O Que Não Tem Remédio...

Os olhos vêem e os corações sentem


"Você tem certeza que não tem problema, Rach?" Kitty perguntou, preocupada. "Eles podem dar bastante trabalho... e você tá de quase nove meses!"

"Não tem problema nenhum... eu juro!" Rachel assegurou à prima mais nova de Finn, enquanto fazia carinho nos cabelos loiros da menininha de apenas um ano e meio que sorria para ela, do colo da mãe. "Meu parto tá previsto pra semana que vem... e o Finn deve chegar em menos de uma hora."

"Pois é... eu só trouxe o Arthur porque ele não parou de me perturbar, um só segundo, depois que o Greg ligou, dizendo que tava aqui, e que o tio preferido dos dois tava vindo pra jogar vídeo game com ele." Riu.

"Eles são agitados, mas obedecem. Você não tem com que se preocupar." A Sra. Hudson reafirmou. "Se a Emma deixou o Greg aqui, pra ela e o Will irem à apresentação de balé da Gaby, não tem porque você não deixar o Arthur."

"É mais um pra olhar... e eles se agitam mais quando estão juntos." Reforçou, dando nova oportunidade para que Rachel recuasse.

"Vai tranquila! O Finn vai amar chegar aqui e encontrar mais um." Sorriu. "Só vai ficar com pena de não ver a Chloe." Lamentou, se referindo à filha mais nova de Kitty, que, sendo muito pequena, ainda não ficava nos lugares sem pelo menos um dos pais.

"O Finn é demais! Você tirou a sorte grande!" Brincou, dando uma levíssima cotovelada na quase prima. "Nem o Jake nem o Ryder são muito atenciosos com as crianças." Lamentou, se referindo ao ex-namorado e ao atual, cada um pai de um de seus pequenos.

"É muito da pessoa, né?" A outra comentou sem jeito e elas mudaram de assunto, combinando sobre a alimentação do menino de quatro anos, que tinha algumas restrições, em razão de alergias.

Logo, Rachel estava sozinha com os garotinhos, mas eles estavam brincando, calmamente, com carinhos e bonecos de menino, enquanto ela apenas os observava, imbuída do espírito maternal que tomara conta de si nos últimos meses. Contudo, sentiu, de repente, uma forte dor no baixo ventre e gemeu alto, sentando-se em seguida, e chamando a atenção dos dois.

"Tá tudo bem, tia Rach?" Foi o mais novo quem perguntou.

"Tá sim, meu amor. A tia só sentiu a neném chutar, ok? Pode voltar a brincar."

A dor se foi, mas, minutos depois, voltou ainda mais forte e mais demorada e, como estudante de enfermagem que era, a futura mamãe desconfiou de que poderia estar entrando em trabalho de parto. Verificou as horas e, como previra, nova forte contração veio, mais ou menos vinte minutos depois, então ela ligou para a Dra. Addison, para confirmar suas suspeitas, e a médica a aconselhou a ir para o hospital, a fim de se preparar da melhor forma possível, mas assegurou, ao mesmo tempo, que ela poderia fazer isso com calma, pois o parto em si ainda deveria demorar algumas horas, sendo o primeiro pelo qual a garota passaria.

Ligou em seguida para Finn, que já estava no trânsito, indo para o apartamento, e até se arrependeu de tê-lo feito. Ele fazia uma pergunta atrás da outra e pedia para ela ter calma, mas era ele quem estava nitidamente nervoso como nunca.

"Eu to calma, amor. Eu nem sei como ou por que, mas eu to bem calma." Ela afirmou, sem titubear. "Agora, se eu continuar falando com você, e escutando você buzinar feito um louco, como se isso fosse tirar as pessoas da sua frente... e cantar pneu, como fez agora... aí, sim, eu vou ficar nervosa!"

"Desculpa, amor." Ele riu, sem jeito. "Eu vou tentar ficar menos ansioso pra ver, finalmente, o rostinho da minha princesa."

"Tudo bem!" Ela não conseguiu deixar de sorrir, bobamente, do outro lado da linha. "Só vem com calma, porque eu preciso de você inteiro, ok?" Riu. "E não liga pra ninguém, pra não se distrair. Eu vou ligar pra Kitty e Emma, porque os meninos tão aqui... e elas podem avisar todo mundo."

"Vai dar tudo certo. Te amo." Declarou, meloso.

"Eu também te amo muito. Até já." Ela disse, desligando sem esperar resposta, para que ele não percebesse em sua voz que ela era tomada mais uma vez pela dor.

