2 de dezembro de 2015 – dia 168 – 14h27min – POV Toni

Caminhava através da multidão de zumbis por dentro da resistência. Corpos de amigos e de vários zumbis abatidos se amontoavam nas ruas do que um dia eu poderia chamar de lar. A capa conseguia encobrir o meu cheiro deles, o suficiente para acharem que sou um deles. Vou através do primeiro lugar que vem a minha mente, o QG.

Entro, escuto barulho metálico tão habitual, o barulho de espadas se chocando. Caminho rapidamente até o salão de festas e encontro um Sr. Akamatsu transformado lutando contra um de seus discípulos. Ele rapidamente desarmou o seu oponente e o decapitou. Ele se ajoelhou e estava prestes a mordê-lo quando eu saio detrás da parede e chamo a atenção dele.

– Vejo que foi mordido. – Não pensei em nada melhor pra falar no momento, mas serviu pra alguma coisa.

– Muita perspicácia a sua. – Ele disse com um tom de sarcasmo na voz. Vi uma mordida no ombro, pequena, mas mesmo assim foi o suficiente. – Onde está a minha filha?

– Eu não sei.

– Não minta pra mim garoto, você sabe exatamente onde ela está. – Ele segurou a katana com as duas mãos e ficou em uma posição ofensiva. – Diga agora e prometo não morder você.

– Não. – Saquei a minha kodachi e fiquei em uma posição defensiva. – Não vou permitir que você a mata também.

Ele se movimentou bem mais rápido do que eu esperava, aplicando um corte horizontal na altura do tórax. Apesar do susto inicial, eu me esquivei do golpe, mas não rápido o suficiente, causando um leve corte em meu peito. Girei a kodachi e apliquei um golpe na coxa esquerda, mas ele facilmente defendeu, me golpeando com o cabo no meu peito, me fazendo cambalear para trás. Coloquei-me na defensiva de novo e firmei a minha voz:

– Por favor, não me faça machucá-lo. – Não tinha certeza se conseguiria ganhar dele, era o meu sensei e era mais rápido e forte que eu, principalmente agora com a mutação. Ele soltou uma longa risada, se recolocou na posição ofensiva e me atacou. Ele aplicou rapidamente uma seqüência de golpes que consegui a algum custo defender, tentei contra-atacar, mas ele defendeu facilmente.

Ele deu um golpe vertical com uma das mãos, enquanto a outra entrou no seu kimono. Eu me esquivei do golpe, ele parou a katana antes dela atingir o chão e subiu, fazendo um corte na diagonal, atingindo de leve o meu braço. Eu me afastei alguns passos quando ele retirou a mão de dentro do seu kimono e arremessou três shurikens na minha direção. Dei um rolamento para o lado e desviei rapidamente de um segundo golpe de sua katana, acertando um chute no seu rosto, utilizando um golpe que vi em uma roda de capoeira, apoio a minha mão no chão e jogo o meu corpo para trás. Trocamos golpes durante alguns minutos, pareceram horas pra mim, eu mais defendia do que atacava, e quando atacava ele defendia com muita facilidade.

Dei dois mortais para trás, apoiando com as mãos no chão e voltei rapidamente para a posição defensiva. Eu já estava cansado, ofegava bastante e tinha diversos cortes no corpo, mas nenhum grave. El se colocou novamente em posição de ataque, nenhum corte visível e nem sinal de cansaço. “Acho que não dá pra ganhar dele”, pensei, procurando uma provável rota de fuga, quando vi um filete de sangue sair do canto da boca dele. “Será que foi do golpe que acertei? Se for, basta...”. Mudei para a posição de ataque, colocando a minha kodachi em uma mão e uma das minhas kunais na outra.

– Acha que atirar kunais vai adiantar algo? Contra o seu sensei? – Ele riu e correu na minha direção, aplicando um golpe na diagonal, aparei o golpe com a kunai e contra ataquei com o cabo, ele se esquivou, mas girei rapidamente a espada e desferi um golpe na diagonal, causando um corte em seu braço esquerdo, ele tentou contra –atacar, mas defendi novamente com a kunai. Deslizei a kunai pelo gume da katana e usei um dos meus pés para desequilibrá-lo, empurrando-o para longe.

