– Ora, ora, se não é o nosso herói Sirius! Diga a que veio, meu jovem! – Sirius quase riu da ingenuidade do mago ao recebê-lo tão calorosamente em seu vasto e luxuoso escritório. O velhote não parava quieto em lugar nenhum: mexia e remexia nos livros, subia numa das escadas das diversas estantes que cobriam todas as paredes, até o teto; descia, ficava em pé sobre ela como se fosse uma perna de pau e saltitava para lá e para cá, deixando marcas no tapete vermelho e fofo, bordado com símbolos orientais. Sirius era um dos únicos – senão o único – que tinha a total confiança do mago para conhecer sua real aparência e visitá-lo quando quisesse.

– Tenho algo para o senhor – disse, no tom de quem trás um presente, mas não tem certeza se será bem aceito. Ora, Sirius não tinha porte de vilão ou cara de mau para parecer mau intencionado. Aquela expressão astuta que sempre vimos em trapaceiros, isso não. Vilões realmente bacanas tem cara de mocinho e Sirius era tão bem cuidado que não tinha como não ser bonito – sem falar da ótima genética da família Black. E as pessoas tem a mania de associar maldade a feiura. Seus cabelos estavam ondulados e sedosos, a juventude sorrindo-lhe a cada fio negro, os lábios finos sombreados pelo nariz charmosamente comprido, os olhos grandes e inocentes como os de uma criança.

– Oho! – exclamou o velho, descendo da escada para encarar o jovem com seus olhos azuis, redondos e brilhantes. Sempre sorridente como um boneco patético, pensou Sirius. – Então é hoje que vai me contar o que vinha tramando e por que me espionou por longos meses. Que bom! Estava ansioso para saber.

Sirius teve a decência de corar levemente sob as sardas enquanto arregalava seus olhos inocentes.

– Como soube? – perguntou, não no tom de quem é pego em uma trapaça, mas no tom de quem é pego em uma brincadeira. Negar, ele sabia, seria burrice.

– Sei de tudo o que acontece em Oz, Sirius – disse o velho, rejeitando a cadeira e sentando-se em sua escrivaninha, seus pés infantis balançando a centímetros do chão e o mesmo sorriso patético no rosto, como uma máscara, deixando salientes as bochechas vermelhas.

Sirius permaneceu por alguns minutos com a mesma expressão estupefata, mas agora de propósito. Quem reparasse bem veria que não mais corava e que estava à beira dos risos.

– Mas é claro! – exclamou ele, deixando a risada finalmente escapar. – E eu ainda me surpreendo! Quando penso que o velho Oz está finalmente enferrujado, me surpreendo! Sim, sim, eu o estava espionando.

– E posso saber por quê? – perguntou, ainda sorrindo, desta vez de forma quase intimidadora, com as mãos velhas, mas macias, sobre os joelhos.

– Mas é claro – disse Sirius com uma risada de alívio, sentando-se ansioso e agitado em frente ao mestre. Pela primeira vez, o sorriso de Oz parecia entristecer-se por alguns segundos.

Sirius levantou-se de repente em sua agitação, tão rapidamente como tinha sentado, e começou a andar pela sala, passando os dedos lentamente sobre os muitos títulos encadernados em couro nas grandes prateleiras que cobriam as paredes.

– Eu tenho sido muito, muito grato pelo que me tem dado – disse ele, hesitante. – Os anos que passei aqui foram os melhores de toda a minha vida, e devo isso ao senhor. – Oz fez menção de interromper, mas Sirius cortou-o, balançando a cabeça. – Não, o que fiz pela cidade já foi pago. Não tenho feito mais nada, não me sinto mais merecedor da cama em que durmo, da comida que como, do dinheiro que esbanjo. Ao mesmo tempo, não quero deixar de tê-los, não quero deixar Oz e na verdade, sequer sei como. Tudo o que quero é sentir que realmente conquistei tudo o que tenho. Venho de família nobre e tradicional, tenho meus costumes, minha honra, e eles estão fragmentando-se. Já fiz dezessete anos, sou homem agora, não posso esconder-me mais atrás de tutela nenhuma, nem mesmo a do senhor.

– Isso explica por que estava me espionando, então?

