O Sexta Feira

Capítulo 09 - Ela ainda é letal


O dia demorou a passar, minutos pareciam ter se tornado horas e Marguerite cada vez mais entediada, explorou quase toda a propriedade, ou o que pode ter acesso, afinal não era surpresa nenhuma que a maioria das portas estavam trancadas e os empregados em grande maioria a ignoravam por completo, com exceção de Leopold, mas o mesmo estava atarefado demais para lhe dar atenção, e a herdeira também não quis atrapalhar o homem, temia prejudica-lo mais do que já havia feito. Pelo menos havia a biblioteca, poderia encontrar um livro ou dois para se distrair.

Era final de tarde, quando escutou o barulho do automóvel estacionando, eram Lady Roxton e Anne, carregadas de pacotes e também havia mais alguém com elas, mas não soube identificar quem era, apenas que de longe assemelhava-se ao Roxton, porém mais jovial.

Para evitar divergências ou quaisquer provocações, Marguerite tratou de esperar em seu quarto e não na biblioteca onde estava até há pouco, bem verdade, pensava que estava agindo mais como uma prisioneira que espera o seu carcereiro, e toda essa situação estava começando a lhe dar ideias.

L.R - Marguerite está acordada? Estamos entrando.

Perguntou a Lady, já na porta de seu quarto. Antes mesmo de qualquer resposta os empregados já depositavam os pacotes nas proximidades.

M - Nossa quantos pacotes.

L.R - Sim Marguerite, acredito que agora tenha tudo o que precisa, só talvez os modos que nem tanto, mas roupas terá de sobra. Também providencie algumas peças para esta criança, afinal não sei mais o que me aguarda, prefiro prevenir. O jantar será servido às 21 horas, informo que teremos um hóspede, espero que ao menos uma vez saiba se portar, seja educada, é o mínimo que pode fazer. Até mais tarde.

A - Ela saberá sim Lady Roxton, e agradece por sua hospitalidade também, não vê, esta tão empolgada que nem palavras consegue expressar. Obrigada senhora, até mais tarde.

A mulher apenas acenou a cabeça para Anne e se retirou, enquanto que Marguerite a encarava, descrente de toda a situação.

M - Hospitalidade Anne? Você jura mesmo, ou prisioneira dela?

A - Ora minha menina, o que queria que eu fizesse? Deixasse você responder? Não podia, não nesse estado. Eu sei que nunca gostou de ser controlada por ninguém e que, ainda que essa lady que mais parece um limão amargurado guardado no final da gaveta ache que te falte modos, sei que é capaz de muito mais que isso... É uma questão de tempo Marguerite, e veja só, está sendo bem alimentada, cuidada, terá inúmeros pacotes para se distrair, abrindo um por um, a casa também não podia ser melhor, é só evitar ficar perto dela, tem espaço de sobra para fazer isso.

... Agora se anime, terá um jantar especial essa noite e alguém que quer muito revê-la.

Após o último comentário, imediatamente Anne ganhou toda a atenção de Marguerite, braços cruzados, em pé a sua frente, passou a observá-la profundamente, concentrada, os olhos a encaravam profundamente.

A - Não adianta me olhar assim menina, se pensa que irei contar quem é esse alguém, devo informá-la que está certíssima, eu irei mesmo. Mas só depois de darmos um jeito em todos esses embrulhos e nós duas juntas.

M - Hahaha..., mas isso eu jamais duvidaria de você Anne. Agora, limão amargurado guardado no final da gaveta?

A - Sim, limão sim, maracujá é muito doce para esta Lady.

Risadas encheram o quarto da herdeira de alegria, que em meio de seus pensamentos agradecia por ter a governanta por perto.

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V - Roxton, por onde andou? Procuramos você por toda a aldeia, já é quase noite. Nos deixou preocupados.

R - Eu precisava pensar Verônica.

V - E parte que nos toca?! Se esqueceu de nós? Seja lá o que tenha visto, não justifica a sua atitude repentina, poderia ter se colocado em perigo e pior, a todos nós também, você sabe disso tanto quanto eu, vive brigando com todos nós sobre o horário, mas quando perde a cabeça é o primeiro a sair por aí a noite.

J - Eu sei, eu sei de tudo isso Verônica, mas você também sabe que quando se trata de Marguerite eu não sei o que fazer ou pensar. Acho que devo um pedido desculpas.

V - Acho que nos deve uma satisfação, depois um pedido de desculpas. Porque não começa nos explicando o que viu afinal?

Minutos depois estavam todos reunidos, de volta a cabana do Xamã Zanga, os ânimos já sobre controle, discutiam acerca da visão "perturbadora" que Roxton teve mais cedo.

N - Espera um pouco Roxton... Você está dizendo que viu Marguerite abraçando outro homem certo? E desde quando isso é novidade, ela sempre se insinua para o primeiro homem que aparece no Platô e fala que sabe a saída daqui, porque está tão surpreso?

J - Ora Malone, não é obvio? Marguerite está lá, seja onde for, cercada de luxo, joias, como sempre gostou e com outro alguém que sequer faço ideia de quem seja também. O que você pensaria se estivesse no meu lugar?

N - Que tenho pena desse homem. Eu sei que não acredita quando falava, mas Marguerite às vezes é letal John. No entanto, apesar das nossas diferenças, eu não acredito de fato que ela nos abandonou, sei que falei isso ontem, mas não acho que ela faria, não nos últimos tempos. Na verdade, ela pode muito bem, estar buscando meios de voltar pra cá, e o que viu é só mais um deles.

