Eu podia ouvir a voz suave da Srta. Ava, conforme ela ia ensinando em frente à classe sobre mais algumas leis que regiam o nosso mundo. Mas minha mente não estava focada nela. Sua voz sumia da minha mente enquanto eu olhava de novo em direção ao garoto de cabelos loiros sentado do outro lado da sala tamborilando os dedos na carteira com impaciência. Seus olhos, é claro, passeando pelas garotas sentadas em volta dele, mandando todos aqueles sinais claros de desejo. Que nojo, a namorada dele estava bem em frente. Ele não se envergonhava de paquerar tão descaradamente todas as outras? E por que é que eu estava prestando tanta atenção nisso hoje?

James, o filho do Alfa da matilha Quileute e o próximo Alfa da linhagem. O típico adolescente super popular – engraçadinho, bonito, atleta. Todos queriam um pedaço dele, seu poder, sua fama, ser amigo próximo do filho do Alfa.

E ele se nutria disso. O tipo de playboy que reina pela escola, flertando com todas as garotas bonitas e descartando-as assim que conseguia se divertir com elas. E, ainda assim, todas elas continuavam a correr atrás dele incessantemente. É claro que ele tinha uma “oficial”. Victoria. A garota absolutamente perfeita de voz anasalada e que todos esperavam que se tornasse a próxima Alfa a seu lado. Que piada. Os dois eram arrogantes e burros, egoístas demais para se preocupar com qualquer coisinha fora da bolha em que viviam. Em pensar que um dia terei que me curvar para pelo menos um deles. Mesmo que o laço sagrado não se formasse entre eles, James encontraria outra Luna para liderar a matilha. E eu não teria outra opção a não ser fazer meu juramento ao meu novo Alfa.

O que mais eu poderia fazer? Aprendemos nas aulas de histórias que houve um tempo em que éramos livres para ir e vir. Podíamos viver entre os humanos, como um deles, ou trilhar o nosso próprio caminho como bem entendêssemos. Mas isso foi há muito tempo.

Hoje, um lobo que se rebelava era expulso e se tornava um corsário. Não que se rebelar por si só fosse algo fácil, já que lobos eram geneticamente programados para obedecer o Alfa, tornando quase impossível para nós cometer qualquer ato contra a vontade do nosso líder. Mas, ainda assim, haviam os raros que se arriscavam. Só que nunca sobreviviam por muito tempo. A força dos lobos dependia de um delicado ecossistema que simplesmente não existia quando se estava à mercê da própria sorte, e era muito difícil ser aceito em outras matilhas. Os corsários iam enfraquecendo pouco a pouco e acabavam por perecer.

É claro que eu não estava impressionada com James, o evitava como se fosse uma praga. Eu ficava na minha. Tinha amigos, é claro, mas nenhum do círculo popular. Eu, na verdade, não ligava de me manter anônima, estava bem em passar a maior parte do tempo invisível. Sempre fui do tipo introvertida e odeio chamar a atenção pra mim mesma.

Mas aí, no último mês, eu comecei a ter essa coisa pelo James. Ainda o acho um babaca insuportável, mas não consigo parar de prestar atenção nele. Eu me dava chutes mentais toda vez que me pegava olhando pra ele, condenando as meninas que se jogavam em cima dele, incomodada quando conseguiam sua atenção. E isso vinha acontecendo com cada vez mais frequência.

Hoje estava particularmente difícil evitá-lo.

Não é como se eu tivesse tentando paquerar ele nem nada assim. Era mais como um ímã. Eu simplesmente não conseguia me impedir. Talvez seja porque ele fez 18 anos recentemente e essa é a idade em que supostamente sua aura de Alfa deve vir à tona. Acontece para todos. Ao atingir a maioridade, nosso lobo aparece e nós nos tornamos mais fortes, mais ágeis, mais imunes à dor e nosso fator de cura acelera. Além de tudo, também é o meu aniversário de 18 anos hoje e todos os meus sentidos estão aguçados. Sei que na próxima lua cheia meu lobo aparecerá. Estou ansiosa para ver como serei. Só vantagens.

Exceto pela parte em que também ficamos aptos a encontrar nosso Lumni ou Luna, o equivalente a alma gêmea para os humanos, e quem é Alfa ganha uma aura de poder que obriga todos os outros a se submeter. Muito legal, só que não.

