Once Upon a Time - Lua de Sangue

A Escuridão vem para a Terra


A Fada Nova estava em luto.

Depois da maldição ter sido quebrada, ela e Leroy relembraram suas origens. Relembraram que ela era uma fada, e ele, um anão. Relembraram sua história de amor tocante, e seu final conturbado. Eles relembraram tudo, mas não voltaram a namorar.

Sequer se falavam direito.

Nova tinha vergonha do que tinha acontecido anteriormente, quando ela e Leroy tinham “terminado”. Não que a Fada Azul fosse deixar que ela e Leroy começassem a namorar ou algo do gênero, mas…

Agora estava tudo acabado. Leroy tinha morrido na explosão. Nova havia recebido a notícia no alvorecer de um dia que pensou ser apenas “mais um”.

Mas não era.

Por incrível que pareça, nenhuma lágrima saiu de seus olhos. Nenhuma lágrima contornou seu rosto, escorrendo por ele. Ela não conseguia chorar, pois sua alma estava fria. Seu coração estava frio. Seus sentimentos haviam sido congelados por completo.

***

As batidas ressoavam na madeira cada vez mais forte.

—Espere, já estou indo! - Gritou Ashley. Tinha acabado de alimentar Alexandra, e estava prestes a tomar banho, quando alguém começou a bater na porta.

“Alguém muito desesperado”, pensou ela, percebendo que a pessoa batia cada vez com mais força.

Ela desceu as escadas, olhando para os lados. A casa estava estranhamente vazia agora. Com Mitchell morto após a explosão no Granny’s, não parecia morar uma alma sequer naquela casa.

A porta foi enfim aberta, revelando um homem parado na soleira. Sua cabeça estava raspada, e seus olhos estavam cheios de desespero. Era baixo e razoavelmente magro, e tinha uma boca um pouco torta.

Ashley parecia reconhecer ele, mas não sabia de onde.

—Quem é você? - Perguntou Ashley, olhando para o homem com desconfiança.

O homem pigarreou.

—Prazer, senhorita… Cinderella, não? Meu nome é Will Scarlet, ou, se prefirir, o Valete de Copas.

O noma a fez lembrar. Will Scarlet, o homem que namorava sua irmã adotiva, Anastasia, e anos depois de seu casamento com Thomas, havia fugido com ela.

—Will!!!

—Se lembra de mim? - Perguntou ele, descrente. Ashley sorriu e assentiu logo em seguida.

—Como poderia me esquecer? Anastasia não parava de falar com você. Tremaine não parou também, depois de você ter fugido com Ana.

Ele sorriu.

—Quer entrar? - Perguntou Ashley, indicando a porta. Ele assentiu, entrando na casa.

—Se me dá a licença…

***

Ruby estava em coma fazia três dias.

Seu estado havia melhorado bastante, mas ainda assim a garota não saiu do coma.

Ficava lá, deitada, dia após dia, sem consciência alguma. Seus cabelos estavam engordurados e embaraçados, e em algumas partes eles faltavam, pois o fogo havia queimado. Seu rosto tinha algumas cicatrizes, e seus braços estavam queimados, e seu couro cabeludo estava em carne viva.

Apesar disso, ela respirava. Apesar disso, ela ainda viveria. Ela ainda acordaria.

Ou melhor, poderia acordar.

Pois quando a figura de cabelos castanhos escuros e longos perguntou à recepcionista qual era o quarto de Ruby, e quando essa mesma figura andou até o quarto, olhou para ver se não havia ninguém por perto e se dirigiu até a maca da mulher, todas as chances de ver Ruby algum dia acordada novamente se foram.

Quando a seringa cheia de veneno entrou em seu pescoço, ela não sentiu. Seus lábios não se abriram em um berro quando o líquido entrou em sua corrente sanguínea e sufocou os seus pulmões, nem seu coração bateu mais rápido quando suas narinas pararam de puxar o ar para dentro e quando a Morte apareceu para lhe levar para uma última viagem.

Seu cadáver foi encontrado depois de quinze minutos, quando a figura de cabelos castanhos estava muito longe para ser encontrada. E, apesar dos ferimentos, das queimaduras, das falhas capilares, e de todas as cicatrizes, Ruby nunca esteve tão bela.

***

—É sério isso? - Perguntou Ashley, parecendo preocupada. Will assentiu.