Voltei à posição ofensiva com um sorriso, a seqüência de golpes que eu usara não era nenhuma das que ele me ensinou. Atirei a minha kunai rapidamente, fazendo ele se mover para a direita, equilibrando a espada com apenas um dos braços. Ele avançou dois passos e desferiu um golpe, na tentativa de decapitar, o vi colocar a mão rapidamente no kimono. Saquei uma kunai e atirei em seu peito e me abaixei, esquivando do seu golpe. A kunai atingiu o seu antebraço, provavelmente um nervo, por não conseguia mover direito a mão.

– Acho melhor para de brincar com você garoto.

Ele investiu rapidamente, aplicando uma série de golpes que ele nunca me mostrou, foi complicado defender de todos, mas no final ele me derrubou no chão com uma rasteira. Ele chutou pra longe a minha kodachi, vi dois zumbis entrarem pela porta. Ele pisou na minha mão esquerda, quebrando os dois últimos dedos e deslocando o do meio.

– Devia deixar que eles fizessem o trabalho sujo pra mim, morder você e depois matá-los. – eles já se ajoelhavam perto da minha perna, mas ele decapitou os dois. – Mas quero ter esse prazer eu mesmo. – Ele ergueu a sua katana, e eu fechei os meus olhos. Ouvi o barulho de uma flecha cortando o ar e logo depois o barulho do metal se chocando no chão. Abri os meus olhos e vi o braço direito do Sr. Akamatsu, ele quebrou a ponta e tirou a flecha, aproveitei e o derrubei com o meu braço direito e pequei a sua katana.

Na porta do salão estava a Tainá. Ela segurara o choro, mas manteve uma nova flecha presa ao arco esticado. Ela soltou, ele conseguiu desviar a tempo, mas eu o decapitei. Ela veio correndo na minha direção e me deu um abraço apertado.

– Toni! Ouvi o barulho das espadas lá fora e depois o silêncio, pensei que foi tarde demais. – Ela apoiara a cabeça no meu ombro e começou a chorar. Eu coloquei os meus braços em volta dela, tentando consolá-la. – O meu pai... ele...

– Eu sei. Sinto muito.

– Sei que sente. – ela me abraçou mais forte. – Não saí mais sozinho ok? Não quero pensar de novo que eu te perdi.

– Eu não vou. – ela retirou a cabeça do meu ombro e me encarou.

– Promete? - Ela parara de chorar, ela era tão linda, não tinha como não me inclinar na sua direção e beijá-la, um beijo doce, que selava aquilo que ela sentia por mim e que eu, em algum momento, passei a sentir por ela. Não foi necessário dizer mais nada depois desse beijo, ambos já sabíamos o que um sentia pelo outro. Ela se afastou, ajudei a cremar o Sr Akamatsu e subimos para reunir aquilo que sobrou no prédio.

No final tínhamos três mochilas, uma com suprimentos e duas com armas. Consegui ajuntar toda a minha coleção em uma mochila só, a outra continha algumas armas de fogo, além d as armas do Sr. Akamatsu. Ela carregava na sua mochila a katana e as cinzas do pai dela.

Saímos do QG, cobertos com as capas e fomos até o hospital. Encontramos o lugar tomado pelos zumbis. Caminhamos lentamente até o quarto da Rita, o lugar foi bem reforçado, então ela ainda estava um pouco viva, apesar de um pouco fraca.

– Graças adeus vocês chegaram, pensei que fosse ficar trancada aqui até morrer! – Disse ela abraçando a Tainá. Entregamos uma faca a ela e fizemos com o lençol uma capa. Passamos despercebidos pelos zumbis até a entrada da Resistência, quando um grupo de quatro soldados virou a esquina atirando nos zumbis ao nosso redor. Nos jogamos no chão para nos proteger dos tiros, vi um dos soldados ser atacado por trás por um zumbi, ganhando uma mordida na perna, ele matou o zumbi e mais dois ao seu redor e descarregou a última bala na sua cabeça. Um dos soldados tentou voltar pra impedir e tropeçou em um corpo no chão, sendo mordido no pescoço por um zumbi sem pernas. Alguns instantes depois os zumbis se juntaram aos corpos e começaram a se deliciar com a carne dos dois oficiais.

