Depois que cheguei da New Scotland Yard, pedi para Susan reunir nossa família na sala enquanto subia para tomar um banho, me preparando para o que faria a seguir.

Enquanto aguardava na recepção o comissário de polícia me chamar, para dar o meu depoimento, decidi que não podia mais esconder nada da minha família. Estava cansada de guardar tantos segredos, que só me machucaram durante todo o processo e não queria mais passar por tudo isso sozinha.

—Você está fazendo o certo. - Susan disse suave assim que desci as escadas e vi toda a nossa família ali, menos os meus sobrinhos mais velhos que estavam na escola.

—Querida, você está bem? Porque está com a aparência, de quem andou chorando? - minha mãe questionou preocupada se levantando do sofá, vindo em minha direção antes de me abraçar com carinho.

—Não estou bem, mãe, mas prometo que vou ficar. Só que preciso contar algo a vocês. - disse cansada me separando da minha mãe, antes de olhar para todos que estavam na sala.

—Claro filha, escutaremos tudo o que quiser nos contar, mas tem certeza que quer fazer isso agora? Cíntia, você parece a ponto de desabar, querida. - meu pai disse preocupado e suspirei, antes de me sentar no sofá e indicar que eles fizessem o mesmo.

Respirei fundo e olhei nos olhos da minha família, antes de contar tudo.

Desde as mentiras de Douglas, sua chantagem e a perda da pensão.

A cada revelação, me sentia mais leve, como se estivesse tirando um peso das minhas costas, que me impedia de respirar.

—Me perdoem por tudo. Juro que tentei resolver toda essa confusão em que entrei, mas não consegui. Acabei metendo os pés pelas mãos e perdendo a pensão. - solucei entre lágrimas enquanto olhava para todos, antes de olhar para minha avó. - Me perdoe vovó, por não ter recuperado a pensão...Por não ter lutado o suficiente, para impedir que a tirassem de nós.

—Cíntia, meu amor, não me importo com a pensão. Ela é só um prédio antigo sem importância, você é muito mais importante pra mim do que esse lugar e saber que passou por tudo isso sozinha, apenas porque não queria me preocupar me deixa triste. Porque te amo demais, querida e seria capaz de tudo por você. - vovó disse suave se levantando do sofá, antes de vir me abraçar com carinho enquanto chorava em seu peito. - Não importa se teremos que deixar esse lugar, a pensão Moema não está ligada a esse prédio e sim aos nossos sentimentos, o que nos permiti recomeçar em qualquer lugar, desde que estejamos todos juntos.

—Sua avó tem razão, filha. Saber que suportou tudo isso sozinha, parti meu coração. Cíntia, sou seu pai meu amor, é meu dever protege-la de qualquer coisa, mas fico feliz que tudo tenha terminado bem e que tenha nos contado a verdade. - meu pai disse com os olhos vermelhos, demonstrando o quanto ele havia chorado ao ouvir tudo que havia passado nos últimos meses.

—Não fiz por mal, papai, só queria poupá-los de todo esse sofrimento e não passei por tudo isso sozinha, minha irmã estava do meu lado. - disse olhando para Susan que sorriu amorosa para mim, antes de vovó me soltar e beijar a minha testa com carinho.

Sem dizer uma palavra, minha família se levantou do sofá e veio me abraçar, me fazendo sentir amada, querida e acolhida.

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Estava uma noite agradável e repleta de estrelas, por isso depois do jantar abri a porta dos fundos da cozinha e me sentei nos primeiros degraus, para respirar um pouco do ar puro, tentando assim acalmar a minha mente agitada.

Apesar de tudo que passei hoje, o único fato que me assombrava era a dor nos olhos de Ethan, quando lhe disse que não queria mais ser a sua amiga. Mesmo nos tornando amigos por apenas alguns dias, foram os melhores dias da minha vida.

Ele me fez respirar e esquecer um pouco, tudo que estava vivendo.

Ele me entendeu e me ouviu, acreditando em mim sem ao menos questionar ou duvidar da minha palavra. Ele me fez sentir especial e única, como ninguém havia sido capaz de fazer.

E saber que podia estar sendo a causa do seu sofrimento me doía profundamente, mas apesar de sentir algo por ele, ainda não me sentia pronta para me arriscar em outro relacionamento. Nem com Ethan, muito menos com Pedro ou com qualquer outra pessoa.