—Eu e Anastasia, após Jafar ser derrotado, nos casamos, e vivemos felizes por um tempo no País das Maravilhas. - Will respondeu. Ele e Ashley estavam conversando fazia horas. Ela já havia contado para ele sobre todas as coisas que haviam acontecido em Storybrooke: a maldição, Cora (que Will conhecia muito bem), Tamara e suas ameaças, Peter Pan, a segunda maldição e a recém-morta Bruxa do Oeste. Ele também havia contado para ela sobre suas aventuras: sobre sua viagem para o País das Maravilhas junto de Anastasia, o término dos dois após Anastasia virar Rainha, a amizade de Alice e Will, Jafar, Cyrus, o Coelho Branco, e tudo mais.

Ashley era boa ouvinte. Parecia estar sempre interessada, fazia vários comentários, e principalmente: tinha um sorriso lindo. Sua estatura era parecida com a de Anastasia: cabelos loiros e lisos, mas não muito longos como o de uma princesa de quem Will havia conhecido a história, uma boca fina e bela, e um sorriso que maravilhava qualquer um.

—Eu e Thomas também já tivemos nosso “breve final feliz”. Foi bem breve, mas aconteceu. - Disse Ashley. Will sorriu, e a garota o olhou, abismada.

—Você está rindo por quê? - Perguntou ela. Não passaram-se segundos até Ashley também começar a rir.

—Sei lá, é que… Sabe, é engraçado esse negócio de “final feliz”. Todos os finais felizes acabam num momento, pelo que eu vi. Eu vivi feliz para sempre com Anastasia, mas agora ela se esqueceu completamente de mim e está com seu marido, com quem você também viveu feliz para sempre por um bom tempo. Quer dizer, vocês tem até uma filha.

Ashley assentiu e depois deu de ombros. Um calor percorreu seu corpo. Will parecia ser tão divertido. Tão alegre.

—Ultimamente, eu venho pensando se todos nós, seres humanos, não temos nosso final feliz em apenas um momento da vida. - Disse Will. Ashley olhou para seus olhos castanhos, interessada.

—E qual seria esse momento?

—Quando a vida acaba. Temo que o único final feliz só possa ser alcançado com a morte. - Disse Will. Ashley achou um estranho sentido naquelas palavras, e assentiu.

—O quê você faz aqui, afinal de contas? - Perguntou ela, e Will deu de ombros.

—Fiquei sabendo que o homem que está com minha esposa nesse momento é seu marido, ou seja, meu cunhado. Então decidi vim ver você e… Sei lá. - Ele sorriu de modo triste. - Eu precisava de alguém para conversar, para falar de Anastasia…

—Geralmente eu falaria com Robin, mas… - Will ficou em silêncio. Robin havia morrido fazia alguns dias, mas Will não havia superado a morte do amigo.

—Então eu decidi vim ver você, cunhada! - Will olhou para ela e sorriu. Ela retribuiu o sorriso.

—Saiba então que será sempre bem-vindo aqui em casa!! Aliás, por que nós não...

Alexandra então começou a berrar de fome, chorando, e Ashley interrompeu sua fala.

—Oh, céus! Alexandra deve estar com fome. - Ashley levantou-se e saiu correndo, com pressa.

De repente, Will sentiu uma súbita vergonha alheia. No quê ele estava pensando? Invadir a casa de uma pessoa que ele mal conhecia para lhe contar sobre seus “sentimentos”.

“Isso é ridículo”, pensou Will. Ele odiava Thomas por ter roubado sua mulher, por ter roubado a vida de Will com Anastasia. E tudo o que ele mais queria era falar mal dele, maltratar ele, humilhá-lo… Era uma estranha idéia achar que Ashley, a mulher de Thomas, seria a pessoa ideal para depositar esses sentimentos.

—Ashley, acho que já vou indo. Tchau, e… Até mais! - Will não esperou resposta, apenas saiu correndo em disparada para a direção da porta.

***

Tremaine estava com a respiração pesada.

Há três dias, havia descoberto por intermédio de Rumplestilskin que Drizella havia sido morta por Cruella. Nesse espaço de tempo, havia tentado convencer a si que era engano. Que era apenas um velho tentando enganar Tremaine, tentando se divertir às suas custas.

Mas a dúvida roçava-lhe o pé da orelha. A dúvida a impedia de dormir. A dúvida a fazia temer pela verdade.

Então finalmente ficou a sós com Cruella, após Malévola sair para “resolver alguns detalhes pendentes”. Apenas as duas, no mesmo cômodo. Exatamente como ela queria.

