O Misterioso Diário de Emily

Capítulo 15 - Lembranças


“A vida só pode ser compreendida olhando para trás, mas só pode ser vivida olhando para frente.” - O Curioso Caso de Benjamin Button

Flashback ON:

Era um dia de domingo, faltavam apenas dois dias até o dia da minha viagem para Fortaleza. Eu, Ana e Mandi estávamos andando pela cidade, aproveitando os últimos momentos juntas.

–Anda Bia! Se anima! – Mandi falava enquanto dava pulinhos na minha frente – Só porque você vai embora não significa que não vamos mais nos ver

–Eu sei – Falei com um tom desanimado – Mas não quero ir embora daqui, minha mãe podia muito bem morar em algum outro apartamento daqui, porque ela tem que ir pra tão longe?

–Lembra o motivo que sua mãe veio morar aqui? – Ana falou clareando a minha mente – Toda a família da sua mãe mora em Fortaleza, inclusive foi lá que ela conheceu seu pai

–E foi lá que eles se apaixonaram – Mandi completou – Mas tinha um problema, seu pai fazia faculdade aqui em Recife, então não podia morar com ela em Fortaleza

–Então ela resolveu vim morar com ele aqui – Ana continuou – E assim eles tiveram uma filha e viveram felizes até hoje.

–Agora já está na hora da sua mãe voltar para a família dela, não acha? – Mandi falou

–Vocês estão falando como se quisessem que eu fosse embora! – Falei chateada

–Não é isso, apenas queremos que você entenda o lado da sua mãe...

Não respondi nada, e elas, percebendo que eu estava realmente triste por ter que ir embora, não insistiram mais no assunto. Quando estávamos chegando na minha “casa”, Ana e Mandi começaram a andar por um outro caminho.

–Para onde vocês estão indo? – Perguntei

–Apenas nos siga! Acho que você vai saber para onde estamos indo – Mandi falou

Andamos até um pouco fora da cidade, comecei a reconhecer aquele lugar. Subimos uma pequena colina que tinha por perto e eu vi uma casinha de madeira perto de um rio. Ao lado da casinha tinha uma grande árvore, que tinha mais de 100 anos. Eu me recordava perfeitamente daquele lugar, sempre ia lá quando era pequena, mas com o tempo ele foi destruído, o rio estava poluído, os animais que passavam por lá nunca mais apareceram e a casa começou a ficar frágil e a desmoronar. A árvore, apesar de velha ainda estava viva, porém algumas de suas folhas começavam a cair devido a poluição daquele lugar.

–Porque vocês vieram aqui? – Perguntei ainda sem saber o motivo pelo qual elas haviam vindo até aqui

–Pensamos que você gostaria de vim aqui antes de ir embora – Ana falou com um sorriso no rosto.

Entramos na casa e vi que uma parte dela ainda parecia inteira. Fomos até uma sala que eu conhecia muito bem, ela parecia ser uma das poucas partes daquela casa que ainda estava inteira.

–Dá pra imaginar que há 8 anos, exatamente nesse lugar nós nos conhecemos? – Mandi falou sentando-se em uma cadeira de madeira.

–É verdade... - Falei sentando-me em uma poltrona vermelha e olhando ao redor.

Aquele parecia ser tipo uma sala de estudos. Havia uma escrivaninha marrom, de madeira, perto da parede, apenas com o espaço para alguém sentar na cadeira que havia entre a escrivaninha e a parede. Perto da escrivaninha tinha a cadeira onde Mandi estava sentada e a poltrona que eu estava sentada. Do outro lado da sala, tinha uma grande prateleira cheia de livros velhos e empoeirados.

Ana foi até a escrivaninha e abriu uma de suas gavetas. Tirou de dentro dela uma caixa, feita com alguns gravetos e pedaços de corda.

–Vocês lembram dessa caixa que fizemos quando éramos pequenas? – Ana perguntou – Nós guardamos aqui nossas coisas mais preciosas e juramos que seriámos amigas para sempre

Olhei dentro da caixa e vi um anel de plástico amarelo, uma presilha de cabelo azul e um chaveiro de um cachorro.

