Opostos

Pizza, filme, afeto.


Capítulo VII – Pizza, filme, afeto.

E quando eu tô cansada e penso em dar um basta
É só te encontrar, um olhar me basta
E nada mais me afasta de ti
Pois só você me faz sentir

Como se todo dia fosse sexta

Sexta – Negra Li.



Ponto de vista por Edward Cullen

Eu não sabia o que estava acontecendo comigo. Sempre fora um homem racional, metódico, nada impulsivo. Contudo, desde que eu havia conhecido a linda tia de minha aluna Claire, tudo o que eu não possuía mais era racionalidade. Primeiro, eu havia emprestado meu guarda-chuva para uma completa estranha; não era nada demais, mas se eu fosse emprestar meu guarda-chuvas para todos os parentes de meus alunos que não levavam tal objeto em dias chuvosos, eu ficaria pobre. Após isso, eu marquei de ir à casa de Claire apenas com a esperança de ver Isabella. Sim, era verdade que eu estava feliz e surpreso com o desempenho de Claire em matemática, mas se eu fosse ir à casa de todos os meus alunos que tiravam uma nota boa, eu não teria mais tempo para mim mesmo, certo?

Como se tudo isso não bastasse, eu lhe dei uma carona para casa, lhe consolei e ainda falei de minha história de vida, o que me rendeu um abraço de Isabella antes de ela se despedir e entrar em casa. Era óbvio que eu não era um insensível, eu teria oferecido consolo a qualquer pessoa que passasse por uma situação tão sufocante na minha frente como ocorreu com ela. A mãe e a irmã de Isabella eram preconceituosas e intragáveis, percebi rapidamente, ao ver que tratavam Isabella com desprezo apenas por ela ter feito suas próprias escolhas; a mãe de Isabella era a pior, uma arrogância infundada emanava dela; já Rosalie repetia as atitudes da mãe em sua filha, Claire. Não compreendia a filha, cobrava-a demais, queria que tudo estivesse sob seu controle... Enfim, tudo naquele jantar – tirando a presença de Isabella – havia sido um pesadelo.

Eu consolaria, sim, qualquer pessoa que necessitasse, mas com Isabella era algo a mais do que isso: estava encantado por ela, interessado em conhecê-la mais, eu diria. Por isso, mandando para o inferno minha ética e meu senso crítico, me deixei levar: entrei em sua casa, aproximei-me dela, dei meu número de telefone, puxei conversas, a chamei para sair.

Era sexta-feira, quase noite, e eu estava nervoso como há muito tempo não ficava. Sei que disse a ela que queria ser seu amigo, mas eu tinha quase certeza que queria mais do que isso. Será que ela havia percebido minhas investidas? Eu sinceramente esperava que sim. As horas haviam se arrastado hoje. Combinei de buscar Isabella na faculdade às 19h; eram 18h5min e eu já estava saindo de casa por não aguentar mais esperar, mesmo morando relativamente perto do local indo de carro. Resultado: cheguei na faculdade de Isabella às 18h18min.

Correndo o risco de parecer chato e extremamente invasivo, lhe mandei uma mensagem:

“Olá, linda. Já estou lhe esperando no estacionamento, certo?”

Sua mensagem não demorou a chegar.

“Eu achei que tínhamos combinado às 19h? Revisei tantos textos em meu estágio pela manhã que devo estar louca...”

Eu ri de suas palavras. Isabella sabia ser gentil, eu não a imaginava sendo rude com quem quer que fosse.

“Combinamos às 19h, mas eu estava tão ansioso para lhe ver que acabei vindo antes.”

Antes que eu pudesse impedir meu surto de sinceridade, enviei a mensagem. Isabella respondeu com um emoji de corações no lugar dos olhos, além de responder que estava saindo de sua aula. Meu lado certinho quis insistir para que ficasse, que eu não me importava de esperar sua aula acabar, mas seria uma grande mentira. Eu queria muito vê-la, aproveitar sua companhia; o quanto antes, melhor.