—Estranho os tempos de hoje. Não vejo Drizella faz algum tempo, quase meses. Me pergunto por onde ela anda. - Disse Tremaine, com falsa inocência. Cruella virou-se para ela e encarou-a.

—Não estou ouvindo isso realmente. - Sussurrou Cruella, com nojo.

—O que você não está ouvindo? - Perguntou Tremaine em tom de desafio, o que fez Cruella rir.

—Me poupe do seu teatro ridículo de mãe sofrendo por suas filhinhas. Você, Tremaine, é o tipo de pessoa sem coração que não ama ninguém, seja filha, seja amigo, seja quem for. Você apenas deu comida a elas, nada mais.

—Não sei do que você está falando.

Cruella gargalhou.

—Então pergunte a Anastasia. Ela saberá responder para você exatamente o quê você fez para ela como mãe. Não, espere… Ela não tem quase nenhuma lembrança!!! Não, espere mais um pouco… Ela não tem nenhuma lembrança porque você apagou-as da mente dela!!! - Cruella começou a rir de modo irônico, exibindo seus dentes extremamente brancos.

Tremaine fez um careta de fúria.

—Eu não apaguei nada da mente dela!!!

Cruella, para o desgosto de Tremaine, riu novamente.

—Oh, oh, oh… Então a mulher que me pediu para simplesmente matar Thomas e, junto com ele, todas as suas lembranças está negando seu pedido? A mulher que invocou um ritual para apagar todas as lembranças da mente da filha está negando o que fez? - Cruella parou de rir, e uma sombra passou por seu rosto. Ela andou até Tremaine com passos pesados e agarrou o pescoço da mesma.

Quem você acha que é, sua idiota? — A voz de Cruella não era mais a voz de uma pessoa. Era uma voz monstruosa, sem humanidade nenhuma, uma voz que arrepiou Tremaine.

Tremaine sentiu o ar lhe faltar e a visão falhar. Cruella jogou-a no chão e saiu, vitoriosa.

—Você é fraca, Tremaine. Fraca demais para mim, fraca demais para Malévola, fraca demais até mesmo para a Rainha Má. Você não é nada, a não ser fraca.

Tremaine respirou ruidosamente.

—O quê v-você fe… f-fez para minha f-filha, s-sua…? - A voz de Tremaine falhava. Cruella olhou-a, e sua boca tornou-se um risco.

—Sua filha está morta, e eu a matei. Quer saber dos detalhes? Quer saber como foi entrar em sua casa, ouvir seus gritos de pavor, olhar para seus olhares de desespero, enfiar uma adaga no seu peito e arrancar seu coração? Como eu posso descrever as sensações do sangue escorrendo por minhas mãos, ou do último olhar vazio de Drizella?

Tremaine gemeu de dor, as lágrimas escorrendo por seu rosto. Seu interior era um turbilhão de sentimentos, um misto de raiva, dor e tristeza.

—EU TE ODEIO, CRUELLA DE VIL!!! EU TE…

O corpo de Tremaine foi jogado para o lado, e uma pressão começou a ser feita no seu pescoço. Magia. Cruella estava usando magia para matá-la aos poucos.

Os vidros da casa começaram a se estilhaçar. Tremaine olhou para o rosto de Cruella, e viu uma face monstruosa no lugar de um rosto humano.

—É HOJE QUE VOCÊ MORRE, CRIANÇA!!! - Disse Cruella, ainda com sua face monstruosa. Tremaine fez um esforço para se levantar e usar magia para fugir, mas algo puxava-a para o chão. Magia novamente.

O vento ficou mais forte, e Tremaine começou a ver tudo em vermelho. Sua boca e seus braços pareciam estar em chamas, e ela nem sentia mais a perna de tanta dor. Ela olhou para suas mãos, e viu sangue. Seu sangue pingava no chão, seu sangue escorria por seus braços, seu sangue escorria por sua face.

Só então percebeu: cada pedacinho de vidro que Cruella havia quebrado com sua magia estava entrando nela. Cruella estava controlando o vidro, fazendo ele transpassar cada parte do corpo de Tremaine.

Tremaine tentou se controlar, mas ela não via mais nada. Estava cega, completamente cega. Estava morta, completamente morta.

Antes de desmaiar, Tremaine só ouviu Cruella gargalhando.

***

O colchão duro incomodava Maria.

Ela estava na casa de Regina, deitada em uma cama de solteiro, enquanto o irmão dormia na outra.

Maria não conseguia simplesmente dormir. Toda vez que tentava, ela aparecia em seus sonhos.

