O Som do Coração

Parte 2: Capítulo 19 - Bem-Vinda de Volta


Wilke demorou a voltar e aquele dia depois que ele se foi eu chorei, ele me vira da pior forma possível, ninguém deveria me ver da forma em que me encontro. Depois da visita dele tentei sair mais, pelo menos do meu quarto, fui até a cozinha preparei um sanduíche, e quando virei encontrei minha madrasta, ela me olhou assustada e sorriu ao ver meu sanduíche, fui para meu quarto, fechei a porta e comi.

Depois comecei a arrumar as coisas, tirei aqueles mil cobertores de cima da cama, os empilhei na cadeira do computador que eu ainda não estava pronta para ligar e ter as várias mensagens da Marina, peguei os fones do chão, estiquei na cama, encostei o violão direitinho, sem minha mãe me enchendo eu bem que poderia ter aprendido mais, ter tentado músicas mais complicadas, mas fiquei nas mesmas músicas chatas e lentas de sempre. Eram mais fáceis do que tentar acertar algo rápido, se antes com minha audição boa eu tinha dificuldade de acertar cada nota em seu lugar, agora seria praticamente impossível, mas arrisquei, talvez fosse bom experimentar tocar, poderia me ajudar.

Acabei dedilhando um pouco e sentindo a vibração das cordas, sentei ao chão e comecei a tocar Lucky do Jason Mraz, meus dedos começaram a travar e eu tive de ir parando, limpei algumas lágrimas, eu só sentia a vibração do violão que estava acelerado e da minha voz que sem eu ouvir sabia que estava desafinada e minha garganta vibrava. Tentei tocar um pouco de bossa nova, mas a voz estava tão ruim quanto em Lucky e o ritmo ainda mais perdido, se antes eu achava que não poderia ficar pior meu nível musical agora eu tinha certeza de que estava no fundo do poço, você deve pensar, mas tem vários artistas deficientes que tocam, é, eu concordo, mas todos eles são pessoas iluminadas que têm um dom que eu nunca tive.

Larguei o violão, e me levantei limpando lágrimas que insistiam em continuar descendo devido ao meu fracasso, e quando virei para a porta pensando em um sanduíche para afogar minhas magoas o encontrei ali parado, ele sorria para mim e batia palmas, claro que apenas o movimento das suas mãos me indicava isso, eu me afastei assustada, ele veio até mim, me fez sentar na cama, pegou meu violão sentou ao meu lado e começou a dedilhar algo que eu não fazia ideia do que era, ele ia começar a tocar, começou e me olhou, eu estava confusa, ele sorriu, pegou minha mão e a colocou no violão, fechei meus olhos para sentir melhor, e depois o olhei, ele já tinha rodado a música algumas vezes, mas aparentemente não tinha cantado, fiquei o encarnado, ele sorriu e voltou a tocar a música. Era Welcome Back do Bruno Mars, ele tocou e na parte das penas ele tocou meu cabelo me fazendo rir, eu tentava acompanhar sua boca e a vibração no violão, mas estavam tão sem sincronia que me fez rir no final o que o deixou sem graça e me fez tomar o violão da sua mão. Coloquei ao nosso lado e fiquei o olhando rindo, seu ritmo ainda era péssimo.

– Se sentindo melhor? - ele me olhou profundamente.

– Um pouco - falei dando de ombros - Quero dizer, não estou mais debaixo dos cobertores...

– E arrumou o quarto - eu ri, ele olhou meus fones, eu quase sentava neles, ele os enrolou e colocou na mesa, olhou os posterês na minha parede eme olhou - Você ainda escuta isso?

– Claro, Pitty ainda é muito boa, saiba disso.

– Se você diz - ele riu, eu sabia que tinha rido pelo movimento dos ombros, eu me encolhi constrangida. Era uma pena que ainda estivessemos tão distantes, sabiamos um pouco sobre os gostos musicais, mas nada além disso, é como se fossemos completos estranhos, mas já fomos melhores amigos, pelo menos em algum momento fomos.

Conversamos mais um pouco sobre música. Ele se jogou na minha cama com os braços abertos, dizia algo, mas pelo angulo que eu estava não conseguia fazer leitura. Ele se sentou e se desculpou.

– Perguntei se tem algo para fazer pela surdez - eu o encarei e me joguei no chão a sua frente - Tem?

– Tem - ele me olhava atento - Cirurgia.

– E você vai arriscar, não vai? - neguei - Por que não?

– Tem chance de sarar minha surdez, tem chance de não mudar e tem chance de eu ficar ouvindo um zumbido, as chances de dar merda me parecem maiores do que as de eu conseguir ouvir novamente.

– Mas zumbidos ainda seriam brulhos - ele falou rindo.

– Eu não posso fazer cirurgia, Wilke - ele me olhava atento - Não posso fazer isso, eu não tenho coragem, eu não posso... - eu ia chorar, estou muito chorona.

Ele abaixou a minha frente, virou meu rosto para ele e sorrindo limpou minhas lágrimas.

– Não fique chorando por qualquer coisa - eu o olhei surpresa - Tudo bem que ajuda a extravasar tudo que está sentindo, mas eu estou aqui, então não fique chorando, ta? - confirmei e limpei minhas lágrimas desajeitada, ele sorriu e me ajudou a levantar.

Peguei o violão na cama, ele me olhou curioso, comecei a dedilhar meio trêmula, ele sorria para mim. Eu o olhei tentando manter minha voz sem os soluços do choro, comecei a cantar, seus olhos se abriram em surpresa, logo ele estava segurando as lágrimas enquanto eu cantava ou gemia, não sei definir, I Won't Give Up do Jason Mraz, ele veio até mim quando a música quase chegava ao fim, parou meus dedos e com calma tapou minha boca, rindo e chorando ao mesmo tempo.

– Shhh... Nem todo mundo ta surdo, você ainda é horrível cantando. - eu não pude conter o riso e nem ele.