C - É verdade meu amigo, o que viu pode ser só mais uma das encenações Marguerite, que já nos salvou muitas vezes. Lembra-se quando Tribuno nos levou para aquela aldeia de pescadores, enquanto todos estávamos presos, ela seduziu o chefe deles, desmaiou o homem e roubou as chaves das nossas celas.

O caçador ponderou sobre o que os amigos falaram, seus pensamentos vagavam por suas lembranças, a ocasião que o cientista comentou não tinha sido a primeira vez que viu Marguerite encenando, tampouco a última. Mas caso os amigos estivessem certos sobre a mulher e seus “métodos”, isso sim era motivo para se preocupar, afinal, porquê ela agiria dessa forma se tudo estivesse correndo conforme o planejado.

J - Se for isso então George, quer que dizer que ela está em perigo, que alguém a capturou e a fez prisioneira, ou sabe-se lá o que mais.

... Luna, você é uma espécie de feiticeira, tem que saber de algo mais que isso. Tem que existir um meio que eu possa ajudá-la. Se talvez usarmos o Tryon e alguma magia sua, não sei, mas podemos também me enviar através dos sonhos, igual quando fizemos com a Verônica e o Ned. Por favor, eu te peço, não pode ser apenas isso.

Luna e o Xamã trocaram olhares cumplices, era doloroso ver o caçador agindo de tal modo, o desespero, a incerteza e o todo medo que sempre buscava conter, ainda que muitas vezes sem sucesso, naquele instante era consumido por todo e qualquer sentimento de perda, havia lagrimas em seus olhos, ainda não derramadas, mas seu semblante falava por si. Não era necessário palavras, entretanto ainda que o casal compartilhasse da dor, nada poderiam fazer no ali e agora.

Luna - Eu sinto muito caçador, mas não existe mais nada que possamos fazer, nenhum de nós. Tente entender, o Tryon é um medalhão de proteção por isso pertence a Verônica, ela é a protetora do platô e ainda se tornará a melhor que este lugar já viu. Os sonhos como sugeriu, eu lamento, mas ainda que sejam desejos da alma e do coração, para que possamos abrir uma janela entre eles, vocês dois precisam estar próximos um do outro, entende. E além disto, só o medalhão daquela mulher que você tanto devota, que permite viajar entre tempo e espaço, não há outro meio. Sinto muito, só nos resta esperar.

J - Esperar?! Esperar por quanto tempo Luna?! Eu não sei sequer o que está acontecendo com Marguerite, onde ela está, com quem está, e se estiver em perigo, eu posso perde-la de uma vez por todas. Como posso apenas esperar?

Luna - Eu lamento meu jovem. Mas talvez sejam tempos de aprendizados. Você sabe, que como anciã e parteira desta aldeia há pelo menos 40 anos, eu aprendi que tudo tem o seu tempo, mas isso, se permitirmos que o tempo caminhe da sua maneira, como tem que ser, como uma criança gerada no ventre da mãe, que deve aguardar nove ciclos de lua. E acredite, nem sempre o senhor destino é tão cruel, e não será o seu perde-la novamente.

...Descansem por hoje, todos vocês, novos dias virão.

C - John, Luna está certa. Veja meu velho, eu não acredito em magias ou feitiçarias, para tudo isso eu busco uma explicação através da minha ciência ou invenções. No entanto, tenho que admitir que, a dúvida é pior do que qualquer certeza que possamos ter, mas por hora, não há nada que possamos fazer, apenas aguardar até que ela retorne ou eu tenha desenvolvido outra máquina tele-transpotador, mas até lá, temos que manter a calma, e eu precisarei de você nesse novo projeto também. Vamos, ela vai conseguir...

Malone de certo modo, ainda tentando se redimir pelo comentário infeliz do dia anterior, quando desacreditou e desdenhou que Marguerite voltaria para o platô se surgisse a oportunidade de permanecer entre a sociedade, foi o próximo a oferecer seu apoio sincero.

N - Ouça Roxton, sei que falei sobre Marguerite nos abandonar na primeira oportunidade que surgisse, mas eu estava errado, não acredito mesmo nisso de fato, nem que eu tenha falado dessa forma.

... Eu e ela temos nossos desentendimentos, não é segredo pra ninguém e está tudo bem, ainda somos uma família. Mas nestes últimos meses, eu aprendi mais do que poderia imaginar, sair um pouco das folhas de papel e diários, me ensinaram a enxergar o que está a minha volta, é uma delas foi Marguerite, ela se preocupa conosco, fez mais coisas por nós do que qualquer poderíamos sonhar. Ela é letal como falei há pouco, mas isso é com aqueles que ameaçam as pessoas que ela ama, e não tenha dúvidas, ela ama você. Ela vai voltar, vai ver, assim como eu voltei. Seja onde ela estiver, ela sempre pensa em algo, logo estará conosco de novo, cobrando o seu café, lendo minhas anotações, implicando com às invenções do Challenger ou até com a Verônica, sobre pegar cogumelos.

V - É isso mesmo John, Marguerite é a mais ágil de todos nós, sempre soube se cuidar muito bem sozinha, vai saber se cuidar agora. E até que retorne, estaremos todos aqui, como comentei outro dia, sempre deixarei a luz da janela da casa da árvore acessa, com ela não seria diferente. Vai ficar tudo bem.

J - Eu espero, eu realmente espero.

Os exploradores como uma verdadeira família, abraçaram se todos juntos, Verônica com lágrimas rolando pelo rosto, assim como o caçador, ambos emocionados, todos os quatro, todos queriam uma coisa só, o retorno da herdeira.