A Bruxa Cega parecia não se cansar de atormentar Maria. A garota nem ao menos sabia o motivo, mas a Bruxa insistia que devia atormentá-la. Aparecia em seus sonhos, dizia que estava economizando energia para acabar com Maria, e que logo ela viria para cumprir o prometido.

Estava escuro no quarto. Nenhuma luz, nenhuma iluminação… Apenas trevas.

—O-oL-Lá-ÁÁ!! - Sussurrou uma voz no ouvido de Maria. A garota se sobressaltou e gritou, e a voz gargalhou.

—Esperando por mim, pequena Maria? - Maria sabia quem sussurrava aquelas palavras. Reconhecia a voz.

—Olá, Bruxa. - Maria tentava soar fria, tentava soar corajosa, mas não deu certo. Sua voz saiu fina e esganiçada, e ela não se sentiu corajosa após a Bruxa rir de suas tentativas.

—Oh, você é uma graça quando tenta parecer corajosa! - A luz do quarto se acendeu, e Maria sobressaltou-se novamente ao ver o rosto da Bruxa próximo ao seu, aqueles olhos brancos e leitosos a encarando de perto.

—BUUUUH!

A última coisa que Maria ouviu antes de apagar foi João gritando de dor.

***

—Mas que raios…? - Regina estava tensa. Tinha passado o dia inteiro planejando junto de Emma, Gancho e Encantado quais seriam as melhores maneiras de atacar Malévola e salvar Rumplestilskin. Tinham todos se reunido na sua casa para discutir os detalhes, até a reunião ser interrompida por um barulho no quarto de João e Maria.

Quando Regina tomou a decisão de “adotar” os irmãos, fora um ato calculado. Ela não queria apenas proteger dois pobres órfãos, mas também atrair Harley, a Bruxa Cega, para uma armadilha mágica instalada no quarto dos irmãos.

—Ora, ora - Sussurrou Regina ao abrir a porta do quarto dos irmãos. Lá estava Harley, presa na rede de aço mágico que Regina havia conjurado enquanto preparava a armadilha.

A Bruxa silvava, xingava e amaldiçoava Regina, o quê provocou um ligeiro sorriso na prefeita. Maria estava encolhida em sua cama, desmaiada, e João gritava sem parar.

—O QUÊ VOCÊ FEZ COMIGO, SUA…? - Harley gritava com ela, e Regina riu. Andou até João e pegou em sua mão.

—Querido, vá tomar um copo d’água. Eu te garanto que, quando você voltar, não haverá mais bruxa nenhuma aqui para te atormentar… - João assentiu, enxugou as lágrimas e saiu correndo, parecendo assustado.

Regina então olhou para Harley, e não pôde conter mais um risinho. Regina havia conhecido Harley há muito tempo atrás. Sabia como a Bruxa era alguém que gostava de se vestir bem, que amava ser a primeira em tudo, e que, principalmente, odiava ficar presa e perder para Regina.

A prefeita ficou observando Harley em todo o seu sofrimento e desespero. Em cada movimento da Bruxa Cega, a rede a queimava. Era feita de um aço poderoso, forjada através do fogo do Dragão. Harley não conseguiria escapar. Para isso, teria que fazer vários e vários movimentos, e isso a queimaria cada vez mais.

—Algumas lendas dizem que, se você fizer mais de quinze movimentos nessa rede, seu corpo entra em combustão. - Disse Regina. Harley silvou com raiva, e se movimentou para tentar sair.

A rede queimou cada pedaço da pele de Harley enquanto ela tentava se libertar de sua nova prisão. Regina sorriu ao ouvir os gritos de dor da Bruxa ao tentar fazer mais movimentos.

—EU… VOU… ME… LIBERTAR… DAQUI!!!!!!! - Gritou Harley, sua voz carregada de ódio. Os olhos de Regina faiscaram.

—É mesmo? Então tente. - Harley estava com a pele em carne viva, o sangue saindo dela e cobrindo todo o chão. A Bruxa gemeu de dor ao perceber seu estado.

—Se você pedir por favor, Harley, eu te liberto de sua prisão. - Disse Regina, com um sorriso irônico. Harley guinchou e tentou se libertar mais uma vez. Os gritos dela estavam ficando cada vez mais fortes.

—Só tem que pedir por favor. - Sussurrou Regina, fazendo uma falsa cara de piedade para Harley. A Bruxa Cega estava começando a se cansar; seus braços doíam tanto que pareciam estar em chamas.