Os dois soldados restantes se dirigiram até a entrada, quando me levantei e me anunciei:

– Não atira, não atira! Eu ainda estou vivo! Tenente!

– Toni! Chegamos agora e já esta esse caos, o que houve?

– Não sei, mas não é o melhor momento para conversarmos, vamos!

Seguimos até o caminhão onde encontramos o restante do grupo esperando por nós. Vimos às irmãs se abraçando, muito mais felizes que a maioria de nós.

– Não tinha mais ninguém no QG Toni? – O Bernardo perguntou assim que me viu.

– Não vivo, melhor contar quando chegarmos a um lugar seguro.

– Mas e quando ao resto das nossas coisas? – A Laura falou, escorada no caminhão.

– Vamos dar alguns dias para as coisas se acalmarem, depois voltamos lá e pegamos o que der.

A tenente o outro soldado e a Laura foram à frente e o resto de nós foi lá dentro. Depois de um tempo na estrada, a Clara me viu tentando colocar o meu dedo no lugar, mas sem sucesso.

– Deixa eu dar uma olhada nisso. – Assim que ela pegou na minha mão, não teve como segurar um gemido de dor. – Você quebrou os dois últimos dedos e deslocou o do meio, acho que quebrou esse osso aqui também. – Ela falou apertando o meio da minha mão. Retirei a minha mão rapidamente, ela parecia gostar de fazer aquilo. - Brenda, Rita, tem como me ajudarem aqui? – Elas colocaram os meus dedos no lugar, não sem antes eu gritar de dor. Depois enfaixaram a minha mão e fizeram uma tipóia. – Vamos tira a camisa pra poder cuidar desses cortes.

– Não precisa.

– Precisa sim, anda.

– Não, a gente faz isso quando chegar a algum lugar seguro. – Ela tentou falar alguma coisa, mas eu a interrompi. – Eu não vou sangrar até morrer Clara! Não precisa, não agora.

Conseguimos dirigir até encontrarmos o Metropolitan, o shopping de Betim. Seguimos um pouco adiante até encontrar um prédio residencial em construção, estava na fase de acabamento. Montamos guarda e nos ajeitamos no lugar.

– Pensa que me esqueci?

– Não. – Retirei a camisa um pouco relutante, e com alguma dificuldade. Ela e a Rita limparam os cortes e enfaixaram apenas o do braço esquerdo.

– Agora pode explicar pra gente o que aconteceu? Não seria nada sério se você não tivesse saído tão machucado. – O Bernardo disse se sentando perto mim e da Tainá. Narrei tudo o que aconteceu, exceto o beijo entre eu e a Tainá. A Tenente explicou que chegou a distribuidora de bebidas e conseguiu abastecer um caminhão rapidamente, mas teve que fazer um trajeto mais longo devido a uma multidão de zumbis. Quando ela viu a fumaça no céu e o barulho de tiros vindos da base. Chegando lá, encontrou o último caminhão saindo da base, não teve como sinalizar e acabou ficando encurralada pelos zumbis, depois foi à saída que nós vimos. Depois da narração, houve um silencio entre nós. O soldado, Arthur, ficou de vigia em uma das janelas enquanto a Karina e a Laura foram dormir.

– Tenente, vi que o centro de BH estava intacto, mas algumas ruas nos bairros vizinhos estavam com crateras enormes. Aquilo foi alguma tentativa de conter o surto?

– Sim, foi. Depois de alguns dias, alguém do alto escalão autorizou os jatos e helicópteros jogarem bombas nas multidões, para tentar amenizar o número e facilitar o trabalho da infantaria. Mas o número de aeronaves no céu foi diminuindo até que não vimos nenhuma por dias. Percebemos que estávamos por conta própria. Foi quando o Comandante montou a Resistência, reuniu o máximo de soldados ainda em atividade e construíram os muros, depois limparam os zumbis do lado de dentro, ou criou as zonas de caça.

– Será que os zumbis não vieram de uma dessas zonas?

– Talvez. – Ela olhou para longe, com um olhar pensativo, ela escondia alguma coisa. Tentei não pensar naquilo e fui tentar dormir. Senti um corpo se encostar-se ao meu, abri os olhos e vi a Tainá se ajeitando. A abracei e fechei os meus olhos, tentando relaxar. Foi quando o barulho de helicóptero cortou o ar.