Iria dedicar esse tempo pra mim.

Em curar as minhas feridas, causadas pelo meu relacionamento anterior e me reerguer, aprendendo e crescendo com os meus erros.

—Olha só, o que trouxe para te animar. - Pedro disse sorrindo fechando a porta atrás de si, antes de balançar um pote de sorvete de chocolate e duas colheres para mim me fazendo rir.

—Obrigada, estava realmente precisando de sorvete. - disse agradecida e ele sorriu, antes de se sentar ao meu lado. Pedro me entregou uma colher antes de abrir o pote de sorvete, me incentivando a ser a primeira a comer.

—Como está se sentindo? - ele questionou preocupado, depois que coloquei minha primeira colher de sorvete de chocolate na boca.

Foi impossível não contar para ele tudo o que aconteceu, afinal, tínhamos uma amizade de anos, apesar de saber recentemente que ele ainda sentia algo por mim. Só que ao contrário de Ethan, Pedro não gritou para todo mundo ouvir que era a mulher dele, mesmo não sendo.

—Péssima, mas estou com a consciência tranquila em parte, por saber que Douglas não poderá chegar perto de mim e responderá por tudo que me fez, mas por outro lado estou apavorada, só de imaginar que podemos ser despejados a qualquer momento.- disse sincera olhando nos olhos de Pedro que concordou, antes de comer um pouco do sorvete.

—Sei que é assustador, mas você precisa respirar fundo e tentar se acalmar. Acredito que tudo vai dar certo, deixe para se preocupar quando chegar a hora. - ele pediu e concordei antes de deitar a minha cabeça em seu ombro, enquanto ficávamos ali juntos olhando para as estrelas.

—O que aconteceu conosco Pedro? Porque nos perdemos um do outro? - questionei me lembrando de como éramos apaixonados quando adolescentes.

—Sinceramente não sei, Ci. Porque me deixou ir embora? Mesmo me amando? - Pedro questionou sincero e me afastei dele para olhar em seus olhos.

—Porque não parecia certo prendê-lo aqui. Eu não tinha o direito de impedi-lo de ser feliz, só porque o amava. Sempre achei que o amor, devia ser altruísta e generoso, por isso decidi abrir mão de você para que pudesse realizar seus sonhos e ser feliz. E não me arrependo da minha decisão, Pedro, porque você se tornou um profissional incrível e respeitado no seu ramo, se tivesse que escolher novamente, não mudaria a minha decisão. - expliquei suave olhando em seus olhos e ele sorriu carinhoso para mim.

—Jamais vou poder agradecer, Ci. Você abriu mão de mim, para que pudesse realizar o meu sonho e isso, foi a maior prova de amor que já recebi de alguém. Por isso, muito obrigado.

—Não precisa agradecer, Pedro. Só de saber que você está feliz com a sua profissão, já me sinto feliz, mas tenho que admitir que tê-lo aqui nesse momento tão difícil é reconfortante. Me faz lembrar de quando tudo era mais fácil e leve. - admiti sincera e ele concordou, antes de colocar uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha.

Sem pensar direito e movidos pelas lembranças dos momentos que vivemos juntos quando adolescentes, nos aproximamos um do outro até nossas respirações estarem misturadas antes de Pedro me beijar.

No começo fui pega de surpresa, mas acabei me deixando levar pelo momento que me fez relembrar de todas as vezes em que nos beijamos quando mais novos. Só que dessa vez, não houve arrepio ou coração acelerado, pois o beijo de Pedro não mexeu comigo da mesma forma como antes.

Foi quando entendi, que apesar de gostar dele e da sua companhia, a nossa história havia se encerrado no momento em que terminamos quando adolescentes, sem direito a nenhuma chance de ter retorno, mas antes que pudesse interromper nosso beijo, a porta do fundo bateu com força e nos separamos devido ao susto.

—O que foi isso? - questionei confusa olhando para a porta, que dava acesso para a cozinha.

—Deve ter sido o vento. - Pedro disse olhando para a porta antes de virar para me ver.

—Me desculpe Pedro, mas não gosto mais de você desse jeito. Eu te amo como meu amigo, espero sinceramente que não fique magoado comigo, por não corresponder aos seus sentimentos. - disse sincera e Pedro sorriu carinhoso pra mim, o que me deixou confusa.