Demorou poucos segundos para Harley ver que todo o seu corpo estava começando a queimar: seus braços, suas pernas, sua cabeça, todos eles estavam ficando vermelhos, todos eles estavam prestes a queimar…

—POR FAVOR, ME LIBERTE DAQUI! - Gritou Harley, quase entre lágrimas. Regina sorriu.

—Com prazer, minha cara amiga… - Regina conjurou então uma bola de fogo e jogou-a na rede. Harley gritou por uma última vez ao perceber que seu corpo definitivamente estava em chamas. Sua pele queimava, seus órgãos internos estavam sendo cozidos, e sua boca doía a cada lambida do fogo.

Passaram-se cerca de minutos, e o fogo parou de queimar com tanta intensidade. Os gritos de Harley se calaram, pois sua boca estava morta agora.

E dela não sairia mais nenhuma palavra.

Regina andou até a rede, e com um movimento de mão a desmanchou, podendo visualizar o cadáver de Harley. A Bruxa estava toda queimada, sua carne e sua pele tostadas; e seu cabelo negro como carvão.

—Você mesma me disse uma vez, Harley… Que a única liberdade é a morte. Considere-se liberta, então. - Disse Regina, tirando o olhar do corpo. Com um movimento, tudo aquilo sumiu. Toda aquela sujeira, todas aquelas cinzas… A prefeita só olhou para a criança, para Maria, que estava deitada, olhando-a com olhos assustados.

—Já acordou, meu bem? - Perguntou Regina com um sorriso, se aproximando da garota. Maria se encolheu.

—Você a matou.

Regina assentiu.

—Ela te atormentava, não é mesmo? Uma vez você me disse que não conseguia dormir porque ela vinha em seus sonhos. Mas agora… Agora ela está morta. - Maria se encolheu ao ouvir a palavra “morta”.

—Sim. Ela está.

—Sabe o quê as coisas que nos impedem de ser felizes são? Essas coisas são demônios. Podem ser demônios internos ou externos, mas é isso que eles são… E sabe o quê devemos fazer com esses demônios? - Perguntou Regina. Maria balançou a cabeça, alegando não saber com uma expressão amedrontada.

—Devemos matar esses demônios, está me ouvindo, Maria? Repita comigo.

—D-Devemos matar e-esses d-demônios. - Sussurrou Maria, sem convicção. Regina sorriu.

—Novamente, e com força.

—Devemos matar esses demônios. Devemos matar esses demônios. Devemos matar esses demônios. - Maria disse, cada vez com mais força e confiança. Regina sorriu.

—Isso mesmo, criança. Eu matei hoje o seu demônio. Mas, da próxima vez, eu posso não estar lá para ajudá-la. Então, lembre-se: mate todos os seus demônios. Não deixe sobrando um. Mate-os. Promete para mim que irá matá-los quando eles aparecerem?

Maria assentiu com cuidado.

—Ótimo. - Regina beijou sua cabeça. - Agora vá dormir. Deite-se, esqueça do quê viu. Esqueça da existência de Harley. Mas não se esqueça de que sempre, sempre devemos matar nossos demônios.

***

Maria foi deitar-se, sorrindo. Não temia mais pesadelos com a Bruxa Cega, pois ela estava morta. Maria estava enfim livre.

João voltou após alguns minutos, e deitou-se na cama ao lado. Maria percebeu que ele parecia estar amedrontado. Mas isso não importou para ela, pois a garota sabia que, agora que seu demônio estava morto, ela poderia cuidar do irmão.

Quando Maria deitou a cabeça no travesseiro naquela noite, ela dormiu como um anjo. Não sonhou com absolutamente nada: nem bruxas, nem fogo, nem nada.

Pois ela tinha uma nova convicção: não importava quem, não importava onde, e não importava quando, se fosse seu demônio, ela o mataria.

***

Mulan estava triste.

Quando enfim soube da morte de Robin Hood e de todos os seus companheiros “Merry Men”, não soube o quê dizer.

Talvez não houvesse nada a dizer. Apenas o silêncio; apenas o luto; apenas o carinho por aqueles que não estavam mais vivos diria o suficiente.

A guerreira estava andando com pressa, quase correndo. Tinha que chegar à casa de Regina. Tinha que chegar lá o mais rápido possível.

***

—Olá! - Disse Belle ao ver uma cliente entrar pela porta da loja. Já era tarde da noite, e Belle estava muito cansada. Tinha apressado tudo o quê a loja necessitava apenas para ir o mais rápido possível para a casa de Regina, onde uma reunião havia sido marcada.

