Opostos

O Guarda-Chuva


Capítulo I – O Guarda-Chuva.

“Quando a gente gosta, a gente começa emprestando um livro, depois um casaco, um guarda-chuva, até que somos mais emprestados do que devolvidos. Gostar é não devolver, é se endividar de lembranças.”

Fabrício Carpinejar

O dia estava bastante nublado hoje, e o vento rajava forte pelas ruas de Nova Iorque. Eu andava apressada, temendo não chegar a tempo na escola da minha adorável sobrinha Claire. Por algum motivo, Rose não poderia buscar a filha na escola, e sobrou para quem? Exato, para a irmã mais nova Isabella Swan, que no caso, sou eu. Não que eu pudesse reclamar, no entanto. Eu era simplesmente apaixonada pela minha pequena garotinha que já tinha seus oito aninhos. Como o tempo passou rápido!

A escola de Claire era relativamente próxima do meu trabalho. Bem, na verdade, não era um trabalho, mas um estágio de meio período. Eu cursava a faculdade de Letras à tarde e trabalhava numa editora revisando textos pela manhã. Era um trabalho realmente bom, contudo, não era o que eu almejava para o futuro. O que eu queria mesmo fazer depois de formada era dar aulas. Passar conhecimento para alguém me parecia ser simplesmente fascinante! Ensinar era a minha paixão, contrariando as expectativas da minha mãe, que queria uma filha advogada e outra médica. Rose ficou com o Direito, e amava o que fazia. Quanto a mim, não tive nenhuma vontade de ser médica em momento algum. Sempre quis ser professora, e era o que eu seria. Simples assim.

Entretanto, a desaprovação de minha mãe pela minha carreira fez com que ela literalmente me expulsasse de casa. Eu fiquei com Rose por alguns meses, porém não era nada legal dormir em um sofá todas as noites. Por isso, assim que arrumei o estágio, aluguei um minúsculo apartamento bem perto da faculdade e me mudei. O dinheiro era estritamente controlado, pois não era nada fácil pagar os estudos, morar e comer ao mesmo tempo, mas eu até que estava indo bem nesse primeiro mês.

Meus pensamentos se dissiparam assim que eu ouvi um forte trovão relampejando no céu escuro. As grossas gotas de chuva começaram a cair rapidamente, e eu soltei um suspiro de alívio ao ver que tinha finalmente chegado em frente à escola de Claire. Olhei em meu relógio. Merda. Meio-dia e dois minutos. Eu estava atrasada por malditos dois minutos e minha sobrinha não estava à vista. Decidi entrar na escola e procurar por ela, já me amaldiçoando por não ter trazido comigo um guarda-chuva. Como eu levaria a menina até em casa? Ela poderia ficar doente se se molhasse demais, pelo amor de Deus! Aí Rose me culparia, minha mãe me culparia, e todos reforçariam o quanto eu era uma incompetente que não podia nunca ter saído de casa, pois não sabia cuidar nem da sobrinha pequena, quanto mais de mim mesma. Merda!

–Posso ajudá-la, querida? – Uma senhora já de idade me perguntou assim que eu entrei nas dependências da escola. Aposto que ela deveria ser a diretora.

–Eu vim buscar a minha sobrinha, mas não sei em que turma ela estuda. Desculpe. Atrasei-me por dois minutos e não estou encontrando-a. A senhora sabe me dizer onde ela está? – Praticamente implorei. Quer dizer, eu estava apavorada. Se Rose descobre que eu me atrasei e não encontrei seu bebê ela me mata!

–Acalme-se. Dois minutos nem pode ser considerado um atraso, querida. –Ela riu, parecendo achar a minha preocupação adorável. Eu me concentrei para não revirar os olhos. –Como está chovendo, as crianças estão na brinquedoteca para não se molharem no pátio. Siga por esse corredor e entre na segunda porta à esquerda que sua sobrinha estará lá.

Agradeci rapidamente a mulher e segui na direção que ela havia me informado. Na minha pressa, nem ao menos me lembrei de bater na porta. Simplesmente a abri, aliviada por encontrar Claire sentada à uma pequena mesa de plástico, conversando com um homem até bem alto, que estava olhando para ela, mas de costas para mim. Graças a Deus! Eu não era uma péssima tia, no fim das contas! Só estava sendo neurótica, como sempre...

