roupagens pesadas e quentes, os braços com os cotovelos espetados para fora, punhos sobre a cintura, pernas afastadas. Se estava armado não se conseguia ver o eventual blaster, disfarçado nos contornos pouco definidos. Deveria haver um, algures, preso num cinto invisível naquela pouca luz. Eram os outros seis que o acompanhavam que lhes apontavam as carabinas laser. Humanoides, criaturas, até um androide.

— Calma, amigo – começou Han. Utilizou o mesmo apodo, para estabelecer uma certa proximidade que os ajudaria a escapar. Escapar a todos os níveis. Da cobertura daquele edifício, daquela situação espinhosa, daquela lua.

— Calado, Solo!

O outro conhecia-o. Han sentiu um amargor no fundo da garganta. Iria insistir na sua atitude despreocupada, iria apostar na sua veia de negociador, de bem-falante. Sempre se safara como um canalha que sabia enrolar os adversários na sua lábia. Mas havia ali pequenos elementos que estavam a confundi-lo e ele precisava que o jogo fosse claro como rum corelliano.

— Ei, parece que sou famoso! Como conheces o meu nome?

Uma risada que fez o corpo do homem sacudir-se num curto espasmo divertido.

— Será possível que tenhas considerado a eventualidade de eu ter desistido?

Lando virou-se.

— Eu conheço essa voz…

— O quê?

Chewie voltou a rosnar e Threepio soltava os seus habituais rangidos nervosos.

— Olá, Calrissian!

Um momento de pausa. Lando respirou fundo. Furioso, acuado, desiludido. Sim, como seria possível que tivessem desconsiderado a ideia de que aquele tipo fosse realmente desistir à primeira contrariedade? Foram estúpidos, ingénuos e ineptos! Especialmente estúpidos!

Exclamou entredentes:

— Yur Tomason!

O taanabiano estava na lua abandonada do planeta gasoso de Hkion. Era o taanabiano, que procurava cobrar uma dívida antiga de Lando Calrissian, que queria reparar uma ofensa antiga e desprezível, que lhes cortava a fuga da fábrica secreta de clones de Hkion. Uma fantasia muito elaborada. Han franziu a testa, em descrédito.

— Não pode ser… – murmurou. Aclarou a garganta, inflou o peito. – Isso não é possível, existe aqui algum truque. Aquele tipo… não é o tipo que pensamos que possa ser.

— Não há truque nenhum, Solo! Interromperam um jogo de sabacc e um jogo de sabacc é sagrado, quando eu estava a ganhar!

— Isso não ficou estabelecido! A minha mão era seguramente superior.

— Oh, por favor, Solo! Queres enganar quem com essa tua conversa gasta de contrabandista falhado? A Aliança amansou-te os instintos, costumavas ser implacável… e seguramente mais inteligente. Os teus esquemas nunca tinham pontas soltas.

— Não acredito em nada disto!

— Pois deves acreditar, Solo. Ou deixaste de confiar no teu amigo Calrissian? Até o wookie já percebeu o que está a acontecer.

— Chewie?

Uma rosnadela de confirmação deixou Han ainda mais incrédulo. Arrastou a bota, ouviu-se um som áspero, havia areia no chão.

— Não querem ir para um lugar mais iluminado? – convidou o homem. – Assim poderemos desfazer todos os equívocos e conversar como pessoas civilizadas. – Apontou com o polegar para trás, num gesto rápido. – De qualquer modo creio que não estão em posição de recusar, pois eu estou a ser… persuasivo. Não arrisquem provocar-me, porque os meus companheiros não costumam perdoar deslizes. Ao contrário, lamentavelmente, de mim próprio. Estou a ficar mais velho, mais… mole. Como tu, Solo. Não fui amansado pelos rebeldes, mas pela vida em si. Tenho perdido algumas coisas, mas outras não admito perder. Como o meu prémio! E vocês são um enorme prémio! Vamos?... Amigos?