—Olá, er… Belle, não é mesmo? - Perguntou a cliente. Era uma bela mulher de cabelos loiros e lisos, e olhos azuis claros. Belle jurava já ter ouvido falar dela.

—Sim, sou eu. E você é…?

—Ashley. Ou Cinderella. Depende de como você me conhece. - Respondeu a garota. Belle assentiu. Já tinha ouvido falar na “gata borralheira”, ou, como os outros preferiam chamá-la, “a garota dos sapatinhos de cristal”.

—Oh, sim, lhe conheço por Cinderella. Mas Ashley é bom para mim. - Disse Belle, sorrindo. Ashley lhe retribuiu o sorriso.

—Enfim… No quê posso lhe ajudar? - Perguntou Belle. Ashley ficou séria repentinamente.

—É uma história longa… Mas ouvi dizer que essa é a Loja de Artefatos de Rumplestilskin, e, bem… Como posso dizer?

—Quer que eu lhe prepare uma xícara de chá? Sabe, para ajudá-la a falar. - Perguntou Belle. Ashley negou.

—Só quero meu marido de volta. Ou melhor, só quero saber o quê fez meu marido ir embora.

—Magia?

Ashley assentiu.

Belle suspirou e pegou na mão da garota. Sabia por experiência própria como era ter seu grande amor levado embora por uma grande força mágica.

—Me conte sua história…

***

—Convoquei todos você aqui porque preciso da ajuda de vocês! - Exclamou a Rainha Má, olhando para o rosto de cada pessoa ali presente.

Nova estava ali, parada, sentada no sofá, olhando diretamente nos olhos da prefeita. A Rainha Má tinha convocado secretamente algumas pessoas para salvar o Senhor das Trevas das garras de Malévola. A Salvadora, o Homem com um Gancho nas Mãos, o Príncipe Encantado, a Menina Guerreira Mulan, algumas das amigas fadas dela e a Namorada de Rumplestilskin. Todos ali, ouvindo Regina contar o plano que salvaria Rumplestilskin.

A Fada estava assustada. Tinha crescido ouvindo falar do poder maléfico do Senhor das Trevas; passara grande parte da vida adulta lutando contra a Rainha Má e amaldiçoara várias vezes pessoas como o Homem do Gancho. Parecia um incrível milagre estar ali, reunida com todos, discutindo sobre planos de guerra.

Não, não era um milagre. Era ele. Leroy invadia seus pensamentos, a forma como Leroy incentivava suas atitudes, a perda que a morte de Leroy havia trazido a ela a mantinha ali, sentada, atenta a cada palavra da Rainha Má, obstinava-a a salvar Rumplestilskin.

Passaram-se minutos, e a Rainha enfim terminou. Confiante, ela exclamou em alto e bom som:

—E sem mais delongas, eu declaro oficialmente… É hora de salvar Rumplestilskin!

***

A guerra tinha começado.

O fogo tampava a visão daqueles que ainda tinham os olhos; a chuva de sangue machucava aqueles que ainda tinham o coração; a fumaça fazia tossir aqueles que ainda tinham garganta para tal.

O cerco liderado por Regina havia começado há horas. A prefeita, usando sua magia, decidiu surpreender Malévola em sua mansão protegida por magia no meio da floresta.

O pequeno exército a seguiu, enfrentando primeiramente a barreira mágica imposta pelo próprio Senhor das Trevas. Depois, quando a magia de Regina e Emma, em conjunto, quebrara a barreira, a batalha foi contra o próprio Rumplestilskin. Sem muita demora, pois logo Malévola e Cruella apareceram para se unir a ele.

Aquela guerra teria acabado tão rápido quanto havia começado se não fosse pela pequena porção de poção da imortalidade que Regina havia dado para cada um dos “soldados”. A poção tinha longa duração, e fazia seu dono resistir à maior parte dos perigos: perigos mortíferos, enforcamentos por magia, tiros de bala, espadas, e coisas do gênero.

Malévola também tinha um exército próprio: a mulher havia conjurado várias manticoras, grifos, árvores encantadas e cavalos alados para ajudar na guerra, que lutavam contra as fadas e os habitantes de Storybrooke. Regina tinha tentado conjurar alguns seres, mas havia fracassado. A magia dela não era páreo para a de Malévola. Não quando a Fada Negra possuía poder total.