Sirius virou-se para encarar o velho nos olhos, aproximando-se lentamente do lugar onde ele estava.

– Só há uma coisa que sei fazer – disse ele. – Uma coisa que, por sinal, descobri que o senhor não sabe. – Ele fez uma pausa proposital, parando com o rosto a centímetros do de Oz. – Magia.

– Entendi o que pretende! – exclamou Oz, afastando Sirius com um empurrão e descendo da mesa. Agora era a vez de ele andar, enquanto Sirius se sentava e o encarava. – E o que eu vou querer com sua magia?

– Meus serviços!

– Seus serviços?

– Imagine o que posso fazer por você! – ele levantou-se, sacou a varinha magistralmente e todos os livros saíram das prateleiras e começaram a dançar, aproximando-se cada vez mais do centro da sala, onde se encontrava Oz em pé. – Você não precisará mais gastar milhares de moedas de ouro com truques de ilusionismo, não precisará viver em correria, basta um gesto e entenderei o que quer que eu faça, e farei, qualquer coisa, a qualquer tempo! Você não precisará mais se esconder, poderá sair nas ruas, ver seu povo, respirar o esplendor de sua cidade! Você será o que dizem que é, nada mais de farsas, nada de máscaras, nada de esconderijos, porque você terá MAGIA! – Até aqui, sua voz vinha aumentando gradativamente, mas, a partir desse ponto, ela suavizou-se, escorregando macia como algodão. – E para tudo isso, você só precisará... de mim.

Os livros agora formavam um círculo ao redor do mago, quase como uma parede de tijolos flutuantes e separados. Sirius também entrou no circulo, caminhando ao redor do mago com a varinha em riste enquanto os livros se fechavam como as paredes de um poço, um brilho quase doentio em seus olhos. Não fosse seu rosto de jovem sonhador para protegê-lo...

– Não são ilusionistas que dominam o mundo de Oz... – seus sussurros embalavam como canções de ninar. – São bruxos.

– Oh!

Ambos os pares de olhos se encararam, se arregalaram, e os livros caíram num baque. Sirius deu um suspiro ofegante, olhando para a sua mão que pendia, mas segurava firmemente a varinha. Traíra a si mesmo com a última frase proferida.

O mago já não sorria.

– Era o que eu temia, meu rapaz – suspirou, olhando o rio de livros ao redor. – Era o que eu temia...

– O quê? – perguntou Sirius, forçado a inocência a retornar. – Que alguém soubesse que não tem magia? Não contarei a ninguém, eu juro, só quero ter utilidade, só quero exercer meu dom! Eu tenho um dom... permita-me usá-lo para o bem...

– Você não usará, Sirius. No final, tudo o que restará será isso... – ele fez um gesto com a mão que abrangia todo o local. – Destroços. É melhor... que fique longe do poder.

Ele suspirou novamente e sentou-se num monte de livros da beira do círculo que ficara, escorando o queixo na mão, os cotovelos apoiados nos joelhos, num gesto de profunda tristeza.

– Não! Eu... posso arrumar! Aqui... Wingardium Leviosa! Wingardium... Wingardium Leviosa... – E já fazia os livros flutuarem frouxamente de volta para seus lugares quando Oz ergueu a mão.

– Basta. O proíbo de fazer magia!

Sirius levou a mão livre aos cabelos, enquanto os livros que voltavam aos seus lugares caíam novamente. Sua expressão era de profunda frustração e tristeza.

– Não pode fazer isso! – gritou, com a voz embargada.

– Não quero ninguém sabendo o que faço 24 horas por dia, obrigado, nem mesmo você.

– Eu não ia contar para ninguém! Não ia fazer nada! Ia servi-lo, ia usar meus poderes! Ia ser leal...

– Por quanto tempo, Sirius?

– Você é um velho medíocre... Um charlatão fajuto, um...

– Volte atrás do que disse. É preciso de muito mais que sangue mágico para governar um país.

– E você não tem nem isso! Você é uma farsa! Menos que um sangue ruim! – E saiu, tropeçando como bêbado nos próprios destroços, repetindo para si mesmo, cheio de ódio: – Menos que um sangue ruim...

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.