Bombas, armas... Caro leitor, jamais compreenderei o motivo de o ser humano ter criado tais objetos, a não ser para causar a destruição total de tudo que há a sua volta. Porém, se pararmos para refletir um instante, bombas e armas de grande potência foram criados para que, nada mais, nada menos, os criadores tenham poder absolutos sobre tudo ao seu redor. Pense, caro leitor, ainda hoje a indústria bélica domina o mundo, de modo até mesmo mascarado e invisível, mas ainda assim, ela está lá. Tenho a mais absoluta certeza que você, amado leitor, sabe até mesmo de que países estou falando, quais são os mais poderosos de nosso amado mundo atual? Quais países se sobressaem perante todos os outros? Pois bem, vejo que você sabe a resposta, não precisarei sequer citar nomes.

Pois então, focaremos em nosso homem invisível, ou a forma animada do cadáver de um judeu chamado Max Vandenburg, nosso carregador de sonhos que sabe mais do que todos o que é enfrentar o ser humano e sua gana pelo poder, suas cicatrizes e dores respondem por si. Ele ainda se encontra ao chão, procurando forças para se levantar, mas a trilha sonora ao seu redor se transforma em algo completamente diferente do que o de costume. Gritos muito mais altos, desespero exalando pelo ar, juntamente com o cheiro de morte e pólvora. Explosões e mais explosões vindo do horizonte são amostra grátis do que o nosso homem invisível ainda terá que enfrentar. Max Vandenburg sabe que não há para onde correr, se avançar, a bomba o atinge, juntamente com todos os outros cadáveres vivos, se recuar, sua morte será mais lenta por meio das heróicas torturas nazistas... A morte o cerca e o lutador judeu sabe que nada mais lhe trará salvação.

Mais uma vez, lembranças de uma infância distante e perdida lhe invadem a mente, lembranças de uma família judia que já não existe mais. O gosto amargo da culpa por ter deixado sua mãe, invade-lhe a boca e ânsia aparece logo em seguida, Max Vandenburg sabe que a hora tão temida, porém óbvia, da morte acaba de chegar, sabe que não há mais atalhos, caminhos ou trilhas que possa livrá-lo de tal situação. Pés desumanamente pesados pisam por sobre suas costas, gritos histéricos perfuram seus tímpanos e o que vê é uma verdadeira prova de que não há mais cadáveres judeus em sã consciência naquele local.

Caro leitor, coloque em sua mente a imagem de vários animais, completamente exaustos de serem trancafiados, estressados e fracos. Agora, imagine esses mesmo animais vendo a, digamos, porteira aberta, a oportunidade de fuga, a euforia tomando conta de cada ligamento de seus corpos, a loucura no controle de tudo. É exatamente isso que nosso homem visível presencia, inúmeros corpos judeus correndo de um lado para o outro, aos gritos, explosões chegando cada vez mais perto de acabar com total insanidade, nosso judeu lutador sabe que a única mente, em partes, sã, é a dele, mas sabe que isso não demorara muito para ter seu fim, já pode prever a bomba chegando e acabando com o que sobrou do seu corpo, um corpo que um dia foi de um judeu saudável, feliz, que pertencia a uma família. Os pés finalmente saem de suas costas e uma trilha sonora ainda mais forte toma conta do lugar, um ruído denominado tiro. Nosso carregador de sonhos percebe que sua hora é agora, se não sair daquele local de alguma maneira, tudo definitivamente acabara. Mesmo sabendo que a morte o cerca de todos os lados, ele começa a sentir que não pode se entregar, tem em mente que já que sobreviveu até o momento, não poderá desistir agora. Apoia sua cabeça sobre a neve gélida e fecha seus olhos, procura ignorar qualquer ruído, levando sua mente até Liesel Meminger, sua sacudidora de palavras. Recorda-se das últimas palavras proferidas pela garota antes de sua primeira partida “Não posso perder você!”, recorda-se de sua promessa de que ela jamais o perderia, e o fato de que, na verdade, ela que o havia mantido vivo até o momento, o que jamais será uma mentira. Recorda-se da vez em que estava doente, quase entrando em óbito, e sua pequena irmã loira ficou ao seu lado, lendo várias vezes ao dia, deixando-lhe presentes. Recorda-se de quando tinha medo de dormir e não mais acordar, Liesel lia e quando percebia que o mesmo estava cochilando, o acordava com algumas cutucadas... Nosso homem invisível percebe que a sua salvação sempre havia sido, e sempre será aquela pequena garotinha que acabara de ver a momentos antes, uma garotinha tão crescida, uma pequena grande mulher, que aos seus olhos, é a esperança de que toda realidade, por mais ruim e forte que seja, pode mudar, basta apenas aguardar um novo dia, apenas mais algumas flexões e a luta será vencida...