Supostamente encontrar seu Lumni ou Luna é uma benção de Selene, a Deusa da Lua, ou algo assim. É um encontro que eu nunca achei particularmente feliz, embora seja sagrado e a maioria das pessoas passe boa parte do tempo procurando por isso. Quando se atinge a maior idade, a maioria está em êxtase para encontrar seu par o mais rápido possível. Um Lumni é um parceiro para a vida toda, escolhido pela Deusa especialmente para você. O laço que se forma entre os dois é forjado na alma. Seus nomes literalmente significam “aquele/aquela que me ilumina”. É poético se pensarmos que lobos são crianças da lua e vivem no escuro. Seus parceiros escolhidos por Selene iluminam suas vidas e os cegam para qualquer outro lobo. É por isso que são tão preciosos, tão vitais à existência um do outro. É claro que alguns são realmente felizes com as suas outras metades. Mas será que eles não veem o absurdo da coisa?

Você é você mesmo um dia, vivendo sua vida com os seus próprios planos pro futuro, e aí, de repente, bang! Você vê sua alma gêmea e o laço sagrado se forma. Diz que o cheiro dela é o mais incrível de todos e é impossível resistir, tudo em você reage a ela. Daí você faria qualquer coisa por ela, seria qualquer coisa por ela.

O que na prática significa que você não tem mais vida ou vontade própria.

Principalmente para as mulheres. É uma relação tão codependente... Não necessariamente encontrar sua alma gêmea significa encontrar o amor da sua vida. Eu já vi mais de uma vez os pares se sentirem sufocados e infelizes e, ainda assim, incapazes de partir. É mais como se você pertencesse a outra pessoa do que a amasse. Pra mim é mais uma maldição do que uma benção. Não, eu não to nada ansiosa pra isso, muito obrigada Selena, mas essa, eu passo.

Entretanto, mal posso esperar pela hora de me descobrir em forma de lobo. Eu sempre me senti... desajustada, por falta de uma palavra melhor. Ter genes de criaturas mágicas geralmente significa ser incrivelmente bonito e inumanamente forte. Mas não é assim para mim. Não é que me ache feia, mas sou comum. E, pior, sou uma aberração de tão desastrada. Sou pequena. Pequena demais para a minha espécie. E tenho zero coordenação. Mas quando o meu lado lobo aflorar, tudo isso vai finalmente mudar.



Demorei um pouco recolhendo meus livros no fim da última aula, a fim de deixar que James estivesse o mais longe possível e eu não precisasse mais vê-lo até a próxima segunda-feira. Ainda assim, eu me sentia estranha, com uma sensação péssima de que algo horrível estava prestes a acontecer. Caminhando pelo corredor até o meu armário, praticamente não participava das conversas com os meus amigos, todos empolgados sobre o fim de semana ter finalmente chegado, suas cartas de aceitação na faculdade e o verão próximo. Eu normalmente também estaria animada, mas ainda sentia um arrepio na espinha e um incômodo no estômago que me deixava fora do meu elemento.

Me despedi de todos prometendo nos encontrar mais tarde para uma pequena comemoração do meu aniversário e resolvi ir para a biblioteca, buscar algum livro que falasse sobre as mudanças que precediam a lua cheia após o nosso aniversário de 18 anos, pra tentar entender porque é que eu estava tão estranha. Novamente um arrepio me fez olhar em volta atenta a qualquer movimento, mas a escola já estava deserta àquela hora. Acabei não encontrando nada muito útil e levei um livro sobre magia antiga, assunto que costumava me distrair por horas quando estava entediada.

Saí para o estacionamento e percebi que o tempo estava mudando, nuvens escuras anunciavam chuva e eu já podia sentir a temperatura cair. Fechei os olhos e respirei fundo tentando acalmar meus nervos a flor da pele. Foi quando uma brisa mais forte passou por mim e trouxe o cheiro mais enlouquecedor que já senti na vida, minha boca encheu de água e todos os meus sentidos me obrigaram a perseguir de onde aquele aroma vinha. Meu lado lobo, que mal começava a nascer, estava fazendo um barulho ensurdecedor na minha cabeça, me obrigando a caçar por todos os cantos.

Sabia o que isso significava — ignorando os meus pedidos, Selena resolveu enviar minha alma gêmea sem me dar nem mesmo o tempo de uma lua cheia para me acostumar com a ideia — e simplesmente não conseguia me impedir de agir como uma psicótica rastreando minha presa. O encontrei no campo de futebol sozinho. Sentado nos bancos, com o rosto tenso. James.