–Eu lembro que eu que coloquei esse chaveiro de cachorro ai – Falei pegando e lembrando do quanto ele era importante para mim naquela época – Como eu não podia ter um cachorro por ter apenas 3 anos, meus pais me deram esse chaveiro e eu andava com ele para todos os lugares

–Eu coloquei esse anel – Mandi falou segurando o anel– Ele nem parece mas tão precioso assim, mas me lembro que todas as outras meninas procuravam um desses amarelo, mas nunca achavam e tentavam pegar o meu – Ela disse dando um risinho.

–E eu coloquei essa presilha... – Ana falou – Eu adorava enfeitar meu cabelo com muitas coisas – Ela disse rindo – Eu sempre usava essa presilha...

–Depois de fazer esse juramento eu lembro muito bem que usamos o resto da corda para fazer colares com algumas pedrinhas que tínhamos achado, vocês lembram? – Mandi perguntou

–Claro que sim – Ana disse puxando algo que estava dentro do seu bolso – Eu ainda ando com ele até hoje

–Eu também – Mandi disse puxando o colar dela e eu fiz o mesmo

–Acho que esses colares da amizade são meio antigos – Ana falou rindo – Já se passaram 8 anos e ainda andamos com eles

Eu e Mandi concordamos. Depois saímos da casa e sentamos encostadas na árvore relembrando os momentos que passamos naquele lugar. Quando percebemos já estava bem tarde e resolvemos voltar para casa.

No caminho, percebi que Ana estava muito pensativa.

–A Bia vai embora daqui na terça, certo? – Ana perguntou

–Sim... – Falei com um tom desanimado por me lembrar da viagem

–Que tal fazermos a última festa do pijama em sua homenagem? Podemos fazer hoje à noite! – Ana falou animada

–Não estou com vontade de fazer nenhuma festa do pijama – Falei – Somente de ficar em casa esperando até o terrível dia da minha viagem

–Vamos Bia! Vai ser legal! Pode ser na minha casa – Mandi se ofereceu – Precisamos nos divertir antes de você ir embora

Depois de tanto elas insistirem acabei aceitando, mesmo sem vontade. No outro dia, de noite, fui pra casa de Mandi, onde seria a festa do pijama.

–A Ana já chegou? – Perguntei quando Mandi abriu a porta

–Não... Isso é bem estranho, já que ela é sempre a primeira a chegar...

–Vamos esperar mais um pouco

Eu entrei e nós fomos para a sala onde ficamos conversando por 10 minutos até que ouvimos a campainha tocar.

–Deve ser ela – Falei – Eu atendo

Levantei-me e fui até a porta. Quando abri vi que era Ana, ela parecia sem fôlego, como se tivesse vindo do centro da cidade até aqui correndo. Na mão dela tinha um pacote dentro de uma sacola de plástico.

–O que é isso que está dentro desse pacote? – Perguntei

–Depois vocês vão saber – Ana disse entrando

–Oi Ana! – Mandi disse levantando-se e dando pulinhos na frente de Ana – Essa vai ser a nossa última festa do pijama por vários meses ou até anos...

–Mandi! – Ana gritou quando Mandi falou em anos

–Tudo bem, tudo bem, haha! Nunca vamos ficar tanto tempo assim sem nos ver... Mas essa será a nossa última festa do pijama por vários meses, então temos que aproveitar ao máximo! – Mandi disse correndo para o quarto dela e corremos atrás – Concordam? – Ela disse abrindo a porta do quarto

–Sim! – Eu e Ana respondemos

Apesar de saber que em pouco tempo eu estaria em Fortaleza eu me sentia feliz, não era como se eu não fosse mais vê-las para sempre, pois eu sabia que iria. Perto delas parecia que todos os meus problemas desapareciam. Eu duvidava que ia conseguir encontrar mais alguma amiga como a Ana ou como a Mandi em Fortaleza.