Chegou um momento em que o fim da batalha era iminente: aqueles que compunham o “exército” de Regina, ou estavam mortos, ou estavam feridos gravemente, ou estavam tão exauridos que não conseguiam ficar de pé; enquanto o exército de Malévola ainda estava de pé, com poucas baixas e muita energia.

Então ocorreu algo.

***

Emma estava exausta. Machucada. Sangrando. Grudenta.

As horas de batalha haviam esgotado a Salvadora por completo. Seu corpo estava dolorido, suas mãos e roupas estavam manchadas pelo sangue, suas pernas pediam por uma noite de sono, e seu mundo estava desabando.

As forças de Malévola estavam destruindo tudo e todos. Era algo óbvio e perceptível para Emma: o bem perderia, pelo menos daquela vez.

As árvores queimavam com o fogo, e o chão estava coberto de destroços e cadáveres. Tudo estava sendo destruído. Tudo.

—EMMA, CUIDADO! - Gritou Gancho para ela. Emma virou-se apenas para se deparar com três seres grotescos, parecidos com orcs, vindo até ela. Eles carregavam manguais e porretes, e pareciam furiosos.

O primeiro chegou com raiva em Emma, atirando seu porrete no rosto da Salvadora. Emma tentou desviar, mas recebeu o impacto da pancada mesmo assim. Caiu então no chão, e lá ficou desmaiada, com o rosto ensanguentado e corpo ainda mais dolorido.

—EMMA! - Gancho correu até ela, para socorrê-la, mas era tarde demais. Os três orcs se reuniram em volta da Salvadora, batendo em seu corpo com os manguais e porretes.

Gancho viu Emma pela última vez quando a mesma estava sendo arrastada pelos orcs para o meio da floresta.

***

—Ora, ora… Regina. - Sibilou Malévola.

Regina encarou a inimiga enquanto ouvia a guerra acontecer por trás. Podia ouvir metal batendo em metal, cabeças batendo e rolando no chão, coisas explodindo e criaturas guinchando de dor.

—Pelo visto, meu animalzinho de estimação fugiu da gaiola.

Malévola bufou.

—Por quê você não vai fazer outra coisa? Morrer, por exemplo?

—Porque eu sou uma dona preocupada com meu bichinho. - Respondeu Regina, fazendo beicinho. A Rainha se aproximou da Fada Negra. - Afinal, não quero que você se machuque.

Malévola sorriu.

—Acho que você deveria tomar cuidado, Regina, pois você é quem está em perigo aqui! - Zombou ela.

—Acho que não, queridinha. - Regina conjurou uma bola de fogo em sua mão, o que fez Malévola rir.

—Sério? Ainda brincando com fogo? Você não aprendeu, minha cara, que o fogo queima mas não machuca? - Malévola conjurou então várias espadas no ar, e jogou-as todas em Regina. Enquanto a Rainha tentava criar um feitiço de proteção, Malévola se teletransportou para trás da inimiga, sussurrando no seu ouvido:

—Deixa que eu te ensino. - Malévola conjurou uma adaga e enfiou-a com força na coluna da Rainha Má.

Regina gritou de dor e caiu no chão, arquejando. Malévola gargalhou e usou sua magia para pressionar o pescoço de Regina, enforcando-a aos poucos.

—Ora, ora, veja quem é o animal de estimação agora!

Regina sentiu aos poucos o ar lhe faltar aos pulmões. Sua visão estava começando a embaçar, e Regina acreditou que aquele era seu último suspiro.

***

Belle odiava batalhas.

Os despojos de guerra, o sangue que encharcava a terra, os pedaços de corpos jogados pelo chão… Tudo aquilo enojava Belle. Ela odiava pensar que um ser humano poderia chegar àquele ponto, odiava pensar que o ser humano tinha uma natureza selvagem e impulsiva, algo capaz de construir prédios e máquinas capazes de fazer maravilhas, mas algo também capaz de destruir sentimentos, de destruir aquilo que fora construído, de destruir o mundo.

Ela estava aconchegada num barranco, escondida atrás de várias moitas, brincando com uma pequena pedra pontiaguda que havia encontrado no chão. De lá, era possível observar todos os movimentos da batalha e continuar em segur se mantendo à distância de tudo aquilo, embora estivesse próxima o suficiente para ver Mulan lutar. Mulan e Belle já se conheciam de um tempo passado, quando Belle ajudara a guerreira a achar um monstro e derrotá-lo.

