Numa fria manhã de janeiro, resolvi visitar meu caro amigo, Sherlock Holmes, com quem dividira o apartamento 221b, Baker Street. Fazia mais tempo que o usual que eu não passava por lá, a vida de recém-casado tomava tempo e cada vez mais pacientes apareciam a minha porta.

Quando cheguei, encontrei Holmes lendo jornal enquanto saboreava o chá matutino. Parecia que não havia clientes à vista ou tormentos em sua mente brilhante. Não me lembrava qual tinha sido a última vez que o vira tão tranquilo.

— Bom dia, Watson.

Ele me lançou um olhar rápido e apontou para a confortável poltrona que eu poderia chamá-la de minha. Sentei-me.

— Como vai o cãozinho? — perguntou-me Holmes enquanto atacava os biscoitos artesanais feitos por Mrs. Hudson, os melhores do mundo, particularmente falando.

Mais uma vez, não pude deixar de impressionar-me com a sagacidade de meu amigo. Como se lesse meus pensamentos, Holmes suspirou.

— Um procedimento muito simples, como sempre. Seus sapatos estão riscados, não é possível que sejam riscos de uma escova para limpá-los, eles são ligeiramente mais grossos e profundos. Há um pelo discreto e cinza na manga esquerda de seu terno, próximo ao botão. — acrescentou quando pus-me a procurar o tal pelo. — Há poeira em suas mãos e perto de seus tornozelos, isso significa que não pode ser um gato ou outro animal senão um cachorro pequeno e agitado. Arrisco-me a dizer que o encontrou vagando pela rua quando voltava para casa depois de um dia calmo com seus pacientes. Ah! E é um filhote, certamente.

— Incrível! — exclamei. — Ele começou a me seguir quando eu estava a duas quadras de casa.

Holmes suspirou pela segunda vez, o que indicava que ele não só estava entediado, como também estava ansioso para entrar em ação. Devo confessar que também gostaria de viver mais uma aventura ao lado de meu amigo, a vida de casado poderia ser entediante às vezes e a vida de um médico repetitiva.

A campainha tocou. Holmes saltou da poltrona, por pouco não derrubou os biscoitos que estavam na ponta da mesinha que ficava do lado de sua poltrona.

— Prepare-se, Watson. Hoje temos muito trabalho a fazer. — disse ele em voz baixa, mas animada, e juntando as mãos uma na outra, ele já esperava tal cliente e provavelmente acreditava que esse prometia muito serviço.

A porta se abriu devagar, ainda não conseguia ver quem era o nosso novo cliente, mas pude observar os vários sentimentos que foram espelhados nos olhos de meu companheiro. Primeiro, a decepção, depois, a perplexidade e, por último, um brilho de divertimento. Todos esses sentimentos aconteceram numa impressionante fração de segundo.

— Sente-se, por favor. — disse Holmes fechando a porta e indicando a poltrona que antes estava sentado.

Saindo da sombra de Sherlock Holmes, uma jovem, que não devia ter mais do que 20 ou 21 anos, caminhou até a poltrona. Seus olhos eram verdes, possuíam um brilho de animação. Os cabelos castanhos estavam presos e escondidos quase inteiramente pelo chapéu creme de rendas azuis, estas eram da mesma cor que seu vestido de inverno.

— Obrigada por me receber, Mr. Holmes. — disse com um sorriso agradável, porém contido. – E bom dia, Dr. Watson.

Meus olhos se arregalaram de surpresa e tive que me esforçar para responder-lhe o cumprimento, como ela sabia de mim? Normalmente, os clientes não sabem quem sou até sermos devidamente apresentados.

Sherlock abriu um sorriso, o que era relativamente raro, principalmente quando se tratava de atitudes femininas, apesar de não criticá-las depois que conheceu Irene Adler.

— O que podemos fazer pela senhorita, Miss...? — indagou Holmes.

— Collins, Maud Collins. Vim aqui para ser sua aprendiz.