Eu parei, em choque, quando entendi que o cheiro vinha dele. Um “ah, merda” saiu da minha boca antes que eu pudesse mantê-la fechada e ele olhou de volta para mim escaneando o meu rosto com o cenho franzido. Alguns segundos se passaram quando seus olhos se arregalaram.

Ele correu na minha direção em velocidade inumana e agarrando minha mão para me puxar até o vestiário mais próximo. Me empurrou para dentro quase me derrubando e me segurou pelos ombros com força.

Ele parou e me olhou com o cenho franzido, me encarando com os olhos ferozes. Inesperadamente seu nariz foi parar no meu pescoço, onde ele inspirou profundamente, bebendo do aroma que eu devia exalar para ele, assim como ele para mim. Eletricidade corria pela minha pele onde ele tocava, mas tudo o que eu podia pensar sem parar era “ai, merda, sério? Ele? Que merda”.

De repente um rugido brotou de seu peito e ele me soltou se afastando com brusquidão, bufando e passando as mãos pelos cabelos num claro sinal de irritação.

“Ouça, isso não pode estar acontecendo! Você não pode ser minha Luna. Eu não posso ter uma Luna fraca e pequena como você. Seria um desastre!” Ele despejou tudo isso em cima de mim com o tom Alfa dele. Eu podia sentir as ondas de dominância que a aura dele emanava tentando me submeter à sua vontade, mas elas simplesmente não me afetavam.

“Você está me rejeitando?”

“Sim, porra! Nós dois sabemos que isso jamais funcionaria. Eu tenho Victória e você é uma ômega!” — Sua expressão de nojo me dava cada vez mais raiva.

Não era possível! Ele sabia o que uma rejeição causava. Não que eu estivesse animada em tê-lo como parceiro de vida, mas, se existia algum propósito nisso, eu estava disposta a descobrir. Jamais desrespeitaria as leis da natureza como ele estava fazendo agora.

Nada disso pareceu importar para ele, ou impediu que ele continuasse.

“Eu, James Bishop, filho do Alfa Laurent e da Luna Irina, futuro Alfa da Matilha Quileute, rejeito você, Isabella Marie Swan e desfaço os laços formados por Selena na terra e no céu agora e para sempre.”

Uma rajada de ar frio passou por nós em fúria e por um momento eu vi medo nos olhos de James. Havia muita sujeira naquela alma. Mas um segundo depois ele saía tempestuoso pela porta, batendo-a com força atrás dele.

Meu peito subia e descia em arfadas e, ainda assim, eu não conseguia respirar. Podia sentir meu coração nos meus ouvidos e uma dor aguda se formava por toda a minha extensão. O que havia acontecido aqui?

Eu nunca o tinha visto tão bravo antes. Com o seu comportamento típico de garoto de ouro da matilha, todos sempre o adorando, incluindo os líderes, James era puro charme. Mas assim que reconheceu sua suposta alma gêmea, seu pior lado veio à tona.

Como podia ser? Era tudo tão confuso. De tudo o que me falaram, não é possível viver sem sua alma gêmea. O laço sagrado vai continuar te puxando em direção a pessoa, e simplesmente não dá pra resistir. Então como que o James conseguiu me rejeitar dessa forma e ir embora? É tudo uma mentira então?

Eu via meus pais juntos todos os dias e eles eram absolutamente apaixonados um pelo outro. Eles se encontraram durante a faculdade e, como todo mundo, o laço se formou imediatamente. Três semanas depois, eles completaram o processo e se marcaram. Uma história bem bonita, e bem comum. Então por quê a minha estava sendo diferente? Será que eu era realmente uma aberração?

O que fazer agora? Supliquei baixinho para que Selena me ajudasse. Por favor, eu não podia forçá-lo a gostar de mim – nem me forçar a gostar dele. O que é que eu havia feito para merecer um destino tão cruel?

Os dias foram se tornando semanas, que se tornaram meses. Eu ignorava James tanto quanto podia, mas não era nada fácil. O laço sagrado é uma força poderosa e estava quase me enlouquecendo com o tormento de sentimentos dentro de mim. Me sentia cada vez mais apática, cada vez mais doente. Era muito raro um lobisomem adoecer, mas estar longe da nossa alma gêmea depois que a encontramos nos deixava fracos. O mais comum quando um parceiro partia, era que o outro não tardasse muito a ir também.