Logo em seguida, ela apareceu em meu campo de visão, descendo as escadas em direção ao estacionamento, onde eu estava. Saí do carro para que ela me visse e não tivesse que ficar procurando no escuro. De longe, ela parecia cansada, mas ainda assim linda. Quando me viu, lançou-me um sorriso encantador, que foi impossível não retribuir.

— Olá, Edward. – O jeito que sua voz doce e meiga pronunciava meu nome só perdia para o jeito que ela pronunciava professor. Contudo, não posso negar que esperava que ela me chamasse desta forma em outras situações mais quentes. Forcei-me a focar no presente, agora não era hora de ficar perdido em pensamentos.

—Olá, Isabella. –Retribui seu cumprimento, aproximando-me dela e lançando um beijo demorado em sua bochecha. –Pronta para nossa noite?

—Com certeza! Estou morrendo de fome, e você? Eu não consegui almoçar hoje porque meu chefe, aquele ridículo, me deu um artigo enorme para revisar no meio da manhã e disse que eu só sairia quando terminasse. Resultado? Me atrasei, às 13h estava recém saindo da editora...

Abri a porta do meu carro para Isabella, contornei o veículo, entrei e dei a partida, atento ao que Isabella me contava. Era reconfortante ver que apesar de nosso pouco tempo de convivência, ela se sentia à vontade para contar-me coisas do seu dia.

—Você tem que comer, vai acabar ficando doente assim.

—Universitários não comem, Edward, vivem à base de ódio e café, apenas. Você não se lembra disso mais? –Ela brincou. Eu ri de sua piada. Isabella era tão espirituosa, engraçada, delicada. Era fácil estar com ela, rir com ela, gostar dela.

—É verdade. Sabe que isso não muda muito quando você se forma professor? A gente tem que escolher entre comer, dormir ou corrigir provas. –Exagerei. Ela riu de minha brincadeira.

—Pelo menos o salário é melhor que o de uma estagiária.

—Mas não muito melhor. –Admiti. –No entanto, o retorno dos alunos é imenso e quase chega a compensar, apesar de precisarmos trabalhar o dobro para poder viver razoavelmente bem.

Eu sorri. Adorava dar aulas, mesmo que o poder aquisitivo não fosse tão bom assim. Escolhi a realização pessoal em vez de retorno financeiro, e não me arrependo. Tinha certeza que Isabella se sentia da mesma forma. Era apaixonante vê-la falar de suas escolhas, sonhos, objetivos.

Enquanto dirigia para sua casa e a ouvia falar, percebi que gostaria de fazer aquilo muitas mais vezes, por anos. A sensação era boa demais.

(...)

—Você sabe de alguma pizzaria boa por aqui? – Isabella me questionou assim que chegamos em sua casa. O espaço era pequeno e simples, mas muito aconchegante, tinha cheiro e cara de lar. Eu me senti bem ali, ao seu lado. Sentei-me em seu sofá, pegando meu celular e abrindo o aplicativo de comida.

—Sei sim, pode deixar que eu peço, você vai adorar. Eles fazem as pizzas em forno à lenha, o que dá um gosto super especial a elas.

—Isso é ótimo, Edward. Sempre que almoço fora, o destino é o Mc Donald’s por causa da Claire. Eu tenho que ensinar aquela menina a comer outras porcarias para que possamos variar. –Ela riu.

—Em uma próxima vez, quem sabe, se você gostar da pizza, podemos ir até à pizzaria e levar Claire conosco, assim viciamos sua sobrinha em uma bomba de carboidrato diferente.

Ela se sentou ao meu lado em seu sofá e apoiou sua cabeça em meu ombro, espontaneamente. Passei meu braço por sobre seus ombros para que ficássemos mais perto e ela não pareceu se importar.

—Eu tenho certeza que ela iria adorar, Edward, mas é raro eu ver a Claire no fim de semana.