–Hoje eu declaro que essa vai ser a última festa do pijama por meses, mas que essa será a melhor guerra de travesseiros que já fizemos em 8 anos! – Ana gritou jogando um travesseiro em mim

–Você pode ser boa em guerra de travesseiros, Ana, mas eu sou mais! – Mandi disse aparecendo atrás de Ana e batendo o travesseiro nela

–Primeiro você, Ana, depois você Mandi – Falei pulando por cima da cama com um travesseiro e batendo na Ana – Vou ser a vencedora dessa vez!

–Não tão rápido senhorita Beatriz – Mandi falou jogando o travesseiro em mim – Eu vou ganhar dessa vez!

–Não! – Falei usando meu travesseiro para impedir que o dela batesse em mim – Eu que vou ganhar! – Corri e bati meu travesseiro na Mandi

–Duas contra um não vale – Ana falou aparecendo atrás de mim e me acertando com o travesseiro – Mas vocês duas sabem que sou a rainha da guerra de travesseiros não é?

Nesse momento eu olhei para Mandi e ela olhou para mim, então corremos com os travesseiro e batemos na Ana fazendo ela cair na cama.

–Como eu disse, duas contra uma não vale! – Ela disse se levantando e correndo para bater em nós duas com o travesseiro

Depois de quase uma hora de guerra decidimos descansar um pouco e Ana aproveitou o momento para nos mostrar o que tinha dentro do pacote.

–Como dissemos hoje de manhã – Ela falou depois de se levantar, pegar o pacote na escrivaninha e voltar para a cama – Aqueles colares da amizade já estavam “um pouco” velhos e então eu comprei esses

Ana tirou de dentro do pacote um colar brilhante, como se fosse de ouro, nele tinha escrito BFF. Ele era dividido em três partes. Ela me entregou a parte do “B”, entregou para Mandi o primeiro “F” e ficou com o segundo “F”. Colocamos os colares no pescoço.

–Quando você comprou eles? – Perguntei

–Antes de vim para cá, mas estava bem difícil de achar um que fosse dividido em três partes, por isso cheguei atrasada.

–E onde você arrumou tanto dinheiro pra comprar isso? – Mandi perguntou surpresa

–Não gasto toda minha mesada como vocês! Eu economizo e gasto com algo que realmente preciso, deviam seguir meu bom exemplo.

Todas rimos pelo jeito que Ana falou. Foi muito legal da parte dela ter comprado aqueles colares para todas nós, apesar de terem sido bem caros.

–Quem está com fome? – Mandi perguntou – Minha mãe fez biscoitos e suco antes de sair com meu pai, eles vão dormir fora hoje, então não precisamos nos preocupar com a hora que vamos dormir – Ela disse levantando-se e saindo do quarto

–Eu estou – Ana disse seguindo-a e eu fui junto

Levamos a comida para o quarto e ficamos conversando até dar 1:30.

–Que tal assistirmos um filme? – Ana perguntou – Como essa festa do pijama é em homenagem a Bia ela mesma pode escolher

–Eu não sou boa em escolher filmes, a Mandi escolhe muito melhor que eu

–Eu sei que escolho melhor que você – Mandi disso rindo – Mas a festa é sua e você escolhe

–Tudo bem, tudo bem – Falei sorrindo – Então eu escolho... A Fantástica Fábrica de Chocolate, vocês sabem como eu amo esse filme, não é?

–Sim, sabemos bem até demais – Ana falou rindo – Mandi, a casa é sua, pode pegar, por favor, esse filme antes que nossa adorável amiga, Beatriz, comece a chorar?

–Claro que sim, tudo por vossa alteza – Mandi falou rindo e indo pegar o filme

–Obrigada por fazerem isso tudo por mim – Falei sentando-me na cama

–Somos amigas não é? – Ana falou sorrindo – Não importa o quanto o tempo passe, a distância que estivermos, não importa se você estará no Japão, eu e Mandi aqui no Brasil. Nossa amizade será a mesma, hoje, amanhã e sempre.