—Cíntia, pode parecer estranho, mas depois desse beijo, percebi que só te amo como minha amiga. E não se preocupe, porque não fiquei magoado, mas acho que você devia ir atrás de quem realmente gosta.

—Não existe ninguém, Pedro. - desconversei e ele me olhou sério, como se não acreditasse no que havia acabado de falar.

—Cíntia, vi o jeito que você e o Ethan se olhavam quando ele veio te deixar em casa, no dia em que cheguei. Vocês dois se amam, basta apenas perceberem isso.

—Foi impressão sua, além do mais, não somos mais amigos. - disse triste voltando a comer meu sorvete, deixando claro que não queria mais falar sobre o assunto e Pedro respeitou o meu desejo.

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Depois da briga que tive com Douglas, Ária me deu uma semana de folga para que pudesse me refazer, mas no terceiro dia já estava ficado maluca sem ter o que fazer, por isso inventei de fazer uma faxina pela pensão, pois vovó recusava ajuda na cozinha.

Estava tão concentrada em aspirar o sofá enquanto escutava minha playlist do meu cantor favorito quando alguém tocou a campanha, atrapalhando o meu momento maníaca por limpeza.

—Eu atendendo, vó. - disse despois que desliguei o aspirador e fui em direção a porta, ver quem era.

—Tenho uma encomenda, para a senhora Cíntia Lopes. - o entregador disse com um lindo buque de lírios em uma mão e um envelope preto na mão, assim que abri a porta.

—Eu sou Cíntia Lopes. - disse sem entender do que se tratava e o entregador rapidamente me entregou um tablet, explicando onde deveria assinar.

Ainda atordoada com a presença do entregador, só fiz o que ele me solicitou antes de receber o buque e o envelope preto nas mãos.

—Obrigada, você sabe quem mandou? - questionei não vendo nenhum cartão no buque de flores.

—Não senhora. Só fui instruído para entregar o buque e o envelope, mas meu supervisor disse que o nome do remetente está dentro do envelope preto.

—Tudo bem, obrigada mesmo assim, só espere até eu pegar a minha bolsa e lhe dar uma gorjeta. - pedi e ele balançou a cabeça negando, o que me deixou confusa.

—O remetente já deixou todas as despesas pagas. Tenha um bom dia senhora. - o entregador disse antes de sair da minha porta.

Confusa fechei a porta, sentindo o perfume dos lírios, minhas flores preferidas, antes de colocar o buque em cima da mesa de centro me sentando no sofá em seguida, para abrir o envelope preto e descobrir quem era o remetente.

Assim que abri o envelope, tirei do mesmo um contrato, um pequeno envelope de carta bege, uma partitura e uma carta escrita de próprio punho, que possuía uma caligrafia elegante e estranhamente familiar. Deixei os outros papeis de lado, decidindo começar pela carta.

“Querida, Cíntia.

Gostaria que as coisas entre nós pudessem ser diferentes...Queria ter feito tudo diferente, ter pensando mais antes de tomar as decisões que julguei serem certas, mas que acabaram nos afastando.

Jamais quis te magoar ou prejudicar, quando decidir quando a verdade para a noiva de Douglas...Sim, fui eu que contei tudo a Larissa.

Não podia permitir que ele fosse feliz depois de todo mal que fez a você, só que não achei que essa escolha iria ter consequências tão dolorosas, pois tudo que fiz, foi pensando no seu bem-estar, desde o começo.

Saber que por minha causa, você se colocou em risco parte meu coração, porque desde a primeira vez que a vi, só desejei que pudesse ser feliz, mas acabei sendo precipitado e a afastando de mim. Respeito a sua decisão de não me querer por perto, por isso decidi escrever está carta, para lhe pedir perdão antes de ir.

Me perdoe por ter lhe colocado em perigo, obrigando-lhe a enfrentar seu ex-namorado, mas principalmente, me perdoe por ter gritado na frente dos funcionários do Conglomerado, que você era a minha mulher.

Eu não tinha o direito de fazer isso, pois você não merece ser tratada como uma coisa ou o objeto de alguém. Você merece muito mais que ser só a mulher de alguém, Cíntia.

Você merece estar com alguém, que a respeite e incentive seus sonhos.