—E por quê?

—Porque eu, aparentemente, só sirvo para buscá-la na escola e ficar com ela quando Rosalie está trabalhando muito no turno da noite ou em raros sábados pela manhã. Quando não sou mais útil a ela, posso ir embora.

—E por que você se sujeita a isso? –Perguntei irritado. Beirava ao absurdo o jeito que a irmã e a mãe de Isabella a tratavam.

—Porque eu quero e devo estar com minha sobrinha, então agarro as oportunidades que tenho. Não desejo que ela cresça como eu, não tendo ninguém para conversar ou ser ela mesmo sem temer julgamentos.

Suspirei em frustração. Isabella estava certa, e eu via o quanto ela gostava de Claire e vice-versa.

—Sabe de uma coisa?

—O quê?

—Claire tem muita sorte de ter você. Ela não é nada parecida com sua mãe ou irmã, ela tem muito de você.

—Você não pode estar falando sério.

—É claro que estou, Bella. Você é gentil, educada, perspicaz... Claire tem o mesmo jeito. Ainda bem, né? Se ela fosse igual à sua mãe, eu acho que já teria pedido demissão daquela escola, seria demais para mim.

Isabella não pareceu se importar com minha brincadeira, rindo do que eu disse. Logo, a pizza que eu havia pedido chegou, e ela foi até a cozinha pegar pratos e copos para que pudéssemos comer e beber nosso refrigerante na sala, vendo televisão.

—O que você quer ver, Edward?

Mal sabia ela que essa pergunta era o começo de um longo tempo de indecisão e ponderações. Eu era muito indeciso para escolher filmes.

—Eu não sei. Você quer escolher?

—Vamos escolher juntos.

A sugestão de Isabella só piorou as coisas, porque descobrimos que nós dois éramos indecisos para escolher um simples filme na Netflix. A pizza já estava fria quando, enfim, ficamos entre três filmes: um de drama, um de comédia e um de romance. Depois de mais meia hora de discussões, finalmente decidimos ver o filme de drama.

Comemos em silêncio, prestando atenção no filme. Descobrimos, no decorrer do longa, que se tratava de um filme de drama com romance, o que aliou o gênero preferido de Isabella ao meu. Uma mulher de meia idade tentava se descobrir depois de muitos anos imersa em um relacionamento abusivo, ao mesmo tempo que começava a sentir uma paixão avassaladora pelo seu ex-cunhado, que enfrentava uma dura reabilitação por ser alcóolatra. No fim do filme, quando os dois finalmente decidem ficar juntos, o homem descobre um câncer no fígado e morre rapidamente.

Era vergonhoso admitir, mas eu chorava silenciosamente com aquele final – a mulher, muito consciente de si, da sua importância, triste e melancólica no enterro de seu amado, que havia a ajudado a se reencontrar. Era horrível demais.

Isabella me alcançou uma caixinha com lenços de papel, além de me presentear com um de seus sorrisos reconfortantes. Após isso, ela chegou mais perto de mim, pousou uma de suas mãos em meu cabelo e começou um delicado cafuné. Eu aconcheguei-me mais a ela, aproveitando seu carinho, sua compreensão e sua delicadeza.

Seu gesto carinhoso, seu cheiro, seu corpo próximo do meu fizeram com que eu me sentisse em casa – eu não queria estar em nenhum outro lugar que não ali, com aquela mulher incrível. Acho que eu estava apaixonado. Era cedo demais? Talvez, mas eu não poderia me importar menos.

Não sei quanto tempo ficamos aconchegados um no outro, aproveitando o momento; os créditos já haviam terminado há muito tempo, mas eu não fiz menção de me mexer, assim como Isabella. Em algum momento da noite, eu adormeci inconscientemente, sentindo-me em paz, querido, vivo.

Acho que, a partir de agora, amo sextas-feiras, se todas forem assim, na companhia de Isabella. Eu faria o possível para que fossem.