–Claire! Vamos, a tia Bella veio de buscar hoje, linda! –Claire se levantou rapidamente, pegou sua mochila cor de rosa com roxo e veio imediatamente em minha direção. Entretanto, o tal homem a parou antes que ela pudesse chegar até mim. Resolvi olhar para ele em busca de respostas, mas qualquer questionamento que eu tinha foi embora ao ver o rosto daquele homem. Ele parecia tão bonito em sua calça social e sua camisa branca de botões. Elegante demais para estar em uma escola, eu diria. Seus cabelos meio bagunçados pareciam tão macios e aquela cor totalmente diferente das demais me chamou muito a atenção. Porém, nada se comparou ao que eu senti ao ver sua barba por fazer parecendo incrivelmente... Atraente. Eu queria tocá-la. Queria senti-la em mim. Ah, meu Deus, Isabella. De onde veio tudo isso? Finalmente, me concentrei em seus olhos incrivelmente verdes e sérios. Ele parecia dizer algo, mas eu não ouvi nada. Merda! –Poderia repetir, por favor?

–Quem é você? A mãe de Claire sempre vem buscá-la. Não tenho conhecimento da senhorita. –O homem extremamente belo tinha uma voz extraordinária também. Rouca e grossa na medida certa. Deus, eu precisava, definitivamente, buscar minha sobrinha mais vezes.

–Eu sou a tia da Claire, irmã de Rosalie. De fato, ela sempre vem buscá-la, mas hoje acho que teve um imprevisto no trabalho e pediu para que eu buscasse a garota. Problemas com isso, Sr...? –Arqueei minhas sobrancelhas, como se estivesse ofendidíssima com seu questionamento. Na verdade, eu apenas queria saber o seu nome, embora todas essas perguntas estivessem sim, me irritando. E me deixando atrasada também.

–Cullen. Edward Cullen. Professor de matemática da Claire. –Eu crispei meus lábios ao ouvir a palavra matemática. Eca, definitivamente eca. O que leva uma pessoa a gostar das exatas, afinal? Era loucura! Certo, certo. Talvez não seja, eu estou apenas sendo recalcada. Como uma apaixonada pelas humanas, eu tinha o mesmo problema que quase todos da minha área: os números não era o meu forte. Não mesmo. –Algum problema, Srta...? –Ele repetiu meu gesto, e deu a mesma arqueada de sobrancelha que eu. O nojo pela matemática fora momentaneamente ao notar sua expressão adorável.

–Swan. Isabella Swan. Tia da Claire e futura professora também. De Inglês e Literatura.

–Oh, então está tudo explicado. A dificuldade de Claire com os números é algo genético. –Ele soltou um riso debochado, e eu me limitei a revirar os olhos. O quê? Que absurdo! Esse homem nem me conhecia e queria vir dizer no que eu tinha dificuldade? Só por que a maioria tem, não quer dizer que seja uma regra geral! Sujeito intragável esse, meu Deus!

–Não tire conclusões precipitadas, Sr. Cullen. Isso tudo é o senso comum falando, ou o machismo? –Provoquei. –Saiba que se Claire está com dificuldade em matemática, eu posso muito bem ajudá-la.

–Mas tia, você é péssima em cálculos! Não é por isso que você sempre usa a calculadora? –Ótimo, outra. Uma pequena traidora na família. Eu mereço.

–Você não sabe o que está dizendo, Claire. Eu sou ótima em matemática. Hoje mesmo depois da faculdade vou passar na casa da sua mãe para lhe ajudar. Agora, vamos! Estou atrasada!

Peguei sua pequena mãozinha com a minha e coloquei sua mochila nada discreta em meu ombro. Estava pronta para me afastar dali sem nem ao menos dar tchau ao homem irritante, mas ele se pronunciou antes que pudéssemos sair, infelizmente.

–Espere! Como eu vou saber que você é mesmo quem diz? E se for apenas uma sequestradora querendo roubar a minha aluna? Ligarei para a mãe dela antes, Srta.

–Ah, droga! Isso realmente não é necessário. Claire está saindo comigo de muito bom grado, e outra, eu não tenho cara de psicopata, Sr. Cullen! Procure um psicólogo para parar de ser um neurótico de merda! Eu vou me atrasar para a faculdade!

–E isso é jeito de falar na frente de uma criança? Agora é que eu faço questão de ligar mesmo! Vamos até a secretária usar o telefone. –Esse professor estava brincando comigo, certo? Não é possível!

–Não há necessidade! Ligue de meu celular, e observe bem o nome. –Estendi meu celular a ele, não antes de discar o número de Rose, que estava salvo na agenda como “Irmã”.