Então nem adiantava ir atrás do James, se tudo o que me disseram era verdade, ele estaria sentindo a mesma coisa. Bastaria esperar e em breve ele mudaria sua decisão. Eu não sei o que me assustava mais. Estar com ele, ou estar sem ele.

Victoria começou a me dar mais atenção. E eu não to falando do tipo bom de atenção. Ela “acidentalmente” esbarrava em mim e derrubava todos os meus livros, e fazia piadas sobre a minha aparência. Eu não entendia o porquê dela ter de repente desenvolvido o interesse de fazer bullying comigo, mas depois eu acabei percebendo que ela sabia que sobre mim e James. James nunca fazia nada para me defender, e ria junto com as outras pessoas. Eu continuei de cabeça erguida, me dizendo para seguir em frente. Não era possível que a Lua tivesse me amaldiçoado com alguém tão infantil e estúpido, ela só podia ter se confundido. Ele ia voltar atrás na sua decisão e tudo isso ia passar. Ele precisava.

Mas minhas esperanças foram totalmente esmagadas após a graduação. Começaram alguns rumores sobre o James marcar a Victoria no dia da nossa formatura. Eu não queria acreditar e continuava me dizendo que aquilo era provavelmente um boato criado pela própria Victoria. Eu nem mesmo queria ir para a formatura, mas por causa dos rumores, me obriguei a ir e ver por mim mesma.

Eu continuava rezando para que a Deusa da Lua desfizesse tudo isso e eu pudesse ficar em paz, sem sentir essa conexão absurda com ele. Porque se os rumores fossem verdade, eu estava ferrada. Assim, quando a cerimonia acabou e nada aconteceu, eu soltei o ar aliviada. Até que toda a matilha foi chamada para a casa Alfa para um “anúncio especial”.

Um sentimento frio e vazio correu por mim quando eu suspeitei do que se tratava. Eu estava ao lado dos meus pais quando tudo aconteceu. Nosso Alfa, Alfa Laurent, tomou a frente com a Luna a seu lado e James um pouco atrás. Eu não conseguia ouvir o que eles estavam dizendo enquanto meu coração acelerava descontroladamente e um zumbido alto invadia meus ouvidos de dentro para fora. Minha garganta estava se fechando, tornando impossível respirar. Tudo o que eu podia ver era Victoria andando confiante até James enquanto ele colocava os seus caninos para fora e descia até o pescoço dela, sem nenhum traço de arrependimento enquanto todos brindavam o novo casal. Eu corri para fora o mais rápido que pude.

Meus pais, é claro, vieram atrás de mim. Eu não podia esperar, não podia deixar que me encontrassem assim. No meio do meu desespero, nem percebi quando minha forma começou a mudar para a de um lobo enquanto corria ainda mais rápido para dentro da floresta. Eu estava quebrada. Mudar pela primeira vez é supostamente doloroso enquanto todos os seus ossos se torcem e se encaixam de novo na nova forma. Mas eu nem sabia diferenciar. Meu corpo inteiro estava engolido por dor, e eu sentia pura agonia. James ter marcado Victoria estava literalmente me matando. Meu lado lobo estava descontrolado, saindo antes da lua cheia, sem conseguir de fato vir para fora completamente. Era uma figura disforme. Eu me escondi na floresta o dia todo, muito fraca para ir para casa, rolando de dor enquanto ondas de mutação me faziam mudar partes do meu corpo apenas para voltar para a forma humana depois.

Minha mãe sempre me falou que encontrar sua alma gêmea é o melhor sentimento do mundo. Mas para mim, estava sendo o pior. Em pensar que o cara que era para ser meu parceiro para cuidar e proteger de mim era justamente quem estava me causando tanta dor. Eu não conseguia comer ou dormir. A lua cheia veio e passou, mas eu não me tornei um lobo novamente. Muito fraca para a mutação. Continuei calada, não falando nada para os meus pais, e eles estavam cada dia mais preocupados comigo sem saber o que estava acontecendo. Eu precisava sair dali.

Para um lobisomem, é muito difícil deixar sua matilha. É sua família, não importa o que aconteça. Além disso, você precisa da autorização do Alfa para partir, e isso só acontece se você der um bom motivo. A não ser, é claro, se você encontrar sua alma gêmea em outra matilha, aí não há problemas para ir viver com ele. Quem sai fora dessas condições se torna um Corsário.

Eu sabia que minha alma gêmea marcando outra pessoa seria razão suficiente para me permitirem partir para outra matilha, mas eu duvidava muito que o Alfa ficasse feliz que de saber que seu próprio filho quebrara o laço sagrado da lua me rejeitando. Isso ia causar tantos problemas.