Que a faça se sentir única e especial no mundo, que a faça sorrir sempre, pois o seu sorriso é o mais lindo e musical que existe.

Que a leve para dançar, pois você é uma excelente dançarina e o mundo inteiro precisa saber disso. E acima de tudo, que ame você, da forma mais pura e verdadeira que existe.

Sabe, por algum tempo sonhei que puderia ser essa pessoa, pois desde que a conheci me apaixonei por você sem ao menos perceber... Sim, Cíntia, eu te amo.

Me apaixonei por você incondicionalmente, desde a primeira vez que a vi no jantar de ensaio do meu irmão, mas não quero que se sinta obrigada a corresponder o que sinto. Só quero que saiba, que você foi a primeira mulher por quem me apaixonei e provavelmente a única.

Que me fez deixar de ser de todas para ser apenas seu.

Você me fez imaginar, como seria a minha vida tendo alguém que amo ao meu lado, para dividir meus sonhos, meus problemas e a minha felicidade, mas principalmente, alguém com quem dividir a minha vida. Mesmo que não possamos ficar juntos, você me fez tanto bem Cíntia.

Em pouco tempo, você me transformou em um homem melhor e lhe serei eternamente grato por isso, por me permitir amar de verdade.

Por me ensinar que o amor é altruísta e generoso, valendo muito mais suas demonstrações do que palavras bonitas, mesmo que não possamos ficar com quem amamos.

E eu te amo tanto por isso...Por me permitir sentir uma vez na vida, o que era amor de verdade. E como demonstração do amor que sinto a você, comprei a hipoteca da pensão e coloquei no seu nome.

Por favor, não fique magoada com o meu gesto nem pense que fiz isso esperando ser recompensado. Comprei a pensão, porque sei o quanto ela é importante para você e não suportaria saber, que vocês perderam o local que tanto amam por minha causa.

Por favor, aceite esse presente, saber que aliviei um pouco o fardo dos seus ombros me deixará um pouco mais tranquilo para partir, sabendo que ficará bem.

Toda a documentação da pensão, tanto da compra como da doação, está nesse mesmo envelope no qual encontrou a carta que está lendo.

Ele também contém um envelope de carta bege, no qual há dois pares de ingresso para um show no Brasileiro do seu cantor preferido, considere isso como um presente atrasado pelo seu aniversário.

E o último papel se trata de uma partitura, da música que escrevi para você no dia em que nos conhecemos, após tê-la deixado em casa. Espero que goste dela, pois a fiz com muito carinho para você.

Se algum dia quiser ouvi-la, é só levar a partitura e pedir ao Sebastian, que ele saberá o que fazer.

Espero sinceramente que algum dia possa me perdoar, por tê-la feito sofrer sem a intenção.

Desejo que seja imensamente feliz, Cíntia.

Com amor,

Ethan.”

Terminei de ler a carta de Ethan entre lágrimas, por perceber o quanto havia sido cruel com ele. Desesperada, deixei a carta em cima da mesa e me levantei do sofá, subindo as escadas correndo até o meu quarto para pegar o meu celular.

—Por favor, atenda. - pedi com o aparelho na orelha ouvindo-o chamar varias vezes, antes de cair na secretaria eletrônica.

Sem pensar duas vezes, procurei o número da mansão Thompson no meu celular ligando em seguida, rezando para que alguém atendesse.

—Mansão da família Thompson, bom dia. - uma voz gentil atendeu do outro lado da linha e respirei aliviada, por alguém ter atendido.

—Alô, bom dia. Ethan, se encontra? Preciso urgentemente falar com ele.- implorei e a voz do outro lado ficou em silêncio, me deixando angustiada.

—Só um minuto, senhora. - a voz disse por fim antes de passar o telefone para alguém.

—Ethan? - questionei esperançosa enquanto meu coração batia acelerado, ansioso para ouvir a sua voz novamente.

—Não querida, é a Leah, a mãe dele.- ela disse com a voz triste e senti a lágrimas caírem dos meus olhos. -O Ethan, viajou para Nova York, Cíntia. Só volta no mês que vem.

—Ele viajou...- sussurrei entre lágrimas, assim que entendi o que sua mãe havia acabado de falar.

—Sim, querida. Eu sinto muito. - Leah disse triste do outro lado da linha e agradeci a informação antes de desligar, me entregando as lágrimas.