E assim, Han, Lando, Chewbacca e um desanimado Threepio regressaram ao interior da fábrica, entrando pelo mesmo alçapão que tinham usado para fugir. Depois de desarmados, as armas todas confiscadas, incluindo Chewie que teve de se separar da sua besta laser artesanal com um urro, foram empurrados para uma sala vazia. Uma arrecadação com paredes metálicas com um odor peculiar a ferrugem, embora estas se mostrassem polidas, cuidadas, brilhantes, sem manchas suspeitas. Só quando entraram aí e as portas foram trancadas pelo androide inimigo é que se puderam voltar e comprovar a identidade, sem lugar para dúvidas, do homem que os capturara porque a sala era muito bem iluminada. Conseguia-se ver tudo. A desolação do lugar asséptico, a sua situação periclitante, aqueles que os aprisionavam.

Era efetivamente o taanabiano, Yur Tomason.

Han cruzou os braços.

— Acho que nos deves uma explicação… O que fazes aqui?

Tomason também cruzou os braços. Fez um movimento curto com a cabeça na direção de Lando.

— Estou atrás dele.

— Existem milhares de lugares na galáxia onde nos podias ter encontrado. Porquê precisamente… aqui?

— Vocês vieram para cá. Limitei-me a seguir o localizador que foi colocado na Falcon a meu pedido.

— Não te faças de desentendido.

— Julgavas que não seria assim tão fácil?

— O que sabes sobre Hkion? – exigiu Han e elevou a voz.

Os cinco mercenários espalhavam-se pela arrecadação, a cobrir todos os ângulos. Olhavam-nos com um certo desprezo, uma alegria selvagem pelo sucesso da captura, divertimento por se acharem na posição superior. As respetivas armas balançavam junto à perna, mas permaneciam engatilhadas, prontas a disparar. A atitude negligente era apenas teatral, para acentuar a sua hegemonia. Ninguém podia mover um músculo, caso contrário a ameaça surgia. Lando não se deixava enganar pela aparente apatia. Já Threepio, por seu turno, escudava-se na envergadura do wookie que vigiava atentamente os mercenários e o androide inimigo, parado junto ao painel dos comandos da porta.

O taanabiano riu-se.

— Não ficaste chocado com a existência de um localizador na Falcon?

— Essa não é a única justificação – acusou Han espetando um dedo na direção do rosto do sorridente Tomason. – Aliás, não é justificação nenhuma. Podias encontrar-nos depois, mas escolheste meter-te em Hkion. É um sistema que costumas visitar com alguma frequência porque tens aqui os teus negócios mais importantes. Estás a viver à custa do outro de Hkion, Tomason!

Não houve qualquer réplica, nem o taanabiano se incomodou em rebater alguma daquelas afirmações acusatórias. Lando olhou atarantado para o amigo, depois olhou para Tomason. Dir-se-ia que iria protestar em nome deste, porque achava aquelas suposições descabidas, mas Han prosseguiu:

— A história com o Lando foi apenas um pequeno aparte. Por acaso, nós viemos para cá e esfregaste as mãos quando nos descobriste aqui. Em vez de perderes tempo a resolver esse pequeno problema no teu currículo, o problema veio ter contigo e achaste que podias fechá-lo e passar adiante.

Entretido com o relato, o taanabiano inclinou a cabeça para a esquerda e franziu os lábios, como se avalisasse a verdade das palavras proferidas.

— És tu que exploras a fábrica dos clones – continuou Han, contundente. – Essa é a tua real atividade. Reativaste a fábrica que, entretanto, esteve parada desde o fim da Guerra dos Clones, no tempo da Antiga República. És tu o dono deste empreendimento. Estás a fazer uma pilha de dinheiro com os senhores ambiciosos de Hkion e geres esta pequena distração que os príncipes querem usar em proveito próprio. Rodeaste-te desses mercenários que te protegem as costas. Estás a agir à margem da lei, à margem da Nova República!

Tomason tornou-se, subitamente, sério. O lábio superior arrepanhou-se num trejeito desagradável.

— General Solo, a tua ousadia é lendária. – Abriu os braços num gesto brusco e sentenciou: – Mas não poderás fazer cumprir a lei aqui, nem invocar a Nova República para vir em tua salvação. Estás em Hkion, és meu prisioneiro e a festa terminou.