Então, no fim, eu só podia sair de férias. E foi o que fiz. Fui visitar minha tia na matilha vizinha, o Bando da Lua Vermelha. Essa era a matilha da alma gêmea dela, e ela se mudou para lá quando o encontrou. Tia Renée tinha poucos anos de diferença de mim, e nós éramos muito próximas, então eu senti muito a falta dela depois que ela partiu. E nesse momento, ela era a desculpa perfeita para eu passar alguns dias fora antes da faculdade começar. Era muito menos tempo do que eu realmente precisava, mas teria que servir.

Ela sabia que algo estava errado comigo no segundo em que me viu. Eu estava mais magra, com olheiras fundas e completamente sem vida. Acabei contando tudo a ela, sem conseguir mais suportar guardar tudo pra mim mesma. Ela não ficou uma fera e queria ir até o Alfa Laurent para tirar satisfações, mas eu consegui fazê-la me prometer que não contaria nada daquilo para ninguém, que só o precisava no momento era de um colo, e é claro que ela se acalmou o suficiente para me acalmar.

Renée me ajudou a melhorar com o passar das semanas. Me obrigou a comer e a me conectar com a maior parte dos meus sentidos de lobo, embora eu ainda não fosse capaz de me transformar, estava muito mais forte. Também me treinou para usar meus sentidos a meu favor mesmo na forma humano, e assim como eu esperava, fiquei muito mais graciosa. Ela me explicou que, como ele havia marcado outra, nosso laço seria dissolvido com o tempo, e eu poderia escolher outra pessoa de uma forma mais normal, e quando marcássemos um ao outro nossa ligação seria muito parecida com aquela concedida pela lua, com a diferença de que a necessidade e codependencia não estariam lá. Ao menos era isso que acontecia com aqueles que sobreviviam a morte da alma gêmea. Embora eles jamais conseguissem ser completos novamente, eles conseguiam encontrar uma forma de felicidade ao lado de outro parceiro.

Feliz com o meu progresso, eu estava resolvida a nunca mais mostrar nenhum sinal de fraqueza, frente a pessoa que fosse. Para continuar forte, eu me mantive olhando para o futuro. James me rejeitou da pior maneira possível, sabendo muito bem como aquilo me quebraria, mas eu não ia me perder por um garoto que sempre desprezei.

Minha tia estava resolvida a me dar uma mudança completa, e era impossível pará-la quando ela estava decidida. Mas para ser sincera, eu gostei de finalmente aprender a me vestir e me sentir mais bonita do que nunca. Qualquer coisa que me ajudasse a me manter confiante era bem vinda. Eu estava, afinal, começando a faculdade, então podia muito bem mudar meu estilo. Aquela altura, eu já tinha voltado ao meu peso normal, mas estava com o corpo mais torneado do treino e tudo ficava bem em mim.

Sim, muitas mudanças aconteceram nessas semanas enquanto eu focava em me recuperar de qualquer que fosse a maldição que acontecia quando a deusa da lua decidia te unir a alguém que te rejeitava, e externamente eu estava melhor do que nunca. Mas toda noite, eu ainda me sentia vazia pela falta da minha outra metade e ficava impossível respirar. Nosso laço ainda não estava completamente quebrado mesmo depois dele ter marcado outra, e eu não entendia o porquê.

Eu ainda me pegava desejando que ele fosse diferente, que tudo aquilo tivesse sido um pesadelo, que ele viesse e me deixasse transformá-lo em uma pessoa melhor. Quantas vezes não me peguei stalkeando as redes sociais dele, vendo vermelho quando havia atualizações de Victoria mostrando o casal perfeito que eles eram. Nesses momentos eu queria voltar correndo para a minha matilha, desmascarar os dois e força-lo a me aceitar. Sua verdadeira alma gêmea te torna mais forte. É por isso que um Alfa só pode acender quando encontra sua Luna. Eu tinha absoluta certeza de que Alfa Laurent ficaria do meu lado. Mas James e Victória já haviam se marcado, e isso era impossível de desfazer, mesmo que eles não tivessem o laço da lua entre eles.