A trilha sonora ensurdecedora da guerra volta bruscamente aos ouvidos de nosso homem invisível, a carnificina é algo completamente aterrorizante. “Ande, mais algumas flexões, Max...” , o medo invade cada osso de seu corpo, mas ao mesmo tempo a esperança que a lembrança de Liesel o traz é o suficiente para nosso lutador judeu ter vontade de se reerguer. Os ruídos de bombas, lentamente, são abafados por heróicos tiros nazistas. Nosso homem invisível olha ao redor e pode perceber que não muito longe da estrada mortal em que caminham, há um barranco monstruosamente branco, e aparentemente, sem um fim visível. Volta seus olhos para frente, para o cemitério a céu aberto de muitos corpos judeus, poucos ainda estão de pé, o branco da neve, dá lugar ao vermelho de um impuro sangue judeu. Aparentemente, os soldados se encontram dispersos com outros cadáveres que teimam em querer escapar, pode até ser que estejam pensando que nosso lutador judeu já se encontra sem vida, pois é nesse momento que ele percebe que se não se arriscar a sair correndo, mesmo sem força, sua vida chegara ao fim. Afinal, se ele ficasse, a morte o levaria, se arriscasse a fuga, provavelmente a morte também o levaria, então Max Vandenburg finalmente fez sua escolha.

Com extrema dificuldade, procurando ignorar suas dores e sangue que escorria por suas cicatrizes, nosso homem invisível procura se colocar de pé, se reerguer e lutar, quem sabe, a última grande luta com o amado Führer. Mal sente suas pernas, sua respiração é falha e seu peito dói, o gosto de sangue percorre todo seu paladar, mas ele sabe que não pode se deixar levar pelos detalhes de sua fraqueza humana, por mais que seja tentador, nosso carregador de sonhos tem em mente que desistir não é e nunca será a solução.

Corpos e mais corpos caem ao chão, junto deles, um rio vermelho se forma, afogando lentamente a vida de todos os outros cadaveres ao redor. Mais uma vez, Max Vandenburg olha para seu objetivo, o tal barranco gélido, ele sabe que é agora ou nunca. Ignorando qualquer vestigio de uma fraqueza física, aproveitando os vinte segundos de coragem que invadiam seu ser, nosso homem invisível endireitou seu corpo até onde as dores permitiam e se colocou a correr em direção a seu alvo gélido. Seu coração bate em seus ouvidos, a adrenalina percorre livremente cada ligamento de seu ser e nosso Max experimenta, depois de muito tempo, uma empolgação boa, mesmo que perigosa, um sentimento de infância. Tiros, explosões, mais tiros, sangue judeu por todos os lados, gritos nazistas, um judeu a procura de fuga, mais explosões, sangue judeu, um judeu sendo atingido bem ao meio de sua panturrilha.

Sim, caro leitor, nosso homem invisível acaba de ser atingido por um heróico e certeiro tiro nazista. Porém, não se desespere, por sorte essa era a última bala de um dos amados soldados de Hitler, nosso carregador de sonhos teve tempo suficiente de se jogar sem pensar sobre o barranco gélido e infinito. Mais gritos nazistas foram ouvidos enquanto um judeu caia sem parar de um barranco interminável, mais explosões se aproximando, apenas os tiros cessaram seus ruídos. Afinal, não valia a pena arriscar a preciosa vida de um soldado nazista apenas para procurar um podre corpo judeu, que provavelmente já estava sem vida.

Porém, os soldados estavam errados a respeito de Max Vandenburg, apesar de quase mortalmente ferido, a esperança o mantém vivo. Após alguns minutos em queda infinita, nosso homem invisível finalmente conseguiu repousar seu corpo sobre uma superfície plana, provavelmente outra estrada, ou coisa do tipo. Olhou ao redor e tudo estava completamente vazio, um deserto gélido e branco o cerca, uma dor desumana deixa seu corpo completamente entorpecido, uma poça de sangue se forma ao seu redor, nosso homem invisível sente o objeto fatalmente nazista, em forma de bala, dentro de seu corpo. Mesmo sem saber muito da anatomia humana, Max Vandenburg sabe que uma de suas principais artérias foi atingida, sua vida pode se acabar em minutos... Porém, ele ainda é um judeu na Alemanha Nazista, sua vida terá fim de qualquer maneira, não é mesmo? Caro leitor, se tiver algum curativo ao seu redor, entregue ao nosso homem invisível, ele precisa desesperadamente dessa ajuda para sobreviver. O sangue judeu escorre lento e initerruptamente sobre a neve ariana, se eu fosse você, não demoraria muito para ajudá-lo.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.