Ao contrário do que eu esperava, Claire não me defendeu para seu professor. Ela apenas olhava a cena quieta e muito concentrada, até mesmo feliz, eu diria. O que estava acontecendo com aquela garota, afinal? Eu, hein!

Eu ouvia o babaca falando ao telefone com minha irmã, mas tentava não prestar atenção para não me irritar ainda mais. Sério, custava acreditar em mim? Por que eu sequestraria uma criança? Não fazia sentido algum!

–Pronto, Srta. Swan. Obrigado pelo celular. –Ele estendeu o celular para mim. –Pode ir agora.

–Acho que o senhor, professor, me deve um pedido de desculpas!

–Ora, e por quê? Estava apenas prezando pelo bem-estar de minha aluna.

–Uma ova que estava! Agora eu estou atrasada para a minha aula e tudo por sua culpa! Idiota! –Novamente, peguei a mão de Claire e saí da porta daquela sala maldita, arrastando-a para longe daquele ser intragável. Ainda pude ouvi-lo rir baixinho, mas não me atrevi a olhar para trás. Provavelmente nunca veria um homem tão bonito quanto aquele outra vez. Merda!

Assim que saímos do prédio da escola de Claire, percebi que chovia. Chovia mais forte do que antes agora. Chovia torrencialmente. E porra, eu não tinha um guarda-chuva. E porra, eu estava com a minha sobrinha pequena bem ali! Permaneci com Claire embaixo do telhadinho de seu colégio, pensando no que fazer. O certo era esperar a chuva passar, fazer o quê? Eu já estava atrasada para a faculdade mesmo.

–Tia, nós não vamos embora? Eu estou com fome. –Olhei para a minha adorável menina e meu coração quase se derreteu todo. Merda, eu tinha que parar de ser tão irresponsável. Se eu tivesse trazido um guarda-chuva, poderíamos já estar em casa. Se eu não tivesse me atrasado dois minutos, eu não teria que ver aquele professor neurótico e preconceituoso. E o pior? É que eu havia gostado de vê-lo. Afinal, quem não gostaria? Era uma visão e tanto! Não é hora para isso, Isabella! Sua sobrinha está com fome!

–Nós já vamos, amor. Só espere a chuva passar um pouco, sim? A tia esqueceu de trazer um guarda-chuva e não quero que você se molhe.

–Eu também não quero que vocês duas se molhem, garotas. –E lá estava ao nosso lado novamente, o professor neurótico. Argh. –Pegue aqui, Isabella. –Eu não consegui raciocinar direito o que ele queria que eu pegasse. Não. Tudo o que eu sabia era que o meu nome inteiro pronunciado por ele ficava extremamente sexy. E eu queria ouvir aquilo de novo e de novo. Milhares de vezes mais, se fosse possível. –Isabella? –Ah, sim. Mais uma vez. No entanto, o que ele queria mesmo? Ele estava me estendendo algo. Um guarda-chuva. Merda, ele estava sendo gentil.

–Ah, não precisa, professor. Eu e Claire esperamos a chuva passar, não tem problema. Agora eu já estou muito atrasada, de qualquer jeito.

–Eu insisto, Isabella. Por favor, pegue. –Ele sutilmente pegou na minha mão esquerda, a que não segurava a de Claire, e levou-a até o guarda-chuva. O toque suave de sua mão tão grande e firme na minha me fez estremecer. Provavelmente, eu estava delirando, mas juro que ele também sentiu algo... Similar. O olhar que ele me lançou depois disso foi algo intenso. E eu não sabia o motivo de tudo aquilo. Meu bom Deus, eu estava atraída pelo professor da minha sobrinha!

–Vamos, tia! Aceita logo, eu estou com fome. –O Sr. Cullen riu com a voz fina e melodiosa da minha menina, e aquilo foi o bastante para que eu despertasse do meu devaneio.

–Tudo bem. Obrigada pela gentileza, professor. Eu mando o guarda-chuva de volta pela Claire o mais rápido possível.

–Ou você pode vir qualquer dia desses buscá-la, e me devolver, Srta. Swan. –Ele piscou para mim. Ah, meu Deus, o professor da minha sobrinha piscou para mim! –Bem, fica a seu critério. Até breve.

Definitivamente, eu viria buscar Claire mais vezes na escola. Mesmo que o professor dela fosse terrivelmente neurótico, machista, e... Terrivelmente lindo e encantador.