–Promete? – Perguntei

–Prometo – Ana falou me abraçando e eu retribui o abraço

Isso era uma coisa que eu mais gostava em Ana, apesar de ela ser mais nova que eu, sempre me fazia ficar melhor e me dava os melhores conselhos. Ela sim, era minha amiga de verdade, e naquele dia, eu tive mais certeza ainda disso. Ela não parecia ser mais nova, exatamente ao contrário, parecia ser mais velha, uma irmã mais velha.

Logo depois Mandi voltou com o filme e nós assistimos, comendo pipoca e tomando refrigerante. Quando o filme acabou eu estava com uma vontade louca de comer chocolate.

–Esse filme me fez ficar com vontade de comer chocolate – Ana falou

–Eu também – Falei – Mandi, pelo amor de Deus, me diga que aqui tem chocolate! – Falei desesperada

–Claro que tem, e do seu preferido, aqueles que tem amendoim e derretem na boca – Mandi disse rindo do meu desespero – E também tem os sem amendoim, sei que você não gosta dos com amendoim ou castanha, Ana

–Pelo menos você lembrou de mim, não é, senhorita Amanda? – Ana disse rindo

–Claro, ué! Você é a conselheira de vossa alteza, nunca poderia esquecer-te

–E você é o bobo da corte – Ana disse rindo

–Haha, que engraçadinha – Mandi disse dando língua para Ana e vice-versa

Mandi foi pegar os chocolates e comemos todos. Quando percebemos já ia dar 4:00.

–Já está bem tarde – Ana disse indo ao banheiro limpar as mãos por causa do chocolate – Mas por milagre, não estou com sono

–Eu também não – Eu e Mandi falamos ao mesmo tempo

Depois de limparmos as mãos olhamos uma para a outra com um olhar que conhecíamos muito bem. Pegamos os travesseiros e começamos uma nova guerra. Dessa vez Mandi se rendeu primeiro e alguns minutos depois, Ana.

–Ganhei! Eu disse que era a melhor!

–Ganhou só dessa vez! – Ana disse, da próxima vez eu vou ganhar

–Nada disso, eu que vou ganhar!

–Meninas – Falei olhando pela janela – Olhem, o sol está nascendo

Nós três fomos para a janela e ficamos olhando o sol nascer. Aquela cena me lembrava muitas coisas, boas e ruins. O nascimento de algo brilhante como o sol era como minha amizade com a Ana e com a Mandi. Apesar do longo tempo que ele está “vivo”, ele continua o mesmo, brilhante, e insubstituível. Porém, ao mesmo tempo, vê-lo me fez lembrar que no dia seguinte eu iria viajar, e iria ficar longe dessas minhas amigas que, para mim, eram o meu único sol, o meu único brilho, a minha única luz.

Abracei Ana e Mandi e comecei a chorar, de emoção e de tristeza ao mesmo tempo. Voltamos para a cama e pude perceber que Mandi chorava tanto quanto eu. Ana não estava chorando, e não me impressionei por isto, ela não chorava por quase nada.

Resolvermos ir dormir, pois já estava bem tarde. Ana estava do meu lado esquerdo e Mandi do meu lado direito. Quando eu estava prestes a dormir ouvi uma voz.

–Bia... Está acordada?

–Estou sim, Mandi, o que foi? – Perguntei com a voz fraca, quase dormindo

–Me promete uma coisa?

–Claro, o que é?

–Promete que nunca, nunquinha vai se esquecer ou trocar eu e a Ana?

–Claro que prometo, pelo que eu saiba, não se pode trocar irmãs

Percebi que ela chegou mais perto, e a Ana também. Em pouco tempo dormi, ou melhor, cochilei, não consegui dormir pensando naquela viagem, e que teria que deixa-las para trás e encontrar outras amigas para chamar de irmã. Mas no fundo, eu sabia que iria vê-las de novo, e sabia que o dia que nos reencontrássemos, seria um dia inesquecível.