Belle às vezes gostaria de ser como Mulan. Corajosa o suficiente para pegar numa espada, sangue-frio o suficiente para enterrar a espada no corpo de alguém, destemida o suficiente para retirar a espada do corpo e observar a pessoa sangrar, observar a pessoa sofrer.

“Não.”, pensou Belle. “Não é isso que sou”. Mas ela ainda gostaria de ajudar de alguma maneira. Afinal, qual era a utilidade de assistir ao acontecimento se você podia participar dele? Belle queria fazer algo. Belle precisava.

A princesa era alguém realmente inteligente. Ela conseguia observar os erros e os acertos táticos de cada um naquele campo de batalha. Podia perceber o porque de estarem perdendo tantas pessoas, podia perceber o porque de Malévola perceber, e enfim pôde perceber como ganhar aquela batalha.

A idéia veio rápida como um flash, e Belle soube o quê deveria fazer. Pegou a pedra e colocou-a no bolso num momento de distração.

Só precisaria da ajuda de alguém, e a guerra estaria ganha…

***

Cruella estava sozinha há algum tempo, encolhida dentro da casa, observando a guerra acontecer naqueles campos. Ela segurava a Adaga do Senhor das Trevas. Malévola a imcubiu daquela missão, alegando que “todos pensariam que a Adaga estaria com Malévola, portanto seria realmente melhor se Cruella a guardasse”.

Cruella estava entendiada. Seu tédio acabou apenas quando a porta do seu quarto desabou e uma mulher oriental, vestida com uma armadura, entrou por ela.

***

—Você! Peço que me entregue a Adaga agora! - Disse Mulan, um pouco incerta. Há poucos minutos, uma Belle exasperada veio lhe pedir para que ajudasse-a a entrar na casa, pois ela sabia onde estava a adaga. A guerreira, conhecendo a inteligência da princesa, decidiu obedecer. Tinha invadido a casa, passado por vários guardas, derrotado várias criaturas… E lá estava ela, encarando uma mulher de cabelos brancos e pretos, que segurava a adaga na mão esquerda.

—Oh, oh… Bela criatura, você. Pena que eu não tenho o mínimo desejo de obedecê-la. - Cruella evocou o poder que Malévola havia lhe dado. Iria matar aquela garota.

Mulan avançou, sacando sua espada e partindo para cima de Cruella. A mulher sorriu ao ver a guerreira avançar, e invocou uma corrente de ar que levou Mulan para o lado oposto, fazendo-a bater a cabeça na parede.

***

Belle viu Mulan bater a cabeça com força na parede.

Tinha seguido a guerreira por todo o caminho, obstinada a achar a adaga e salvar Rumplestilskin. Pelo visto, seria muito mais difícil do quê o imaginado.

Mulan levantou-se do chão e tentou mais uma vez ir ao ataque. Cruella mais uma vez conseguiu desviar-se, e Mulan mais uma vez foi ao chão.

Belle precisava fazer algo. Mas precisava, primeiramente, saber o quê.

A idéia veio rápida na cabeça da garota. Mulan estava mais uma vez se levantando e se preparando para atacar, e Cruella parecia estar reunindo poder para mais uma vez jogar a guerreira na parede. Cruella precisava ser distraída. Assim, Mulan teria o tempo necessário para avançar e pegar a adaga.

Ela observava o duelo entre Cruella e Mulan de longe, vendo pelo vão da porta o que acontecia. E Belle sabia quem seria a distração.

—HEY, VOCÊ, DOS CABELOS COLORIDOS! - Gritou Belle, abrindo logo em seguida a porta e aparecendo, logo em seguida pegando a pedra que estava guardada em seu bolso e jogando-a no rosto de Cruella.

Funcionou tão bem quanto o esperado. A pedra atingiu em cheio o rosto da mulher, fazendo ela se desequilibrar e esquecer-se momentaneamente da Mulan furiosa que avançava para ela.

Mulan foi rápida, e decepou a mão que segurava a adaga. Cruella gritou ao perceber o que havia acontecido, e Belle se apressou, agarrando a mão (com nojo, muito nojo) e retirando a Adaga de lá.

Cruella gritou como uma condenada ao perceber que Belle possuía a adaga. Mulan sorriu para a amiga. E Belle simplesmente fechou os olhos, sussurrando:

—Eu lhe invoco, Senhor das Trevas. Destrua Malévola, destrua Cruella, vire-se contra elas e venha para o lado do bem. Lute por Regina; lute por mim. Destrua todos esses seres mágicos, destrua todos aqueles que lutam pela Fada Negra.

E aconteceu.