Quando as aulas começaram e eu precisei retornar para a faculdade, recebi olhares chocados sobre a minha nova aparência. Eu estava nervosa para o meu primeiro dia, é claro, e desejei que eu pudesse escolher uma faculdade bem longe da minha matilha. Mas isso só acontecia em bandos menores, que não eram tão desenvolvidos e não tinham as opções de curso dentro da própria cidade. Ao menos, quando vi os rostos familiares de quem fez o colegial comigo, fiquei satisfeita com o olhar abobalhado na cara deles, e isso me deu ainda mais confiança. Eu desfilei pelos corredores da faculdade como uma rainha, e sorri “like a boss” da cara deles.

Mas então, eu o vi. Ele continuava o mesmo de sempre, mas talvez um pouco mais musculoso. Os genes Alfa eram realmente uma coisa. E eu sentia aquela urgência de ir até ele. Coisa do maldito laço, não da pra escapar. Sempre ficava me perguntando como é que ele conseguia lutar contra isso com tanta calma. Talvez perceber que eu era a alma gêmea dele tenha sido uma decepção tão grande que ele nem sequer sentiu nada disso. Eu realmente queria odiá-lo. Victória, é claro, estava pendurada no pescoço dele. E foi aí que ele também me viu. Assim como todo o resto do bando que rodeava ele. Mais uma vez, eu estava satisfeita com os olhares chocados na cara deles. Não pude impedir um sorriso de lado no meu rosto, enquanto eu passava direto por eles, deixando todos de boca aberta.

E assim meus dias foram passando. Todos mais ou menos iguais. A atenção que eu recebia ainda me deixava desconfortável, mas ao menos me dava distrações. Eu realmente recebia convites pra sair agora. Encontros. Com caras de verdade. As garotas também tentavam se aproximar. Mas eu ignorei a maioria e mantive meus amigos antigos, que gostavam de mim antes de eu melhorar minha aparência. Não queria esses falsos todos me rodeando mais do que o necessário. Eu não perdia é claro os olhares de ódio que Victoria me enviava sempre que me via. Ou os olhares longos me queimando da minha antiga alma gêmea. Mas estava tarde demais pra ele agora, ele já havia feito a escolha dele.

Uma noite, quando fui a uma festa em uma das fraternidades, James teve o desplante de me agarrar. Ele enfiou o nariz no meu pescoço, inalando forte o meu cheiro, e se eu não tivesse o empurrado pra longe, ele provavelmente teria feito outras coisas também. Eu sabia que ele estava bêbado, e eu tava tentando me livrar dele quando ele começou a deslizar a mão por mim e a sussurrar coisas sem sentido no meu ouvido, me pedindo pra esquecer o passado e fazer um acordo com ele... como amante dele. Eu sentia vontade de vomitar. Por sorte as semanas treinando com a minha tia me prepararam pra me defender e eu consegui dar uma joelhada nele com força e sair dali.

Que filho da puta! Ele devia me achar uma estúpida, uma das idiotas apaixonadas por ele se pensava que eu aceitaria ser amante de um cara comprometido. Vai se foder. Eu preferia morrer a prestar esse papel. Ainda mais para um completo imbecil.

Depois daquela noite, ele não parou, mesmo que eu repetidamente o afastasse. A parte boa, é que quanto mais ele tentava se aproximar, mais desprezo eu sentia por ele, e sabia que em breve nosso laço não passaria de uma lembrança distante, dessas que a gente nem tem certeza se aconteceu de verdade. Finalmente, um dia, ele veio até o meu dormitório, bêbado, e tentou forçar a entrada dele. Pra minha sorte, Angela, que dividia o quarto comigo, me ajudou a chutá-lo para fora.

Foi pensando nisso que eu comecei a encará-lo através da sala pela primeira vez desde o colegial. Como ele ousa? Ele pensa que por ser o próximo Alfa pode fazer o que quiser?

“Srta. Isabella?” Eu me virei para o som do meu nome sendo chamado. Ela e toda a classe estavam virados para mim. Droga.

“Tem algo mais interessante que você queira compartilhar?”

Eu não gosto muito dela. É uma dessas professoras extremamente rígidas na sala de aula.

“Não Srta. Leah.” Eu balancei a cabeça brevemente, me sentindo envergonhada com a atenção desnecessária. Ela me deu mais um daqueles olhares enviesados e voltou para o que estava explicando.

Eu voltei a olhar para o encapetado do James, para ver que ele sorria abertamente para mim. Ele provavelmente me pegou encarando e tava pensando que era por algum outro motivo. Eu bufei sentindo o desgosto por ele e voltei a prestar atenção na aula.

“Desgraçado”, murmurei.