Menos de uma hora havia se passado, quando o casal chegou ao hospital e se reuniu a uma Kitty muito preocupada, que repetia que deveria ter levado Greg para sua casa, em vez de deixar Arthur se juntar a ele na residência dos Hudson, e perguntava se eles tinham atrapalhado demais.

"Na verdade, a Rach disse que eles até ajudaram bastante a arrumar as coisas... ficaram tentando cuidar dela." Finn respondeu, sorridente.

"É claro que eu ajudei!" Greg se intrometeu na conversa dos adultos, como de costume. "A Ariel vai ser linda igual a Ray-Ray, e vai ser minha namorada!"

"Eu já tenho namorada lá no colégio!" Arthur mostrou os dentes, orgulhoso, mas Gregory não se fez de rogado.

"Eu também tenho namorada... dã!" Disse, dando um tapinha na testa do primo. "Mas a Margie tem a minha idade... é bem mais velha que a Ari... então, quando a Ari crescer e puder namorar, eu troco a mais velha por uma mais nova, que nem o vô Pillsbury fez." Acrescentou, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, e Finn e Kitty se olharam, sem saber como reagir.

"Eu vou deixar vocês dois sozinhos... e conversar com esse mocinho aqui, sobre essa história de troca." A garota disse ao primo, fazendo cara de reprovação para o sobrinho, e praticamente empurrando as duas crianças para o corredor, onde se uniu a Ryder e Chloe.

Depois disso, tudo aconteceu de forma tranquila para Rachel, que estava sob os cuidados da mesma equipe com a qual trabalhava, da qual fazia parte, inclusive, a sua melhor amiga Sugar. Finn, por sua vez, não conseguiu ficar nada calmo, tendo que esperar por quase nove horas para ver, afinal, sua filha ser dada à luz, ainda que estivesse cercado de parentes e amigos que lotavam a sala de espera da maternidade, reunidos de tal forma que poderia parecer que estavam em uma festa, se não houvesse cheiro de hospital, muita gente circulando vestida de branco e ausência completa de álcool, música e acepipes.

Sua mulher tinha apenas os pais, Hiram e Leroy, mas ele tinha uma família imensa! Tinha os pais, irmão, os quatro avós vivos, um total de três tios e sete primos, que, por sua vez, já estavam tendo seus próprios filhos, como ele. Não estavam todos presentes, porque alguns tinham compromissos inadiáveis, mas estavam em número suficiente para fazerem mais barulho do que um local como aquele permitia, e serem repreendidos, mais de uma vez.

Ariel Berry Hudson chorou pela primeira vez no meio da madrugada, quando os bisavós já cochilavam no sofá. A pediatra, Dra. Dany, a colocou em um berço aquecido e a limpou, fazendo, em seguida, uma primeira avaliação rápida, pra ver se tudo estava dentro da normalidade. Conferiu o batimento cardíaco, a respiração, o tônus muscular, a coloração da pele, o choro, e sugou secreção de seu pequenino pulmão, pra liberar a via aérea.

Após os cuidados e enrolada como uma trouxinha, a princesinha foi levada para conhecer a mãe e o pai, que choravam e riam de emoção, ao mesmo tempo, ao vê-la e tocá-la pela primeira vez. Seguiu para o berçário onde tomou seu primeiro banho, foi medida, pesada e vestida, voltando, pouco depois, para o quarto, onde a mãe, por sua vez, dormia, vencida pelo cansaço.

Finn estava exausto também, mas não conseguia dormir no pequeno sofá do hospital, então aproveitou para pegar a filha no colo e ter sua primeira "conversa" com ela. Falou do quanto ela era amada, não só por ele e pela mãe dela, como também pela grande e divertida família de que faziam parte, e que tinha enchido o quarto da maternidade com todo tipo de presentes para a recém-nascida e os jovens pais.

Autorizado pela pediatra, ele a levou para conhecer membros da família, em pequenos grupos, e não houve quem não se emocionasse com a chegada de mais uma benção ao clã.

Ariel ainda enxergava apenas sombras, como qualquer recém-nascido, mas arregalava os grandes olhos que herdara da mãe para o mundo, como se pudesse distinguir e apreender todo e qualquer detalhe.

O mais importante, no entanto, não era o que a menina podia ver, mas como ela era vista e sentida. Quando abria os olhos, daquela forma, encarando o novo, ela trazia algo também novo consigo, e sua família inteira abria não somente os olhos, mas também os corações para receber e dar muito amor.